Interface (Botucatu)
Interface - Comunicação, Saúde, Educação
Interface (Botucatu)
1414-3283
1807-5762
Laboratório de Educação e Comunicação em Saúde, Departamento de Saúde
Pública, Faculdade de Medicina de Botucatu e Instituto de Biociências de Botucatu -
UNESP
El objetivo de este estudio fue analizar las prácticas profesionales de la atención a la
salud de la mujer en situación de violencia, identificando los elementos del proceso de
trabajo y su relación con la emancipación de la opresión de género. Para ello, se
investigó con profesionales de la salud de un servicio de atención primaria si las
intenciones de la actual política de salud de la mujer se estarían realizando en la
práctica profesional por medio de los procesos de trabajo destinados a esa finalidad. Por
medio de la investigación cualitativa, los resultados mostraron la indivisibilidad de la
violencia en el servicio y el desconocimiento de la categoría Género y de su complejidad.
Por lo tanto, se configura la adecuación del proceso de trabajo en salud en la atención a
mujeres en situación de violencia como un gran desafío para la producción de una
asistencia potencialmente emancipadora de la opresión de género y de acuerdo con los
presupuestos de la política.
Introdução
A violência perpetrada contra a mulher é um fenômeno social que tem recebido visibilidade,
nos últimos tempos, pela sua elevada frequência, recorrência e severidade dos casos. A
magnitude das suas consequências à saúde fez com que o problema fosse reconhecido
mundialmente como uma grave questão de Saúde Pública 1. Tal violência parece expressar relações de iniquidades entre
homens e mulheres nas quais - pela vantagem biológica de sua força física - o homem tem sido
beneficiado.
Atualmente, a violência de gênero é reconhecida como uma violação aos direitos humanos das
mulheres e é compreendida como a aplicação da força física e/ou constrangimento psicológico
que se impõe a alguma mulher contra seus interesses, vontades e desejos 2. Esse tipo de violência tem sido produzido
sob a organização hierárquica do domínio masculino nas relações historicamente delimitadas,
culturalmente legitimadas e cultivadas, nas quais a mulher está exposta a agressões
objetivas e subjetivas, tanto no espaço público como no privado, com repercussão na sua
saúde física e mental 3.
No sentido de explicar a violência contra a mulher, a categoria sociológica gênero faz uma
abordagem que considera a diversidade dos processos de socialização de homens e de mulheres.
Contrapõe-se ao entendimento do enfoque hegemônico clássico, que naturalizou
as desigualdades entre os sexos, determinando consequências que impactam a vida e
as relações dos seres humanos, tanto no plano individual quanto no coletivo, distanciando a
mulher de sua emancipação social e trazendo prejuízos para ambos os sexos. Na cultura
hegemônica, a rígida divisão sexual da vida social determinou a existência de um mundo
masculino cuja base é o poder e o reconhecimento social, enquanto o mundo feminino é
relegado à invisibilidade e à falta de valor social 4. Segundo Fonseca 5, na atualidade, a contradição de gênero é uma das três grandes
contradições produzidas na sociedade ocidental. As outras duas são referentes à classe e à
raça/etnia.
A categoria Gênero foi teoricamente reformulada pela historiadora norte-americana Joan
Scott. Para Scott 6, gênero é um termo que
se refere aos domínios estruturais e ideológicos existentes na relação entre os sexos,
denunciados com veemência pelo movimento feminista, com ênfase no caráter social das
distinções baseadas no sexo. Nesse enfoque, o termo gênero indica a “rejeição ao
determinismo biológico” e valoriza o aspecto relacional e social da reciprocidade para a
compreensão de homens e mulheres 6.
A violência contra a mulher é hoje reconhecida quase como sinônimo de violência de gênero.
Entretanto, Saffioti 7 defende que a
violência de gênero engloba tanto a violência do homem contra a mulher, como o contrário,
“uma vez que o conceito de gênero é aberto”. Apesar disso, a premissa comum é de que o termo
gênero exprime a relação de poder, dominação-exploração, e esse polo explorado é quase
predominantemente ocupado pela figura feminina. Por isso, ocorre, comumente, a nomeação da
violência contra a mulher como violência de gênero.
Nesse sentido, Guedes et al. 8 afirmam ser
fundamental, para a compreensão da violência conjugal, apoiar-se no enfoque de gênero. Para
essas autoras, entender a violência contra a mulher com suporte na abordagem de gênero
significa reconhecer a hierarquia de poderes na sociedade, onde a mulher sempre esteve em
posição inferior, posição essa aceita e legitimada por desigualdades construídas e
naturalizadas ao longo da história.
Considerando a explicação hegemônica sobre a naturalização essencial do feminino e do
masculino ou sobre os gêneros naturalizados, a desigualdade sexual, produzida nos primórdios
da história, mantém-se na atualidade por meio de interesses sociais igualmente
naturalizados, constituindo uma espécie de ideologia que subverte a compreensão da realidade
essencial do ser humano e interdita a igualdade no âmbito da diversidade. Segundo Chauí
9, ao discurso naturalista opõe-se o que
afirma que a humanidade do ser humano é construída nas relações sociais. Essa última
compreensão pressupõe que os fenômenos sociais sejam produtos da ação humana e possam ser
por ela transformados.
No enfoque da construção social como resultado da ação humana, um dos grandes desafios das
políticas públicas no Brasil relativas à mulher é transformar a intenção revolucionária da
política em gesto que lhe corresponda, na ação de práticas profissionais com potencial para
fomentar a emancipação da opressão de gênero. Na área da saúde, isso significa contribuir
para o reconhecimento da transformação paradigmática do Modelo de Atenção à
Saúde da mulher. A categoria Modelo de Atenção à Saúde é
compreendida, neste estudo, no enfoque defendido por Gonçalves 10, como um conceito que tem suporte em três pilares: a) as
intenções da política; b) a organização dos serviços, e c) os processos de trabalho. Nesse
sentido, defendemos o argumento de que só haverá mudança do modelo de atenção se houver a
transformação desses três pilares em um processo dinâmico. No entanto, depois do advento do
Sistema Único de Saúde (SUS), verifica-se uma mudança nos dois primeiros eixos, e o que se
observa é a manutenção de um processo de trabalho desarticulado com os demais pilares. Disso
decorre a importância deste estudo, que analisa os avanços já conquistados nesses três
pilares, pela verificação da produção de conhecimentos e de sua aplicação nas práticas
profissionais da área da saúde. O estudo também sinaliza sobre a necessidade de produção de
novos saberes e práticas, importantes para o reconhecimento de que a área da saúde da mulher
apresenta uma lenta aproximação com os princípios e diretrizes emancipatórias que a teoria
de gênero defende e o atual sistema de saúde comporta.
