Open-access Jiu-jitsu X capoeira: entre os estrangeirismos e a valorização de uma cultura nacional (1905-1909)

Jiu-jitsu X Capoeira: Between Foreignisms and the Appreciation of a National Culture (1905-1909)

Resumo

O jiu-jitsu chegou ao Brasil na primeira década do século XX, quando oficiais da Marinha brasileira inseriram a arte marcial japonesa na formação da marinhagem. O jiu-jitsu era considerado uma prática com uma técnica mais eficiente e científica e, portanto, deveria substituir a marginalizada capoeira como forma de defesa pessoal. Nesse sentido, o presente artigo visa compreender a contraposição ocorrida na primeira década do século XX no Brasil entre o jiu-jitsu e a capoeira. A pesquisa evidencia que a capoeira era considerada por alguns como superior por ser um elemento genuinamente brasileiro e que, com um processo metodológico adequado, poderia se transformar em uma prática útil para o país. Por outro lado, havia quem defendesse o jiu-jitsu por considerá-lo uma prática mais racional e científica. Como conclusão, o artigo aponta que o triunfo de um capoeira sobre um lutador japonês de jiu-jitsu contribuiu para a consolidação de um discurso nacionalista em torno da capoeira.

Palavras-chave:
Jiu-Jitsu; Capoeira; Marinha; Ginástica Nacional; Nacionalismo

Abstract

Jiu-jitsu arrived in Brazil in the first decade of the 20th century, when Brazilian navy officers introduced the Japanese martial art into the training of sailors. Jiu-jitsu was considered a more efficient and scientific practice and, therefore, should replace marginalised capoeira as a form of self-defense. In this sense, this article aims to understand the opposition that occurred in the first decade of the twentieth century in Brazil between jiu-jitsu and capoeira. The research shows that some considered capoeira as superior for being a genuinely Brazilian element and that, with an excellent methodological process, it could become a valuable practice for the country. On the other hand, some defended jiu-jitsu as a more rational and scientific practice. In conclusion, the article points out that the triumph of a capoeira over a Japanese jiu-jitsu fighter contributed to the consolidation of a nationalist discourse around capoeira.

Keywords:
Jiu-Jitsu; Capoeira; Navy; National Gymnastics; Nationalism

O jiu-jitsu é uma arte marcial japonesa que na passagem do século XIX para o XX se difundiu para além das fronteiras do Japão (Okada, 2005; Rouse, 2015; Yabu, 2018). A Restauração Meiji, ocorrida em 1868, fez com que o país começasse a se ocidentalizar, inserindo-o no rol das grandes potências mundiais. Além disso, um fenômeno de depressão econômica se acentuou devido à guerra contra a Rússia (1904-1905). Tal fato acarretou num aumento considerável do fluxo migratório de nipônicos para outras nações. Entre tais países estava o Brasil, que, a partir de 1908, começou a receber oficialmente contingentes populacionais vindos do Japão (Dezem, 2005). Foi nesse contexto, que o jiu-jitsu começou a circular, fazendo com que a arte marcial asiática se tornasse conhecida fora do território japonês.

Nesse momento de abertura do Japão diversos dos seus elementos culturais começaram a despertar a atenção de nações ocidentais. Porém, foi no Brasil que uma das artes marciais japonesas, o jiu-jitsu, desenvolveria uma vertente bastante singular. Por intermédio da família Gracie, se sistematizaria aquilo que ficaria conhecido globalmente como Brazilian jiu-jitsu, tornando-se um produto de exportação Made in Brazil (Cairus, 2011; 2012; 2020). Contudo, a história da vertente brasileira, apesar de ter uma ligação com a família Gracie, não se iniciou com esse clã. Sua trajetória no Brasil começou na primeira década do século XX e foi um fenômeno marcado por uma enorme tensão com a capoeira (Cairus, 2011; 2012; Santos Júnior, 2022).

Sendo assim, o objetivo do presente artigo é analisar o tensionamento ocorrido entre o jiu-jitsu e a capoeira entre 1905 e 1909, manifestado na imprensa escrita brasileira. A data inicial trata-se do momento no qual foram encontradas as primeiras menções à arte marcial asiática nos jornais do país, já o marco final refere-se ao ano da realização de um combate entre um praticante de jiu-jitsu e outro da capoeira, com a vitória do jogo nacional.

O jiu-jitsu no processo de modernização da Marinha brasileira

No final do século XIX e início do XX o Japão obteve diversos êxitos militares, pois derrotou a China no conflito ocorrido em 1894/1895, anexou o Taiwan em 1895 e superou aos russos na guerra de 1904/1905 (Dezem, 2005). Essa ascensão japonesa foi algo que inclusive obteve ampla repercussão na imprensa brasileira. Freyre (2004), ao comentar o conflito entre Japão e Rússia, indica que inicialmente as simpatias se dividiram, porém, com o desenrolar da guerra, os japoneses foram conquistando uma maior admiração por parte da opinião pública brasileira.

Os êxitos obtidos pelas Forças Armadas comandadas pelo marechal Ōyama Iwao e pelo almirante Tōgō Heihachirō foram mencionados com admiração pela imprensa brasileira. Foi nesse contexto que a marinha japonesa se tornou um exemplo para a sua congênere no Brasil. Cabe lembrar que nesse momento o almirante Alexandrino de Alencar, então ministro da Marinha, estava pondo em curso um projeto de modernização da armada (Almeida, 2010). Sendo assim, foi possível encontrar diversas menções positivas ao Japão na principal publicação da marinha brasileira:

Não se pode negar que o bom resultado da campanha naval da actual guerra no Oriente é devido em grande parte ao hábil preparo da oficialidade e guarnição da marinha japoneza, porque salvo pequenas diferenças, os elementos de efficiencia das duas esquadras estavam no mesmo parallelo de força material. (...) O mundo naval, que não despreza os menores ensinamentos, já comprehendeu que o Japão deve os seus triumphos a sua melhor organização, as qualidades de seu pessoal superior, e por isto vem bem o nosso proposito conhecer com interesse o programma geral de evolução do ensino technico do official japonez, desde os bancos iniciaes, das ancoras dos aspirantes aos bordados do almirante. (Revista Maritima Brazileira, Edição 45, 1904, p. 927).

