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Análise da Social Netchain em cadeias do agronegócio: aplicação em uma cadeia brasileira de pescado

Analysis of Social Netchain in agribusiness chains: application in a Brazilian chain of fish

Analyse des Social Netchain dans les chaînes agro-industrielles: application dans une chaîne brésilienne de poisons

Análisis de Social Netchain en las cadenas agroindustriales: aplicación en una cadena brasileña de peces

Resumos

Resumo: Este estudo buscou analisar a configuração da Social Netchain da cadeia do pescado do município de Mundo Novo, MS, através da metodologia de análise de redes sociais. Os resultados sugerem que a Social Netchain possui baixos índices de coesão e fragilidade quanto à saída de atores centrais, podendo nesses casos ocasionar o rompimento da rede. Além disso, é possível relacionar os índices de confiança entre os agentes com a posição que ocupa na rede.

Palavras-chave:
Social Netchain; relações sociais; confiança


Abstract: This study aimed to analyze the configuration of the Social Netchain of the chain of fish of the municipality of Mundo Novo, MS, through the methodology of analysis of social networks. The results suggest that the Social Netchain has low coefficients of cohesion and fragility regarding the exit of central actors, in which case the network may be broken. In addition, it is possible to relate trust indexes between agents with the position they occupy in the network.

Keywords:
Social Netchain; social relationships; centrality


Résumé: Cette étude examine la configuration Social Netchain de la chaîne de poissons de la ville de Mundo Novo, MS grâce à la méthodologie d’analyse de réseau social. Les résultats suggèrent que Social Netchain a de faibles niveaux de cohésion et de fragilité que les acteurs clés de sortie, ces cas peuvent provoquer des perturbations du réseau. Par ailleurs, il est possible de relier l’indice de confiance des agents à la position dans le réseau.

Mots-clés:
Social Netchain; relations sociales; confiance


Resumen: Este estudio investiga la configuración Social Netchain de la cadena de peces de la ciudad de Mundo Novo, MS a través de la metodología de análisis de redes sociales. Los resultados sugieren que Social Netchain tiene bajos niveles de cohesión y la fragilidad como los jugadores clave de salida, estos casos pueden causar perturbaciones de la red. Además, es posible relacionar el índice de confianza de los agentes con la posición en la red.

Palabras clave:
Social Netchain; las relaciones sociales; la confianza


1 INTRODUÇÃO

As estruturas organizacionais têm apresentado mudanças no decorrer dos anos, na economia como um todo, evidenciados principalmente nas estruturas analíticas das cadeias produtivas. No agronegócio, os pioneiros na abordagem de estruturas analíticas foram Davis e Goldberg (1957)DAVIS, J. H.; GOLDBERG, R. A. A concept of agribusiness. Boston: Division of Research, Graduate School of Business Administration, Harvard University, 1957. 136p., que incluíram o termo agribusiness como estrutura analítica sistêmica.

