Resumo
Neste artigo analisamos dois retratos de Antônio Joaquim Ribas (1818-1890): uma pintura a óleo e uma litografia. Construindo a narrativa a partir de uma interrogação constante dessas imagens, este texto reconstitui as ideias de Ribas, bem como a trajetória do pintor Nicolau Huascar de Vergara (?- 1886) - artista pouco conhecido do século XIX. A seguir, o artigo correlaciona os dois retratos, de modo a iluminar transformações nos modos de representação e autorrepresentação das elites paulistas, num momento em que a cidade passava por profundas mudanças. Trata-se de um estudo particularizado, com problemática específica, a partir do caso do segundo retrato a óleo que veio formar a Galeria do antigo Salão Nobre da Faculdade de Direito de São Paulo e de um retrato litográfico do mesmo professor, realizado concomitantemente ao primeiro, ambos por iniciativa de estudantes.
Palavras-chave:
retrato; Galeria da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco; Nicolau Huascar de Vergara; Conselheiro Ribas; São Paulo no século XIX
Abstract
In this article we shall analyze two portraits by Antônio Joaquim Ribas (1818-1890): an oil painting and a print. In examining these images, this paper sheds light on Ribas’ ideas as well as on the biography of Nicolau Huascar de Vergara (?- 1886) - a little-known artist of the nineteenth century. We then compare the two portraits to examine the forms of representation and self-representation of São Paulo’s elites at a time when the city was undergoing major changes. This is a case study based on the second oil portrait that came to form the Gallery of the former Great Hall of the São Paulo Law School and a lithograph portrait, made at the same time, both funded by students.
Keywords:
portrait; São Francisco School of Law Gallery; Nicolau Huascar de Vergara; Conselheiro Ribas; São Paulo in the 19th century
Apresentamos, a seguir, um estudo particularizado, com problemática específica, a partir do caso do segundo retrato a óleo que veio formar a Galeria do antigo Salão Nobre da Faculdade de Direito de São Paulo e de um retrato litográfico do mesmo professor, realizado concomitantemente ao primeiro, ambos por iniciativa de estudantes.1 1 Participaram desta pesquisa as mestrandas Débora Elise de Almeida (PPG História da Arte-EFLCH/ UNIFESP e Tatiane Gomes da Silva (PPG História Social-FFLCH-USP) e os graduandos Igor Tostes Fiorezzi (FD-USP), Mayara Dantas (Dep. de História -EFLCH/Unifesp) e Yngrid Ferreira de Sousa (Dep. de História da Arte - EFLCH/Unifesp).
Entre os mais de 100 retratos a óleo existentes hoje na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 23 obras de grandes dimensões - com variações em torno de 2m40 x 1m50 - são as que compunham a Galeria de Retratos do Antigo Salão Nobre (ou Salão de Honra), desde seu início, em 1859, até a demolição, em 1935, do edifício conventual que abrigava a Faculdade para sua substituição pelo atual, sempre no mesmo lugar, o Largo de São Francisco.2 2 De acordo com informação do Museu da Faculdade de Direito-USP.
A Faculdade de Direito era então a mais importante instituição imperial existente em São Paulo. Fundada em 1827, no contexto de esforços para a consolidação do governo imperial, destinava-se à formação de uma elite dirigente e de quadros para administrar o país recém-emancipado, para ela convergindo estudantes de todo o país (MARTINS; BARBUY, 1999MARTINS, A. L.; BARBUY, H. Arcadas: história da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, 1827-1997. São Paulo: Alternativa/BM&F, 1998.; ADORNO, 1988ADORNO, S. Os aprendizes do poder: o bacharelismo liberal na política brasileira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988.).
Uma galeria de retratos ali se formou paulatina e espontaneamente, no espaço que passou a ser designado, com o tempo, como Sala dos Retratos ou outras formas similares. Até o momento não foi encontrada nenhuma imagem que registrasse essa Galeria no século XIX. A imagem mais antiga encontrada até aqui é uma fotografia impressa em 1905 (Figura 1), na qual, no entanto, pouco se consegue distinguir dos retratos (BARBUY, 2018BARBUY, H. Os inícios da Galeria de Retratos da Faculdade de Direito de São Paulo em meados do século XIX. In: BAREL, A. B. D.; COSTA, W. P. (org.). Cultura e poder entre o Império e a República: estudos sobre os imaginários brasileiros (1822-1930). São Paulo: Alameda, 2018. p. 209-250., p. 227 e 243-250).
Vista do Salão de Honra da Faculdade de Direito em 1905. Fotografia impressa em S. Paulo Antigo e S. Paulo Moderno, de autoria de Jules Martin, Nereu Rangel Pestana e Henrique Vanorden (1905, p. 39).
Os primeiros e a maior parte dos 23 retratos que compuseram a Galeria do Antigo Salão Nobre da Faculdade foram encomendados por grupos de estudantes, que se cotizaram, por meio de subscrições que se abriam publicamente em jornais, para adquiri-los e doá-los à Faculdade, em homenagem a seus professores mais admirados.
O gesto inscreve-se na prática largamente disseminada na segunda metade do século XIX, de homenagear homens importantes dando-lhes de presente seus retratos, mas, mais que isso, revelam o desejo de criar, na Faculdade de Direito, uma “galeria de homens ilustres”, condizente com o peso da tradição que, àquela altura, a instituição já cultivava (MARTINS; BARBUY, 1998MARTINS, A. L.; BARBUY, H. Arcadas: história da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, 1827-1997. São Paulo: Alternativa/BM&F, 1998., p. 30-55). A galeria vinha garantir, assim, a figuração e uma forma de presença, que reforçava a tradição de professores míticos. O retrato de Ribas foi o segundo de corpo inteiro a entrar na Faculdade, em 1863, poucos anos após o de Gabriel Rodrigues dos Santos, que havia sido instalado em 1859. No caso do retrato de Gabriel Rodrigues dos Santos, haviam sido 185 estudantes a se cotizarem, de todos os anos,3 3 Relação dos srs. que subscreverão (e pagarão) para compra do retracto (sic) do falecido dr. G.J.R. dos Santos, Correio Paulistano, 21 out. 1859, ed. 01059, p.3-4. e, no caso de Ribas, 14 estudantes, restritos ao quinto ano, para o retrato a óleo,4 4 Relação dos senhores que assignarão para o retrato do exm. sr. Dr. Antonio Joaquim Ribas..., Correio Paulistano, 8 out. 1863, ed. 02219, p.3. e 100 subscritores para a litografia,5 5 Despezas feitas com os retratos lithographados do Illm. Sr. Dr. Ribas, Correio Paulistano, 27 set. 1863, ed. 02210, p.3. entre os quais só foi possível identificar os estudantes que eram membros da comissão incumbida de encomendar a obra.
Após estudos sobre os contextos e circunstâncias que deram origem a cada um dos retratos dessa galeria, foi possível concluir que a maior parte das pinturas não foi inspirada por um momento político ou histórico específico. Articulam-se sobretudo à biografia de cada retratado e seu significado social no grupo envolvido em homenageá-lo, tudo intimamente entrelaçado à história da instituição. Esta, por sua vez, à história de São Paulo e do Brasil.
A principal hipótese lançada é de que, nos retratos dessa Galeria, é possível relacionar a forma como cada professor foi representado e as características pelas quais era conhecido, de personalidade, qualidades ou realizações. É claro que existe um padrão de representação comum a todos os retratos, como será discutido a seguir. Entretanto, parece-nos válido examinar cada retrato também a partir de pistas colhidas na história de vida de cada retratado. O grupo representado na Galeria era formado por indivíduos de grande projeção social. Eram figuras muito presentes no ambiente de São Paulo do século XIX - lecionavam no já então histórico Largo de São Francisco, eram atuantes na política paulista e nacional -, e por isso muito conhecidas, especialmente na cidade, onde também atuava a maior parte dos pintores envolvidos nessa Galeria. Com isso, queremos dizer que, ao receber uma encomenda para fazer o retrato de um professor do Largo de São Francisco, o pintor iria se inspirar na ideia geral existente sobre ele - que chamaríamos hoje de imagem pública. Esta imagem pública estava calcada em seu prestígio entre os estudantes, nas polêmicas que podiam envolvê-lo, nos artigos de sua autoria que podiam ser lidos nos jornais, assim como em sua figura. Os professores podiam ser vistos com frequência pela vida da cidade, atuando na Assembleia Legislativa, falando a um auditório, transitando pelas ruas, na cadeira de uma barbearia ou numa loja, de prosa com um comerciante ou com um livreiro e tantas outras situações.
Passemos, assim, ao retrato do professor Antonio Joaquim Ribas, mais conhecido como Conselheiro Ribas.6 6 O título de conselheiro foi-lhe conferido anos depois de realizado o retrato que nos ocupa. Antes disso, era referido apenas como “dr. Ribas” (cf. Arquivo da Faculdade de Direito-USP. Série Atas das sessões da Congregação). No título deste artigo, porém, optamos pela forma “Conselheiro Ribas” por ser aquela pela qual ficou mais conhecido.
Neste artigo, o retrato é o documento-base para uma pesquisa que articula a história social à história da arte. É o ponto de partida para uma investigação que vai se dividir entre a biografia de Antonio Joaquim Ribas - o homem representado na pintura -, e a trajetória de Nicolau Huascar de Vergara - o artista que fez o retrato. Ao explicitar as trajetórias individuais entre modelo e pintor, este artigo busca transitar pela complexa tessitura de relações sociais na São Paulo de meados do século XIX. Reconstituem-se as ideias e a atuação do retratado, pautadas na função civilizatória do teatro, na escrita de uma história da independência a partir de São Paulo, na crença no direito como força organizadora da nação, que se constituía desde os anos 1820. Já a trajetória do pintor se encontra com a do retratado não apenas na realização de uma encomenda, mas também na vivência da vida boêmia da cidade, com seus pequenos teatros, poetas e universidade. Finalmente, este estudo aponta para um fato curioso: Ribas se deixa retratar de duas formas. Na pintura a óleo, para adentrar uma galeria de honra - no Ocidente, uma categoria quase milenar e no Brasil, tradicional local de memória para as elites desde o período colonial. Desse retrato, existe uma fotografia impressa em 1944, momento em que a Galeria do Antigo Salão Nobre já não mais existia e a pintura encontrava-se na Sala da Associação dos Antigos Alunos (Figura 2). O retrato a óleo hoje pertencente ao acervo da Faculdade de Direito é uma réplica pintada por Henrique Manzo em 1954 (Figura 3).