Na especificidade da área da saúde, a mulher apresenta problemas e necessidades singulares,
diferentes das necessidades dos demais grupos que compõem a esfera social. Há um
reconhecimento oficial sobre o impacto dos determinantes sociais na saúde da mulher, que se
manifesta na Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PNAISM), ao se afirmar
que a vulnerabilidade feminina, frente a certos agravos, está mais relacionada com as
questões de gênero, como a situação de discriminação na sociedade, do que com fatores
biológicos 11.
Em trabalhos anteriores de Souza et al. 12, verificou-se que a discriminação nas relações de trabalho, a
sobrecarga pela soma de responsabilidade de trabalho nas esferas pública e doméstica, a
violência e a falta de poder de decisão sobre o corpo são exemplos de fatores que provocam
ou agravam os problemas de saúde das mulheres. Desse modo, na construção histórica e social
das identidades de gênero, tem-se atribuído, às mulheres, condições de vida e trabalho
precárias e opressoras (porque subalternas) que impactam sua saúde física, mental e social
e, por isso, se requer uma acurada consideração no âmbito da saúde coletiva.
Na atualidade, um desses fatores de grande destaque é a violência de gênero, fenômeno que
passou a fazer parte da agenda da Saúde Pública do Brasil, a partir dos anos de 1990,
fundamentalmente pelo crescente número de mortes e traumas que provoca. A Organização
Pan-Americana da Saúde, em 1994, priorizou a violência social (que contém a violência de
gênero) como tema na elaboração do seu plano de ação regional, instando os governos a
executarem ações interinstitucionais, a fim de prevenirem as consequências fatais e os
agravos à saúde relacionados à violência 1.
O Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência contra Mulher 13 reconhece a complexidade e a frequência da violência contra
mulher como um problema de saúde pública; e a necessidade de intervenções multidisciplinares
não só para o combate, mas, também, para a prevenção, atenção, proteção e garantia dos
direitos das mulheres e de sua família em situação de violência, com vistas a superar as
desigualdades de gênero.
Nesse contexto, os serviços de saúde fazem parte da rota percorrida por grande parte das
mulheres em situação de violência de gênero. Contudo, nesses serviços, segundo Guedes et al.
8, muitas vezes, a atenção à saúde se
restringe à lesão ou ao dano físico, consequência da violência, sem nenhuma, ou muito pouca,
consideração sobre ela como categoria sociológica que faz interseção com a área da saúde.
Isso porque a lesão se constitui um problema específico da área da saúde, sobretudo no
enfoque hegemônico do modelo de assistência tradicional e exclusivamente biológico. No
sentido de repensar essas práticas profissionais em saúde, a investigação de programas,
serviços, intervenções e tecnologias que analisem o potencial transformador dos instrumentos
empregados nos processos de trabalho é um tema a ser levado em conta, por se constituir
naquilo que Conill 14 considera uma
ferramenta de apoio à avaliação de implementação e consolidação das políticas públicas.
No Brasil, o processo de municipalização das ações e serviços de saúde tem exigido, cada
vez mais, o emprego de métodos analíticos e avaliativos para subsidiar gestores e técnicos
na redefinição de diretrizes, estratégias e objetivos para a efetivação do atual sistema de
saúde. Todavia, segundo Campos 15, os
parâmetros oficialmente adotados para avaliação do desempenho dos serviços de saúde têm-se
limitado a quantificar a produção das unidades, aos indicadores de produtividade e à análise
das capacidades de utilização de equipamentos e instalações, sem uma aproximação
significativa com o enfoque de abordagem qualitativa.
Diante da problemática apresentada, questiona-se: as intenções da atual política de saúde
destinada à mulher estão sendo realizadas na prática profissional, por meio dos processos de
trabalho destinados a esse fim? Para Gonçalves 10, o trabalho é uma categoria potente para responder às novas
necessidades sociais que demandam mudanças. No enfoque, a transformação deve ocorrer tanto
no modo de conceber o trabalho, como na maneira de processá-lo. Assim, o trabalho é uma
categoria que materializa os modelos assistenciais em saúde. Por essa razão, na análise
desse estudo, procurou-se identificar e compreender os diferentes elementos do processo de
trabalho na assistência à saúde da mulher em situação de violência de gênero, para verificar
a adequação e articulação entre o objeto, a finalidade e o instrumento de trabalho – os três
elementos do processo de trabalho, segundo Marx 16 – na perspectiva de um trabalho com potencial para fomentar a
emancipação da mulher da opressão de gênero.
Percurso metodológico
Este estudo está vinculado ao projeto de pesquisa financiado pelo Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq – Agência do Ministério da Ciência e
Tecnologia (NCT), intitulado: O trabalho das Práticas Profissionais na atenção à mulher em
situação de violência doméstica e sua relação com a emancipação da opressão de gênero.
O estudo atendeu à Resolução nº 196/96, hoje substituída pela 466/12, do Conselho Nacional
em Saúde/Ministério da Saúde do Brasil, que dispõe e regulamenta a ética da pesquisa
envolvendo seres humanos. Após aprovação do projeto de pesquisa pelo Comitê de Ética em
Pesquisa do Hospital Universitário Lauro Wanderley da Universidade Federal da Paraíba,
iniciou-se a investigação junto à Unidade de Saúde, cenário de estudo.
A pesquisa apresenta uma abordagem qualitativa pela necessidade de se apreender o
significado cultural e ideológico que a violência de gênero assume para os profissionais de
uma Equipe de Saúde da Família. Para isso, arguiu-se sobre as concepções/saberes com
conteúdos da abordagem de gênero que orientam os processos de trabalho na atenção dispensada
às mulheres em situação de violência.
O cenário de estudo foi uma Unidade Estratégia de Saúde da Família – ESF, localizada em
João Pessoa, no estado da Paraíba, Brasil, a qual tem cadastradas cerca de novecentas
famílias. A escolha desse cenário deveu-se à sua condição de mecanismo estratégico para
reorientação do modelo assistencial em saúde. Disso decorre a importância de se investigarem
os saberes que orientam as práticas profissionais na atenção à mulher em situação de
violência doméstica na nova perspectiva paradigmática.