A passagem localizada no periódico editado pela Marinha brasileira evidencia que a armada japonesa era vista como um exemplo de organização e que seu programa de formação deveria ser visto com atenção por parte dos brasileiros. A presença de notícias como essa não foi algo isolado na revista da Marinha nacional, visto que diversas outras matérias que se referiam positivamente a armada japonesa foram localizadas no referido periódico:

O marinheiro do Japão pode ter ou não ter tanta intelligencia como os marinheiros das esquadras da França ou da Inglaterra; a qualidade dos seus músculos pode ser e pode não ser tão boa como a dos dinamarqueses, ele certamente não tem tantas libras de carne e osso como o russo, mas tudo quanto o marinheiro japonez tem em si é dominado, transfigurado pelo seu ideal secular. Para ele batalhar pelo seu paiz não é questão de ambição, nem tampouco de gloria. Tampouco é questão de recompensa, de lucro ou de prejuízo. Como para os antepassados que morreram antes deles, a questão de defesa do Estado é para ele uma cousa das mais simples. As únicas duas soluções que se lhe oferecem são as seguintes: - ou fazer o seu dever e vencer os inimigos do seu paiz, ou envergonha-se de o não ter levado à morte. É neste X immaterial e altamente espiritual que os críticos do Occidente e os que estudam a última guerra, têm de buscar a solução do mysterio. (Revista Maritima Brazileira, Edição 53, 1908, p. 813).

Desta forma, não é de se estranhar que o comando da armada brasileira tenha se interessado em conhecer mais profundamente o que era realizado pela Marinha japonesa (Almeida, 2010). Essa procura do oficialato também tinha relação com um outro aspecto, pois, conforme aponta Freyre (2004), a Marinha brasileira era constituída nos postos mais baixos por negros e mulatos, enquanto os oficiais eram em sua maioria brancos. Torna-se ainda importante salientar que na passagem do período imperial para o republicano a armada brasileira passava por inúmeros problemas de disciplina que culminaram em alguns motins, o mais célebre deles foi a Revolta da Chibata, ocorrida em 1910.

Assim, o interesse em utilizar um modelo japonês, além do intuito de modernizar a Marinha brasileira, buscava também constituir um novo formato disciplinar, acabando com os problemas de insubordinação no seio da corporação. A partir desse momento, os exercícios físicos, os sistemas de ginástica e de educação física, passaram a ser considerados como uma forma de modernização e a ser levados em conta no processo de formação dos marinheiros brasileiros (Almeida, 2010; Cancella, 2014). Nesse contexto, o oficialato começou a olhar para a experiência da armada japonesa com o jiu-jitsu.

Porém, esse interesse em conhecer os segredos do sucesso dos japoneses não era algo restrito às Forças Armadas. Tratava-se de um fenômeno social que se manifestou para além dos muros das instituições militares (Freyre, 2004; Dezem, 2005). Uma matéria publicada no Diário de Pernambuco, amparada na obra de um norte-americano chamado Irving Hancock, evidencia esse interesse pela cultura japonesa. A notícia presente no jornal pernambucano apontava que Hancock afirmava que os baixos índices de tuberculose no Japão eram oriundos dos hábitos higiênicos das japonesas, que não utilizavam espartilhos e dormiam em câmaras ventiladas, o que contribuiria para a saúde dos seus pulmões (Diário de Pernambuco, 03/07/1904, p. 2).

Cabe salientar que as obras do norte-americano desempenharam um papel fundamental na difusão da cultura japonesa em diversas nações ocidentais (Okada, 2015; Rouse, 2015; Yabu, 2018). Entre seus inúmeros manuscritos sobre o Japão, pode-se destacar um livro publicado em 1905, em coautoria com Katsukuma Higashi, intitulado Japanese Physical Training. No Brasil o livro teve uma versão em português, publicada no próprio ano de 1905, traduzida por dois oficiais da Marinha e que alcançou certo destaque na imprensa nacional:

O ju-jitsu faz o ataque sem o auxílio de armas. É uma luta leal, de valor, de tactica, de musculatura e de agilidade. Foi o jiu-jitsu que fez a victoria dos japonezes contra os russos (...) O sr. Irving Hancock, cidadão americano, fez um estudo completo do jogo do povo do Mikado. Estudou-o em Nagasaki com Inovye Sau, instructor de gymnastica no departamento da policia da referida cidade e depois em Tokio e Yokoama. Os seus conhecimentos do jiu-jitsu deram-lhe materia para um interessante livro que é um verdadeiro tratado escripto em linguagem clara e intuitiva acompanhado de gravuras explicativas dos vários lances e posições do jogo. Traduzindo o para o vernáculo, como acabam de fazel-o os srs. capitão tenente Santos Porto e o 1º. tenente Radler de Aquino prestam um serviço a nossa mocidade. (Jornal do Brasil, 13/01/1906, p. 2).

A nota localizada no Jornal do Brasil destacava as qualidades do jiu-jitsu, evidenciando que a forma de combate teria desempenhado um papel fundamental na vitória japonesa frente aos russos. Por esse motivo indicava que o livro também poderia contribuir na educação física da juventude brasileira. A revista O Commentario, ao seguir a mesma linha argumentativa, afirmava que:

O Jiu-Jitsu não é absolutamente um jogo como a capoeiragem, um conjuncto de movimentos gymnasticos com certos passos coreographicos; o Jiu-Jitsu vai desde os conhecimentos anatômicos, as boas noções de Hygiene, até à alimentação, o vestuário, e a respiração; depois é que se aprendeu os ardis do combate. O Capitão-tenente Santos Porto que muito amor consagrou sempre, à litteratura maritima e a tudo quanto dizia respeito à educação physica, base essencial da educação militar, traduzio, com o 1º. tenente Radler de Aquino, o bello livro de H. Irving Hancock - Educação Physica Japoneza, e deu nos uma obrinha magnifica, de leitura muito curiosa e util. Impresso nas officinas da Companhia Typographica do Brazil, illustrada com muitas gravuras, o último trabalho do illustre official de marinha é perfeito como informação e propaganda de que é o jiu-jitsu. O capítulo II, dos vinte e dois que compõem o livro, é uma perfeita lição de hygiene alimentar. Depois explicam-se os exercicios que fortalecem o coração e os pulmões, os que desenvolvem as pernas e os braços; os golpes, livramentos e maneiras systematisadas de provar dextreza e illudir a dextreza do contendor. (O Commentario, Edição 10, 1906, p. 127-128).

