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Sobre anorexias e bulimias: concepções e suposições etiológicas na perspectiva dos profissionais de Saúde

Sobre anorexias y bulimias: concepciones y suposiciones etiológicas en la perspectiva de los profesionales de Salud

Resumos

Anorexias e bulimias são síndromes graves que requerem um manejo cuidadoso. A prática clínica e a literatura mostram, entretanto, que sua abordagem é, muitas vezes, inadequada. Neste estudo, interessou-nos conhecer o discurso dos profissionais de Saúde acerca da caracterização e etiologia desses quadros. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com 13 trabalhadores da rede pública de saúde de um município de Minas Gerais. A partir dos pontos de convergência, divergência e silêncio das falas, localizamos eixos discursivos tais como distorção da imagem corporal, estigma e padrão estético do corpo magro veiculado pela mídia. Chegamos à formação discursiva de todos eles por meio de um diálogo crítico com a literatura médica, psicanalítica e sociológica. Os resultados encontrados apontam para a insuficiência do saber biomédico nesse contexto, indicando a necessidade de diálogos com outras teorias para o alcance de estratégias mais eficazes de abordagem.

Saúde mental; Anorexia; Bulimia; Profissionais da saúde


Anorexias y bulimias son síndromes graves que requieren un manejo cuidadoso. No obstante, la práctica clínica y la literatura muestran que su abordaje es muchas veces inadecuado. En este estudio nos interesó conocer el discurso de los profesionales de salud sobre la caracterización y la etiología de esos cuadros. Se realizaron entrevistas semi-estructuradas con 13 trabajadores de la red pública de salud de un municipio de Minas Gerais. A partir de los puntos de convergencia, divergencia y silencio de los diálogos, localizamos ejes discursivos tales como la distorsión de la imagen corporal, estigma, estándar estético del cuerpo delgado mostrado por los medios. Llegamos a la formación discursiva de todos ellos por medio de un diálogo crítico con la literatura médica, psicoanalítica y sociológica. Los resultados encontrados señalan la insuficiencia del saber biomédico en ese contexto, indicando la necesidad de diálogos con otras teorías para alcanzar estrategias más eficaces de abordaje.

Salud mental; Anorexia; Bulimia; Profesionales de la Salud


Anorexia and bulimia are serious syndromes that require careful management. Clinical practice and literature show, however, that their approach is often inadequate. In this study, we were interested in knowing the discourse of health professionals about the characterization and etiology of these disorders. Semi-structured interviews were conducted with 13 workers from the public health network of a city in Minas Gerais/Brazil. From the points of convergence, divergence and silence of the speech, we locate discursive axes such as distortion of the body image; stigma; the slim body aesthetic pattern conveyed by the media. We came to the discursive formation of all of them through a critical dialogue with medical psychoanalytic and sociological literature. The results point to the insufficiency of biomedical knowledge in this context, indicating the need for dialogues with other theories to reach more effective strategies of approach.

Mental health; Anorexia; Bulimia; Health personnel


Introdução

As anorexias e bulimias nervosas são síndromes descritas entre os transtornos alimentares caracterizadas, de acordo com o Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais V (DSM V)11. American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 5a ed. Porto Alegre: Artmed; 2014., por alterações persistentes no comportamento alimentar associadas a perturbações no modo como o peso ou a forma corporal são vivenciados. São quadros graves que causam prejuízos físicos, psíquicos e sociais, impactando negativamente pacientes, familiares e serviços de saúde22. National Institute for Health and Care Excellence. Eating disorders: recognition and treatment. London: National Guideline Alliance; 2016.,33. Reid M, Williams S, Burr J. Perspectives on eating disorders and service provision: a qualitative study of healthcare professionals. Eur Eat Disord Rev. 2010; 18(5):390-8..

Ainda que, do ponto de vista epidemiológico, as síndromes completas sejam raras na população geral, suas taxas de prevalência entre adolescentes e adultos jovens do sexo feminino são significativas11. American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 5a ed. Porto Alegre: Artmed; 2014.,22. National Institute for Health and Care Excellence. Eating disorders: recognition and treatment. London: National Guideline Alliance; 2016.,44. Smink FR, Van Hoeken D, Hoek HW. Epidemiology of eating disorders: incidence, prevalence and mortality rates. Curr Psychiatry Rep. 2012; 14(4):406-14.

5. Swanson SA, Crow SJ, Le Grange D, Swendsen J, Merinkangas KR. Prevalence and correlates of eating disorders in adolescents. Results from the national comorbidity survey replication adolescent supplement. Arch Gen Psychiatr. 2011; 68(7):714-23.
-66. Val AC, Carvalho MB, Campos RO. Entre o singular e o coletivo: a experiência de um serviço na abordagem das anorexias e bulimias. Physis. 2015; 25(1):99-119.. A anorexia nervosa é a terceira enfermidade crônica mais prevalente na adolescência e, entre todos os quadros psiquiátricos, é o que apresenta maiores taxas de mortalidade. Além disso, sabe-se que sujeitos com esses sintomas apresentam qualidade de vida pior do que aqueles com diagnóstico de esquizofrenia22. National Institute for Health and Care Excellence. Eating disorders: recognition and treatment. London: National Guideline Alliance; 2016.,77. Tirico PP, Stefano SC, Blay SL. Qualidade de vida e transtornos alimentares: uma revisão sistemática. Cad Saude Publica. 2010; 26(3):431-49.

8. Arcelus J, Mitchell AJ, Wales J, Nielsen S. Mortality rates in patients with anorexia nervosa and other eating disorders. A meta-analysis of 36 studies. Arch Gen Psychiatr. 2011; 68(7):724-31.
-99. Simon J, Schmidt U, Pilling S. The health service use and cost of eating disorders. Psychol Med. 2005; 35(11):1543-51..

As manifestações psíquicas e orgânicas desses quadros são delicadas e requerem um manejo cuidadoso dos profissionais da saúde22. National Institute for Health and Care Excellence. Eating disorders: recognition and treatment. London: National Guideline Alliance; 2016.. A prática clínica e a literatura33. Reid M, Williams S, Burr J. Perspectives on eating disorders and service provision: a qualitative study of healthcare professionals. Eur Eat Disord Rev. 2010; 18(5):390-8.,66. Val AC, Carvalho MB, Campos RO. Entre o singular e o coletivo: a experiência de um serviço na abordagem das anorexias e bulimias. Physis. 2015; 25(1):99-119.,1010. Sibeoni J, Orri M, Valentin M, Podlipski M-A, Colin S, Pradere J, et al. Metasynthesis of the views about treatment of anorexia nervosa in adolescents: perspectives of adolescents, parents, and professionals. PLoS One. 2017; 12(1):1-21.