Vista que traz, ao fundo, o retrato do Conselheiro Ribas em 1944, na sala que então levava seu nome e sediava a Associação dos Antigo Alunos. Fotografia impressa em Americano (1944AMERICANO, J. O Conselheiro Ribas (Antonio Joaquim Ribas). São Paulo: Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo/Associação dos Antigos Alunos, 1944. , p. 5).
Retrato de Antonio Joaquim Ribas. Réplica realizada por Henrique Manzo, em 1954, a partir de pintura original de Nicolau Huascar de Vergara, de 1863. Óleo sobre tela, 270x170 cm. Acervo Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Fotografia de César Viegas.
Assim, em 1863, a imagem de Ribas seria fixada primeiro pela fotografia e, a seguir, pela pintura a óleo e pela litografia. Desta última, um exemplar original está preservado no acervo do Museu Republicano Convenção de Itu (Figura 4).7 7 Essa litogravura foi reproduzida em RIBAS, Antônio Joaquim. Curso de Direito Civil Brasileiro: parte geral. 3.ed. Rio de Janeiro: Typ. do “Jornal do Commercio” de Rodrigues & C., 1905. (Prefácio por Geraldo Ribas). A produção desses dois retratos ao mesmo tempo sugere como a São Paulo dos anos 1860 já estava inserida na modernidade e como esse fato impactou também o modo como as elites paulistas se viam ou queriam se ver representadas (MICELI, 1996MICELI, S. Imagens negociadas: retratos da elite brasileira (1920-1940). São Paulo: Cia das Letras, 1996. ).
Retrato de Antonio Joaquim Ribas. Litografia realizada em Paris pela casa litográfica Desmaisons, com base em fotografia de Gaspar (Carneiro & Smith, S. Paulo). 1863, 55x45 cm. Acervo do Museu Republicano Convenção de Itu - Museu Paulista-USP, Coleção Prudente de Moraes (provável). Reprodução fotográfica por Hélio Nobre e José Rosael.
A encomenda
A Galeria de Retratos tinha-se iniciado com a doação, em 1859, por um grupo de alunos, do retrato do Dr. Gabriel José Rodrigues dos Santos, para instalação no recinto da Escola. Naquele caso, o professor havia falecido precocemente e a comoção tomara conta do ambiente não só da Academia como da capital paulista. Como o Dr. Rodrigues dos Santos não deixou nenhum livro publicado, o Dr. Antonio Joaquim Ribas decidiu organizar os discursos parlamentares do colega, que foram publicados com prefácio seu.8 8 DISCURSOS parlamentares do Dr. Gabriel José Rodrigues dos Santos coligidos pelo Dr. A .J. R. Rio de Janeiro: Typographia Paula Brito, 1863.
Não seria óbvio entender por que o Dr. Ribas, aparentemente mais identificado com o Partido Conservador pelo qual se elegera inicialmente como deputado à Assembleia Provincial de São Paulo,9 9 Atuou como deputado na Assembléia Provincial de São Paulo entre 1850 e 1859. teria sido a pessoa para essa iniciativa. Afinal, Gabriel Rodrigues dos Santos era um liberal marcado: apesar de suas posições terem tendido à conciliação nos últimos anos, tinha em sua trajetória a marca do jovem brilhante, deputado provincial já em 1838, com apenas 21 anos de idade, e escolhido, em 1840, para secretário do Presidente da Província, Rafael Tobias de Aguiar. Sob a liderança de Tobias, participou do “núcleo duro” da Revolução Liberal de 1842, tendo sido com ele condenado e como ele sofrido as consequências da derrota. Não chegou a ser preso porque homiziou-se no sul do país e foi por fim anistiado. Examinando, porém, a trajetória de Ribas, veremos que, embora fosse presente e atuante nas Assembleia Legislativa e em várias outras frentes, era, antes de mais nada, um professor, um intelectual, preocupado com a realidade e a ação sobre ela, mas não se envolvia em movimentos revolucionários e não dava grande importância à política partidária, como notou Jorge Americano (1944AMERICANO, J. O Conselheiro Ribas (Antonio Joaquim Ribas). São Paulo: Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo/Associação dos Antigos Alunos, 1944. , p. 40).
Contudo, Rodrigues dos Santos e Ribas tinham muito em comum: ambos haviam se formado pela Academia de Direito de São Paulo (o primeiro na turma de 1836, obtendo grau de Doutor em 1838 e o segundo, na turma de 1839, obtendo grau de doutor em 1840); juntos, foram nomeados professores em 1854;10 10 Foram nomeados... Correio Paulistano, 10 jul. 1854, ed. 00012, p.4. A categoria de lente substituto correspondia ao início da carreira docente e os professores nela ingressos tinham como função substituir os catedráticos sempre que necessário, lecionando, assim, diferentes disciplinas, até que viessem a atingir o grau de catedráticos. atuaram como deputados na Assembleia Provincial de São Paulo, por seguidas legislaturas, além de outros pontos a que iremos nos referir ao longo deste artigo.
O retrato de Ribas foi encomendado por alunos desejosos de homenagear publicamente seu mestre, nesse caso, porém, em vida.11 11 Não encontramos a data precisa em que o retrato foi instalado na Faculdade de Direito mas no elogio fúnebre que fez ao Dr. Ribas (que é, porém já de 1890), Luiz Alves (1890, p. 621) indica que o retrato havia sido colocado na “sala dos atos” (uma denominação coimbrã para designar o recinto em que se realizavam os atos acadêmicos oficiais). No caso da Faculdade de Direito de São Paulo, essa sala era conjunta com o salão nobre ou salão de honra. Era 1863, mesmo ano da publicação dos Discursos parlamentares.12 12 A venda da obra foi anunciada pela Casa Garraux: Discursos Parlamentares, Correio Paulistano, 6 nov. 1863, ed. 02244, p.2. A biografia de Rodrigues dos Santos, de autoria de Paulo Antônio do Valle, que foi incluída nessa obra, tinha sido publicada primeiro nesse mesmo jornal, por partes, entre 5 e 23 de setembro de 1863. A iniciativa da homenagem a Ribas vinha dos estudantes que viriam a se formar no final daquele ano. No dia 12 de julho, o Correio Paulistano transcreveu uma carta enviada de São Paulo, que havia sido publicada no jornal acadêmico pernambucano Faculdade do Recife:
Folgo anunciar-te que no dia 22 de Abril reuniram-se os estudantes do quinto ano, dominados todos pela grandiosa ideia de patentearem por um modo digno ao sr. dr. Antonio Joaquim Ribas, lente catedrático de direito civil, a amizade, simpatia e gratidão que lhe devem, pelas maneiras delicadas com que soube sempre tratar a essa mocidade durante quase três anos, que dirigiu-a em sua educação literária. O sr. dr. Ribas é sem dúvida nenhuma digno da manifestação honrosa, que de seus sentimentos para com ele quer fazer essa distinta parte de nossa corporação. Sua probidade, ilustração, lhaneza, como mestre, e sinceridade como amigo, não podem deixar de ser tomadas em devida consideração por seus discípulos; eles pois, assim o fizeram, e decidiram que se lhe tirasse o retrato, a óleo, para ser-lhe depois oferecido, como único meio, de que dispunham para manifestação de sentimentos tão puros, quanto verdadeiros.
Honra e glória aos estudantes do quinto ano!
Nomeou-se uma comissão composta dos srs. Fortunato e Camargo, Pedro Rodovalho, e Pereira de Carvalho, a qual incumbir-se-á de dar execução à ideia.13 13 Faculdade do Recife. Correio Paulistano, 12 jul. 1863, ed. 02148, p.2.
A notícia no jornal Correio Paulistano indica que o retrato fora encomendado em abril, e sugere que havia um grupo grande engajado no projeto. É preciso lembrar que o retrato encomendado nada tinha a ver com um quadro doméstico. Não era um presente pessoal para o professor. Ao contrário, como se verá a seguir, o quadro de Ribas seguia os padrões típicos da “galeria de honra” tradicionais. Ou seja, fora feito para ser colocado nas paredes da Faculdade e Direito do Largo de São Francisco. Nesse sentido, o “oferecimento” mencionado pelo Correio deve ser compreendido em seu sentido histórico: era uma doação da memória do professor - de seu valor como mestre e homem público - à instituição e, portanto, à memória da Faculdade. Com seu retrato, Ribas entrava na história da instituição, ocupando seu lugar junto ao retrato de Gabriel Rodrigues dos Santos.
O mesmo jornal traz, poucos meses depois, uma nota curiosa. Alguém que se assinava “um colega”, informava: “acha-se concluído o retrato a óleo do Sr. Dr. A. J. Ribas, que os estudantes do quinto ano mandaram tirar ...” e pedia à “comissão encarregada de mandar fazer o retrato, que envide todos os seus esforços, para que ele tenha logo o destino que se lhe quer dar”. O pequeno texto parece um sutil lembrete de que o quadro estava pronto e, portanto, precisava ser pago. O valor de um retrato como aquele não era barato: já que tinha grandes dimensões e era destinado a um espaço de distinção (TELLES, 2015TELLES, P. Retratos entre baionetas: prestígio, política e saudades na pintura de retrato em Portugal e Brasil ente 1804 e 1834. 2015. 429 f. Tese (Doutorado em História da Arte), Universidade de Évora, Évora, 2015. Disponível em: Disponível em: https://dspace.uevora.pt/rdpc/handle/10174/14542 . Acesso em: 23 ago. 2018.
https://dspace.uevora.pt/rdpc/handle/101...
). Mesmo assim, seu criador não é mencionado na nota, que busca um tom cuidadoso, talvez para não ofender os encomendantes.
Retratos e galerias no Brasil do século XIX
Antes de continuar a discutir a galeria da Faculdade de Direito de São Paulo, cabe retomar a história do retrato na tradição luso-brasileira, bem como lançar algumas luzes sobre o surgimento de galerias e exposições de arte a partir de meados do século XIX.