As abordagens conceituais de análise evoluíram ao longo do tempo, passando pelos conceitos de Commodity System Approach (CSA) (GOLDBERG, 1968GOLDBERG, R. A. Agribusiness coordination: a systems approach to the wheat, soybean, and Florida orange economies. Boston: Division of Research. Graduate School os Business Administration, Harvard University, 1968. 256p.; ZYLBERSTAJN, 2000ZYLBERSZTAJN, D. Conceitos gerais, evolução e apresentação do sistema agroindustrial. In: ZYLBERSZTAJN, D.; NEVES, M. F. (Ed.). Economia e gestão dos negócios agroalimentares. 1. ed. São Paulo: Pioneira; Thomson Learning, 2000.), conceito de filière (LABONNE, 1985LABONNE, M. Sur le concept de filiere en economie agro-alimentaire. In: REUNIÃO MSA-CEGET, 13-14 de junho de 1985. Anais... Montpellier: Institut National de la Recherche Agronomique, 1985.; GRAZIANO DA SILVA, 1996GRAZIANO DA SILVA, J. F. A nova dinâmica da agricultura brasileira. 2. ed. Campinas, SP: Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas, 1996.; ZYLBERSTAJN, 2000ZYLBERSZTAJN, D. Conceitos gerais, evolução e apresentação do sistema agroindustrial. In: ZYLBERSZTAJN, D.; NEVES, M. F. (Ed.). Economia e gestão dos negócios agroalimentares. 1. ed. São Paulo: Pioneira; Thomson Learning, 2000.; TALAMINI; PEDROZO, 2004TALAMINI, E.; PEDROZO, E. A. Matriz de Insumo-Produto (MIP) de uma propriedade rural derivada do estudo de filiere. Teoria e evidencia econômica, Passo Fundo, RS, v. 12, p. 77-103, 2004.; MORVAN, 1991MORVAN, Y. Fondements d’ economie industrielle. Paris: Economica, 1991. 639p.), conceito de sistema agroindustrial (BATALHA, 2008BATALHA, M. O. Sistemas agroindustriais: definições e correntes metodológicas. In: ______ (Coord.). Gestão agroindustrial. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2008. v. 1, p. 23-48.), conceito de Supply Chain Management (SCM) (BOWERSOX; CLOSS, 1996BOWERSOX, D. J.; CLOSS, D. J. Logistical management: the integrated supply chain process. Singapura: McGraw-Hill Companies, 1996.; LAMBERT; COOPER, 2000LAMBERT, D. M.; COOPER, M. C. Issues in Supply Chain Management.Industrial Marketing Management, New York, v. 29, p. 65-83, 2000.), conceito de redes (BATALHA, 2008BATALHA, M. O. Sistemas agroindustriais: definições e correntes metodológicas. In: ______ (Coord.). Gestão agroindustrial. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2008. v. 1, p. 23-48.; 2001; CORREA, 2005), e por fim o conceito de netchain (LAZZARINI; CHADDAD; COOK, 2001LAZZARINI, S. G.; CHADDAD, F. R.; COOK, M. L. Integrating supply chain and network analyses: the study of netchains. Journal on Chain and Network Science, Wageningen, v. 1, n. 1, p. 7-22, 2001.; HOFSTEDE, 2004HOFSTEDE, G. J. Culture, globalizations and netchains. Chain Management Conference, maio 2004.).

Essas estruturas analíticas apresentaram evoluções em suas abordagens, com o objetivo de suprir as constantes alterações do ambiente econômico, bem como analisar as complexidades que foram surgindo no agronegócio ao longo dos anos. Contudo tais estruturas mantinham o foco de análise nas empresas ou organizações e nas suas relações comerciais, baseadas em produtos específicos. Porém cabe mencionar que as complexidades do sistema do agronegócio têm colocado em evidência a necessidade de incluir os atores sociais e suas interações para melhor compreensão das relações ao longo da cadeia.

No campo teórico, a abordagem da análise das relações sociais surgiu junto com o conceito de redes sociais, através de temas relacionados a capital social, território e sobre a ideia de enraizamento (embeddedness) de Granovetter (1985)______. Economic action and social structure: the problem of embeddedness. The American Journal of Sociology, v. 91, n. 3, p. 481-510, 1985.. Com a intenção de juntar os conceitos de redes e os conceitos de confiança e de relações sociais, adotados pela Nova Sociologia Econômica (NSE), Talamini e Ferreira (2010)TALAMINI, E.; FERREIRA, G. M. V. Merging netchain and social network: introducing the ‘social netchain’ concept as an analytical framework in the agribusiness sector. African Journal of Business Management, v. 4, n. 13, p. 2981-93, 2010. mesclaram os conceitos de netchain com os conceitos de redes sociais para propor uma estrutura de análise denominada Social Netchain.