11. Hepworth J. The social construction of anorexia nervosa. London: Sage Publications; 1999.
-1212. Ryan V, Malson H, Clarke S, Anderson G, Kohn M. Discursive constructions of ‘eating disorders nursing’: an analysis of nurses’ accounts of nursing eating disorder patients. Eur Eat Disord Rev. 2006; 14(2):125-35., no entanto, evidenciam que essa abordagem é, muitas vezes, inadequada. De forma geral, os sujeitos resistem a buscar ajuda e, quando o fazem, não se sentem acolhidos, nem aderem aos tratamentos. Já os profissionais indicam que não se sentem instrumentalizados para sustentar um vínculo e desenvolvem relações contratransferenciais negativas, associadas à pressuposição de que esses sujeitos são difíceis de serem abordados. Esse dado é especialmente relevante quando se trata de profissionais da Atenção Primária que, apesar de frequentemente serem os primeiros na rede de saúde a estabelecer contato com esses sujeitos, mostram-se pouco familiarizados com o tema1313. Hepworth N, Paxton SJ. Pathways to help-seeking in bulimia nervosa and binge eating problems: a concept mapping approach. Int J Eat Disord. 2007; 40(6):493-504..

A insuficiência do saber biomédico hegemônico, nesse contexto, torna-se evidente, indicando a necessidade de diálogos com outros referenciais teóricos. Diante disso, o campo da Saúde Coletiva, comprometido com a atuação da Saúde Mental, constitui-se como terreno privilegiado para investigação desses quadros, assim como para a discussão de suas interpretações e abordagens.

Para detalhamento e aprofundamento da complexidade envolvida nos aspectos subjetivos dessas manifestações e de seu cuidado, pesquisas qualitativas anteriores focaram sintomas, experiências dos pacientes e familiares e relação terapêutica. Entretanto, poucos abordaram as construções discursivas dos profissionais de saúde sobre o tema33. Reid M, Williams S, Burr J. Perspectives on eating disorders and service provision: a qualitative study of healthcare professionals. Eur Eat Disord Rev. 2010; 18(5):390-8.,1010. Sibeoni J, Orri M, Valentin M, Podlipski M-A, Colin S, Pradere J, et al. Metasynthesis of the views about treatment of anorexia nervosa in adolescents: perspectives of adolescents, parents, and professionals. PLoS One. 2017; 12(1):1-21.

11. Hepworth J. The social construction of anorexia nervosa. London: Sage Publications; 1999.
-1212. Ryan V, Malson H, Clarke S, Anderson G, Kohn M. Discursive constructions of ‘eating disorders nursing’: an analysis of nurses’ accounts of nursing eating disorder patients. Eur Eat Disord Rev. 2006; 14(2):125-35.,1414. Carvalho MB, Val AC, Ribeiro MMF, Santos LG. Itinerários terapêuticos de sujeitos com sintomas anoréxicos e bulímicos. Cienc Saude Colet. 2016; 21(8):2463-73..

Neste estudo, interessou-nos conhecer como trabalhadores de uma rede de saúde entendem esses quadros, no que diz respeito à sua caracterização e etiologia, circunscrevendo as ideias centrais de seus discursos. Essas informações são relevantes, pois se associam diretamente ao modo como os profissionais dizem reconhecer, acolher e tratar sujeitos com essa sintomatologia. Partindo de um diálogo crítico entre a literatura médico-psiquiátrica, psicanalítica e sociológica, esperamos que este estudo contribua não só para ampliar o debate sobre estratégias de assistência a essa população, mas também para problematizar a extensão do saber psiquiátrico contemporâneo no campo da Saúde Mental.

Percurso metodológico

Trata-se de estudo qualitativo em que foram realizadas entrevistas semiestruturadas, entre junho e dezembro de 2014, com profissionais de saúde de um município da região metropolitana de Belo Horizonte (Minas Gerais). Na época, havia, nessa rede de saúde, vinte equipes de Estratégia de Saúde da Família (ESF) e três Unidades Básicas de apoio; um Centro de Atenção Psicossocial (Caps) II; um Caps Álcool e Drogas; um Centro de Referência da Criança e do Adolescente e um Ambulatório de Saúde Mental. A integração entre as equipes de Atenção Primária e Saúde Mental ocorria por meio de reuniões periódicas para discussão de casos e da presença constante de um profissional da Saúde Mental na ESF que acolhia e matriciava os casos do território.

A seleção dos entrevistados foi intencional: participando das reuniões periódicas, localizamos os profissionais que já haviam atendido sujeitos anoréxicos e/ou bulímicos; explicamos-lhes nossa investigação e, mediante consentimento, agendamos entrevistas nos locais de trabalho. Ao todo, foram entrevistados 13 profissionais, oito de diferentes instâncias da Saúde Mental (quatro psiquiatras, um terapeuta ocupacional e três psicólogos) e cinco dos serviços da Atenção Primária (dois médicos, dois enfermeiros e um técnico de Enfermagem).

Para as entrevistas, elaboramos perguntas-chave, como “O que você entende como anorexias e bulimias?” e “Quais são as suas causas?”. A intenção foi a de circunscrever o campo com o cuidado de não o amarrar demais, deixando o entrevistado livre para se expandir caso quisesse. Gravamos e transcrevemos as entrevistas que, em média, tiveram duração de 45 minutos.

A análise teve como referência a definição de Foucault de que discurso é a “realidade material da coisa pronunciada ou escrita”1515. Foucault M. A ordem do discurso: aula inaugural no Collège de France, pronunciada em 2 de dezembro de 1970. 20a ed. São Paulo: Edições Loyola; 2010. (p. 8). Para examinar o discurso dos profissionais, inspiramo-nos na análise arqueológica do mesmo autor, definida como aquilo que “individualiza e descreve formações discursivas”1616. Foucault M. A arqueologia do saber. 3a ed. Rio de Janeiro: Forense-Universitária; 1987. (p. 130). Indagamos: Como esse discurso se constituiu? Qual foi o seu lugar de aparecimento? É possível determinar um conjunto de enunciados e de práticas que o sustentem? Que regras o determinam? Como Foucault1616. Foucault M. A arqueologia do saber. 3a ed. Rio de Janeiro: Forense-Universitária; 1987., buscamos: "[...] o conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço, que definiram, em uma determinada época e para uma determinada área social, econômica, geográfica ou linguística, as condições de exercício da função enunciativa" (p. 136).