Durante o período colonial, seguindo a tradição lusa, a produção artística no Brasil era vinculada à igreja. As ordens religiosas encomendavam imagens sacras em madeira policromada ou faiança. Preferia-se o azulejo à pintura de cavalete. No período colonial coube às irmandades a prática de encomendar retratos comemorativos. Estes seguiam um esquema sólido, com algumas pequenas variações (MIGLIACCIO, 2000MIGLIACCIO, L. Mostra do Redescobrimento: século XIX. São Paulo: Fundação Bienal de São Paulo/ Associação Brasil 500 anos Artes Visuais, 2000., p. 36). Esses retratos, porém, não eram destinados à apreciação pública -tampouco ocupavam os espaços domésticos. A falta de quadros decorando as paredes das casas ricas, tanto das fazendas quanto nas habitações citadinas, aliás, foi notada por diversos viajantes estrangeiros do século XIX.
Encomendados para ordens terceiras e misericórdias, os retratos tinham uma vocação pública: simbolizavam o poder e, ao mesmo tempo, os bons serviços, as ações beneméritas, prestadas pelos homens, e raramente as mulheres, representados. Esses retratos serviam, portanto, como memória e também como modelo, bem de acordo com a ideia de Historia Magistra Vitae, tão cara à tradição iluminista. Também na tradição europeia, o retrato devia portar valores vinculados ao sagrado, ao ensinamento e à moral (DIAS, 2009DIAS, E. Paisagem e academia‒ Félix-Émile Taunay e o Brasil (1824-1851). Campinas: Editora da Unicamp, 2009. , p. 16). Esse quadro geral se modifica a partir de inícios do século XIX, com a chegada da família real portuguesa, de diversos artistas viajantes, que vêm para Corte e outras cidades brasileiras para vender seus serviços como litógrafos, fotógrafos e pintores, e, sobretudo, com a criação da Academia Imperial de Belas Artes do Rio de Janeiro.
Inaugurada em 1826, já sob o reinado de D. Pedro I, a Academia Imperial de Belas Artes (AIBA) teve profundo impacto na vida cultural da Corte. Como órgão do governo imperial, ela centralizou diversas práticas artísticas: em primeiro lugar, como escola de artes. É nesse contexto que a pintura de cavalete passa a ser praticada no Rio de Janeiro. Os jovens aspirantes a artistas aprendem o desenho, a pintura, bem como buscam se apropriar de todo cabedal de saberes inerentes ao ambiente das academias: a hierarquia dos gêneros pictóricos - com destaque para a pintura histórica e o retrato; o conhecimento da história clássica, da mitologia e da iconografia religiosa, entre outros.
O quanto o ensino acadêmico modificou a tradição retratística luso-brasileira e, também, o quanto essa continuou sendo praticada e se misturou a técnicas e valores da tradição europeia, são questões complexas, que ainda merecem estudos mais abrangentes. Jean-Baptiste Debret, um dos artistas franceses que chegaram em 1816, treinou e aperfeiçoou dois artistas que já traziam as marcas da tradição luso-brasileira: Francisco Pedro do Amaral e Simplício Rodrigues de Sá. Este último, respeitado retratista, produziu tanto retratos para a Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, quanto imagens do imperador e de membros da corte. O artista criou, portanto, nas duas tradições: aquela que remontava a séculos de tradição lusa - os retratos sóbrios e formais das misericórdias, e também representações já perpassadas por valores modernos, com certa apreensão psicológica do modelo, caso do famoso retrato do Chalaça e também de algumas representações de D. Pedro I (MIGLIACCIO, 2000MIGLIACCIO, L. Mostra do Redescobrimento: século XIX. São Paulo: Fundação Bienal de São Paulo/ Associação Brasil 500 anos Artes Visuais, 2000.; SQUEFF, 2018SQUEFF, L. Retrato de Pedro I. In: : PICCOLI, V.; NERY, P.; KNAUSS, P. (org.). Coleções em diálogo: Museu Histórico Nacional e Pinacoteca de São Paulo. 1. ed. São Paulo: Pinacoteca de São Paulo, 2018. v. 1, p. 93-98.). Por outro lado, o próprio Debret incorporou certos motivos da tradição luso-brasileira - como no caso do retrato de D. João VI, em que aparece a Nossa Senhora da Conceição (SQUEFF, 2020SQUEFF, L. “Das fronteiras entre arte colonial e arte acadêmica no Brasil: o caso da Alegoria de Nossa Senhora da Conceição, do pintor Manoel Dias (1764-1837)”. In: BRANDÃO, A. (org.). As Fronteiras na História da Arte. 1. ed. Bragança Paulista: Margem da Palavra, 2020. v. 1, p. 89-96.). O retrato que discutimos aqui, do Conselheiro Ribas, tem vários elementos que o aproximam dos retratos das irmandades, como será discutido mais à frente.
Além de ser um centro de formação de artistas, cedo a Academia do Rio de Janeiro sediou também o que pode ser considerada a primeira exposição de arte da cidade, em 1829, num evento organizado pelos artistas franceses. A partir de 1840, sob a direção de Félix-Émile Taunay, a Academia passou a organizar as Exposições Gerais de Belas Artes, exibições periódicas em que expunham não apenas professores e alunos da instituição, como também artistas estrangeiros que estavam de passagem pela Corte (DIAS, 2009DIAS, E. Paisagem e academia‒ Félix-Émile Taunay e o Brasil (1824-1851). Campinas: Editora da Unicamp, 2009. ). A Academia de Belas Artes tornou-se também, a partir de fins de 1850, um espaço de exposição sistemática de artes. O Diretor Manoel de Araújo Porto-Alegre organiza novos estatutos para a instituição, que a partir de então passou a funcionar como uma espécie de museu (SQUEFF, 2013SQUEFF, L. Uma galeria para o Império: a Coleção Escola Brasileira e as origens do Museu Nacional de Belas Artes. São Paulo: Edusp, 2013. v. 1. 200 p.). O prédio ganhou um conservador/zelador, encarregado de abrir o prédio para visitação do público em certos dias da semana (SQUEFF, 2013SQUEFF, L. Uma galeria para o Império: a Coleção Escola Brasileira e as origens do Museu Nacional de Belas Artes. São Paulo: Edusp, 2013. v. 1. 200 p.).
A partir de meados do século, termos como “museu”, “galeria” e “panteão de heróis” ganham a Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, jornais como o Jornal do Commercio, entre outros. Na exposição Geral de 1859, os quadros são organizados de acordo com normas que seriam retomadas mais tarde. Em 1879, seria organizada pela primeira vez a “Coleção Escola Brasileira” - cuja disposição já se inspirava naquela dos museus europeus da época, conforme apontado por Squeff (2013SQUEFF, L. Uma galeria para o Império: a Coleção Escola Brasileira e as origens do Museu Nacional de Belas Artes. São Paulo: Edusp, 2013. v. 1. 200 p.).
Nesse sentido, ainda que não tivesse um centro de produção artística oficial como uma academia, a cidade de São Paulo estava sintonizada com os debates e valores do tempo. A encomenda do retrato do Dr. Gabriel R dos Santos e, pouco tempo depois, do Conselheiro Ribas, são indícios desse fenômeno. Ou seja, ainda que não existisse um espaço destinado a uma “galeria” no prédio, os dois quadros mencionados indicam: 1) que havia a preocupação com a inscrição daquelas obras numa tradição reconhecida e bem-aceita entre as elites da época. O modelo das Santas Casas inseria-se perfeitamente nesse caso. 2) Os quadros têm tamanho parecido e seguem padrão compositivo semelhante, sugerindo que talvez já houvesse uma intenção de serialização. Ou seja, intenção de produção de mais de um retrato num mesmo espaço. E aqui, ainda que não nomeada em 1859 ou em 1863 (anos em que foram colocados, na Faculdade, os retratos de Rodrigues dos Santos e Ribas, respectivamente), a ideia de galeria certamente já pairava entre os encomendantes dos dois retratos.
O artista
Quanto à encomenda - e ao pagamento - do retrato de Ribas, podemos ter certeza de que a discrição sobre o artista tinha fundamento. Afinal, ele era estrangeiro - mas não europeu -, e havia chegado a São Paulo há pouco tempo. Ou seja, ainda se firmava, na cidade, como ilustrador e retratista, e um comentário no Correio Paulistano indica o autor do retrato:
Acha-se concluído o retrato a óleo do Sr. Dr. A. J. Ribas, que os estudantes do quinto ano mandaram tirar pelo distinto retratista Nicoláo Huascar Vergara. É um quadro majestoso. Aquela fronte alta, aqueles olhos sempre buscando o céu, aquela boca d’onde partem frases tão cheias de erudição, a atitude das mãos, a nobreza do porte, tudo em uma palavra, parece animar-se perante aqueles que o contemplam.
É um trabalho que honra o artista que o fez, que enobrece os discípulos que tiveram semelhante idéia, e dará para sempre um testemunho das nobres qualidades, do profundo saber, e da verdadeira consideração em que é tido o Sr. Dr. Antonio Joaquim Ribas, pelos seus discípulos que se confessam seus sinceros amigos.14 14 O retrato do Exm. Sr Dr. Ribas. Correio Paulistano, 10 set. 1863, ed. 02195, p. 2. Transcrito da Revista Commercial, de Santos.
De fato, Vergara havia chegado à cidade no ano anterior e anunciara seus serviços como retratista, colocando-se à disposição do público: “...As pessoas, portanto, que desejarem possuir seus retratos fiéis, a óleo, a lápis ou miniaturas podem procurar o sr. Huascar”.15 15 Retratista. Acha-se nesta capital o sr. Vergara Nicolau Huascar, pintor ... Cf. Correio Paulistano, 25 maio 1862, ed. 01816, p. 2; Memorial Paulistano para o anno de 1863, op. cit. De fato, em cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, em meados do século XIX, inexistiam espaços institucionalizados de exposição artística, como museus e galerias. A retratística era uma alternativa de sobrevivência para a maioria dos pintores. Huascar já tinha colocado em exposição (no escritório do Correio Paulistano) pelo menos um retrato a óleo como mostra de suas habilidades:
PINTOR - O sr. Nicoláo Huascar, conhecido por seu talento em pintura, pela perícia em cenografia, pela idade em estudos comparados das escolas modernas de pintura, deu, como prova de sua proficiência um retrato a óleo, no qual se pode ver a perfeição dos delineamentos, as saliências dos traços fisionômicos e a firmeza d’um pincel de mestre. O retrato de que falamos acha-se em nosso escritório em exposição.16 16 PINTOR. Correio Paulistano, 28 jun. 1862, ed. 01842, p.1. O retrato a que se refere não é identificado.