A publicação enaltecia as conquistas bélicas dos japoneses, evidenciando que seu modelo de educação física era algo digno de atenção, principalmente por valorizar uma retórica higienista e sistematizada. Uma outra matéria localizada no jornal carioca A Notícia seguiu uma retórica semelhante:

(...) entre os que andaram procurando o <segredo> dos japonezes figura o auctor do volume, agora, traduzido pelo capitão tenente Santos Porto e o 1º. tenente Radler de Aquino. Achou que a resistência dos japonezes dependia de um certo processo de educação physica, a que no Japão chamam Jiu-Jitsu. Este systema, está agora fazendo succeso na Europa (...). Mas, afinal, que há de característico nesse systema gymnastico? È um processo de ataque e defesa pessoal, em que se exige mais agilidade do que força. Só isto basta para lhes lembrar que é qualquer coisa no gênero da nossa antiga capoeiragem. O capitão-tenente Silva Porto, em um prologo bem feito e espirituoso, lembra essa analogia e mostra que o facto daquelles exercícios de agilidade terem sido mal aproveitados não é motivo para condemnal-os. (...) O jiu-jitsu parece ter uma superioridade grande sobre a capoeiragem à brasileira: é mais sábia, mais scientifica. Não porque requisite conhecimentos especiaes de alto grau, mas porque os ataques são feitos a pontos fracos do organismo, determinados com methodo. Procura-se principalmente dar os golpes de tal modo, que se ponha o adversário fora de combate, embora elle seja mais forte. É evidente que exercícios dessa ou de qualquer outra gymnastica não se aprendem em livros: desta, menos ainda que das outras. O jiu-jitsu está sendo ensinado à polícia da França e da Inglaterra. (A Notícia, 05/01/1906, p. 3).

O artigo evidencia que o jiu-jitsu já estava circulando em países ocidentais como a França e Inglaterra e que se tratava de um sistema de educação física científico e metodologizado. Porém, sua utilização como contraponto à brasileiríssima capoeira é o elemento que mais chama a atenção. Torna-se importante lembrar que a capoeira tinha uma relação com a Marinha brasileira que vinha desde a primeira metade do século XIX, visto que a armada em diversos momentos da sua história obteve seus contingentes de maneira forçada entre os setores marginalizados da sociedade brasileira (Almeida, 2010). Inclusive vários desses indivíduos eram capoeiras que acabaram desempenhando um papel fundamental em diversos conflitos em que o Império brasileiro se envolveu durante todo o século XIX. O apogeu dessa relação se deu principalmente na Guerra do Paraguai. Todavia, apesar dos capoeiras terem desempenhado um protagonismo nesses conflitos, eles não eram bem-vistos por grande parte do oficialato, pois diversas insurreições foram protagonizadas por esses indivíduos (Reis, 1993; Soares, 1999; Downey, 2002).

Torna-se importante mencionar que a capoeira nesse período era algo marginalizado, e com o início do período republicano passou a sofrer uma dura perseguição por parte das autoridades governamentais (Reis, 1993; Soares, 1999; Downey, 2002; Assunção, 2008; 2014). Lise et al. (2023) salientam que, na busca por aceitação social, a capoeira passou por um processo de institucionalização, que buscou criar em torno da prática uma série de dispositivos que visavam afastá-la de uma imagem de criminalidade, aproximando-a de uma cultura mais formal, regulamentada e moralmente aceita. Esse processo ocorreu concomitantemente a toda a repressão sofrida pela capoeira, pois, mesmo sendo perseguida, ela também foi celebrada por alguns intelectuais (Soares, 1999; Assunção, 2008). Sendo assim, a capoeira precisava sair das páginas policiais e incorporar códigos específicos da modernidade que supostamente o jiu-jitsu já possuía.

O livro de Irving Hancock parece ter desempenhado um papel relevante nesse processo de substituição da capoeira pelo jiu-jitsu no interior da Marinha brasileira. Contudo, existem indícios localizados na imprensa escrita de que essa obra não se manteve restrita aos círculos militares, conquistando espaço também em periódicos de ampla circulação, como, por exemplo, a revista O Malho, que, ao comentar o livro do norte-americano, destacava o jiu-jitsu como um “(...) curiosíssimo jogo athletico em que o profundo conhecimento da anatomia e da mecânica humana colloca em igualdade de condições um pygmeu japonez e o mais agigantado hercules” (O Malho, 09/01/1906, s.p.). Como pode ser visto, o jiu-jitsu passava a ser considerado uma alternativa no processo de educação física, não somente do marinheiro, mas de toda a mocidade brasileira. Talvez a arte marcial asiática pudesse ser uma opção para a educação dos mestiços e caboclos brasileiros, pois se o “pigmeu e franzino japonês” suplantou o “agigantado Hércules russo”, o jiu-jitsu poderia ser uma alternativa viável para a educação física da juventude brasileira.

O Brasil ansiava por se modernizar e se mostrar ao mundo como uma nação que estava na trilha do progresso. A capoeira representava o passado que deveria ser apagado da memória, pois afastava o país de uma retórica civilizacional (Lise et. al., 2023). Sendo assim, o jiu-jitsu passou a ser classificado como uma possibilidade formativa, e as primeiras ações em relação a essa arte marcial no país aconteceriam por intermédio da Marinha.

Jiu-Jitsu x Capoeira: tensões entre “estrangeirismos” e uma cultura nacional

A relação da Marinha brasileira com o jiu-jitsu se tornou mais efetiva quando o navio de guerra Benjamin Constant, numa viagem de circum-navegação pelo mundo, passou, em 1908, pelo Japão (Santos Júnior, 2022). A jornada da embarcação foi acompanhada com interesse pela imprensa brasileira, que relatou a contratação de japoneses para se dedicaram ao ensino do jiu-jitsu (A Federação, 30/12/1908, p. 1).