Para organizar o material, procuramos pontos de convergência em torno das concepções e causas das anorexias e bulimias, além de considerarmos divergências e silêncios. Localizamos, assim, alguns temas principais. Estruturamos a análise de modo a sustentar um diálogo crítico entre os referenciais teóricos do campo da Saúde – que, possivelmente, são os principais responsáveis pela constituição e regulação do discurso-objeto que analisamos –, da Psicanálise e das Ciências Sociais. Para a apresentação, dividimos os resultados em dois grandes grupos, destacando, entre aspas, os temas encontrados.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa institucional (CAAE-23492213.1.0000). Os participantes foram designados com um código, o que impossibilita sua identificação e preserva o caráter confidencial das informações (quadro 1).

Quadro 1
Participantes da pesquisa

Resultados e discussão

Mas, afinal, o que são as anorexias e as bulimias?

De forma geral, a maioria dos entrevistados apresentou definições similares às do DSM11. American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 5a ed. Porto Alegre: Artmed; 2014., priorizando uma descrição objetiva dos fenômenos observados que permitem sua categorização como transtornos psiquiátricos preestabelecidos. O foco recaiu nos “comportamentos alimentares”, seja nas práticas de restrição – nas anorexias – ou de ingestão compulsiva de alimentos seguida de vômitos – nas bulimias. Outro elemento enfatizado foi a “distorção da imagem corporal”, conforme observa-se a seguir:

São distúrbios psiquiátricos que interferem na alimentação da pessoa, no comportamento diante da fonte de nutrientes que ela tem. E a forma como ela se enxerga. Maria, por exemplo, é uma paciente extremamente magra que, ainda assim, se vê gorda. [...] Então, é uma forma de alteração a partir de uma percepção que a pessoa tem. (Enf1)

Cumpre destacar que a inclusão discursiva das manifestações anoréxicas e bulímicas no campo psiquiátrico é frequentemente entendida como mera formalização de uma essência que antes era subdiagnosticada ou nomeada de outras formas. No entanto, os procedimentos normalistas que regem a Psiquiatria atualmente parecem contribuir para a reprodução desses quadros na forma como eles se apresentam no contemporâneo. A potência dessas nomeações que se disseminam discursivamente mediante dispositivos médicos, psicológicos, jurídicos, etc. pode ser detectada quando observamos, por exemplo, que as primeiras descrições das anorexias não levavam em conta o desconforto com a imagem1717. Lasègue C. Sobre la anorexia histérica (1873). Rev Asoc Esp Neuropsiquiatr. 2000; 20(74):271-82..

Na tentativa de construir alguma explicação para esse fenômeno da imagem, alguns profissionais tentaram "aproximar esses quadros de outros mais conhecidos":

Eu sempre via a anorexia como alguma coisa mais próxima de um quadro psicótico, partindo muito da distorção da imagem corporal, das vivências do próprio eu, da própria corporalidade. [...] Mas, ao mesmo tempo, um quadro psicótico diferente do esquizofrênico, pois a medicação, pelo menos nos que eu já vi, não tem tanta resposta. (Psiq1)

Esse paralelo entre anorexias e quadros psicóticos não é incomum na literatura1111. Hepworth J. The social construction of anorexia nervosa. London: Sage Publications; 1999.,1818. Steinglass JE, Eisen JL, Attia E, Mayer L, Walsh BT. Is anorexia nervosa a delusional disorder? An assessment of eating beliefs in anorexia nervosa. J Psychiatr Pract. 2007; 13(2):65-71.,1919. Konstantakopoulos G, Varsou E, Dikeos D, Ioannidi N, Gonidakis F, Papadimitriou G, et al. Delusionality of body image beliefs in eating disorders. Psychiatry Res. 2012; 200(2-3):482-8.. Hepworth1111. Hepworth J. The social construction of anorexia nervosa. London: Sage Publications; 1999., em seu trabalho acerca da construção social da anorexia, ressalta que a identificação das causas de condições clínicas é fundamental para que a Medicina possa estabelecer tratamentos adequados. Entretanto, devido à notória dificuldade encontrada para identificação da etiologia dos quadros psiquiátricos, os tratamentos nesse campo são usualmente estabelecidos a posteriori, baseados nas conclusões advindas da observação dos efeitos das medicações ou de outras intervenções. Contudo, na abordagem dos sintomas alimentares, os profissionais deparam-se com um impasse: diferentemente das ideações delirantes das psicoses que podem diminuir com o uso de antipsicóticos, a distorção da imagem corporal resiste a essa intervenção22. National Institute for Health and Care Excellence. Eating disorders: recognition and treatment. London: National Guideline Alliance; 2016..

Outra tentativa de aproximação a quadros mais estabelecidos se encontra na ideia de "comorbidades", ou seja, na possibilidade de que sujeitos apresentem dois ou mais transtornos psiquiátricos simultaneamente11. American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 5a ed. Porto Alegre: Artmed; 2014.,22. National Institute for Health and Care Excellence. Eating disorders: recognition and treatment. London: National Guideline Alliance; 2016.,2020. Nunes MA. Transtornos alimentares e obesidade. Porto Alegre: Artmed; 2006.:

A gente foca muito na identificação de outros transtornos psiquiátricos associados, que é uma prevalência muito grande. [...] A gente busca ter muito critério na identificação desses outros quadros porque têm alguns estudos que mostram que, se uma paciente tem anorexia e depressão, se você tratar a depressão, isso melhora o prognóstico. E o mesmo vale para quadros de ansiedade etc. [...] A gente propõe tratamento sempre que é identificado um quadro comórbido, tratamento medicamentoso. (Psiq3)