Nicolau Huascar de Vergara ainda é um artista pouco conhecido. As referências encontradas na bibliografia não oferecem informações seguras sobre o pintor. Também a grafia e a ordem de seus sobrenomes possuem diferentes registros. Contudo, sua participação na vida artística do Império foi bastante importante, sobretudo como ilustrador, caricaturista e cenógrafo - atividade sobre a qual falaremos mais à frente.
Ele atuou no periódico Diabo Coxo (1864-1865), dirigido pelo caricaturista italiano Angelo Agostini, cujos redatores eram Sizenando Nabuco de Araújo e Luiz Gama, o que mostra a proximidade de Huascar com egressos da Faculdade de Direito, o primeiro bacharel formado e o segundo, antigo aluno ouvinte e depois advogado provisionado, de acordo com a legislação então em vigor.17 17 DIABO COXO. São Paulo, 1864-1865 (ed. fac-smilar). São Paulo: EDUSP, 2005. Introdução (“Foi o diabo!”, de Antônio Luiz Cagnin). Jornal redigido por Luiz Gama e Sizenando Nabuco de Araújo; ilustrado por Angelo Agostini com a colaboração de Nicolau Huascar de Vergara; impresso na Typographia Allemã. Mais tarde, Huascar de Vergara foi ilustrador d’O Polichinello, lançado em São Paulo em abril de 1876, “... redigido por Luís Gama e ilustrado por Nicolau Huascar de Vergara”, de acordo com Ana Maria CAMARGO, na Introdução (1981, p. 10). Em 1876, participou d’O Polichinello, jornal republicano e abolicionista dirigido por Luiz Gama. Dois anos mais tarde, assinava sozinho A Lanterna, folha satírica e ilustrada, periódico que teve apenas 15 números, publicado no Rio de Janeiro.18 18 A LANTERNA: folha satírica e ilustrada. Rio de Janeiro, 1878. Disponível em: http://acervo.bndigital.bn.br/sophia/index.html. Acesso em: 23 ago. 2018 Em todas essas publicações, é seu talento como desenhista e caricaturista que sobressaem. Tais participações jornalísticas, no entanto, eram posteriores ao retrato de Ribas, que Huascar pintou quando ainda era recém-chegado à cidade de São Paulo.
Em 1881, inscreveu-se em concurso para professor de pintura de paisagem na Academia de Belas Artes, mas não foi selecionado.19 19 MUSEU D. JOÃO VI-Escola de Belas Artes-UFRJ: documentos encadernados referentes ao requerimento de “VERGARA, Huscar Nicolas”, solicitando inscrição no concurso para a cadeira de Paisagem, flores e animais, 28/10/1880 a 20/03/1881. Nessa ocasião, declarou-se mexicano. Contudo, algumas descobertas sugerem que ele pudesse ter vínculos com outras nacionalidades.
Sua chegada a São Paulo foi inaugurada com “O Amazonas- Fragmentos de viagem”, que ocupou vários números do Correio Paulistano.20 20 VERGARA, Nicoláo Huscar de. “O Amazonas: fragmentos de viagem”. Traduzido do espanhol por Joaquim Cândido de Azevedo Marques e publicado em nove partes no Correio Paulistano, nos dias 26, 29, 30 e 31 de outubro e 4, 5, 7, 9 e 11 de novembro de 1862 - ed. 01942, 01944, 01945, 01946, 01948, 01949, 01951, 01953, 01954, respectivamente (BIBLIOTECA NACIONAL) bb. Esse relato nos dá algumas pistas sobre sua biografia. Em primeiro lugar, o texto é traduzido do espanhol. Além disso, em uma passagem, o autor comenta que conversou com uma mulher indígena em quéchua. Ele lhe pergunta onde fica a cidade mais próxima, e a mulher informa que é “Valsa Puerto”. Esses detalhes do relato nos permitem aventar ligações do artista para além de uma origem mexicana. A cidade de Balsa Puerto fica no Peru, na região do Alto Amazonas. Esse dado geográfico, encontrado no início do relato de viagem publicado pelo artista, sugere que ele vinha de algum país andino, e que provavelmente chegou ao país vizinho - o Brasil - atravessando a floresta e seus rios. Sua ligação com a região andina se confirma, além do mais, pelo nome. Huascar foi o imperador que dividiu por um tempo o controle do Império Inca, até ser assassinado por seu irmão, Atahualpa. Seria Huascar o sobrenome de sua mãe? Seria um sobrenome criado? Sabemos apena que seu pai se chamava José Maria de Vergara, conforme declaração oficial do próprio artista à Academia Nacional de Belas Artes.21 21 MUSEU D. JOÃO VI, documento citado.
Sua experiência entre os índios da Amazônia talvez explique uma de suas atividades de maior prestígio, que foi fazer as ilustrações para a Revista da Exposição Antropológica do Museu Nacional, em 1882. Fez algumas pinturas de paisagem, e pelo menos um quadro histórico de que se tem notícia: Moisés sendo apanhado na água pela filha do faraó, da qual encontramos apenas uma menção, referida como uma obra de excelência no Correio Paulistano.22 22 O publico desta capital... Correio Paulistano, 20 jul. 1864, ed. 02450, p.2. Huascar pintaria outro retrato semelhante ao de Ribas em 1877, o retrato de José Arouche de Toledo Rendon para a Galeria de Retratos da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
Quanto à sua atuação como cenógrafo, veremos adiante, no item “O retratado”, pois observamos um entrelaçamento entre os envolvimentos de ambos, Huascar e Ribas, com o teatro.
O retrato
A pintura de retrato tem larga tradição na pintura europeia: está vinculada à hagiografia moderna, à narrativa das biografias exemplares e dos grandes homens. Desde o Renascimento, reis, papas, artistas “geniais”, os chamados “grandes homens” do Antigo Regime (filósofos, matemáticos, negociantes), foram retratados. Portanto, retrato e biografia modelar são parte de um mesmo todo. Nas colônias, o retrato dos reis assumia a representação dos monarcas distantes: colocados em destaque nas festas públicas, recebiam honras e olhares como o governante que substituíam (SOUZA, 1999SOUZA, I. L. S. Pátria coroada: o Brasil como corpo político autônomo, 1780-1831. São Paulo: Edunesp, 1999. ). Não representavam o poder - eram o próprio poder (FARIA, 2012FARIA, B. M. R. “Retratos do Poder: a pintura de retrato setecentista da família real portuguesa no Brasil”. 2012. Dissertação (Mestrado) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2012. Disponível em: Disponível em: http://www.repositorio.unicamp.br/handle/REPOSIP/278653 . Acesso em: 23 ago. 2018.
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).
No âmbito do Império colonial português, as Santas Casas de Misericórdia destinavam um espaço para dispor os retratos dos provedores e benfeitores - na maior parte das vezes homens que haviam feito doações significativas - terras ou dinheiro -, entre outros membros das elites locais (BILAC, 2014BILAC, M. B. B. Elites e retratos: um estudo sobre as galerias de honra das Misericórdias de São Paulo e Santos. Acervo - Revista do Arquivo Nacional, v. 27, n. 1, p. 333-348, jan./jun. 2014.). Esses retratos tinham uma função celebrativa, de serem colocados numa série maior, uma galeria de beneméritos, personalidades exemplares cujas ações justificavam sua memória na sociedade. Por causa dessa função civil e comemorativa, esses retratos eram geralmente em grade formato. Dentro da concepção artística do antigo regime, o tamanho do quadro correspondia à importância e ao poder do retratado (TELLES, 2015TELLES, P. Retratos entre baionetas: prestígio, política e saudades na pintura de retrato em Portugal e Brasil ente 1804 e 1834. 2015. 429 f. Tese (Doutorado em História da Arte), Universidade de Évora, Évora, 2015. Disponível em: Disponível em: https://dspace.uevora.pt/rdpc/handle/10174/14542 . Acesso em: 23 ago. 2018.
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). A retratística produzida para essas instituições constitui uma das principais remanescentes da pintura brasileira do período colonial. E continuou sendo produzida no século XIX.
Essas obras seguem um padrão relativamente estável, estabelecido na península ibérica desde o século XVI: o modelo é representado em pé, com roupas sóbrias e expressão neutra. A composição é simples, com poucos objetos: cartas de doação, tapetes, estantes de livros, relógios, mesa com aparatos para escrita, entre outros. Eles funcionam como atributos que revelam a importância e o valor do retratado, informando ao observador a respeito de sua personalidade pública (jamais pessoal). No Brasil, esse gênero de retrato foi inserido numa tipologia em artigo clássico de Hannah Levy (1945LEVY, H. Retratos coloniais. Revista do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Rio de Janeiro, v. 9, n. 5, p. 251-290, 1945. ).
O retrato de Ribas insere-se nessa longa tradição, marcada, como notou Patrícia Telles, pela “continuidade plástica” (TELLES, 2015TELLES, P. Retratos entre baionetas: prestígio, política e saudades na pintura de retrato em Portugal e Brasil ente 1804 e 1834. 2015. 429 f. Tese (Doutorado em História da Arte), Universidade de Évora, Évora, 2015. Disponível em: Disponível em: https://dspace.uevora.pt/rdpc/handle/10174/14542 . Acesso em: 23 ago. 2018.
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, p. 15). A posição do modelo segue de perto a do primeiro retratado - Gabriel Rodrigues dos Santos, esquema que se mantém mais ou menos igual nos retratos seguintes: o modelo tem a mão direita apoiada numa mesa, está em pé - visto de frente ou de três quartos -, com rosto completamente visível, com roupas e expressão austeras, circundado por objetos significantes - a borla doutoral, livros, (caneta, tinteiro, no caso de outros retratos), entre outros. A luminosidade cai cuidadosamente sobre o rosto e as mãos do modelo, seguindo esquema compositivo típico da retratística desde o Renascimento italiano.
A expressão de Ribas é grave, a musculatura em torno da sobrancelha e da face esquerdas estão contraídas e os lábios cerrados. Cabelos lisos, repartidos, entrada pronunciada no lado esquerdo, barba aparada. Apresenta-se em traje social - conjunto de casaca, colete e calça no mesmo tecido escuro. Gravata de fita estreita com nó (do tipo borboleta) e sapatos de couro, tudo em preto. A camisa é branca, assim como as luvas: a mão esquerda veste a luva e segura aquela que teria sido retirada da mão direita. Esta, por sua vez, apoia-se sobre um livro aberto, este sobre um livro fechado e o capelo, ao lado da borla (insígnias doutorais), tudo sobre uma mesa coberta com um pano grosso verde escuro com frisos e franjas amarelo-ouro. À direita de quem olha, há parte de uma cadeira. Por trás do professor, uma cortina levantada deixa ver o fuste canelado de uma coluna clássica e uma estante de livros.