O conceito de Social Netchain mescla duas fontes teóricas distintas. A primeira relacionada às estruturas analíticas do agronegócio, e a segunda relacionada à teoria proposta pela NSE, de que as relações entre empresas são, em essência, o conjunto de relações pessoais entre os indivíduos que compõem cada elo da cadeia (GRANOVETTER, 1973______. The Strength of Weal Ties. American Journal of Sociology, v. 78, n. 6, p. 1360-80, 1973.; 1985______. Economic action and social structure: the problem of embeddedness. The American Journal of Sociology, v. 91, n. 3, p. 481-510, 1985.; 1992GRANOVETTER, M. Economic Institutions as Social Constructions: a framework for analysis. Acta Sociologica, v. 35, p. 3-11. 1992.; UZZI, 1997UZZI, B. Social structure and competition in interfirm networks: the paradox of embeddedness. Administrative Science Quarterly: Cornell University, ABI/INFORM Global, n. 42, p. 35-67, 1997.; RAUD-MATTEDI, 2005RAUD-MATTEDI, C. H. J. Análise crítica da Sociologia Econômica de Mark Granovetter: os limites de uma leitura do mercadoem termos de redes e imbricação. Politica & Sociedade - Revista de Sociologia Politica, Florianópolis, n. 6, p. 59-82, abr. 2005.).

Considerando que Talamini e Ferreria (2010)TALAMINI, E.; FERREIRA, G. M. V. Merging netchain and social network: introducing the ‘social netchain’ concept as an analytical framework in the agribusiness sector. African Journal of Business Management, v. 4, n. 13, p. 2981-93, 2010. apresentaram a proposição do estudo de uma cadeia produtiva a partir da Social Netchain, contudo não foi realizada uma aplicação empírica que demonstre a aplicabilidade prática dessa estrutura analítica. Neste estudo, propõe-se uma análise de uma cadeia de produção-consumo agroindustrial, utilizando a abordagem de Social Netchain. O estudo será aplicado em uma cadeia do pescado no Município de Mundo Novo, MS.

Para a análise da referida cadeia, a metodologia de análise de redes sociais é proposta como uma boa alternativa para a análise em conformidade com os conceitos de Social Netchain e relações sociais. A metodologia de análise de redes sociais se propõe a analisar as estruturas sociais, focando-se na conexão dos membros, na troca de recursos entre eles e nos fatores que envolvem as relações.

2 ESTRUTURAS DE ANÁLISE DOS SISTEMAS DO AGRONEGÓCIO

A partir da proposição de Davis e Goldberg (1957)DAVIS, J. H.; GOLDBERG, R. A. A concept of agribusiness. Boston: Division of Research, Graduate School of Business Administration, Harvard University, 1957. 136p., que afirmavam que não era mais possível analisar a economia nos moldes tradicionais, com setores isolados que fabricavam insumos, processavam os produtos e os comercializavam, surgiu o agribusiness com visão sistêmica, que vai desde o produtor rural até o consumidor final. Nesse contexto, o agribusiness consiste na soma das operações de produção e distribuição de suprimentos agrícolas, das operações de produção nas unidades agrícolas, do armazenamento, processamento e distribuição dos produtos agrícolas e itens produzidos a partir deles (DAVIS; GOLDBERG, 1957DAVIS, J. H.; GOLDBERG, R. A. A concept of agribusiness. Boston: Division of Research, Graduate School of Business Administration, Harvard University, 1957. 136p.).

Segundo Graziano da Silva (1996)GRAZIANO DA SILVA, J. F. A nova dinâmica da agricultura brasileira. 2. ed. Campinas, SP: Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas, 1996., da definição de agribusiness, proposta por Davis e Goldberg, derivaram-se vários outros conceitos para explicar sempre o mesmo fenômeno, a crescente inter-relação setorial entre agricultura, indústria e serviços. Entre esses conceitos e frameworks, pode-se citar o Commodity System Approach (CSA) e o conceito de Filière.

O conceito de CSA foi inicialmente adotado por Goldberg (1968)GOLDBERG, R. A. Agribusiness coordination: a systems approach to the wheat, soybean, and Florida orange economies. Boston: Division of Research. Graduate School os Business Administration, Harvard University, 1968. 256p. ao analisar os sistemas do trigo, da soja e da laranja nos Estados Unidos, sob a perspectiva de produção sistêmica, de acordo com o conceito de agribusiness. O autor abordou assuntos como as intervenções institucionais no processo de coordenação da cadeia, como as políticas governamentais, os mercados futuros e as associações.