A partir desse episódio os membros da Marinha tiveram a oportunidade de ter um contato maior com o jiu-jitsu. As aulas ministradas por um japonês chamado Sada Miyako aconteceram na Fortaleza de São Francisco Xavier, localizada na Ilha de Villegagnon (Cancella, 2014), e obtiveram certa atenção da imprensa brasileira. Contudo, em algumas ocasiões foram publicadas em diversos jornais fortes críticas à arte marcial asiática. O jornal A República, da cidade Curitiba, afirmou que forte corrente favorável ao jogo nacional da capoeira havia se levantado em resistência às aulas de jiu-jitsu ministradas em Villegagnon, lembrando que o Brasil havia obtido êxitos militares na guerra do Paraguai com a ação de capoeiras. Além disso, a matéria também indicava que importantes intelectuais defendiam a metodologização da capoeira e a necessidade de separar aqueles que a usavam como forma de defesa individual útil daqueles que a utilizavam de modo desordeiro. Segunda essa nota: “Urge, pois, systhematizar o exercício nacional muito superior ao japonez com a vantagem de constituir um segredo defensivo das nossas tropas combatentes ao passo que o jiu-jitsu está assaz vulgarizado” (A República, 04/03/1909, p. 1).

O trecho é uma amostra da tensão existente entre o jiu-jitsu e a capoeira. O teor do artigo deixava claro que o problema não era o jogo nacional em si, mas seu passado, ligado à criminalidade. Para sanar tais aspectos a fonte indicava que seria importante que a prática se sistematizasse, visto que, após esse processo, ela poderia se tornar a verdadeira ginástica nacional. Em contraposição à capoeiragem, o alto oficialato da Marinha brasileira enxergava na inserção do jiu-jitsu uma forma de modernização da instituição. Conforme salientado anteriormente, esse modo de pensar havia se materializado, em 1905, na tradução que os militares realizaram da obra de Irving Hancock. Tanto que os dois oficiais afirmaram no prefácio da edição brasileira que o jiu-jitsu poderia ser a contraposição civilizada à capoeira. Os tradutores lamentavam que a prática originada no Brasil tivesse sido mal-empregada pelas maltas que nas suas palavras eram “(...) profissionais da desordem, armados de facas e navalhas - uma verdadeira calamidade pública” (Hancock, 1905, p. VI-VII).

Essa menção inserida num prefácio de uma obra dedicada ao jiu-jitsu não era destituída de sentido. Evidenciava os posicionamentos contrários à capoeira, que passaram a visualizar na luta asiática um modelo de educação física adequado à lógica modernizadora que a Marinha almejava instalar na instituição. Porém, esse contraponto gerou tensões que se materializaram na imprensa. Uma publicação, encontrada na revista Fon-Fon em 1908, ao explorar um evento fictício, no qual um professor chamado Ching-Chang-Fung (o Invencível) enfrentou um marinheiro, indica que o asiático foi atingido por um golpe de capoeira aplicado pelo brasileiro perdendo os sentidos. Ao saber do ocorrido, o ministro da Marinha do Japão teria ficado:

(...) maravilhado com a arte da rasteira e da cabeçada, considerando o jiu-jitsu muito inferior e telegraphou incontinente ao Alexandrino de Alencar pedindo autorisação para abrir um curso de capoeiragem, afim de tornal-a conhecida entre os nippons. Espera-se com anciedade a resposta do ministro brasileiro. (Fon-Fon, 11/04/1908, p. 10).

A passagem era uma ode à capoeira, visto que foram destacados alguns dos seus aspectos técnicos como a “cabeçada” e a “rasteira”. Porém, o ponto central levantado pelo texto era a crítica direcionada a decisão tomada por Alexandrino de Alencar de inserir o jiu-jitsu na formação dos marinheiros. Tais menções valorizando os elementos da capoeira não foram um fenômeno isolado, conforme pode ser visto numa nota publicada num jornal paranaense: “Com a adopção do exercício japonez do ‘jiu-jitsu’ na Armada nacional, voltou à baila a propaganda em prol da adopção aperfeiçoada do celebre jogo nacional da capoeiragem, dedicando um de nossos contemporâneos extenso artigo a respeito” (A República, 23/04/1908, p. 4).

A fonte demonstra que diversos intelectuais ficaram incomodados com a escolha realizada pela Marinha de incorporar o jiu-jitsu no processo de formação da marinhagem brasileira. A matéria localizada no jornal da cidade de Curitiba salientava ainda que a capoeira era uma forma de expressão da identidade brasileira, sendo necessário sensibilizar as autoridades a reconhecê-la como a verdadeira ginástica nacional. A sequência do artigo mostrou alguns elementos existentes nesse tensionamento entre o jiu-jitsu e a capoeira:

Estudando devidamente todos os exercícios physicos, desde a clássica gymnastica de apparelhos até os modernos jogos desportivos que têm sido importados, a observação nos aponta o jogo da capoeira como o mais completo e o de mais resultado. O principal característico desse importante exercício é a agilidade, a destreza que desenvolve, havendo casos curiosos de pessoas relativamente franzinas vencerem em poucos momentos os mais alentados e musculosos Porthos. Em um livro curioso, o finado Capitão-Tenente Santos Porto, traduziu, como de grande valor, o exercício japonez “jiu-jitsu”, apontando-o como um dos de mais importância; sem se lembrar de que esse exercício demanda um longo e extenuante estudo, que só pode ser conquistado pela paciência japoneza, uma vez começados os trabalhos na meninice. (A República, 23/04/1908, p. 4).

No processo de valorização da capoeira, o texto mencionou de forma jocosa o livro de Hancock, utilizando o adjetivo “curioso” para se referir à obra do norte-americano. Porém, no intuito de descontruir os argumentos em torno do jiu-jitsu, o artigo ainda afirmava que a prática se tratava de algo ligado à cultura japonesa e que requereria um longo e extenuante esforço para ser verdadeiramente incorporada pelos brasileiros. A capoeira, por sua vez, seria mais eficiente, visto que estaria mais sintonizada com o espirito brasileiro. Ao descrever um encontro ocorrido entre um capoeira e um conhecedor do jiu-jitsu, o jornal indicou o seguinte:

Em defensiva, nem um dos golpes do antagonista nos alcançou, e na offensiva bem sempre as “guardas” do antagonista o livraram dos golpes, e certamente não teria evitado um só dos ataques, se mais completa fosse a nossa “sciencia”. Há um jogo francez, a “savate” que dizem ser semelhante ao da capoeiragem, mas é simplesmente desastrado, pois só pode ser jogado com as regras próprias. (A República, 23/04/1908, p. 4).