Como entender todos esses elementos de representação? Não há, por certo, explicações seguras, mas ensaiaremos algumas explicações que ajudam a compreender a biografia de Ribas por um lado, e a escolha de Vergara para fazer seu retrato por outro.
O retratado
Continuemos a descrever a tela. Vemos uma cortina em tecido grosso, pesado (possivelmente um veludo), tem franjas e puxador alto. A cortina era um elemento muito representado nos retratos por possibilitar efeitos plásticos (movimento, brilho, cor) e tridimensionais, permitindo a representação de um outro espaço dentro do quadro. Nessa obra, ela é usada para mostrar a biblioteca do retratado. Mas talvez a cortina possa receber ainda uma outra interpretação. Seria uma alusão ao teatro?
É sabido o quanto a atividade teatral era praticada e dinamizada por estudantes e egressos da Faculdade de Direito de São Paulo, fosse como autores, críticos, plateia ou mesmo atores. Conforme analisado por Elizabeth Azevedo (1995AZEVEDO, E. F. C. Um palco sob as arcadas: o teatro dos estudantes de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo, no século XIX. 1995. 410 f. Dissertação (Mestrado) - Departamento de Artes Cênicas, Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1995. , Capítulo 1, passim), o aperfeiçoamento da atividade teatral, no século XIX, em São Paulo, era considerado como parte do processo civilizatório. Segundo Azevedo (1995AZEVEDO, E. F. C. Um palco sob as arcadas: o teatro dos estudantes de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo, no século XIX. 1995. 410 f. Dissertação (Mestrado) - Departamento de Artes Cênicas, Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1995. ), a escrita de peças por autores nacionais e com temas nacionais, o estabelecimento de casas de espetáculos e o exercício da crítica teatral eram realizados como missões que contribuiriam para a construção do país e se faziam essencialmente por estudantes ou egressos da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco.
É nessa relação entre a Faculdade e o teatro que encontraremos um possível motivo para a escolha de Nicolau Huascar de Vergara para realizar o retrato de Antonio Joaquim Ribas, assim como para as referências que interpretamos como teatrais nessa pintura. Sendo Huascar de Vergara um cenógrafo ativo - um homem de teatro -, era bem adequado que fosse escolhido para retratar Ribas, já que este havia se constituído, desde alguns anos antes, em personalidade com atuação em prol da atividade teatral em São Paulo. Vejamos, em primeiro lugar, o caso de Vergara.
Vergara ficaria conhecido por sua “perícia em cenografia” (mencionada na citação acima), atuando tanto em São Paulo como no Rio de Janeiro. Sua ligação com a atividade teatral se confirma, ainda, pelo fato de que logo que chegara a São Paulo, em 1862, tivesse ido residir no Hotel do Hilário, na rua do Carmo n° 3, endereço no qual, conforme se pode pinçar no Memorial Paulistano para 1863,23 23 MEMORIAL PAULISTANO PARA O ANNO DE 1863. S. Paulo: Typ. Imparcial de J. R. de A. Marques, 1862. Acervo do Museu Republicano “Convenção de Itu”-Museu Paulista-USP. moravam alguns atores da Companhia Dramática, cujos 18 membros (um diretor, 10 atores, cinco atrizes, um ponto e um contrarregra) se dividiam basicamente entre três endereços próximos: uns nesse hotel, outros no largo da Sé n° 4 e outros na rua da Fundição n° 6 (atual rua Floriano Peixoto), ou outros números na mesma rua. Somente o ator Antônio Corrêa Vasques habitava um pouco mais afastado, na rua da Freira n° 5 (atual rua Senador Feijó) e o contrarregra Francisco Luiz Esteves, na rua do Imperador n° 29 (rua não mais existente). No Hotel do Hilário, onde veio residir Huascar de Vergara, moravam os atores João Eloy Quezado e José Victorino da Silva Azevedo e as atrizes Julia Carlota de Azevedo e Maria Vellutti. Em outras palavras, quando de sua chegada à Cidade, Huascar foi morar no mesmo local em que residiam atores e atrizes da companhia que se apresentava em São Paulo. Seu pertencimento ao mundo do teatro devia ser conhecido à época; para nós, no entanto, só se torna claro em razão de atividades que, mais tarde, nos anos de 1870, receberiam divulgação. Em 1875, volta a São Paulo, vindo do Rio, para fazer o pano de boca e outras obras cenográficas para a reforma de modernização por que passava o Teatro São José.24 24 HUASCAR VERGARA. Correio Paulistano, 21 dez. 1875, ed. 05761, p. 2. Em março de 1876, registrou-se que, nesse teatro:
[...] ao levantar-se o pano para o começo da representação, foram recebidas com palmas da plateia as pinturas cenográficas do primeiro ato, as quais bem como todas as outras que adornam o palco são devidas ao talento do hábil e conhecido cenógrafo sr. Huascar de Vergara.
Também o pano de boca que é de bonito efeito e obra do mesmo pincel, mereceu justa atenção do público pela austera singeleza com que foi traçado e pelos tons apropriados e seguros que a pintura conseguiu produzir”25 25 HUASCAR VERGARA. Correio Paulistano, 21 dez. 1875, ed. 05761, p. 2. (o tema do pano de boca era “a província de S. Paulo dando ao Brasil a Independência no dia 7 de setembro de 1822”).26 26 QUADRO A OLEO”. Correio Paulistano, 25 jan. 1876, ed. 05788, p. 2.
Em outras crônicas sobre a reabertura do Teatro São José, registra-se que também o pintor Villaronga27 27 Sobre José Maria Villaronga, ver Carlos Eugênio Marcondes de Moura. Vida cotidiana em São Paulo: memórias, depoimentos, evocações. São Paulo: Ateliê, Ed. Unesp, Imprensa Oficial, SECSP, 1998. p.385. tinha feito pinturas na Casa, juntamente com Huascar de Vergara:
[...] E vai senão quando põe-se todo aquele povo a olhar assim meio espantado para as pinturas do sr. Villaronga e para as pinturas do sr. Huascar, e para os bastidores e para o teto da sala, e para o pano e para o gás, e veio cá fora dizer que realmente aqueles dois cavalheiros possuíam dois respeitáveis pincéis!28 28 Correio Paulistano, 19 mar. 1876, ed. 05830, p.1. Também o jornal A Provincia de S. Paulo de 19 fev. 1876, p.2, faz menção aos dois pintores.
A partir de então, Nicolau Huascar de Vergara aparece como cenógrafo de peças levadas no Teatro São José: Ali-Babá e os quarenta ladrões (out. 1876), O naufrágio da fragata Medusa (maio 1877); D. João Tenorio ou O convidado de pedra (abr. 1882), Cocota (ago. 1885), A gata borralheira (set. 1885), de par com outras múltiplas atividades que continua a exercer como ilustrador e pintor. Também no Rio de Janeiro figura como cenógrafo em peças como Aimée ou O assassino por amor (abr. 1880), Um drama no alto mar (fev. 1885), O rei dos selvagens, em seguida assumido como O guarani (jun. 1885). Quando faleceu, em janeiro de 1886, foi identificado sobretudo como cenógrafo.29 29 HUSCAR DE VERGARA. Gazeta de Noticias [RJ], 12 jan. 1886, p.4; FALLECIMENTO. A Provincia de S. Paulo, 13 jan. 1886, p.999; HUSCAR DE VERGARA Correio Paulistano, 12 jul. 1887, ed. 09257, p.2.
Também na trajetória de Ribas, o teatro teve papel importante. Entre 1856 e 1859, ele se dedica com afinco ao desenvolvimento do teatro em São Paulo. Em 1856, estava entre os fundadores do Conservatório Dramático de São Paulo, ao lado de Gabriel Rodrigues dos Santos, João Dabney de Avellar Brotero e Manoel José Chaves,30 30 Correio Paulistano, Parte Oficial, Expediente da Presidência, 19 set. 1856, ed. 00455. p.2. todos os egressos da Faculdade de Direito. Segundo Azevedo (1995AZEVEDO, E. F. C. Um palco sob as arcadas: o teatro dos estudantes de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo, no século XIX. 1995. 410 f. Dissertação (Mestrado) - Departamento de Artes Cênicas, Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1995. , p. 94), as funções do Conservatório eram “1. renovar o repertório (a crítica à falta de novas composições era corrente); 2. Privilegiar os originais brasileiros e fazer com que as traduções fossem previamente aprovadas; 3. Dar aos autores porcentagens sobre a representação de seus trabalhos”.
Erudito, Ribas escreveu também sobre teatro, tendo cabido a ele o parecer emitido sobre o drama As feiras de pilatos, de Paulo Antonio do Valle.31 31 PARECER lido no Conservatorio Dramatico de S. Paulo sobre o novo drama - As Feiras de Pilatos. Correio Paulistano, 3 out. 1856, ed. 00458, p.4. Esse parecer informou aquele que foi, provavelmente, o primeiro julgamento feito pelo Conservatório Dramático recém-fundado, e constituía-se em uma crítica teatral favorável à encenação da peça em São Paulo. No ano seguinte, o parecer foi lido e aprovado por unanimidade em reunião do Conservatório, e o autor da peça foi incorporado como sócio.32 32 Conservatorio Dramatico de S. Paulo.Correio Paulistano, 17 maio 1857, ed. 00553, p.3.
Em seguida, Ribas passou a figurar como membro da Diretoria do próprio Teatro Público (depois Teatro São José), e nessa qualidade foi um dos signatários do convite ao célebre ator e empresário teatral João Caetano para que viesse a São Paulo.33 33 DIRECTORIA do Theatro. Correio Paulistano, 17 jun. 1857, ed. 00562, p.3. Ribas atuou em prol desse teatro, cuja construção havia sido entregue pelo Governo ao empreendedor particular Antonio Bernardo Quartim.34 34 REGULAMENTO do Directorio do Theatro Publico desta Capital. Correio Paulistano, 1 jul. 1857, ed. 00565, p.2-3; O THEATRO... O Publicador Paulistano, 22 ago. 1857, ed. 00008, p.4. A contratação desse empreendedor pelo governo da província para a construção do novo Teatro de São José foi um caso cheio de percalços até que a obra pudesse realmente se efetivar. Antonio Joaquim Ribas foi, ao lado de Gabriel Rodrigues dos Santos, um dos juristas cujos pareceres permitiram essa contratação (AMARAL, 2006AMARAL, A. B. História dos velhos teatros de São Paulo: da Casa da Ópera à inauguração do Teatro Municipal. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2006. , p. 135-136). Estava também entre os membros fundadores da Sociedade de Proteção aos Artistas.35 35 SOCIEDADE Protecção aos Artistas. Correio Paulistano, 2 set. 1857, ed. 00580, p.3.