Os sujeitos da pesquisa foram os profissionais da ESF, local do estudo. A equipe foi
composta por um médico, uma enfermeira, uma técnica de enfermagem, uma dentista, um Agente
de Saúde Bucal (ASB), sete Agentes Comunitários de Saúde (ACSs) e uma marcadora de
consultas. Tais profissionais foram entrevistados ao longo de um mês, a partir de um roteiro
de entrevistas semiestruturado. Para garantir o sigilo e anonimato dos participantes, os
depoimentos foram categorizados de acordo com a ordem do entrevistado em E(1),
E(2) e, assim, sucessivamente.
Como fonte do material empírico, foram usados os depoimentos dos profissionais da unidade,
obtidos por meio de entrevistas, acerca de suas concepções (saberes) a respeito da violência
doméstica e sobre a assistência prestada a mulheres que procuram o serviço, vítimas desse
tipo de violência, no sentido de investigar a correspondência entre o discurso da política e
a prática profissional que a executa, identificando os diferentes elementos do processo de
trabalho.
Os depoimentos foram gravados, transcritos em sua íntegra e analisados pela técnica de
análise de discurso proposta por Fiorin 17.
Essa técnica permitiu compreender os sentidos que as intenções da política de saúde da
mulher assumem, enquanto objeto teórico-prático, a partir da identificação das contradições
que produzem as tensões entre dois diferentes polos da argumentação: temas e práticas
referentes à resistência à transformação do status quo – no enfoque da
manutenção do modelo de atenção tradicional, em confronto com a identificação de temas e
práticas, que informam possibilidades de aproximação com a transformação do modelo
hegemônico.
Nesse sentido, considerando o enfoque defendido por Gonçalves, 10 em que o processo de trabalho é um dos pilares da categoria
Modelos de Atenção à Saúde, os depoimentos foram analisados na perspectiva de se contrapor o
modelo de atenção tradicional curativo ao novo modelo que se pretende no contexto do SUS e
que, na saúde da mulher, comporta a estratégia política de emancipação de gênero. De acordo
com Gonçalves 10, a organização
tecnológica do trabalho em saúde, ainda dominante no país nos dias atuais, atende ao modelo
de atenção tradicional que recortou, como objeto de trabalho, o corpo humano em suas
dimensões individual e coletiva. A finalidade, por sua vez, foi recortada como o controle
das doenças e a recuperação da força de trabalho incapacitada pela doença. Entre os
instrumentos, há o saber que, em combinação com a visão de mundo dos profissionais, se
manifesta nos equipamentos de diagnóstico e terapêuticas.
Considerando o objeto e os objetivos deste estudo, após leituras dos textos, foram
identificados os temas que orientaram a construção das seguintes categorias: 1) A
invisibilidade da violência contra a mulher e sua relação com o objeto de trabalho em saúde
da mulher; 2) A finalidade do trabalho em saúde da mulher: a predominância dos aspectos
biológicos na busca pela cura física e psicológica dos danos; 3) Gênero: o novo saber como
instrumento de trabalho na perspectiva da superação paradigmática.
Resultados e discussão
A invisibilidade da violência contra a mulher e sua relação com o objeto de trabalho
em saúde da mulher
Na atenção à mulher em situação de violência doméstica, a superação da opressão de gênero
há que ser considerada, enquanto objeto de trabalho, para que sejam mobilizadas
estratégias capazes de nortear uma assistência especializada, associada a enfoques de
outras áreas do conhecimento, como a Sociologia e o Direito, para potencializar a
transformação do modelo hegemônico de saúde, de enfoque apenas biológico. Nesse contexto,
defende-se a transdisciplinaridade e argumenta-se que o enfoque dos estudos e intervenções
nesse campo deve remeter-se à saúde na sua concepção social, e não apenas na sua dimensão
biológica, pois só assim a violência contra a mulher poderá ser vislumbrada, no interior
dos serviços de saúde, como um fator que produz necessidade em saúde da mulher e que, por
isso, requer a vigilância da violência de gênero, no contexto da saúde coletiva 18.
Entretanto, os depoimentos dos participantes do estudo não evidenciaram essa
característica, e a violência contra a mulher, além de pouco percebida, foi igualmente
pouco valorizada pelos profissionais. Para Schraiber et al. 19, os profissionais de saúde não reconhecem a violência
contra a mulher como uma “transgressão de direito ou mesmo instaurador de um processo
saúde-doença, por esse motivo desconhecem a importância de intervenção de mesmo porte
socioinstitucional que as demais violências.” 19 Assim, ao desconhecerem a violência doméstica e suas interfaces
com a saúde, os profissionais também a desconhecem como objeto de trabalho em saúde.
O não-reconhecimento da violência nos serviços de saúde é provocado por diversos fatores,
entre eles: a dificuldade, relatada pelos profissionais, de intervir em assuntos tidos
como delicados e íntimos. Apesar da ampla divulgação nos meios de comunicação, com o
objetivo de promover maior visibilidade ao problema e torná-lo de interesse público e
civil, buscando-se romper com o caráter exclusivamente privado do
fenômeno, e criar mecanismos para sua prevenção e solução, a partir da responsabilização
social do problema, a intervenção pública ainda acontece de forma discreta e com pouco
efeito, posto que essa problemática ainda é vista como assunto referente ao
locus privado, constituindo, portanto, assunto restrito ao casal.
Essa realidade foi demonstrada nos relatos dos entrevistados, ao expressarem a sua pouca
intervenção em situações que envolvem a violência perpetrada contra as mulheres, por
tratar-se de um assunto íntimo e conjugal, conforme os depoimentos que afirmam:
“É muito complicado pelo seguinte, é aquilo que a gente fala, muitas vezes perpassa
pelo segredo de família”. E (8)
“[...] eu disse pra ela que não queria saber o porquê nem queria entrar na vida dos
dois”. E (1)
Um estudo realizado por Sugg e Inui 20
, com médicos com atuação na atenção primária à saúde, buscou investigar as experiências
desses profissionais no atendimento a vítimas de violência doméstica e determinar os
obstáculos na identificação e intervenção nos casos. Os resultados concluíram que abordar
a violência doméstica é semelhante a “abrir a caixa de Pandora”, pois envolve sentimentos
de incômodo e impotência, receio de ser ofensivo e interferir na vida conjugal, perda do
controle da situação e constrangimento.
Para Schraiber e D’Oliveira 21, os
profissionais de saúde não atribuem a devida importância à violência pelo fato de as
próprias mulheres, em situação de violência, não relatarem o caso. Desse modo, ele não se
constitui parte da demanda do serviço. As autoras acrescentam que:
As mulheres evitam falar por medo, sentimentos de vergonha ou culpa pelo ocorrido; os
familiares ou vizinhos, porque valorizam seu individualismo e não acreditam que devam se
solidarizar com a mulher, ou acham que seria intromissão em assunto privado, ou ainda,
também por medo; os profissionais, porque não sabem o que fazer ou não querem se
adiantar à mulher 21.