Comorbidades não são apenas tentativas de construir explicação a partir de outros quadros mais estabelecidos no campo psiquiátrico. Como a aproximação desses sintomas, habitualmente, ocorre com quadros que apresentam respostas mais consistentes aos tratamentos padronizados – normalmente, à base de medicamentos ou psicoterapias que se prestam à quantificação estatística de seus efeitos –, há possibilidade de se oferecer um tratamento baseado em evidências. Esse fato revela o modus operandi da Psiquiatria contemporânea, que foca sua atuação no diagnóstico e no protocolo de tratamento2121. Aguiar AA. A psiquiatria no divã: entre as ciências da vida e a medicalização da existência. Rio de Janeiro: Relume Dumará; 2004.. Essa fragmentação do sujeito em categorias diagnósticas, entretanto, associa-se à fragilização da representação de si e das próprias necessidades e sentimentos, dificultando o emprego da palavra e a elaboração de uma demanda por ajuda2222. Viganò C. Assunção múltipla de substâncias e comorbidades psiquiátricas. Mental. 2003; 1(1):11-22.. Além disso, conforme comentamos, sintomas anoréxicos e bulímicos não apresentam boa resposta às abordagens protocolares22. National Institute for Health and Care Excellence. Eating disorders: recognition and treatment. London: National Guideline Alliance; 2016., constituindo grande desafio para os profissionais, sobretudo quando se prendem à lógica biomédica.

O "medo de engordar" foi enfatizado nas entrevistas, principalmente para o diagnóstico de anorexia. A prática clínica, entretanto, mostra que esses sujeitos nem sempre revelam esse desconforto. Esse fato contribuiu para que, na quinta edição do DSM, o critério fosse ampliado para incluir não apenas o medo expresso de ganho de peso, mas também a presença de hábitos persistentes que interferem no aumento de peso11. American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 5a ed. Porto Alegre: Artmed; 2014.,2323. Becker AE, Eddy KT, Perloe A. Clarifying criteria for cognitive signs and symptoms for eating disorders in DSM-V. Int J Eat Disord. 2009; 42(7):611-9.. Outro elemento destacado foi o "peso corporal", principalmente para diferenciação entre a anorexia e a bulimia:

[...] essencialmente, o que distingue a anorexia da bulimia é o peso atual [...]. Você pode ter uma paciente bulímica com sintomas purgativos e vai estar com o peso normal ou, eventualmente, até com sobrepeso. A anorexia você pode ter pacientes anoréxicas com sintomas purgativos ou somente com sintomas restritivos, mas, segundo o DSM, o que vai caracterizar o diagnóstico de anorexia é o peso abaixo daquele critério [...]. (Psiq3)

[...] a anorexia é mais relacionada ao emagrecimento. Porque o corpo sempre está gordo, sempre é muito grande... é demais. [...] A bulimia, eu acho que está ligada a essa coisa de comer muito e produzir certa intenção de esvaziamento, né? (Psic1)

De fato, um dos critérios do DSM11. American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 5a ed. Porto Alegre: Artmed; 2014. para diagnóstico de anorexia é a não manutenção de um peso corporal mínimo. Esse manual indica que a determinação do baixo peso deve ser relativizada de acordo com a história de desenvolvimento corporal e ponderal do paciente. Na prática, no entanto, a relativização do que seria um peso adequado para certo sujeito é, na maioria das vezes, ofuscada pelas definições rígidas dos parâmetros ponderais ideais determinados estatisticamente2424. Kraemer FB, Prado SD, Ferreira FR, Carvalho MCVS. O discurso sobre a alimentação saudável como estratégia de biopoder. Physis. 2014; 24(4):1337-60.. Além disso, o diagnóstico diferencial usualmente é complicado: quadros anoréxicos e bulímicos, frequentemente, alternam-se ou sucedem-se, o que significa que encontramos períodos de sintomas anoréxicos na bulimia, momentos de compulsão alimentar e purgação na anorexia e, habitualmente, saída do quadro anoréxico pela via bulímica2525. Eddy KT, Dorer DJ, Franko DL, Tahilani K, Thompson-Brenner H, Herzog DB. Diagnostic crossover in anorexia nervosa and bulimia nervosa: implications for DSM-V. Am J Psychiatry. 2008; 165(2):245-50..

Diante da insuficiência dos critérios dos manuais para fazer essa distinção, alguns entrevistados citaram características norteadoras para a prática clínica. Nesse sentido, a "recusa radical" presente nos sujeitos com sintomas anoréxicos foi destacada. De fato, conforme já demonstrado em outros estudos22. National Institute for Health and Care Excellence. Eating disorders: recognition and treatment. London: National Guideline Alliance; 2016.,66. Val AC, Carvalho MB, Campos RO. Entre o singular e o coletivo: a experiência de um serviço na abordagem das anorexias e bulimias. Physis. 2015; 25(1):99-119.,1010. Sibeoni J, Orri M, Valentin M, Podlipski M-A, Colin S, Pradere J, et al. Metasynthesis of the views about treatment of anorexia nervosa in adolescents: perspectives of adolescents, parents, and professionals. PLoS One. 2017; 12(1):1-21.,1414. Carvalho MB, Val AC, Ribeiro MMF, Santos LG. Itinerários terapêuticos de sujeitos com sintomas anoréxicos e bulímicos. Cienc Saude Colet. 2016; 21(8):2463-73., tanto o estatuto patológico dessas práticas quanto o tratamento são insistentemente recusados.

Na perspectiva psicanalítica, a recusa pode ser entendida como forma de preservação de um espaço singular do sujeito; em última instância, relaciona-se ao desejo. O psicanalista Jacques Lacan2626. Lacan J. O seminário, livro 4: a relação de objeto (1956-1957). Rio de Janeiro: Jorge Zahar; 1995. explicita essa questão ao afirmar que a demanda é uma espécie de falso pedido. Afinal, quando aquilo que o sujeito pede ao Outro é atendido prontamente, a falta deixa de existir e, sem a falta, definitivamente, não há espaço para se continuar desejando. Essa tese evidencia a inadequação do termo “anorexia” – que etimologicamente deriva do grego an, ausência, e orexis, apetite ou desejo –, pois a recusa da satisfação plena da demanda pode, na verdade, ser uma forma de evidenciar uma falta no Outro, preservando assim o desejo do sujeito2626. Lacan J. O seminário, livro 4: a relação de objeto (1956-1957). Rio de Janeiro: Jorge Zahar; 1995.. Essa elaboração está em consonância com a de Lasègue1919. Konstantakopoulos G, Varsou E, Dikeos D, Ioannidi N, Gonidakis F, Papadimitriou G, et al. Delusionality of body image beliefs in eating disorders. Psychiatry Res. 2012; 200(2-3):482-8., um dos primeiros médicos a descrever a anorexia, já alertando que o que está em jogo não é a falta de apetite, mas uma forma de manter certo controle sobre o Outro: "Eu acho que a anorexia é mais severa. É de uma recusa radical. Eu acho que na bulimia existe ainda alguma flexibilidade, quando ingere o alimento e alguma coisa está insuportável e é devolvida" (Psic2).