Ribas e a História
Ainda no cenário simbólico que circunda o Dr. Ribas no retrato que nos ocupa, detenhamo-nos agora em dois elementos que preenchem o ambiente por trás da cortina: uma coluna e uma estante cheia de livros. Associadas, podem representar os amplos conhecimentos intelectuais do Dr. Ribas (livros), solidamente fundamentados (coluna). Mais à frente, Ribas apoia-se sobre um livro aberto, indicando atividade de estudo e leitura. Sob esse, um livro fechado - uma base - e a borla e o capelo - o Direito - tudo assentado sobre o verde-amarelo (toalha) representativo do país. Ribas era, de fato, um erudito. Poucos, em seu tempo, debruçaram-se com tanta profundidade intelectual sobre o Direito; poucos tiveram tão profícua produção escrita. Mais que apenas uma referência à sua condição de intelectual erudito, podemos entender que o simbolismo da coluna da Antiguidade associada aos livros remeta ao perfil de Ribas como jurista, pois, como tal, pode ser vinculado, ao menos em parte, à chamada escola histórica (BARROS JUNIOR, 1974BARROS JUNIOR, C. S. Antonio Joaquim Ribas (O Conselheiro Ribas). Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, v. 69, n. 2, p. 239-253, 1974. ), tendência encabeçada, no século XIX, pelo jurista alemão Friederich Carl von Savigny, que entendia que o Direito é histórico, emergindo das raízes culturais profundas de um povo, dependente, portanto, de seu tempo e lugar. Entre muitas formas de defender o caráter histórico do Direito, ao escrever, por exemplo, sobre sua “noção filosófica”, afirma: “O direito manifesta-se na história como uma força viva, que germina no seio dos povos desde a sua idade primitiva, que se desenvolve e transforma no tempo e no espaço segundo uma lei de lógicas evoluções” (RIBAS, 1905, p. 8-9). Sua principal obra escrita, que se intitulou Curso de Direito Civil Brasileiro36 36 RIBAS, Antônio Joaquim. Curso de Direito Civil Brasileiro. Rio de Janeiro: Typographia Universal de Laemmert, 1865. (era o nome da disciplina), trouxe um Direito Civil historicamente situado. Publicada pela primeira vez em 1865, no período em que Ribas ainda era professor da Faculdade de Direito de São Paulo,37 37 Em 1870 pediu jubilamento (equivalente à aposentadoria) assim que lhe foi possível por tempo de serviço. é um guia para o seu pensamento, amplamente fundamentado em autores de referência à época, dando provas de uma admirável capacidade não apenas intelectual, mas também para ter acesso a obras que não seria tão fácil receber na São Paulo de meados do século XIX. É verdade que Ribas manteve-se sempre ligado ao Rio de Janeiro e o próprio Curso de Direito Civil Brasileiro foi editado pela Typographia Laemmert, no Rio,38 38 Na mesma época, Joaquim Ignacio Ramalho, o futuro Barão de Ramalho, fez publicar suas obras por tipografias paulistanas. assim como todas as suas demais obras foram também publicadas por editoras fluminenses. Isso quer dizer que ele certamente tinha fácil contato com livreiros da Corte, mas, mesmo assim, era um grande feito manter-se atualizado sobre a literatura jurídica então produzida na Europa.
Por sua atuação anterior como professor de história no ensino secundário, foi membro de uma comissão nomeada para organizar um código legislativo da Instrução Pública na província paulista, conforme já mencionado acima.39 39 CODIGO DE INSTRUCÇÃO PUBLICA DA PROVINCIA DE SÃO PAULO organisado pela commissão composta dos Snrs. Dr. Antônio Joaquim Ribas, Dr. João Dabney de Avellar Brotero, e Diogo de Mendonça Pinto nomeada pelo Governo em virtude da Lei Provincial nº 30 de 10 de maio de 1854 art. 30. S. Paulo: Typ. Dous de Dezembro de Antônio Louzada Antunes, 1857. Acervo da Biblioteca Mário de Andrade. Disponível em: http://docvirt.com/DocReader.Net/DocReader.aspx?bib=LIVROSSPMP&pesq=. Acesso em: 23 ago. 2018. De acordo com esse código, no ensino médio estavam incluídas as “noções de História Universal” e no ensino secundário, a História, associada à Geografia.
Observa-se, ainda, que o perfil de historiador vinha associado a um ideal nacionalista, que foi uma tônica de muitos dos intelectuais de seu tempo e notadamente na Faculdade de Direito. A Independência do Brasil ainda era recente, de poucas décadas. Coerentemente com esse perfil, Ribas participou de uma comissão incumbida de projetar um monumento à Independência no Ipiranga.40 40 Correio Paulistano, 23 maio 1855, ed. 00262, p.2. Foi uma das várias tentativas havidas ao longo do século XIX de se construir um marco no Ipiranga, que só viria a se realizar mais tarde com a construção do edifício monumental que depois viria a abrigar o Museu Paulista. Não há dúvida de que, em 1861, Ribas já era reconhecido como historiador, uma vez que, naquele ano, tornou-se membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.41 41 SOCIOS FALLECIDOS EM 1890. Revista Trimestral do Instituto Historico e Geographico Brazileiro, Tomo LVIII , 3º e 4º trimestres, 1890, p.654, Rio de Janeiro: Laemmert.
Litografia
Vamos analisar agora a o retrato litográfico de Ribas, também encomendado por um grupo de estudantes, entre os quais o jovem Prudente de Moraes, que viria, mais tarde, a ser o primeiro presidente civil do Brasil. Importante assinalar que a própria técnica litográfica, naquele momento, era um indicador de modernidade. A chamada “Revolução Litográfica”, iniciada em fins do século XVIII, cedo chega ao Brasil (FABRIS, 1998FABRIS, A. A invenção da fotografia- repercussões sociais. In: FABRIS, A. (org.) Fotografia, usos e funções no século XIX. São Paulo: Edusp, 1998. p. 11-38.). O baixo custo, a facilidade de execução, a rápida recuperação das pranchas e o arquivamento do desenho no papel são alguns dos aspectos que explicam a rápida circulação dos álbuns de figurinhas e viagens pitorescas pelo império brasileiro. Somente em 1869 - alguns anos após, portanto, a encomenda dessa gravura de Ribas -, Jules Martin iria instalar uma litografia na capital paulista, integrando-se a um momento importante de transformações da cidade, já em tônica de modernização (LEITE, 2016LEITE, M. P. M. Jules Martin, litógrafo: catálogo iconográfico de um comerciante de imagens de São Paulo. 2016. 449 f. Dissertação (Mestrado) ‒ Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2016 . Disponível em:Disponível em:https://doi.org/10.47749/T/UNICAMP.2016.968206 . Acesso em: 23 ago. 2018.
https://doi.org/10.47749/T/UNICAMP.2016....
, p. 97-103). A esse respeito, Tania de Luca (2018LUCA, T. R. A Ilustração (1884-1892): circulação de textos e imagens entre Paris, Lisboa e Rio de Janeiro. São Paulo: Editora Unesp, 2018., p. 154-171) nos mostra o quanto a técnica litográfica em larga escala, isto é, para uso na imprensa, ainda era novidade de difícil aplicação, mesmo posteriormente, nos anos 1880 e na capital do Império.
Quanto à Casa Garraux, no momento em que foi encomendada a litografia de Ribas em Paris, estava ainda em seus primeiros anos na capital paulista, já que tinha iniciado suas atividades em 1859. Era livraria, que viria a ser a maior fornecedora de obras jurídicas (e não só) para professores e alunos da Faculdade de São Paulo, e loja de artigos finos franceses, importante lugar de conexão comercial e cultural entre São Paulo e Paris. Com essas características, logo se tornou também um importante espaço de sociabilidade para estudantes e bacharéis do largo de São Francisco (DEAECTO, 2011DEAECTO, M. M. O Império dos livros: instituições e práticas de leitura na São Paulo oitocentista. São Paulo: Edusp, 2011., p. 280-341; MARTINS, 2015MARTINS, A. L. Gabinetes de Leitura: cidades, livros e leituras na Província paulista. São Paulo: Edusp, 2015., p. 125-129; BARBUY, 2006BARBUY, H. A Cidade-Exposição: comércio e cosmopolitismo em São Paulo1860-1914,. São Paulo: Edusp, 2006. , p. 40-41; MARTINS; BARBUY, 1998MARTINS, A. L.; BARBUY, H. Arcadas: história da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, 1827-1997. São Paulo: Alternativa/BM&F, 1998., p. 53; BRUNO, 1984BRUNO, E. S. História e tradições da Cidade de São Paulo. 3. ed. São Paulo: Hucitec, 1984., v. 2, p. 847).
O Correio Paulistano comentou a chegada da litografia, trazida de Paris:
Chegaram de Paris os retratos do sr. Dr. Antonio Joaquim Ribas, lente da faculdade, mandados tirar a expensas dos acadêmicos do quinto ano. O sr. Garraux, por incumbência dos mesmos srs. fez litografar este retrato pelo sr. Desmaison42 42 Emile ou Pierre-Emile Desmaisons (Paris, 19 dez. 1812 - Montlignon, 28 jan. 1880) foi um litógrafo francês atuante em Paris. Entre 1830 e 1860, produziu litogravuras de cenas e retratos. De 1861 a 1862 (período em que realizou o retrato litográfico de A.J. Ribas), mantinha ateliê no número 5 da rue des Grands Augustins e em 1866 estava no 22, rue de l´Arbre Sec. Em 1863 foi condecorado com a alta distinção francesa da Legião de Honra (cf. BENEZIT, 1950; Bibliothèque Nationale de France. Verbete “Emile Desmainsons”; Biblioteca Nacional do Brasil). o mais notável dos litógrafos parisienses. Quer como semelhança, quer como desenho é perfeitíssimo o trabalho.43 43 Chegaram de Paris... Correio Paulistano, 24 set. 1863, ed. 02207, p.2.