Seguindo a evolução conceitual das estruturas de análise do agronegócio, surgiu, na escola francesa, o conceito de filière, que traduziu o termo agribusiness, criado por Davis e Goldberg, e definiu quatro setores presentes nos sistemas agroalimentares: montante, agropecuário, indústrias de transformação e jusante. Malassis definiu como filière agroalimentar a análise dos fluxos e encadeamentos por produto dentro de cada um desses setores, abrangendo os sistemas de produção-transformação-distribuição e os encadeamentos gerados por eles (LABONNE, 1985LABONNE, M. Sur le concept de filiere en economie agro-alimentaire. In: REUNIÃO MSA-CEGET, 13-14 de junho de 1985. Anais... Montpellier: Institut National de la Recherche Agronomique, 1985.; GRAZIANO DA SILVA, 1996GRAZIANO DA SILVA, J. F. A nova dinâmica da agricultura brasileira. 2. ed. Campinas, SP: Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas, 1996.).

Batalha (2008)BATALHA, M. O. Sistemas agroindustriais: definições e correntes metodológicas. In: ______ (Coord.). Gestão agroindustrial. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2008. v. 1, p. 23-48. afirma que o sucesso de uma cadeia de produção está diretamente relacionado aos resultados obtidos junto com todos os elos e agentes da cadeia. A visão tradicional de que as organizações são todas concorrentes e devem agir isoladamente está perdendo espaço para um pensamento mais cooperativo entre todos os componentes dos elos, com o objetivo de desenvolvimento integrado de toda a cadeia. Em conformidade com essa posição, utilizou-se o conceito de Supply Chain Management (SCM) ou gestão da cadeia de suprimentos. De acordo com Breitenbach, Brandão e Zorzan (2017)BREITENBACH, R.; BRANDÃO, J. B.; ZORZAN, M. Vantagens e oportunismo no relacionamento entre associados e cooperativa de laticínios. Interações, Campo Grande, MS, v. 18, n. 2, abr./jun. 2017., na gestão da cadeia de suprimentos deve haver sintonia entre o fluxo de informações e a coordenação ao longo de toda cadeia, com a finalidade de proporcionar esse desenvolvimento integrado.

Ao considerar a SCM como ferramenta adequada para oportunizar a captura de integrações intra e entre empresas, é possível associá-la ao conceito de redes (networks). Lazzarini, Chaddad e Cook (2001)LAZZARINI, S. G.; CHADDAD, F. R.; COOK, M. L. Integrating supply chain and network analyses: the study of netchains. Journal on Chain and Network Science, Wageningen, v. 1, n. 1, p. 7-22, 2001. integraram os dois conceitos, propondo o conceito de netchain. A netchain é definida pelos autores como um conjunto de redes formadas por laços horizontais entre firmas que estão sequencialmente arranjados com base nos laços verticais em diferentes camadas. A natureza social da netchain foi abordada por Talamini e Ferreira (2010)TALAMINI, E.; FERREIRA, G. M. V. Merging netchain and social network: introducing the ‘social netchain’ concept as an analytical framework in the agribusiness sector. African Journal of Business Management, v. 4, n. 13, p. 2981-93, 2010., ao propor o conceito de Social Netchain, que surge a partir da fusão dos conceitos de netchain e redes sociais. O conceito de Social Netchain é definido por Talamini e Ferreira (2010)TALAMINI, E.; FERREIRA, G. M. V. Merging netchain and social network: introducing the ‘social netchain’ concept as an analytical framework in the agribusiness sector. African Journal of Business Management, v. 4, n. 13, p. 2981-93, 2010. como um conjunto de redes de relações interpessoais, formado por laços horizontais entre os indivíduos de firmas ou organizações dentro de um setor particular, os quais são sequencialmente arranjados com base nos laços verticais entre indivíduos em diferentes camadas da referida estrutura.