A consideração de impotência perante os casos de violência, seja por falta de tempo,
“falta” de demanda ou por não se considerarem profissionalmente preparados, fez com que os
profissionais declarassem a necessidade de capacitação em gênero para proporcionar
autonomia e uma atuação mais efetiva diante de tais situações.
“Acho que a gente precisa de um curso pra gente se profissionalizar e ajudar essas
pessoas de uma forma mais técnica”. E (3)
A Educação Permanente em Saúde (EPS) se configura como uma estratégia de educação
profissional com foco na problematização e mudanças de prática. Essa EPS, para os
profissionais envolvidos com o atendimento a mulheres vitimizadas, é uma das medidas de
integração e prevenção preconizadas na Lei Nacional Maria da Penha nº 11.340 de agosto de
2006, criada para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher 22. Apesar de importante, questionar e
interessar-se pelo problema remetido pela mulher não é suficiente, isso porque “saber
perguntar sobre as agressões é tão importante quanto saber o que fazer quando a resposta
for positiva”, ou seja, além de perguntar sobre a violência é importante “dar sentido
assistencial a essa pergunta” 19
,
23. Por esse motivo, treinamento,
supervisão e conhecimento por parte dos profissionais, a respeito da rede de serviços
existentes, são fundamentais.
Para Schraiber e D’Oliveira 24, a área
da saúde apresenta sérias dificuldades em trabalhar questões percebidas como culturais,
sociais e até psicológicas. A proposta de investigação de casos de violência contra a
mulher pode acabar por produzir duas outras situações delicadas: a primeira seria a de
rejeição do problema pelo fato de ele não ser percebido como doença, mas, sim, como
questão social; a segunda situação seria decorrente do efeito contrário, ou seja, por ser
identificada nos serviços de saúde, a violência poderia ser percebida apenas sob o ponto
de vista patológico, com o tratamento de lesões, reduzindo a questões somáticas aquilo que
é fruto de relações sociais. Daí decorre a necessidade de utilização de novos saberes e
técnicas que favoreçam a identificação e abordagem do problema, para contribuir com a
visibilidade e enfrentamento da violência contra mulheres nos serviços de saúde. Nesse
sentido, estão sendo pensadas novas formas de capacitar e abordar o problema com esses
profissionais, fazendo uso de novas tecnologias, a exemplos de jogos de vídeo, com o
intuito de mobilizar novos saberes que levem a mudança de práticas 25.
A finalidade do trabalho em saúde da mulher: a predominância dos aspectos biológicos
na busca pela cura física e psicológica dos danos
A finalidade do trabalho em saúde da mulher revela-se no sentido da cura e da saúde
reprodutiva. Nesse sentido, os profissionais de saúde apresentam uma grande dificuldade
para intervir nos casos de violência, devido ao seu caráter social. Assim, a atuação dos
profissionais apresentou-se restrita ao encaminhamento, diante da ausência de agravos
físicos e da doença propriamente dita.
Para Schraiber et al. 19, os
profissionais de saúde são, em geral, competentes para atuar com a doença e o corpo que
adoece, diagnosticando e tratando casos em que há a presença de sinais e sintomas
característicos. Para esses autores, ocorre a predominância de uma assistência
medicalizada, tradicional e fragmentada, valorizando o modelo hegemônico biomédico e
desprezando ações de caráter preventivo e de promoção à saúde. A esse respeito, Feurwerker
26 afirma que as necessidades de
saúde, tecnicamente definidas, e as práticas estabelecidas pelos serviços acabam por
limitar a ação profissional, restringindo à atenção ao atendimento das demandas e
desconsiderando as singularidades e as subjetividades que interferem no processo
saúde-doença, como, por exemplo, situações e relações conjugais conflituosas. Portanto,
pode-se afirmar que o contexto social dos usuários continua desvalorizado na atenção à
saúde, fazendo com que a violência contra a mulher seja rejeitada nesses serviços, por não
visualizarem doença ou o risco de adoecer em mulheres que procuram o serviço com tais
queixas.
Nesta pesquisa, o que ilustra claramente essa situação é o processo de “psicologização”
da violência. Diante da ausência de agravos físicos, os profissionais se mostram
impotentes para atuarem, encaminhando aquelas usuárias a quem teoricamente tem habilidades
para resolver aquele problema que, se não é físico, é mental, ou seja, aos serviços de
Psicologia. Porto 27 entende por
“psicologização” o enfrentamento de uma questão cultural, social e/ou econômica como um
transtorno psicológico. Nesse sentido, os encaminhamentos são entendidos como uma forma de
transferir, para a Psicologia, um problema considerado de difícil solução ou com pouco
valor para a saúde – como são percebidos os casos de violência contra a mulher –, que
passa a ser demandado ao profissional da Psicologia.
Houve uma predominância quase unânime de depoimentos que ressaltavam a importância do
psicólogo no serviço para tratar de tais assuntos tidos como de interesse e práticas da
saúde mental, como verificou-se nos depoimentos seguintes:
“Já foi até colocado aqui, a gente ter um psicólogo, pelo menos assim, que viesse de
quinze em quinze dias, entendeu? [...] Era bom que viesse um fisioterapeuta uma vez no
mês, um psicólogo, principalmente”. E (4)
Além de relatarem a importância e a necessidade de um psicólogo na unidade para resolver
problemas que, segundo os entrevistados, são do interesse e da atuação do campo da saúde
mental, os sujeitos da pesquisa também falaram a respeito do encaminhamento aos serviços
de Psicologia como intervenção possível dentro das suas limitações enquanto
profissional.
“Olha, primeiro eu a deixo falar, desabafar, e digo: ‘olha você quer uma ajuda de um
profissional, porque tem psicólogos, que procuram orientar. Se você quiser vá lá ao
posto pegar um encaminhamento para o psicólogo’”. E (4)
Os discursos apontaram para a utilização da Psicologia como último recurso, isso porque,
para os entrevistados, dentro das possibilidades da intervenção em saúde, nada mais
poderia ser feito. Sobre a psicologização da violência doméstica, tão frequente nos
discursos dos entrevistados, Porto 27
defende que a violência contra a mulher apresenta-se para o serviço de saúde como um
problema que o modelo de atenção tradicional, biologicista e medicalizado não consegue
resolver. Nesse caso, a solução para o problema é encaminhar a mulher ao serviço de
Psicologia, que, segundo o autor, é visto como um serviço que “resolve coisas
complicadas”, “que entende de problemas da cabeça dessas mulheres problemáticas”.