Vale destacar que essa recusa não se restringe aos alimentos, envolvendo também o Outro simbólico, social e relacional:

Acho difícil conduzir o tratamento dos dois tipos de problema, sabe? Eu penso na anoréxica… a recusa do anoréxico marca muito! Me marca muito! E, aí, a recusa do alimento, sim, mas acho que é a recusa do outro, a recusa da relação, a recusa dessa construção, sabe? Ao passo que, na bulímica, eu não vejo uma recusa tão explícita, mas eu vejo uma coisa mais conturbada. Faz uma relação, mas uma relação, assim, de, às vezes, desqualificar, de romper regra, sabe? (Psiq1)

Essa indicação de que sujeitos com sintomas bulímicos se relacionam com o outro de forma mais problemática parece contribuir para a sedimentação de um imaginário em relação a esses quadros, encontrado não só entre profissionais de saúde, mas também entre pacientes e na sociedade em geral. Estudos corroboram esse fato ao mostrarem diferenças entre as personalidades daqueles que desenvolvem sintomas anoréxicos e daqueles que desenvolvem sintomas bulímicos11. American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 5a ed. Porto Alegre: Artmed; 2014.,22. National Institute for Health and Care Excellence. Eating disorders: recognition and treatment. London: National Guideline Alliance; 2016.. Para além dessas constatações, interessa-nos destacar o discurso relativo a essas manifestações. Tradicionalmente, a anorexia é entendida como um excesso de controle, e a bulimia, como a ausência de controle. Não é incomum no cotidiano da clínica, por exemplo, definir sujeitos bulímicos como “anoréxicos frustrados”. Características associadas à bulimia como impulsividade e comportamentos de risco deliberados (incluindo atuações sexuais e abuso de substâncias) apresentam um valor social negativo11. American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 5a ed. Porto Alegre: Artmed; 2014.,22. National Institute for Health and Care Excellence. Eating disorders: recognition and treatment. London: National Guideline Alliance; 2016.. Esse dado colabora para que "o estigma dos profissionais em relação às bulimias seja maior do que em relação às anorexias"2727. M. Eating like an ox: femininity and dualistic constructions of bulimia and anorexia. Fem Psychol. 2004; 14(2):269-95..

Apesar de serem poucos, alguns entrevistados demonstraram certo distanciamento crítico em relação aos critérios dos manuais psiquiátricos, ressaltando que, nesses quadros, há algo que está além dos sintomas alimentares e do peso em si:

Me parece muito limitado a gente ficar com essa questão do transtorno psiquiátrico e reduzir a um transtorno que seja puramente um conjunto de sintomas para fazer esse diagnóstico. [...] as questões subjetivas e psicoterápicas têm um componente muito extenso e muito variado. [...] Têm sinais mais claros como alterações de peso importantes, mas acho que, fundamentalmente, é uma alteração da relação com a comida e da relação com o ato de comer [...]. (Psiq2)

Entendo que é uma psicopatologia, que não está relacionada, especificamente, ao transtorno da alimentação. É muito maior que isso. (Psic2)

De fato, observa-se que a redução desses quadros aos fenômenos destacados pelos manuais psiquiátricos atuais corrobora uma lógica de tratamento fortemente focada na readequação da alimentação, do peso e da satisfação com a imagem. Esse tipo de abordagem, no entanto, é limitada, uma vez que desconsidera os aspectos subjetivos e singulares do sujeito66. Val AC, Carvalho MB, Campos RO. Entre o singular e o coletivo: a experiência de um serviço na abordagem das anorexias e bulimias. Physis. 2015; 25(1):99-119..

Quais são as causas das anorexias e bulimias?

A discussão etiológica dos quadros psiquiátricos esteve no cerne da Psiquiatria Clássica durante o século XIX. Nessa época, havia uma preocupação com a descrição pormenorizada dos quadros e com o desenvolvimento de teorias explicativas2828. Bercherie P. Os fundamentos da clínica: história e estrutura do saber psiquiátrico. Rio de Janeiro: Jorge Zahar; 1989.. Esse debate, no entanto, perdeu força desde a criação do DSM III, em 1980, que adotou perspectiva supostamente ateórica para descrever e classificar os transtornos mentais. Como o saber psiquiátrico desconhecia a etiologia e o processo de adoecimento psíquico, criou-se uma classificação baseada em fenômenos facilmente observáveis na clínica, que poderiam ser descritos de maneira objetiva. Entretanto, o pressuposto científico contido na pretendida posição ateórica do manual, implicou, na verdade, na adoção de uma visão fisicalista do adoecimento mental. Dessa maneira, pode-se entender esse ateoricismo como a aceitação de uma teoria específica acerca do sofrimento mental, distanciando-se de uma leitura psicológica e trazendo a Psiquiatria para o seio da Medicina2929. Russo JA. Do desvio ao transtorno: a medicalização da sexualidade na nosografia psiquiátrica contemporânea. In: Piscitelli A, Gregori MF, Carrara S. Sexualidade e saberes: convenções e fronteiras. Rio de Janeiro: Garamond; 2004. p. 95-109..

O manual atenderia não só aos interesses dos psiquiatras, que precisavam estabelecer uma delimitação mais precisa da fronteira entre o normal e o patológico e, consequentemente, do campo de ação da Psiquiatria, mas também aos interesses da indústria farmacêutica, que necessitava separar pessoas que deveriam ou não tomar medicamentos. Em 1994, a Associação Psiquiátrica Americana (APA) publicou o DSM IV. Embora esse manual tenha uma continuidade conceitual com o DSM III, sua pretensão ultrapassa a de simplificar a comunicação entre pesquisadores e clínicos da área, incluindo a de ser o suporte educacional para os ensinamentos de psicopatologia2121. Aguiar AA. A psiquiatria no divã: entre as ciências da vida e a medicalização da existência. Rio de Janeiro: Relume Dumará; 2004..