A passagem argumentava que, caso fossem eliminados os golpes perigosos e mortais, sobretudo aqueles com a presença de armas brancas, a prática brasileira seria muito superior ao jiu-jitsu. A crítica presente na fonte não se restringiu somente à arte marcial japonesa; o savate, forma de combate de origem francesa, também não foi poupado de ataques. Na sua sequência o artigo publicado no jornal paranaense, procurando consolidar seus argumentos nacionalistas, mencionou personagens da Marinha que praticavam a capoeira:

(...) o jogo da capoeira, não foi desprezado por homens notáveis, que deram em público bastas provas de sua vantagem. Distincto médico da Armada, hoje fallecido, que deixou seu nome ligado ao ensino da Escola Naval, de cujo corpo docente fazia parte, homem magro, moreno, sympathico, de olhar vivo e intelligente, estatura mediana, empregou muitas vezes a capoeiragem, vencendo sempre (...) Outro official da Armada, que occupou logares distinctos na administração do paiz, quando ainda aspirante, graças à capoeiragem que alliara à sua poderosa musculatura, auxiliado por um collega, conseguiu “varrer” um theatro, em noite de espectaculo, em uma República do Sul. É por todos sabido que um distincto official de marinha, desafiado para um duelo, em Paris, quando sentado à mesa de um café, levantou-se prontamente declarando que só se batia “à brasileira”... e, acto continuou, desmanchou-se em “trancos, rasteiras e pantanas”, fazendo com que o duelista, a sua gente, o dono do café, os empregados, batessem a linda plumagem. (A República, 23/04/1908, p. 4).

O excerto além de valorizar os elementos técnicos da capoeira como os “trancos”, “rasteiras” e “pantanas” tinha uma intenção política, pois ao mencionar os capoeiras ligados à Marinha realizou uma forte crítica à aproximação realizada pela armada em direção ao jiu-jitsu. Ao caminhar para as suas conclusões o autor continuou o seu trabalho de enaltecimento da capoeira, apontando que ela era muito mais útil num confronto de um contra vários oponentes, enquanto o jiu-jitsu (assim como o boxe) era útil apenas no combate de um contra um (A República, 23/04/1908, p. 4). Nesse sentido, o texto foi finalizado com o argumento que a capoeira poderia ser muito mais eficiente que o jiu-jitsu e que os diversos modelos de ginástica, sobretudo da vertente sueca, no processo de educação física da mocidade brasileira:

O “jiu-jitsu” demanda um demorado estudo, constante, pertinaz, à guisa de gymnastica sueca (...) ao passo que a capoeiragem, bem ensinada, em poucos mezes se conquista, requerendo-se para isso destreza e folego. Nos exercícios japonez os corpos encontram-se, muitos golpes são tirados do encontro dos braços, do tronco, nuca; na capoeiragem nunca se encontram os corpos, a luta e feita a razoável distância, sendo um dos principais elementos do combate afastar sempre o antagonista depois de tocado. Em resumo adopte-se o nosso jogo nacional, que dá destreza, agilidade, desenvoltura e requer apenas folego, que se adquire com o próprio exercício, folego forte. (A República, 23/04/1908, p. 4).

O artigo se apegava a uma retórica nacionalista e contra os “estrangeirismos”, visto que atacava outras formas de combate como o boxe inglês, o savate francês e principalmente o jiu-jitsu japonês. Sendo assim, se a capoeira incorporasse determinados dispositivos institucionais seria algo mais adaptado e, consequentemente, mais útil à sociedade brasileira (Lise et. al., 2023). Contudo, o argumento nacionalista presente neste artigo esteve longe de ser único. Essa disputa entre capoeira e jiu-jitsu também se repercutiu nos altos escalões da política brasileira. Tanto que alguns veículos da imprensa realizaram sátiras (Figura 1) sobre a preferência de importantes políticos pela luta asiática:

Figura 1:
O Malho 11/04/1908, p. 19.

A ilustração mostra Alexandrino de Alencar e um personagem denominado Zé Povo, observando um combate entre um japonês e um brasileiro. Na parte inferior da ilustração encontra-se uma legenda que contêm um diálogo entre o almirante e o personagem popular. Na conversa o oficial afirmava que queria ver seus marinheiros versados em “japonizes”, porém Zé Povo retrucou, afirmando que o jiu-jitsu era apenas mais uma “estrangeirice” e que não existia nada melhor que uma “rasteira” bem passada.

Apesar de todas essas críticas ao jiu-jitsu não se pode considerar essa incorporação apenas como mais uma “estrangeirice”. Santos Júnior (2022) aponta que a utilização da arte marcial japonesa na Marinha brasileira não estava deslocada do seu tempo. A escolha era uma ação que apresentava uma perspectiva transnacional, visto que era algo que estava sendo disseminado de forma concomitante em importantes países ocidentais. O autor menciona a presença do jiu-jitsu em forças de segurança dos Estados Unidos, França e Inglaterra. Sendo assim, não é de estranhar que mesmo em meio a tantas críticas a luta asiática tenha sido inserida na formação da marinhagem brasileira. Contudo, conforme aponta Moraes e Silva (2024), o jiu-jitsu não ficou restrito aos membros da Marinha, visto que Sada Miyako, o instrutor nipônico contratado pela Armada brasileira, realizou diversas apresentações em teatros cariocas, bem como participou de alguns combates, desafiando praticantes de outras modalidades como o boxe, luta romana e a própria capoeira.