Porto 27 cita Schraiber e D’Oliveira
24, ao afirmar que a violência contra
a mulher foi, a princípio, percebida como uma doença que requeria uma intervenção baseada
na racionalidade biomédica, na condição da presença de uma “base anátomo-patológica,
objetiva e visível”, ou seja, uma lesão física, que justificasse a intervenção, assim como
acontece na justiça, em que o crime só configura-se na materialidade da prova. Nesse
enfoque, a queixa de violência doméstica sem a presença da lesão visível desqualifica-se
como necessidade de atenção em saúde e intervenção médica, e remete a uma intervenção
social e/ou psicológica.
Tomando essa posição, os profissionais da saúde se eximem de entender o fenômeno complexo
da violência contra a mulher e de reformular suas ações de forma a colaborarem no processo
de prevenção e assistência a esses casos. Assim, realizam encaminhamentos automáticos que,
no entender de Schraiber e D’Oliveira 24
, são perigosos, pois podem ser interpretados, pela mulher, como um “atestado” de que o
problema é exclusivamente seu e que seu funcionamento subjetivo estaria alterado de alguma
forma (doença mental).
Apesar dessa discussão sobre a participação do psicólogo no atendimento a mulheres
vítimas de violência doméstica, vale salientar a importância desse profissional no apoio a
mulheres e no assessoramento e orientação aos profissionais dos serviços de saúde para a
promoção de uma atenção multiprofissional com caráter preventivo e de inclusão,
proporcionando uma assistência efetiva e integral.
Gênero: o novo saber como instrumento de trabalho na perspectiva da superação
paradigmática
O enfrentamento da violência contra a mulher no serviço de saúde requer a inclusão da
perspectiva de gênero nas políticas e nas práticas profissionais 18. As concepções sobre gênero e sobre violência
identificadas nos depoimentos obtidos apontam que os saberes se apresentam potentes e
adequados ao modelo tradicional de Saúde Pública que não considera, na assistência à saúde
da mulher, a emancipação da mulher da opressão de gênero. As noções sobre as duas
categorias anteriores convergem para uma perspectiva conservadora que ressalta a opressão
de gênero, o que dificulta a execução de uma intervenção e de um trabalho transformador da
realidade de violência vivida por mulheres no cenário investigado.
Os profissionais do serviço, ao serem questionados sobre qual a sua concepção acerca de
gênero, manifestaram, frequente e prevalentemente, a falta de um entendimento coerente
sobre o assunto.
“Não... não sei dizer não”. E (2)
“Entende-se por gênero, ignorância”. E (5)
“Não tenho entendimento sobre gênero”. E (6)
“Eu não entendo essa parte de gênero que você está colocando não”. E (11)
Para Schraiber e D’Oliveira 24, a
noção de gênero é complexa e ainda muito confundida com a ideia de sexo feminino, quando,
na verdade, surgiu exatamente para ressaltar essa distinção. Ao contrário do que vem a
indicar sexo, o termo gênero exprime um caráter social, material e simbólico, e não
biológico. Apesar de não conceituarem e de reconhecerem a falta de entendimento sobre
gênero, muitos dos depoimentos apresentam o discurso sobre a desigualdade social entre os
sexos, ao fazerem referência à questão cultural e ao machismo como causa da violência, que
é tida como manifestação direta do poder do homem sobre a mulher. Essas considerações
evidenciam a importância de atualização sobre o tema, tendo em vista a complexidade da
categoria gênero e o recente tempo em que a temática vem sendo mais amplamente discutida
no setor saúde. Destarte, compreende-se que, mesmo na ausência de uma situação teórica
mais aprofundada, os profissionais de saúde que apresentam uma posição ideológica sobre a
igualdade entre os seres humanos são capazes de desenvolver práticas profissionais em uma
perspectiva emancipatória, a partir das quais podem-se desenvolver novos conhecimentos
sobre gênero para impactar o trabalho das práticas profissionais na saúde da mulher que
sofre violência.
Os depoimentos que conduziram a identificação dessa subcategoria foram tematizados pelos
profissionais na responsabilização da mulher pela violência sofrida. Os discursos
indicaram uma posição social cristalizada nas relações desiguais entre os sexos, nas quais
o poder masculino é aceito e naturalizado pela sociedade, e o uso da força é justificado
na iminência de um rompimento dessa relação hierárquica entre os sexos para manutenção
desse status quo.
“A gente sabe que tem mulheres que tiram um homem do sério com ciúme doentio”. E
(1)
“ [...] a mulher que está muito vulgar também, competindo com o homem. [...] Mas a
mulher contribui com muita coisa. Eu acho que ela está muito visada, muito solta,
competindo com o homem e homem não dá mole não. [...] Eu vejo as mocinhas gritando,
botando o dedo na cara do homem e diz tanto coisa. E a violência surge daí”. E (10)
Nesses depoimentos, o comportamento da mulher justifica a violência contra ela
perpetrada. A reação de resistência feminina à dominação do homem é vista, nesses relatos,
como o maior problema, e não a violência em si. É essa a ideia expressada no depoimento
seguinte:
“[...] É a mulher que participa e que contribui para essa violência”. E (5)
A esse respeito, Schraiber e D’Oliveira 21 afirmam que o que ocorre é uma inversão ética reforçada
moralmente, em que a “vítima”, muitas vezes, é vista como pessoa indigna. Para essas
mesmas autoras, as desigualdades de gênero são reforçadas politicamente, uma vez que o
homem detém a autorização social para agredir sua parceira íntima, visto que lhe é sempre
dado crédito de ter um bom motivo para tal, ou seja, a violência é aceita como norma de
correção de um comportamento da mulher avaliado exclusivamente pelo agressor como
comportamento a ser corrigido.
A responsabilização da mulher pela violência que sofre também foi colocada em pesquisa
realizada por Kiss e Scharaiber 28 com
profissionais de saúde. Naquela pesquisa, os entrevistados afirmaram que as mulheres “são
responsáveis pela situação que vivem, como resultado de suas escolhas pessoais”. Segundo
as autoras, os profissionais “julgam muitas vezes equivocados os valores que informam
essas escolhas, imprimindo uma forte carga moral nessas posições”.