A Psiquiatria atual resulta da tentativa de aproximar o saber psiquiátrico do modelo da Medicina Baseada em Evidências, movimento médico que preconiza utilizar provas científicas existentes e disponíveis no momento, com boa validade interna e externa, para a aplicação de seus resultados na prática clínica. A ênfase recai nos estudos da epidemiologia clínica, excluindo aquilo que não é mensurável, ou seja, sujeitos e suas subjetividades. Essa proposta pretende circunscrever dados, por meio de estudos clínicos controlados, que garantam tratamentos padronizados baseados em evidências científicas3030. Castiel LD, Povoa EC. Medicina baseada em evidências: “novo paradigma assistencial e pedagógico”? Interface (Botucatu). 2002; 6(11):117-21.. Nesse contexto, mais do que discutir possíveis causas do sofrimento psíquico, pressupõe-se que os quadros preestabelecidos existem independentemente do observador. Buscam-se sinais e sintomas correlatos para diagnosticá-los e tratá-los. Apaga-se, assim, qualquer aspecto subjetivo, tanto do profissional quanto do paciente2121. Aguiar AA. A psiquiatria no divã: entre as ciências da vida e a medicalização da existência. Rio de Janeiro: Relume Dumará; 2004.,2222. Viganò C. Assunção múltipla de substâncias e comorbidades psiquiátricas. Mental. 2003; 1(1):11-22.. Nesse sentido, retomar a discussão etiológica pode ter um efeito de ruptura com essa lógica.

Em nossas entrevistas, a maioria dos profissionais entrevistados destacou que a "valorização social do corpo magro fomentada pela mídia" contribui significativamente na gênese desses quadros:

Com certeza [tem relação com o ideal de corpo magro]. Vamos colocar aí em torno de 50-70%, mais ou menos. Com certeza, acho que tem associação. Porque, hoje em dia, o que eu recebo de pacientes querendo anorexígenos, sibutramina ou outros que já saíram de linha... (Med1)

Esse entrevistado destacou que o imperativo de magreza da sociedade contemporânea também se associa à "demanda por medicamentos para emagrecer" nas Unidades Básicas de Saúde (UBS). Segundo dados da Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecentes, o Brasil é um dos maiores consumidores no mundo dessas substâncias. Visando barrar esse crescimento acelerado, em 2010, o governo estabeleceu regras rígidas para a comercialização e consumo de remédios para emagrecimento. A quantidade passou a ser limitada à receita e as doses máximas de cada substância diminuíram3131. Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecentes. Relatório anual 2010. Referências ao Brasil [Internet]. 2011 [citado 5 Jan 2018]. Disponível em: http://www.unodc.org/documents/lpo-brazil/noticias/2011/03-marco/Jife/INCB_References_Brazil_Portuguese.pdf.
http://www.unodc.org/documents/lpo-brazi...
, algo que, conforme destacou o entrevistado, ajuda a negar esse tipo de prescrição.

Muito se comentou sobre a "maior vulnerabilidade das mulheres aos padrões estéticos ditados pela cultura". O lugar social de objeto de desejo exposto ao olhar do outro e as expectativas de perfeição foram alguns dos motivos mencionados:

Essas formulações da mídia em relação à mulher, o que ela tem que ser e como tem que ser, qual é o corpo bonito, qual não é. Acho que tem a ver com um ideal das meninas de serem modelos. Até se a gente for pensar nos brinquedos, na Barbie, nas bonecas, a mulher é sempre colocada em contato com esses ideais, com o que é esperado de uma mulher bonita [...]. A mulher está sempre nesse lugar, de buscar um ideal, de buscar algo para oferecer para o homem. Ela é muito cobrada nesse sentido, de perfeição. [...] O homem não tem essas cobranças todas. (TO)

Bourdieu3232. Bourdieu P. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2003. corrobora essa ideia apontando que a dominação masculina impõe à mulher o lugar de objeto simbólico, incessantemente exposto à objetivação operada pelo olhar e pelo discurso dos outros (não só dos homens). Isso concorre para que elas levem ao limite a experiência do “corpo-para-o-outro”, determinada pelas expectativas masculinas e naturalizadas pela sociedade. Como efeito, a mulher permanece em um constante estado de insegurança com sua imagem e de dependência simbólica em relação aos outros. Não devemos esquecer, no entanto, que os sintomas anoréxicos e bulímicos também podem estar presentes em homens, indicando que a experiência com a imagem ultrapassa as questões relacionadas a gêneros3333. Darcy AM. Eating disorders in adolescent males: a critical examination of five common assumptions. Adolescent Psychiatry. 2011; 1(4):307-12..

Outros profissionais, embora tenham comentado a influência do ideal do corpo magro no desenvolvimento dos sintomas alimentares, questionaram a supervalorização desse elemento por não explicar a etiologia de forma isolada:

Bom, eu acho que isso vai variar individualmente. Mas o que eu postulo seria que aquele indivíduo teria questões pessoais já, predisponentes, que levam ele a crer que a materialização daquela estética vai suprir determinadas necessidades anteriores, internas, dele [...]. Às vezes, existe uma sobrevalorização do papel da mídia. [...] mas acho que há uma sobrevalorização porque é a causa mais facilmente identificável. Se você for pegar o psíquico e o social, eles têm um mesmo peso. (Psiq4)

O tensionamento entre cultura, sociedade e sujeito, que sempre esteve no centro das discussões etiológicas dos quadros psiquiátricos, torna-se ainda mais evidente quando se trata de anorexias e bulimias2020. Nunes MA. Transtornos alimentares e obesidade. Porto Alegre: Artmed; 2006.. Na literatura médica atual, predomina a ideia de que essas manifestações apresentam etiologia multifatorial, ou seja, são determinadas por diversos fatores que interagem de forma complexa em um determinado sujeito11. American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 5a ed. Porto Alegre: Artmed; 2014.,22. National Institute for Health and Care Excellence. Eating disorders: recognition and treatment. London: National Guideline Alliance; 2016.. A ênfase recai, no entanto, mais nos fatores associados a esses quadros a partir de estudos estatísticos do que no nexo causal propriamente dito, distanciando-se da riqueza do debate etiológico da Psiquiatria Clássica. Arnaiz3434. Arnaiz MG, Comelles JM, organizadores. No comerás: narrativas sobre comida, cuerpo y género en el nuevo milenio. Barcelona: Icaria Editorial; 2007. destaca que, atualmente, o reconhecimento do papel dos fatores culturais na gênese dos sintomas alimentares é apenas retórico. A antropóloga comenta que, embora se fale do caráter biopsicossocial dessas manifestações, as pesquisas acabam focando no biológico, conforme criticou um dos entrevistados:

Tem todas as discussões das causas biológicas, né? Das tendências biológicas, dos tipos de personalidade em que é mais comum. Agora, não sei. [...] Eu não costumo ver biologia como muito determinante. Então, podem ter tendências, você tem certa vulnerabilidade para algum tipo de adoecimento, mas eu acho que onde pega mesmo é na história da pessoa. (Psiq1)

Realmente, na literatura médica11. American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 5a ed. Porto Alegre: Artmed; 2014.,22. National Institute for Health and Care Excellence. Eating disorders: recognition and treatment. London: National Guideline Alliance; 2016., os fatores socioculturais são abordados de forma simplificada, reduzidos ao ideal de magreza socialmente valorizado e à dinâmica familiar. A relação complexa entre os fatores sociais, econômicos e políticos é, muitas vezes, esquecida nessas análises. Há tendência a abordar os quadros de maneira individual, desconsiderando articulações da experiência clínica com a complexa interação entre os processos atrelados às desigualdades sociais e de gêneros e às estratégias comerciais das indústrias alimentares e farmacêuticas3434. Arnaiz MG, Comelles JM, organizadores. No comerás: narrativas sobre comida, cuerpo y género en el nuevo milenio. Barcelona: Icaria Editorial; 2007..

Essa estratégia é solidária com a manutenção da lógica da biopolítica, que, conforme já anunciava Foucault3535. Foucault M. Em defesa da sociedade. São Paulo: Martins Fontes; 1999., caracteriza-se por jogos tácitos de poder sustentados por discursos dominantes que, em última instância, visa à gestão dos corpos e da população. Dunker3636. Dunker CIL. Mal-estar, sofrimento e sintoma: uma psicopatologia do Brasil entre muros. São Paulo: Boitempo; 2015. complementa afirmando que a biopolítica atual tende a traduzir como patologias o mal-estar decorrente do desmantelamento dos sistemas de suporte social. Um dos entrevistados retomou essa discussão ao relacionar essas manifestações à "fragilidade das relações na sociedade contemporânea":

Eu acho que [o ideal de corpo magro difundido pela mídia] contribui, mas não isoladamente. Contribui neste contexto onde o significativo mesmo passa batido. [...] A gente dá tanta ênfase nisso que é aparente, nisso que é muito na superfície, que aumenta a possibilidade das pessoas adoecerem dessa forma. Em um contexto em que as relações já são complicadas, já são carentes de afeto. Acho que, mesmo com essa ênfase toda na aparência, se a gente conseguisse construir relações diferentes, não seriam tantas pessoas adoecendo assim. (Psiq1)

Vale destacar que a prática clínica mostra que os sujeitos não adotam esses comportamentos para ficarem parecidos com os padrões propagados pela mídia. Aliás, o que se observa é que eles, definitivamente, não ficam semelhantes aos modelos e estão fora da lógica de compartilhamento de valores socialmente construídos. Do ponto de vista da Psicanálise, o que está em jogo é uma satisfação psíquica autoerótica, que não passa pelo outro e, por isso, rompe com o laço social66. Val AC, Carvalho MB, Campos RO. Entre o singular e o coletivo: a experiência de um serviço na abordagem das anorexias e bulimias. Physis. 2015; 25(1):99-119..

Com efeito, estudos psicanalíticos têm discutido a questão da imagem no contemporâneo. Baseado em dados experimentais da Psicologia Comparada, Lacan3737. Lacan J. O estádio do espelho como formador da função do eu (1949). In: Lacan J. Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar; 1998. p.96-103. distinguiu o momento da constituição do Eu a partir da imagem do próprio corpo vista no espelho. A experiência evidencia que a criança, ainda imatura em relação ao domínio motor e fisiológico, percebe seu corpo como fragmentado; ao se deparar com um espelho, a imagem de seu corpo inteiro lhe causa júbilo, o que não ocorre sem que antes ela busque no olhar do adulto a confirmação desse reflexo; a partir daí, aliena-se nessa imagem completa, o que marca o primeiro momento da constituição do Eu. Escrito de outro modo, o olhar do outro e todas as significações que daí advêm são fundamentais para que o sujeito adentre no código coletivo da linguagem, universo simbólico por excelência que fornece um suporte para a subjetivação da representação da imagem unificada e sua ligação a situações socialmente elaboradas. Esse processo, em última instância, descreve a formação do Ideal do Eu, ou seja, uma identificação simbólica que irá regular a relação do sujeito com seu corpo, com sua imagem e com o Outro social3737. Lacan J. O estádio do espelho como formador da função do eu (1949). In: Lacan J. Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar; 1998. p.96-103..

A deformação da imagem corporal, muitas vezes presente nas anorexias e bulimias atuais, parece relacionar-se justamente com essa matriz simbólica: o Ideal do Eu. No contemporâneo, observamos um enfraquecimento do poder da instância simbólica – tese retomada por alguns autores como liquefação dos vínculos, queda das grandes narrativas, declínio dos ideais, desmantelamento do suporte social, entre outras66. Val AC, Carvalho MB, Campos RO. Entre o singular e o coletivo: a experiência de um serviço na abordagem das anorexias e bulimias. Physis. 2015; 25(1):99-119.,3636. Dunker CIL. Mal-estar, sofrimento e sintoma: uma psicopatologia do Brasil entre muros. São Paulo: Boitempo; 2015.,3838. Eidelberg A. Porciones de nada. La anorexia y la época. Buenos Aires: Del Bucle; 2009.,3939. Bauman Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar; 2001.. Sem o suporte de uma referência simbólica, sem o ponto de vista que Freud encontrou no Ideal do Eu, a imagem vacila. Essa imagem deixa de funcionar como um véu para algo do psiquismo que acaba irrompendo no espelho como um excesso de carne, um excesso não simbolizado. Esse excedente – conhecido na Psicanálise como gozo – angustia os sujeitos com sintomas anoréxicos e bulímicos, que encontram no jejum e nas purgações uma forma de defesa3838. Eidelberg A. Porciones de nada. La anorexia y la época. Buenos Aires: Del Bucle; 2009..