A litografia fora feita a partir de uma fotografia de Gaspar A. da Silva Guimarães,44 44 Despezas feitas com os retratos lithographados do Illm. Sr. Dr. Ribas, Correio Paulistano, 27 set. 1863, ed. 02210, p.3. responsável pela filial paulistana do estúdio fotográfico Carneiro & Smith, que tinha matriz no Rio de Janeiro (KOSSOY, 2002KOSSOY, B. Dicionário histórico-fotográfico brasileiro: fotógrafos e ofícios da fotografia no Brasil (1833-1910). São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2002. , p. 103-104). Vale a pena comparar a litografia com a pintura que analisamos há pouco. Aqui perceberemos importantes ausências na forma final da litografia, bem como podemos fazer questões a respeito da circulação e do alcance dessa imagem.
É provável que o pintor, além do contato direto que pode ter tido com o retratado, tenha buscado referência na fotografia, já que a posição física, postura, gestual e indumentária, do retratado (Figura 3), em muito se assemelham àqueles observados na litografia que vimos acima (Figura 4). De fato, o retrato de Ribas incorpora e desenvolve elementos que já aparecem na litografia: os livros, a cortina, a mesa. A litografia traz, contudo, novos problemas para a compreensão da imagem ou autoimagem de Ribas.
Na comparação com a pintura, alguns objetos somem, caso da coluna e do capelo. Já os demais elementos que aparecem duplicados - a estante de livros, a mesa e a cortina - não recebem a mesma ênfase. Ao contrário, servem como pálido cenário para o personagem, representado em tons mais escuros. O que significa o sumiço e/ou escurecimento destes objetos? Que impacto isso tem na imagem do retratado?
A imagem da litografia resulta menos formal, menos tradicional, a despeito da roupa elegante e do rosto sério do modelo. Ela se aproxima da forma de outras imagens que circulavam em grande quantidade na cidade de São Paulo naquele momento, como os retratos litografados e as carte-de-visite. De fato, São Paulo dos anos 1860 era espaço de circulação de imagens numa escala inédita até então. Muitos estúdios fotográficos dividiam o espaço de criação de retratos com os tradicionais pintores. Não por acaso, entre os cinco retratistas, cujos nomes se encontram no já citado Memorial Paulistano para 1863, Vergara era o único indicado como pintor (“a óleo e miniatura”); todos os demais eram fotógrafos.45 45 Memorial Paulistano para o anno de 1863, op. cit. p. 86 (“Retratistas”).
A litografia iria representar o ponto culminante de um novo estatuto da imagem, marcado pela reprodutibilidade, rapidez, baixo custo (FABRIS, 1998FABRIS, A. A invenção da fotografia- repercussões sociais. In: FABRIS, A. (org.) Fotografia, usos e funções no século XIX. São Paulo: Edusp, 1998. p. 11-38.). Suas relações com a pintura e com a fotografia, por outro lado, não podem ser ignoradas, visto que, durante um certo tempo, artistas, fotógrafos e litógrafos compartilham ateliês e trocam experiências. A fotografia iria se inspirar na pintura, e também na litografia, e assim por diante (CHIARELLI, 2019CHIARELLI, T. Marc Ferrez: a pintura, a gravura e a “nitidez prosaica” da fotografia. In: CHIARELLI, T. Marc Ferrez, território e imagem. São Paulo: IMS, 2019. p. 129-136. ). Desse ponto de vista, as relações entre o retrato a óleo e a fotografia litografada apontam para novos modos de criação imagética. Seria a fotografia a base para a litografia e também para o retrato a óleo do Conselheiro Ribas? Teria o pintor partido desse retrato moderno, a meio corpo, para finalizar numa composição tradicional, adicionando os demais atributos da pintura - de modo a torná-la passível de fazer parte de uma galeria de homens ilustres?
Como tem sido observado por diversas pesquisas, um retrato nunca é obra apenas do artista. Todo retrato é também resultado da vontade e da subjetividade, do modelo. O retrato resulta, assim, numa representação da autoimagem do representado, ou de uma negociação entre retratista e modelo (MICELI, 1999; MAUAD, 2008MAUAD, A. M. Poses e flagrantes: ensaios sobre história e fotografias. Niterói: EdUFF, Editora da Universidade Federal Fluminense, 2008. ). Desse ponto de vista, podemos aventar uma última interpretação a respeito dos dois retratos do conselheiro/doutor Ribas.
O retrato a óleo foi feito para ocupar um lugar de distinção - as paredes do Salão de Honra da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. Naquele ambiente, as relações entre retrato e visitantes, entre trajetória exemplar e sociedade tradicional, mantinham-se não tão diferentes da sociedade colonial. Eram retratos que se inseriam numa relação de continuidade centenária, evidenciando graus de parentesco e proximidade entre as elites paulistas que não tinham sido interrompidos pela proclamação da Independência.
Já a litografia apaga da imagem tudo aquilo que poderia não ser compreendido: os atributos de distinção - os livros, as insígnias doutorais, as referências ao mundo clássico, a coluna, o medalhão, entre outros. Feita para circular entre os estudantes, como presente, a litografia também fora concebida, inclusive por suas dimensões, para ser usada como decoração.46 46 A litografia foi oferecida a Ribas tanto em pequeno formato, como já enquadrada, para ser colocada na parede. Cf. “Despezas feitas com os retratos lithographados do Ilmo. Sr. Dr. Ribas”, Correio Paulistano, 27 set. 1863, ed. 02210, p. 3. Uma espécie de relatório de despesas publicado no Correio Paulistano, incluía o “Quadro e retrato que foi oferecido ao ilmo. sr. Dr. Ribas” (Figura 5), que, presume-se, seria constituído pelo retrato do professor em litografia, com vidro e moldura para colocação em parede.
Relatório de despesas publicado em jornal, a pedido da comissão de estudantes incumbida da encomenda do retrato litografado do professor Antonio Joaquim Ribas. Correio Paulistano, 27 set. 1863, n. 2210, p. 3.
Como notara Saint-Hilaire e outros viajantes, era comum encontrar litografias decorando as paredes das casas ricas de cidades como São Paulo (SAINT-HILAIRE, 1949SAINT-HILAIRE, A. Viagem à província de São Paulo. São Paulo: Cia Editora Nacional, 1949. , p. 175). Por isso, o retrato litografado de Ribas tinha que ser simples, direto, sem tantas referências. Sua estrutura aproxima-se, aliás, dos retratos do álbum Galeria dos Brasileiros Ilustres (Os contemporâneos) (1861), organizado por S.A. Sisson.
Observe-se, ainda, que um quadro assim montado tinha seu valor monetário como objeto decorativo: de acordo com o relatório de despesas mencionado acima, enquanto um exemplar simples da litografia, tal como foi distribuído aos estudantes que se haviam cotizado para a encomenda (“duzentos retratos para os cem assinantes - 400$000”), valia dois réis cada um, o quadro oferecido a Ribas tinha custado 50 réis. Já para o retrato a óleo haviam sido arrecadados 151 réis.47 47 Relação dos senhores que assignarão para o retrato do exm. sr. dr. Antonio Joaquim Ribas..., Correio Paulistano, 8 out. 1863, ed. 02219, p.3.
É certo que Ribas tenha-se deixado fotografar. Além disso, teria se preocupado e de algum modo interferido nas escolhas de Vergara? O que sabemos, contudo, é que com o retrato a óleo, Ribas ingressava na galeria de honra. Já com a litografia, a imagem e a autoimagem de Ribas saíam do ambiente circunscrito da Academia para entrar no universo da polis - da cidade moderna e dinâmica, que se transformava junto com suas elites.
Via-se, assim, um novo signo - o retrato litografado -, de dimensões menores, figurando um professor moderno, destinado às paredes de interiores de residências ou escritórios. Entretanto, no ambiente solene do Salão de Honra da Faculdade de Direito, continuariam a ser colocados retratos a óleo, de corpo inteiro e de grandes dimensões, na antiga tradição já consolidada pelo tempo.
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» https://dspace.uevora.pt/rdpc/handle/10174/14542
NOTAS
-
1
Participaram desta pesquisa as mestrandas Débora Elise de Almeida (PPG História da Arte-EFLCH/ UNIFESP e Tatiane Gomes da Silva (PPG História Social-FFLCH-USP) e os graduandos Igor Tostes Fiorezzi (FD-USP), Mayara Dantas (Dep. de História -EFLCH/Unifesp) e Yngrid Ferreira de Sousa (Dep. de História da Arte - EFLCH/Unifesp).
-
2
De acordo com informação do Museu da Faculdade de Direito-USP.
-
3
Relação dos srs. que subscreverão (e pagarão) para compra do retracto (sic) do falecido dr. G.J.R. dos Santos, Correio Paulistano, 21 out. 1859, ed. 01059, p.3-4.
-
4
Relação dos senhores que assignarão para o retrato do exm. sr. Dr. Antonio Joaquim Ribas..., Correio Paulistano, 8 out. 1863, ed. 02219, p.3.
-
5
Despezas feitas com os retratos lithographados do Illm. Sr. Dr. Ribas, Correio Paulistano, 27 set. 1863, ed. 02210, p.3.
-
6
O título de conselheiro foi-lhe conferido anos depois de realizado o retrato que nos ocupa. Antes disso, era referido apenas como “dr. Ribas” (cf. Arquivo da Faculdade de Direito-USP. Série Atas das sessões da Congregação). No título deste artigo, porém, optamos pela forma “Conselheiro Ribas” por ser aquela pela qual ficou mais conhecido.
-
7
Essa litogravura foi reproduzida em RIBAS, Antônio Joaquim. Curso de Direito Civil Brasileiro: parte geral. 3.ed. Rio de Janeiro: Typ. do “Jornal do Commercio” de Rodrigues & C., 1905. (Prefácio por Geraldo Ribas).
-
8
DISCURSOS parlamentares do Dr. Gabriel José Rodrigues dos Santos coligidos pelo Dr. A .J. R. Rio de Janeiro: Typographia Paula Brito, 1863.
-
9
Atuou como deputado na Assembléia Provincial de São Paulo entre 1850 e 1859.
-
10
Foram nomeados... Correio Paulistano, 10 jul. 1854, ed. 00012, p.4. A categoria de lente substituto correspondia ao início da carreira docente e os professores nela ingressos tinham como função substituir os catedráticos sempre que necessário, lecionando, assim, diferentes disciplinas, até que viessem a atingir o grau de catedráticos.