Portanto, na perspectiva da superação paradigmática, esse saber que orienta o processo de
trabalho se apresenta inadequado, indicando a necessidade de seu aprofundamento,
sobretudo, na reorientação da formação dos profissionais de saúde no sentido de um
entendimento a respeito da necessidade de se investigar e agir diante da violência de
gênero.
Considerações finais
Esse estudo evidenciou resultados que se aproximaram de pesquisas semelhantes realizadas,
também, com profissionais de saúde sobre suas práticas; no qual foi possível identificar a
realização de práticas profissionais cujos elementos do processo de trabalho se apresentam
desconexos com o que propõe a perspectiva de atenção à saúde da mulher com caráter integral
e resolutivo, ou seja, um processo de trabalho, cujos elementos em articulação contemplem as
diferentes dimensões da existência do sofrimento das mulheres em situação de violência.
A falta de reconhecimento da violência como um problema gerador de necessidades em saúde,
ou seja, como objeto de intervenção em saúde, e a adequação da finalidade e dos saberes
instrumentais ao modelo de atenção em saúde tradicional e curativo, evidenciaram um trabalho
sem perspectivas de proporcionar uma assistência pautada na integralidade e com potencial
para a emancipação de gênero das mulheres que sofrem esse tipo de violência e que recorrem
aos cuidados daquela equipe.
A violência contra a mulher é invisível no serviço mediante o seu caráter privado e íntimo,
segundo os depoimentos obtidos. O silêncio das mulheres, o medo em intervir em assuntos
conjugais, a falta de tempo e a não-identificação de danos físicos visíveis causados pela
violência e que demandam cuidados em saúde são relatados como motivos que contribuem para a
não-contemplação da violência doméstica no serviço de saúde. Essa não-contemplação da
violência enquanto objeto de intervenção em saúde contribui significativamente para a
não-adequação do segundo elemento de trabalho: a finalidade da assistência.
Diante da ausência de casos declarados na comunidade, da “baixa” incidência de casos no
serviço de saúde, o que nos remete a uma possível subnotificação, e da inexistência de
mulheres com queixas físicas aparentes, a violência contra a mulher acaba por não se
configurar no serviço como problema que necessite de intervenção do profissional de saúde.
Por esse motivo, os profissionais entendem que o melhor e mais indicado atendimento para
essas mulheres seja o encaminhamento para quem, segundo eles, detém conhecimento e
capacidades para intervir nesses casos: aos serviços de psicologia e saúde mental.
A psicologização da violência evidenciou, na pesquisa, a desvalorização do caráter social
do processo saúde-doença, fazendo com que a violência contra a mulher seja rejeitada nesses
serviços por não visualizarem a doença ou o risco de adoecer em mulheres que procuram o
atendimento com tais queixas. Nesse enfoque, a finalidade nos serviços de saúde continua
sendo a cura da doença instalada que, em se tratando de violência contra a mulher, se não
existir danos físicos, foge das atribuições daquele profissional, relacionando o problema ao
sofrimento mental, o que explica os encaminhamentos e a necessidade, expressa pelos
profissionais, da presença do psicólogo na unidade para resolver tais problemas.
No que concerne ao último elemento do processo de trabalho em saúde, foi possível
identificar que os saberes se apresentam potentes e adequados ao modelo tradicional de Saúde
Pública que não considera, na assistência à saúde da mulher, a emancipação da mulher da
opressão de gênero. As noções dos entrevistados convergiram no sentido de uma perspectiva
conservadora da opressão de gênero, o que dificulta a execução de uma intervenção e de um
trabalho transformador da realidade da violência vivida por mulheres no cenário investigado.
A presença de discursos que veiculam a responsabilização da mulher pela violência sofrida
exprime a inadequação do saber instrumental desses profissionais, o que os impede de traçar
estratégias específicas no combate e prevenção desse fenômeno. Assim, falta-lhes associar a
competência técnica ao caráter político e das Ciências Humanas que o setor saúde pressupõe,
sobretudo depois da ampliação do conceito de saúde e da perspectiva e advento do SUS.
A violência contra a mulher precisa ser entendida no serviço como fruto de uma desigualdade
de poder entre homens e mulheres, capaz de transformar a vida de suas vítimas, e, portanto,
geradora de necessidades em saúde dentro do serviço, não só diante da confissão de casos ou
presença de danos físicos evidentes, mas na presença de qualquer manifestação de poder e
domínio do homem sobre a mulher que sugira relações violentas no interior das relações
conjugais.
Prestar uma assistência integral, livre de preconceitos e estereótipos de gênero ainda é um
grande desafio para os profissionais de saúde da atenção básica, fazendo-se fundamental uma
reorientação das técnicas e saberes para que a violência seja reconhecida pela sua gênese
social e cultural importantes. Nesse sentido, destaca-se a necessidade da qualificação das
práticas profissionais por meio da educação permanente, que contemple discussões sobre
conteúdos de gênero, com o objetivo de proporcionar uma reorientação do trabalho em saúde na
atenção à mulher em situação de violência. O novo trabalho tomaria, por exemplo, como seu
objeto: a transformação da situação de opressão para a situação de emancipação da mulher que
sofre violência doméstica. Para tanto, o profissional de saúde deveria ser capaz de
despertar as motivações dessas mulheres para o enfrentamento da violência, sua denúncia e as
consequências dela. O recorte deste novo objeto implica a utilização de novos instrumentos
de trabalho, entre os quais: a perspectiva de gênero, no que se refere ao saber sobre as
relações desiguais entre os seres do sexo feminino e do sexo masculino, com a finalidade de
tornar possível a resolução de conflitos entre as partes em situação de violência
doméstica.
A complexidade do trabalho em saúde no enfrentamento da violência doméstica não se encerra
nos elementos do seu processo, mas requer que sejam também mobilizadas estratégias de busca,
identificação e valorização dos casos de violência contra a mulher. Essa valorização deve
acontecer por meio do registro e da notificação dos casos, além de um encaminhamento com
possibilidades de resolubilidade. Trabalho esse que só será possível através de uma equipe
integrada e motivada e com a disposição de uma rede de serviços que se articule e se
comunique, para que o profissional sinta-se seguro em dar seguimento à sua atuação.
O enfrentamento da violência de gênero, no interior dos serviços, requer também: o
desenvolvimento de um de trabalho que valorize o processo saúde-doença na sua interface
social, privilegiando não apenas a dimensão biológica do adoecimento e a medicalização, mas
o contexto de vida das mulheres em situação de violência; o estabelecimento de relações
interpessoais fortes entre profissional e usuária, com o estreitamento de vínculos e o
reconhecimento da escuta e da orientação como equipamentos dos cuidados em saúde. Nesse
contexto, pode-se promover uma assistência com potencial emancipatório da opressão de gênero
que tenha, entre suas finalidades, a luta contra a passividade e as dependências, pelo
empoderamento de mulheres que buscam os cuidados daqueles profissionais.