O jiu-jitsu “vai ao teatro”: das “curiosas” exibições aos combates intermodalidades

Após sua chegada ao Brasil, Sada Miyako ministrou aulas para os marinheiros, bem como se envolveu com algumas apresentações em teatros, conforme indícios localizados em diversos jornais cariocas: “No theatro João Caetano realizou-se, à tarde, um match de jiu-jitsu, pelos dois japonezes Sado Miyako e M. Kakiora, que vieram a bordo do Benjamin Constant” (O Século, 25/12/1908, p. 2). Gradativamente essas apresentações se tornaram algo mais amplo do que curiosas exibições, onde os japoneses começaram a desafiar outros lutadores: “Os dous notáveis professores japonezes oferecem 5 Libras em ouro a todos os competidores que não tombem em 3 minutos de luta” (Gazeta de Notícias, 18/04/1909, p. 10). O seguinte anúncio (Figura 2) demonstra que tais confrontos realmente se efetivaram:

A publicidade apontava que Sada Miyako iria confrontar um lutador sírio de nome Rich Jorge. Combates como esses acabaram trazendo fama ao jiu-jitsu, pois o japonês estava vencendo com suas técnicas da arte marcial japonesa adversários de compleição física muito superior. Fato que não passou desapercebido pela imprensa carioca:

(...) tendo o cidadão portuguez Arnaldo José Ferreira de 18 annos e 1 metro de peito, lançado um repto ao japonez Sada Miyako, realiza-se neste dia o <match> entre Arnaldo José Ferreira e Sada Miyako - N.B. - O portuguez Arnaldo José Ferreira assistiu em Lisboa a todos os critérios do celebre jogador do <jiu-jitsu> RAKU o que faz provar que esta luta de segunda-feira, 19, será interessantíssima. (Gazeta de Notícias, 18/04/1909, p. 2).

Foi nesse contexto que o nipônico conquistou fama e se tornou uma atração teatral, onde a imprensa o apontava como invencível: “(...) Sada Miyako, o japonez audaz continua entretanto nas lutas do <jiu-jitsu> como sempre invencível” (A Imprensa, 30/04/1909, p. 3). Sendo assim, as apresentações, bem como as lutas com outras modalidades começavam a se aproximar das lógicas do esporte moderno. Um outro artigo marca esses aspectos, principalmente ao mencionar o regramento do jiu-jitsu:

Tem despertado o mais vivo interesse as luctas de <jiu-jitsu>, disputadas todas as noites no Concerto Avenida, pelos japoneses Sada Miyako e mme. Kakiara, (...). O nosso público amante desses sports pode apreciar naquele theatrinho as vantagens que se pode tirar de saber jogar bem o <jiu-jitsu>, cujas regras damos a baixo. O <jiu-jitsu> não obedece a nenhuma das normas estabelecidas para os outros sports como sejam lucta romana, box, etc., etc.; o único sport que se poderia comparar a este e ainda assim mesmo dando uma pallida idéa, seria a luta livre denominada na Suissa de <lutte au calçon> e em Inglaterra chamada <Catch as catch can>. Ao inverso do que se passa na lucta romana, um adversário cahido no solo ainda mesmo sobre as duas espaduas não pode ser considerado vencido, porque é um dos golpes dos jogadores de “jiu-jitsu”; atiram-se propositamente ao solo para dar certos golpes. (O Século, 28/04/1909, p. 2).

A passagem mostra a presença de alguns elementos típicos do esporte moderno (Vigarello, 2002; Guttmann, 2004). Afinal, regras mais estabelecidas passaram a ser incorporadas nas retóricas relacionadas ao jiu-jitsu, fato que evidenciaria sua maior racionalidade e superioridade em relação a capoeira. A sequência do artigo fornece elementos interessantes para se visualizar o movimento de aproximação da luta japonesa com as lógicas do esporte moderno:

<O Jiu-Jiutsu> deve vencer pela destreza e agilidade pondo fora do combate o adversário por um pequeno sofrimento que ele não possa suportar durante muito tempo. O lutador, então, declarar-se-á, vencido batendo com a palma da mão dois golpes sobre o solo ou mesmo sobre o seu adversário, que o deve deixar acto continuo e será considerado vencedor. Os golpes prohibidos nos assaltos em theatro são os seguintes: 1 - dedos nos olhos; 2 - fractura dos dedos; 3 - esmagamento da coluna vertebral ou clavicular; 4 - torcegão nas partes sexuais. N’uma palavra o <Jiu-Jitsu> é um sport com a ajuda do qual um indivíduo, atacado na rua por um malfeitor mesmo armado (menos arma de fogo), por mais extraordinário manejo que elle tenha da briga característica do seu paiz, pode, querendo, pol-o fora de combate sem nenhuma arma. (O Século, 28/04/1909, p. 2).

Nota-se que a fonte aponta um ordenamento para os combates, detalhando as regras que deveriam ser seguidas pelos participantes. A passagem exaltava a racionalidade e as valências físicas do jiu-jitsu. Contudo, um combate entre Sada Miyako e um capoeira, ocorrido em maio de 1909, iria mudar o curso dos acontecimentos (Moraes e Silva, 2024). A derrota de Sada Miyaco para um capoeira de nome Cyriaco foi utilizada à exaustão por aqueles que eram contra os “estrangeirismos”. Nesse contexto, diversas vozes nacionalistas ganharam destaque na imprensa: “Sada Miyako, o campeão do jiu-jitsu, resolveu aprender a arte nacional da capoeira. Na primeira licção publicamente realizada no Concerto Avenida, o professor Cyriaco quebrou-lhe as até alli invencível queixadas” (Careta, 08/05/1909, p. 16). Por sua vez, uma publicação encontrada na Gazeta de Notícias se referiu ao combate da seguinte maneira:

Todas as noites, lá estava o público assistindo o interessante “sport” e applaudindo o japonez que, calmo, frio, ia derrubando com seus golpes de surpresa os adversários de todas as nacionalidades que ousavam apresentar-se na arena. Pois hontem foi vencido o profissional do “jiu-jitsu” por um negro que não é profissional de capoeiragem. E é digno de registro o golpe empregado pelo negro brasileiro para vencer o japonez. Esse golpe ficará na história. Foi elle um “rabo de arraia”. (Gazeta de Notícias, 02/05/1909, p. 8).