-
11
Não encontramos a data precisa em que o retrato foi instalado na Faculdade de Direito mas no elogio fúnebre que fez ao Dr. Ribas (que é, porém já de 1890), Luiz Alves (1890ALVES, J. L. Elogio dos sócios falecidos desde 15 de dezembro de 1888 até hoje pronunciado da Sessão Magna do Instituto Historico e Geographico Brazileiro a 15 de dezembro de 1890. Revista Trimestral do Instituto Historico e Geographico Brazileiro, Rio de Janeiro, Laemmert, t. LIII , parte II (3º e 4º trimestres), p. 621-623, 1890. Disponível em https://ihgb.org.br/publicacoes/revista-ihgb/item/107775-revista-ihgb-tomo-liii-parte-ii.htm . Acesso em: 23 ago. 2018.
https://ihgb.org.br/publicacoes/revista-... , p. 621) indica que o retrato havia sido colocado na “sala dos atos” (uma denominação coimbrã para designar o recinto em que se realizavam os atos acadêmicos oficiais). No caso da Faculdade de Direito de São Paulo, essa sala era conjunta com o salão nobre ou salão de honra. -
12
A venda da obra foi anunciada pela Casa Garraux: Discursos Parlamentares, Correio Paulistano, 6 nov. 1863, ed. 02244, p.2. A biografia de Rodrigues dos Santos, de autoria de Paulo Antônio do Valle, que foi incluída nessa obra, tinha sido publicada primeiro nesse mesmo jornal, por partes, entre 5 e 23 de setembro de 1863.
-
13
Faculdade do Recife. Correio Paulistano, 12 jul. 1863, ed. 02148, p.2.
-
14
O retrato do Exm. Sr Dr. Ribas. Correio Paulistano, 10 set. 1863, ed. 02195, p. 2. Transcrito da Revista Commercial, de Santos.
-
15
Retratista. Acha-se nesta capital o sr. Vergara Nicolau Huascar, pintor ... Cf. Correio Paulistano, 25 maio 1862, ed. 01816, p. 2; Memorial Paulistano para o anno de 1863, op. cit.
-
16
PINTOR. Correio Paulistano, 28 jun. 1862, ed. 01842, p.1. O retrato a que se refere não é identificado.
-
17
DIABO COXO. São Paulo, 1864-1865 (ed. fac-smilar). São Paulo: EDUSP, 2005. Introdução (“Foi o diabo!”, de Antônio Luiz Cagnin). Jornal redigido por Luiz Gama e Sizenando Nabuco de Araújo; ilustrado por Angelo Agostini com a colaboração de Nicolau Huascar de Vergara; impresso na Typographia Allemã. Mais tarde, Huascar de Vergara foi ilustrador d’O Polichinello, lançado em São Paulo em abril de 1876, “... redigido por Luís Gama e ilustrado por Nicolau Huascar de Vergara”, de acordo com Ana Maria CAMARGO, na Introdução (1981CAMARGO, A. M. Introdução à “O Polichinello”. In: CAMARGO, A. M. O Polichinello Edição Fac-Similar. São Paulo: Imprensa Oficial: Arquivo do Estado, 1981. p. 10. , p. 10).
-
18
A LANTERNA: folha satírica e ilustrada. Rio de Janeiro, 1878. Disponível em: http://acervo.bndigital.bn.br/sophia/index.html. Acesso em: 23 ago. 2018
-
19
MUSEU D. JOÃO VI-Escola de Belas Artes-UFRJ: documentos encadernados referentes ao requerimento de “VERGARA, Huscar Nicolas”, solicitando inscrição no concurso para a cadeira de Paisagem, flores e animais, 28/10/1880 a 20/03/1881.
-
20
VERGARA, Nicoláo Huscar de. “O Amazonas: fragmentos de viagem”. Traduzido do espanhol por Joaquim Cândido de Azevedo Marques e publicado em nove partes no Correio Paulistano, nos dias 26, 29, 30 e 31 de outubro e 4, 5, 7, 9 e 11 de novembro de 1862 - ed. 01942, 01944, 01945, 01946, 01948, 01949, 01951, 01953, 01954, respectivamente (BIBLIOTECA NACIONALBIBLIOTECA NACIONAL. Hemeroteca digital ‒ Jornal Correio Paulistano. Biblioteca Nacional. Disponível em: Disponível em: http://memoria.bn.br/hdb/periodico.aspx . Acesso em: 23 ago. 2018.
http://memoria.bn.br/hdb/periodico.aspx... ) bb. -
21
MUSEU D. JOÃO VI, documento citado.
-
22
O publico desta capital... Correio Paulistano, 20 jul. 1864, ed. 02450, p.2.
-
23
MEMORIAL PAULISTANO PARA O ANNO DE 1863. S. Paulo: Typ. Imparcial de J. R. de A. Marques, 1862. Acervo do Museu Republicano “Convenção de Itu”-Museu Paulista-USP.
-
24
HUASCAR VERGARA. Correio Paulistano, 21 dez. 1875, ed. 05761, p. 2.
-
25
HUASCAR VERGARA. Correio Paulistano, 21 dez. 1875, ed. 05761, p. 2.
-
26
QUADRO A OLEO”. Correio Paulistano, 25 jan. 1876, ed. 05788, p. 2.
-
27
Sobre José Maria Villaronga, ver Carlos Eugênio Marcondes de Moura. Vida cotidiana em São Paulo: memórias, depoimentos, evocações. São Paulo: Ateliê, Ed. Unesp, Imprensa Oficial, SECSP, 1998. p.385.
-
28
Correio Paulistano, 19 mar. 1876, ed. 05830, p.1. Também o jornal A Provincia de S. Paulo de 19 fev. 1876, p.2, faz menção aos dois pintores.
-
29
HUSCAR DE VERGARA. Gazeta de Noticias [RJ], 12 jan. 1886, p.4; FALLECIMENTO. A Provincia de S. Paulo, 13 jan. 1886, p.999; HUSCAR DE VERGARA Correio Paulistano, 12 jul. 1887, ed. 09257, p.2.
-
30
Correio Paulistano, Parte Oficial, Expediente da Presidência, 19 set. 1856, ed. 00455. p.2.
-
31
PARECER lido no Conservatorio Dramatico de S. Paulo sobre o novo drama - As Feiras de Pilatos. Correio Paulistano, 3 out. 1856, ed. 00458, p.4.
-
32
Conservatorio Dramatico de S. Paulo.Correio Paulistano, 17 maio 1857, ed. 00553, p.3.
-
33
DIRECTORIA do Theatro. Correio Paulistano, 17 jun. 1857, ed. 00562, p.3.
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34
REGULAMENTO do Directorio do Theatro Publico desta Capital. Correio Paulistano, 1 jul. 1857, ed. 00565, p.2-3; O THEATRO... O Publicador Paulistano, 22 ago. 1857, ed. 00008, p.4.
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35
SOCIEDADE Protecção aos Artistas. Correio Paulistano, 2 set. 1857, ed. 00580, p.3.
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36
RIBAS, Antônio Joaquim. Curso de Direito Civil Brasileiro. Rio de Janeiro: Typographia Universal de Laemmert, 1865.
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37
Em 1870 pediu jubilamento (equivalente à aposentadoria) assim que lhe foi possível por tempo de serviço.
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38
Na mesma época, Joaquim Ignacio Ramalho, o futuro Barão de Ramalho, fez publicar suas obras por tipografias paulistanas.
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39
CODIGO DE INSTRUCÇÃO PUBLICA DA PROVINCIA DE SÃO PAULO organisado pela commissão composta dos Snrs. Dr. Antônio Joaquim Ribas, Dr. João Dabney de Avellar Brotero, e Diogo de Mendonça Pinto nomeada pelo Governo em virtude da Lei Provincial nº 30 de 10 de maio de 1854 art. 30. S. Paulo: Typ. Dous de Dezembro de Antônio Louzada Antunes, 1857. Acervo da Biblioteca Mário de Andrade. Disponível em: http://docvirt.com/DocReader.Net/DocReader.aspx?bib=LIVROSSPMP&pesq=. Acesso em: 23 ago. 2018.
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40
Correio Paulistano, 23 maio 1855, ed. 00262, p.2.
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SOCIOS FALLECIDOS EM 1890. Revista Trimestral do Instituto Historico e Geographico Brazileiro, Tomo LVIII , 3º e 4º trimestres, 1890, p.654, Rio de Janeiro: Laemmert.
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Emile ou Pierre-Emile Desmaisons (Paris, 19 dez. 1812 - Montlignon, 28 jan. 1880) foi um litógrafo francês atuante em Paris. Entre 1830 e 1860, produziu litogravuras de cenas e retratos. De 1861 a 1862 (período em que realizou o retrato litográfico de A.J. Ribas), mantinha ateliê no número 5 da rue des Grands Augustins e em 1866 estava no 22, rue de l´Arbre Sec. Em 1863 foi condecorado com a alta distinção francesa da Legião de Honra (cf. BENEZIT, 1950BENEZIT, E. Dictionnaire critique et documentaire des peintres, sculpteurs, dessinateurs et graveurs. Paris: Librairie Gründ, 1950.; Bibliothèque Nationale de FranceBIBLIOTHÈQUE NATIONAL DE FRANCE. Émile Desmaisons (1812-1880). Bibliothèque National de France. Disponível em: Disponível em: http://data.bnf.fr/14972831/emile_desmaisons/ . Acesso em: 23 ago. 2018.
http://data.bnf.fr/14972831/emile_desmai... . Verbete “Emile Desmainsons”; Biblioteca Nacional do Brasil). -
43
Chegaram de Paris... Correio Paulistano, 24 set. 1863, ed. 02207, p.2.
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44
Despezas feitas com os retratos lithographados do Illm. Sr. Dr. Ribas, Correio Paulistano, 27 set. 1863, ed. 02210, p.3.
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45
Memorial Paulistano para o anno de 1863, op. cit. p. 86 (“Retratistas”).
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46
A litografia foi oferecida a Ribas tanto em pequeno formato, como já enquadrada, para ser colocada na parede. Cf. “Despezas feitas com os retratos lithographados do Ilmo. Sr. Dr. Ribas”, Correio Paulistano, 27 set. 1863, ed. 02210, p. 3.
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47
Relação dos senhores que assignarão para o retrato do exm. sr. dr. Antonio Joaquim Ribas..., Correio Paulistano, 8 out. 1863, ed. 02219, p.3.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
21 Jul 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
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Recebido
21 Maio 2022 -
Aceito
02 Nov 2022