Referências
1
. Organización Panamericana de la Salud. Resolución XIX: Violencia y Salud.
Washington, DC: Opas; 1993.
Organización Panamericana de la Salud
Resolución XIX: Violencia y Salud
Washington, DC
Opas
1993
2
. Krug EG, Dahlberg LL, Mercy JA, Zwi AB, Lozano R. Relatório mundial sobre
violência e saúde. Genebra: Organização Mundial de Saúde; 2002.
Krug
EG
Dahlberg
LL
Mercy
JA
Zwi
AB
Lozano
R
Relatório mundial sobre violência e saúde
Genebra
Organização Mundial de Saúde
2002
3
. Almeida LR, Silva ATMC, Silva CC, Souza JA, Lucena, KDT. A violência de
gênero na concepção dos profissionais de saúde da Atenção Básica. Saude Debate. 2011;
35(90):396-404.
Almeida
LR
Silva
ATMC
Silva
CC
Souza
JA
Lucena
KDT
A violência de gênero na concepção dos profissionais de saúde
da Atenção Básica
Saude Debate
2011
35
90
396
404
4
. Borrell C, Artazcoz L. La relación entre el sexismo percibido y la
depressión. Saude Debate. 2009; 33(82):316-25.
Borrell
C
Artazcoz
L
La relación entre el sexismo percibido y la
depressión
Saude Debate
2009
33
82
316
325
5
. Fonseca RMGS. Equidade de gênero e saúde das mulheres. Rev Esc Enferm USP.
2005; 39(4):450-9.
Fonseca
RMGS
Equidade de gênero e saúde das mulheres
Rev Esc Enferm USP
2005
39
4
450
459
6
. Scott J. Gênero: uma categoria útil para análise histórica. Recife: SOS
Corpo; 1991.
Scott
J
Gênero: uma categoria útil para análise histórica
Recife
SOS Corpo
1991
7
. Saffioti H. Gênero, patriarcado e violência. São Paulo: Fundação Perseu
Abramo; 2011.
Saffioti
H
Gênero, patriarcado e violência
São Paulo
Fundação Perseu Abramo
2011
8
. Guedes RN, Silva ATMC, Fonseca RMGS. A violência de gênero e o processo
saúde-doença das mulheres. Esc Anna Nery. 2009; 13(3):625-31.
Guedes
RN
Silva
ATMC
Fonseca
RMGS
A violência de gênero e o processo saúde-doença das
mulheres
Esc Anna Nery
2009
13
3
625
631
9
. Chauí M. Cultura e democracia: o discurso competente e outras falas. 11a
ed. São Paulo: Moderna; 2006.
Chauí
M
Cultura e democracia: o discurso competente e outras falas
11a ed
São Paulo
Moderna
2006
10
. Gonçalves RBM. Práticas de saúde: processos de trabalho e necessidades.
São Paulo: Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP;
1992.
Gonçalves
RBM
Práticas de saúde: processos de trabalho e necessidades
São Paulo
Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da
USP
1992
11
. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção a Saúde. Departamento de Ações
Programáticas Estratégicas. Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher:
princípios e diretrizes. Brasília, DF: SAS; 2004.
Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção a Saúde. Departamento de Ações
Programáticas Estratégicas
Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher: princípios
e diretrizes
Brasília, DF
SAS
2004
12
. Souza JA, Silva ATMC. O significado do impacto da violência doméstica na
saúde mental de mulheres no estado da Paraíba. In: Anais do Encontro de Iniciação
Científica; 2008- 2010; João Pessoa. João Pessoa: Editora Universitária/UFPB; 2008-2010.
[1 cd rom].
Souza
JA
Silva
ATMC
O significado do impacto da violência doméstica na saúde
mental de mulheres no estado da Paraíba
Anais
Encontro de Iniciação Científica
2008- 2010
João Pessoa
João Pessoa
Editora Universitária/UFPB
2008-2010
1 cd rom
13
. Presidência da República. Secretaria Especial de Políticas para Mulheres.
Pacto Nacional de Enfrentamento à violência contra Mulher. Brasília, DF: SEPM;
2007.
Presidência da República. Secretaria Especial de Políticas para
Mulheres
Pacto Nacional de Enfrentamento à violência contra Mulher
Brasília, DF
SEPM
2007
14
. Conill EM. Notas sobre cuidados no monitoramento de políticas e programas
intersetoriais. Cienc Saude Colet. 2007; 12(6):1422-8.
Conill
EM
Notas sobre cuidados no monitoramento de políticas e
programas intersetoriais
Cienc Saude Colet
2007
12
6
1422
1428
15
. Campos GWS. Saúde pública e saúde coletiva: campo e núcleo de saberes e
práticas. Cienc Saude Colet . 2000; 5(2):219-30.
Campos
GWS
Saúde pública e saúde coletiva: campo e núcleo de saberes e
práticas
Cienc Saude Colet
2000
5
2
219
230
16
. Marx K. O capital. Rio de Janeiro: Brasiliense; 1996.
Marx
K
O capital
Rio de Janeiro
Brasiliense
1996
17
. Fiorin JL. Linguagem e ideologia. 6a ed. São Paulo: Ática;
2007.
Fiorin
JL
Linguagem e ideologia
6a ed
São Paulo
Ática
2007
18
. Guedes RN, Fonseca, RMGS. A autonomia como necessidade estruturante para o
enfrentamento da violência de gênero. Rev Esc Enferm USP. 2011;
45(2):1731-5.
Guedes
RN
Fonseca
RMGS
A autonomia como necessidade estruturante para o
enfrentamento da violência de gênero
Rev Esc Enferm USP
2011
45
2
1731
1735
19
. Schraiber LB, D’Oliveira AFPL, Falcão MTC, Figueiredo WS. Violência dói e
não é direito: a violência contra a mulher, a saúde e os direitos humanos. São Paulo: Ed.
Unesp; 2005.
Schraiber
LB
D’Oliveira
AFPL
Falcão
MTC
Figueiredo
WS
Violência dói e não é direito: a violência contra a mulher, a saúde
e os direitos humanos
São Paulo
Ed. Unesp
2005
20
. Sugg NK, Inui T. Primary care physicians’ response to domestic violence.