A problemática na constituição da imagem no contemporâneo ganha ressonância na fala de vários profissionais que entendem que o desenvolvimento das anorexias e bulimias está relacionado a traumas decorrentes de ataques à imagem. Esses ataques, habitualmente nomeados "bullying", parecem reforçar o desconforto de uma imagem caracterizada pela fragilidade de seu suporte simbólico.

Em geral, acredito que exista algum trauma, alguma angústia, algum sofrimento que isso trouxe para a pessoa que desencadeia essa mudança de postura, de atitude. Porque, até então, se ela não tem nada para incomodar, para desencadear isso, ela vai continuar vivendo a vida dela gorda, com sobrepeso, obesa, magra, da forma que for. (Enf1)

Em nossas entrevistas, localizamos estratégias parecidas com aquelas apontadas por Hepworth1313. Hepworth N, Paxton SJ. Pathways to help-seeking in bulimia nervosa and binge eating problems: a concept mapping approach. Int J Eat Disord. 2007; 40(6):493-504. em seu estudo com profissionais. A pesquisadora marca que a repetição de termos como “desconhecimento”, “complexidade”, “pode ser” e “multifatorial” funcionam como chaves para justificar a não discussão etiológica de um problema cuja essência é enigmática. Aliás, essa suposta etiologia comum e indeterminada, segundo Dunker3636. Dunker CIL. Mal-estar, sofrimento e sintoma: uma psicopatologia do Brasil entre muros. São Paulo: Boitempo; 2015., é fundamental para disseminação desses sintomas na forma de nomeações rígidas estabelecidas pelo discurso biomédico. Esse tipo de aprisionamento em certa lógica discursiva parece contribuir para algumas respostas sociais, como as normas que tentam regular o peso das modelos, controlar as prescrições de anorexígenos, fiscalizar a ocorrência de bullyings, entre outras66. Val AC, Carvalho MB, Campos RO. Entre o singular e o coletivo: a experiência de um serviço na abordagem das anorexias e bulimias. Physis. 2015; 25(1):99-119.. Nesse contexto, a regulação dos corpos e das vidas sustentada pela biopolítica atual se torna mais evidente.

Considerações finais

Esta investigação permitiu-nos apreender e descrever um discurso sobre anorexias e bulimias: o de profissionais atuantes hoje, na segunda década do século XXI, no serviço público de saúde de um município de Minas Gerais. Buscamos conhecer a formação desse discurso, isto é, as determinações não apenas locais, mas também históricas e sociais que o regulam. Dada a complexidade do tema e a própria opção metodológica do estudo, não se esgotaram as possibilidades de compreensão do objeto em pauta. Mas – acreditamos –, fomentamos discussões e questionamentos para novas investigações sobre essa temática ainda pouco explorada.

Como vimos, apesar da variedade de concepções e suposições etiológicas entre os profissionais, o discurso enunciado por eles reflete ideias oriundas do saber médico-psiquiátrico dominante na contemporaneidade, em particular, o do DSM. Assim, não foi por acaso que a maioria das falas que se destacaram foi as dos psiquiatras. Consideramos, no entanto, importante que novos estudos sejam realizados, de forma a contemplar as especificidades de cada categoria profissional e campo de atuação.

Em relação às concepções, evidenciam-se, no discurso-objeto, para se fazer o diagnóstico, elementos como a presença de alterações autoinduzidas dos comportamentos alimentares, distorção da imagem e variação do peso corporal. A crença de que essas práticas constituem quadros psiquiátricos bem estabelecidos e a tentativa de inscrevê-los nesse campo é patente.

Ao confrontarmos nossa análise com uma vasta literatura sobre o tema, percebemos indicações de que os profissionais de saúde, na prática cotidiana, não buscam compreender essas manifestações, mas enquadrá-las em um grupo homogêneo, tratá-las, medicá-las e sedá-las. Essa observação corrobora a preponderância da lógica biopolítica atual nas práticas de saúde: constrói-se um discurso amarrado e homogêneo sobre o sofrimento, sem deixar espaço para a manifestação das singularidades. Entretanto, essa nomeação excessivamente normativa de um sintoma mostra-se redutiva em relação ao domínio de vivências que ela comprime e generaliza.

Em relação à etiologia, a ideia de que o imperativo do padrão estético de corpo magro esteja na base das práticas anoréxicas e bulímicas prepondera. A partir dessa premissa, outros elementos vão sendo desenvolvidos: o predomínio desses quadros no sexo feminino, a busca incessante por dietas e medicamentos para emagrecer e a nomeação genérica dos bullyings sofridos por aqueles que não se adequam aos ideais. Tais suposições, mais uma vez, desconsideram os sujeitos e seus aspectos singulares, constituindo-se em uma manobra bastante característica da biopolítica atual que visa, em última instância, tentar uma integração discursiva do mal-estar ao sofrimento diagnosticável e tratável.

Esse reconhecimento social, contudo, fundamentalmente exclui o mal-estar contemporâneo decorrente do declínio dos ideais e do excesso de normatizações. Não pretendemos esgotar, com tais argumentos, a diversidade etiológica desses quadros ou propor uma universalização, mas enfatizar a esquiva localizada nos relatos. Eles, na maioria, não sugerem que as manifestações anoréxicas e bulímicas possam estar relacionadas a questões estruturais da essência humana, ou seja, ao desconforto sempre presente no encontro do sujeito com a civilização que, a cada momento, apresenta-se de uma forma. Tampouco fazem referência aos processos de aprisionamento dos sujeitos aos diagnósticos atuais que em nada contribuem para o reconhecimento de conflitos psíquicos singulares.

Como observamos, tais quadros são sempre construídos em torno do status de transtorno psiquiátrico, priorizando critérios diagnósticos em detrimento de causas possíveis. Essa conduta mantém as manifestações ainda mais restritas ao discurso biomédico, deixando outras teorias, como as das Ciências Sociais e a da própria Psicanálise, na periferia e evitando discussões que poderiam contribuir para a abordagem desses sujeitos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Abr 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    01 Jun 2017
  • Aceito
    03 Maio 2018
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