Um primeiro aspecto que chama a atenção na passagem é concernente à questão identitária, pois enfatizava o fato de Cyriaco ser negro e brasileiro. Um segundo elemento é relativo ao aspecto técnico, pois foi através de um dos golpes mais emblemáticos da capoeira que um negro brasileiro nocauteou o invencível japonês. A sequência do relato apresenta outras informações interessantes:

A cousa passou-se assim. O profissional do “jiu-jitsu” havia vencido uns tantos adversários quando se apresentou o negro (...). Enfrentaram os dois adversários e apóz dois minutos de ansiedade geral o negro que mantinha o mesmo espaço que o separava do japonez, abaixou-se de repente, firmou-se nas mãos e rodando os pés no ar, como quem faz uma “pantana”, deu tão violento choque no profissional de “jiu-jitsu” que o atirou no chão estonteado. Explodiu uma estrondosa acclamação, que durou mais de dez minutos, durante os quaes, o negro esteve fazendo umas “letras” enquanto o japonez se levantava a custo, indeciso, e ainda meio desequilibrado, para assim ficar até que se deu por vencido. Os espectadores em massa trouxeram o vencedor para a rua, e em aclamações andaram com elle pelas redações dos jornaes. Chama-se ele Francisco Cyriaco, tem 39 anos, e é carregador de café. O “jiu-jitsu” jogo japonez foi assim vencido pelo nosso jogo de capoeiragem. (Gazeta de Notícias, 02/05/1909, p. 8).

Um aspecto evidente na fonte é a retórica nacionalista, visto que menciona o fato de lutadores de diversas nacionalidades terem sido derrotados pelo nipônico e que somente um capoeira negro foi capaz de superar o lutador oriundo do país do sol-nascente. Destaca-se ainda a valorização dos componentes técnicos da capoeira, bem como a utilização do pronome possesivo “nosso” para se referir ao jogo brasileiro. Além da valorização de uma cultura nacionalista, cabe ainda salientar que tal acontecimento foi utilizado em questões políticas mais amplas. Santos Júnior (2022) e Moraes e Silva (2024) salientam que a vitória de Cyriaco foi usada para criticar o governo dos “presidentes japoneses” Campos Sales e Afonso Pena, denominados com essa expressão irônica por terem sido os mandatários que haviam apoiado Alexandrino de Alencar na iniciativa de incorporar o jiu-jitsu na Marinha. Novamente a revista O Malho se utiliza do personagem Zé Povo para comentar o acontecido e realizar sua feroz crítica política (Figura 3):

A figura da página seguinte apresenta quatro quadrinhos contando dois episódios distintos. Na primeira tira encontram-se representados dois personagens, um relativo a Sada Miyaco e outro referindo-se a Cyriaco. A primeira legenda explica que o jiu-jitsu se tratava de um sistema japonês de combate que havia suplantado outras modalidades como o boxe e a luta romana, porém enfatizava que a arte marcial japonesa não foi párea para a capoeira. Já a legenda presente no segundo quadrinho buscou evidenciar que o lutador nipônico que havia desafiado “meio-mundo” foi derrotado por um brasileiro que aplicou um “rabo de arraia” “de se tirar o chapéu”. Inclusive o golpe é representado na imagem, na qual os pés do brasileiro atingem a cabeça do japonês que pronunciou a seguinte frase: “não quero mais!”. Por sua vez, a segunda tira, traz o personagem Zé Povo tendo uma conversa com o presidente Afonso Pena. Nela o político representaria o jiu-jitsu e o personagem oriundo das classes populares simbolizaria o jogo nacional. Sendo assim, Zé Povo mandou o “presidente japonês” “fazer política no inferno”, aplicando no rosto do político uma poderosa “cabeçada”.

Figura 3:
O Malho, 08/05/1909, p. 43.

Essa contenta envolvendo a capoeira e o jiu-jitsu ganhou atenção até mesmo de veículos mais tradicionais, como o Jornal do Commercio, periódico que geralmente publicava somente questões relativas a economia e a política:

Desde muito tempo vem preocupando as rodas sportivas o jogo do Jiu-Jitsu, jogo este japonez que chegou mesmo a espicaçar tanto o espirito imitativo do povo brasileiro que o próprio sr. ministro da Marinha mandou vir do Japão dois peritos profissionais no jogo para instruir os nossos marinheiros. Na occasião que o ilustre almirante Alexandrino cogitou tal medida, houve um official general da Armada que disse ser de muito melhor resultado o jogo da capoeira, muito nosso e que, como sabemos, é de diffícil aprendizagem e de grandes vantagens. Essa observação do official general foi ouvida com indiferença (...). (Jornal do Commercio, 04/05/1909, p. 2).

Cabe mencionar que a vitória de Cyriaco foi o momento oportuno para uma parte da intelectualidade brasileira afirmar seu discurso nacionalista contra os “estrangeirismos” existentes no país. Contudo, o artigo publicado no importante e tradicional jornal carioca evidenciou que tal questão era muito mais ampla e que era algo que estava impregnado em todo tecido social brasileiro:

A curiosidade do Jiu-Jitsu chegou a tal ponto que o emprezario do Pavilhão Internacional (...) contractou para se exhibir no seu estabelecimento, um campeão do novo jogo que veio diretamente do Japão. Há alguns dias esse terrível jogador vem assombrando a platêa daquela casa de diversões com sua agilidade indiscreptível com seus pulos machiavelicos. Todas as noites o campeão japonez desafia a platêa a medir forças com elle, sendo que, logo aos primeiros dias de sua exhibição, achava-se na platêa conhecido malandro. Feito o desafio o camaradinha não teve dúvida em acceitar, subindo ao palco. Depois de tirar o paletot, collete, punhos, collarinhos e as botinas o freguez <escreveu> diante do campeão, <mingourou> embaixo do <cabra>, assentou-lhe a testa que o japonez andou amarrotando as costellas no tablado. A cousa aqueceu o japonez indignou-se, quis virar <bicho>, mas o brasileiro que não tinha nada de <paca>, foi queimando o grosso de tal maneira, que a polícia teve de intervir para evitar consequências desagradáveis para o japonez. (Jornal do Commercio, 04/05/1909, p. 2).

O excerto demonstrava que a desaprovação era com uma parcela da sociedade que se deixava levar pelos “estrangeirismos”. Em contraposição a esse modo de pensar, o texto acabou por valorizar elementos genuinamente brasileiros, utilizando-se de de um vocabulário que exaltava a capoeira. Sendo assim, o negro capoeira lavava a alma de uma parcela da população brasileira contrária aos modismos vindos do estrangeiro. O “rabo de arraia” de Cyriaco havia se transformado em um importante símbolo de brasilidade. Nesse contexto, a vitória do capoeira foi um momento de valorização dos elementos técnicos do jogo nacional. Era o triunfo da cultura brasileira sobre a estrangeira. Foi nesse momento que Cyriaco foi, conforme salienta Moraes e Silva (2024), alçado a um posto de herói nacional.