JAMA. 1992; 267(27):3157-60.
Sugg
NK
Inui
T
Primary care physicians’ response to domestic
violence
JAMA
1992
267
27
3157
3160
21
. Schraiber LB, D’Oliveira AFPL. Romper com a violência contra a mulher:
como lidar desde a perspectiva do campo da saúde. Athenea. 2008;
14:229-36.
Schraiber
LB
D’Oliveira
AFPL
Romper com a violência contra a mulher: como lidar desde a
perspectiva do campo da saúde
Athenea
2008
14
229
236
22
. Lei nº 11340, “Lei Maria da Penha”, de 22 de setembro de 2006. Cria
mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Diário Oficial da
República Federativa do Brasil. 2006 Set 22.
Lei nº 11340, “Lei Maria da Penha”, de 22 de setembro de
2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a
mulher
Diário Oficial da República Federativa do Brasil
2006
Set
22
23
. Schraiber LB. Violência contra as mulheres e políticas de saúde no Brasil:
o que podem fazer os serviços de saúde? Rev USP. 2001; (51):104-13.
Schraiber
LB
Violência contra as mulheres e políticas de saúde no Brasil:
o que podem fazer os serviços de saúde?
Rev USP
2001
51
104
113
24
. Schraiber LB, D’Oliveira AFPL. Violência contra as mulheres: interfaces
com a saúde. Interface (Botucatu). 1999; 3(5):11-26.
Schraiber
LB
D’Oliveira
AFPL
Violência contra as mulheres: interfaces com a
saúde
Interface
Botucatu
1999
3
5
11
26
25
. Almeida LR, Silva ATMC, Machado, LS. Serious games para capacitação de
profissionais de saúde na atenção à violência de gênero. Rev Bras Educ Med. 2013;
37(1):110-9.
Almeida
LR
Silva
ATMC
Machado
LS
Serious games para capacitação de profissionais de saúde na
atenção à violência de gênero
Rev Bras Educ Med
2013
37
1
110
119
26
. Feuerwerker LM. Modelos tecnoassistenciais, gestão e organização do
trabalho em saúde: nada é indiferente no processo de luta para a consolidação do SUS.
Interface (Botucatu). 2005; 9(18):489-506.
Feuerwerker
LM
Modelos tecnoassistenciais, gestão e organização do trabalho
em saúde: nada é indiferente no processo de luta para a consolidação do
SUS
Interface
Botucatu
2005
9
18
489
506
27
. Porto M. Violência contra a mulher e atendimento psicológico: o que pensam
os/as gestores/as municipais do SUS. Psicol Cienc Prof. 2006;
26(3):426-39.
Porto
M
Violência contra a mulher e atendimento psicológico: o que
pensam os/as gestores/as municipais do SUS
Psicol Cienc Prof
2006
26
3
426
439
28
. Kiss LB, Schraiber LB. Temas médico-sociais e a intervenção em saúde: a
violência contra mulheres no discurso dos profissionais. Cienc Saude Colet. 2011;
16(3):1943-52.
Kiss
LB
Schraiber
LB
Temas médico-sociais e a intervenção em saúde: a violência
contra mulheres no discurso dos profissionais
Cienc Saude Colet
2011
16
3
1943
1952
Autoría
Luana Rodrigues de Almeida
Doutoranda, Programa de Pós-Graduação em Modelos de
Decisão e Saúde, Departamento de Estatística, Centro de Ciências Exatas e da Natureza,
Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Cidade Universitária, s/n. João Pessoa, PB,
Brasil. 58051-900. luanaralmeida02@
gmail.com
Universidade Federal da ParaíbaBrasilJoão Pessoa, PB, BrasilDoutoranda, Programa de Pós-Graduação em Modelos de
Decisão e Saúde, Departamento de Estatística, Centro de Ciências Exatas e da Natureza,
Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Cidade Universitária, s/n. João Pessoa, PB,
Brasil. 58051-900. luanaralmeida02@
gmail.com
Ana Tereza Medeiros Cavalcanti da Silva
Departamento de Enfermagem de Saúde Pública e
Psiquiátrica, Centro de Ciências da Saúde, UFPB. João Pessoa, PB, Brasil. anaterezaprof@gmail.com
UFPBBrasilJoão Pessoa, PB, BrasilDepartamento de Enfermagem de Saúde Pública e
Psiquiátrica, Centro de Ciências da Saúde, UFPB. João Pessoa, PB, Brasil. anaterezaprof@gmail.com
Liliane dos Santos Machado
Centro de Informática, UFPB. João Pessoa, PB, Brasil.
liliane@di.ufpb.br
UFPBBrasilJoão Pessoa, PB, BrasilCentro de Informática, UFPB. João Pessoa, PB, Brasil.
liliane@di.ufpb.br
Colaboradores
As autoras Luana Rodrigues de Almeida e Ana Tereza Medeiros Cavalcanti da Silva
participaram, igualmente, da elaboração do artigo, da análise do material empírico, da
sua discussão, redação e da revisão do texto. A autora Liliane dos Santos Machado
participou da revisão bibliográfica, da discussão, redação e revisão do texto.
SCIMAGO INSTITUTIONS RANKINGS
Doutoranda, Programa de Pós-Graduação em Modelos de
Decisão e Saúde, Departamento de Estatística, Centro de Ciências Exatas e da Natureza,
Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Cidade Universitária, s/n. João Pessoa, PB,
Brasil. 58051-900. luanaralmeida02@
gmail.com
Universidade Federal da ParaíbaBrasilJoão Pessoa, PB, BrasilDoutoranda, Programa de Pós-Graduação em Modelos de
Decisão e Saúde, Departamento de Estatística, Centro de Ciências Exatas e da Natureza,
Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Cidade Universitária, s/n. João Pessoa, PB,
Brasil. 58051-900. luanaralmeida02@
gmail.com
Departamento de Enfermagem de Saúde Pública e
Psiquiátrica, Centro de Ciências da Saúde, UFPB. João Pessoa, PB, Brasil. anaterezaprof@gmail.com
UFPBBrasilJoão Pessoa, PB, BrasilDepartamento de Enfermagem de Saúde Pública e
Psiquiátrica, Centro de Ciências da Saúde, UFPB. João Pessoa, PB, Brasil. anaterezaprof@gmail.com
Centro de Informática, UFPB. João Pessoa, PB, Brasil.
liliane@di.ufpb.br
UFPBBrasilJoão Pessoa, PB, BrasilCentro de Informática, UFPB. João Pessoa, PB, Brasil.
liliane@di.ufpb.br