A vitória de Cyriaco se tornou a consagração dos elementos técnicos mais informais da capoeira que haviam superado a racionalidade do jiu-jitsu. O improvável herói recrutado nas fileiras das classes populares subjugava a científica luta oriunda do país do sol-nascente (Moraes e Silva, 2024). Cabe destacar que nessa construção da figura do herói o “rabo de arraia” se eternizou aos olhos da imprensa brasileira:

A capoeira foi uma representação nacional adversária do sr. Sampaio Feraz, que jurou aos seus deuses republicanos dar capo das maltas que infestavam o Rio de Janeiro (...) O preto Cyriaco é uma apagada lembrança da arte que constituía o heroísmo desses terríveis cordões que deram grandes facínoras, mas também deram bravos. Havia capoeiras que só para o bem utilizavam os seus difíceis manejos de cabeça, de pernas e de braços, não empregando a navalha traiçoeira e assassina (...) Qual o feito heroico do preto Cyriaco? Um rabo de arraia. (A Tribuna, 09/05/1909, p. 1).

A passagem localizada no jornal da cidade de Santos estava repleta de elementos que demonstravam a tentativa de descriminalizar a capoeira. Se seu passado era ligado aos distúrbios que foram combatidos no início do período republicano, agora a prática poderia se tornar um símbolo de uma identidade nacional, inclusive com um vocabulário próprio. Sendo assim, Cyriaco foi alçado ao posto de herói nacional e seu nome foi aprumado a símbolo de uma identidade genuinamente brasileira (Moraes e Silva, 2024). Os feitos obtidos com seu famoso “rabo de arraia” representariam o brasileiro típico que, mesmo em face a todas as adversidades, seria triunfador por natureza. Sua imagem retrataria uma simbologia que estava faltando a uma jovem república tão carente de símbolos (Carvalho, 1990).

O “inocente rabo de arraia” seria a personificação do mestiço brasileiro, uma prova de que elementos mais naturais existentes no Brasil seriam mais eficientes do que práticas vindas do exterior e que, nesse caso específico, estavam encarnadas nas técnicas do jiu-jitsu. Foi nesse tom que um artigo localizado no jornal O Paiz relacionou o triunfo de Cyriaco com todo o contexto político e social:

Ora, encaradas as coisas sob um certo aspecto, seria, sem dúvida, curioso saber o que pensa esse glorioso compatriota sobre a suprema investidura governamental. Em primeiro logar, há uma certa semelhança, que ninguém pode esconder nem contestar, entre suas rasteiras e as das altas rodas da política.... Negará por ventura, alguém que tem havido, esta semana, alguns rabos de arraia nas mais elevadas espheras sociaes? ... O leitor, que é muito mais intelligente, veja se não lembra de diversos.... Em segundo logar, Cyriaco pode muito bem vir a decidir sobre o assumpto, em maio do anno próximo. É claro, é muito claro até, é muito fácil de provar, que duas dúzias de rabos de arraia, como o do Concerto Avenida, seriam capazes de transtornar várias centenas de eleitores (...). Pode-se, é verdade, por malicia, dizer que há outros Cyriacos mais interessantes do que aquelle, que sabem dar “rabos de arraia” muito mais formidáveis! Sem contestar essa afirmação malevolente, eu sempre teria um imenso prazer em ouvir o Cyriaco authentico... (O Paiz, 22/05/1909, p. 2).

O jornal relaciona a figura do capoeira com o contexto político, demostrando que o “rabo de arraia”, simbolizado na figura do Cyriaco, representaria um Brasil autêntico e que deveria de ser valorizado e não sucumbido por “estrangeirices”. A capoeira havia suplantado o jiu-jitsu, que ficaria nesse momento relegado a um segundo plano. Tal situação, se modificaria somente na década seguinte com a chegada ao Brasil, no ano de 1914, de Mitsuyo Maeda, o Conde Koma (Cairus, 2011; 2012; 2020).

Conclusões

Conforme evidenciado, o jiu-jitsu chega ao Brasil por intermédio da Marinha brasileira, que visualizava na arte marcial asiática uma forma de modernizar a armada nacional. A luta oriunda do país do sol-nascente passava a ser vista como uma forma de retirar a capoeira do seio da instituição. Sendo assim, houve um tensionamento entre aqueles que viam o jiu-jitsu como uma prática racional contra os que acreditavam que a luta seria apenas mais um modismo vindo do estrangeiro e que a capoeira, por ser um elemento da cultura nacional, seria mais condizente com o espirito brasileiro.

Constatou-se que, após uma exaltação inicial do jiu-jitsu, a arte marcial japonesa passou a sofrer duras críticas por parte daqueles que viam a capoeira como a ginástica nacional. Essa vanguarda intelectual soube aproveitar o triunfo de Cyriaco frente à Sada Miyaco. Ao argumentarem que a capoeira seria superior ao jiu-jitsu, acabaram por produzir a figura de um improvável herói, um personagem que surgia, mesmo em meio de todas as dificuldades, das entranhas das classes populares do país. Uma nova fase da trajetória da luta japonesa começaria em 1914, com a chegada de Mitsuyo Maeda ao Brasil. A partir desse momento, a arte marcial nipônica entraria num outro processo que culminaria, nas décadas de 1920 e 1930, no início da sistematização realizada pelos Gracies daquilo que ficou conhecido como Brazilian jiu-jitsu. Porém, tais questões são elementos a serem explorados em pesquisas futuras.

Referências

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Fontes

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  • Financiamento
    Este artigo faz parte do projeto “A cultura física na Argentina, Brasil e Uruguai (1880-1950): a constituição de uma educação do corpo”, com bolsa de produtividade de pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Processo: 311502/2022-9.
  • Declaração de disponibilidade de dados:
    Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.

Editado por

  • Editoras-chefe:
    Ana Carolina de Carvalho Viotti, Karina Anhezini de Araujo
  • Editor Associado:
    Virginia Camilotti

Disponibilidade de dados

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Set 2025
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    04 Dez 2024
  • Aceito
    12 Abr 2025
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