O referido conceito se pauta na abordagem das relações sociais e da confiança como mecanismo regulador das relações no mercado, que surgiu com as obras de Mark Granovetter e a corrente teórica da NSE. Pelo ponto de vista de Granovetter, a NSE teria como foco principal dar respostas às questões não respondidas pela Teoria Econômica, através do argumento de que as atividades econômicas se enraízam em redes pessoais, e que essas redes pessoais formam também redes de empresas (RAUD-MATTEDI, 2005RAUD-MATTEDI, C. H. J. Análise crítica da Sociologia Econômica de Mark Granovetter: os limites de uma leitura do mercadoem termos de redes e imbricação. Politica & Sociedade - Revista de Sociologia Politica, Florianópolis, n. 6, p. 59-82, abr. 2005.). Pigatto, Queiroz e Lourenzani (2015)PIGATTO, G. A. S.; QUEIROZ, T. R.; LOURENZANI, A. E. B. S. Redes sociais de produtores de mandioca em regiões do estado de São Paulo. Interações, Campo Grande, MS, v. 16, n. 1, p. 75-86, 2015. destacam a importância das interações sociais ao mencionar que estas afetam o comportamento econômico dos agentes e, portanto, devem ser consideradas nas análises econômicas.

Devido ao foco nas relações entre os indivíduos, a característica principal da estrutura analítica proposta por Talamini e Ferreira (2010)TALAMINI, E.; FERREIRA, G. M. V. Merging netchain and social network: introducing the ‘social netchain’ concept as an analytical framework in the agribusiness sector. African Journal of Business Management, v. 4, n. 13, p. 2981-93, 2010. é a identificação da posição dos indivíduos na Social Netchain e o conjunto de relações interpessoais que cada um apresenta e com quem essas relações ocorrem.

3 METODOLOGIA

Este estudo foi conduzido no município de Mundo Novo, localizado ao sul de Mato Grosso do Sul. A região possui um grupo de piscicultores, que desempenham posição de destaque no estado, organizados em forma de cooperativa, a Cooperativa de Piscicultores de Mundo Novo (COOPISC).

A coleta dos dados se deu inicialmente pela busca documental com a finalidade de identificação da estrutura da cadeia produtiva e os principais elos ou segmentos que compõem a cadeia. Após o delineamento da cadeia do pescado, foram realizadas entrevistas estruturadas com 37 indivíduos que compõem os diversos segmentos ou elos da cadeia produtiva. A coleta de dados e informações tem por objetivo identificar os indivíduos e suas relações e, também, informações relacionadas aos aspectos da confiança percebida entre eles. Alguns agentes envolvidos no estudo se encontram em outros estados, impossibilitando a coleta de dados pessoalmente, em tempo hábil, portanto o contato foi realizado através de e-mails ou telefone. Optou-se por não abranger o mercado consumidor na pesquisa, devido à dispersão e dificuldade de acesso aos consumidores finais.

Após a coleta, os dados foram analisados, inicialmente através da análise das redes de relações formadas entre os elos, com a utilização do software de análise de redes sociais, ORA v.2.3.6 (Organizational Risk Analyzer). A partir dos dados e informações coletadas no campo, foi estruturada a sócio matriz da Social Netchain da cadeia produtiva do pescado, com a indicação da presença ou não de relações entre os indivíduos e atribuindo valores para a mensuração da intensidade dessas relações. Em seguida, foi realizado o cálculo dos indicadores de análise de redes sociais, como densidade, centralidade, intermediação, poder e prestígio de cada indivíduo da Social Netchain da cadeia do pescado.

Para a análise da densidade da rede, é utilizado o conceito e fórmula de cálculo proposta por Wasserman e Faust (1994)WASSERMAN, S; FAUST. K. Social Network Analysis: methods and applications. Cambridge: Cambridge University Press, 1994., conforme segue:

D = 2 * L t N * N 1

Onde: N é o número de nós da rede analisada, sendo N >1; Lt é o número total de ligações entre os nós.

Na análise posicional dos agentes, utilizam-se as variáveis de centralidade, sendo as mais utilizadas as de centralidade de grau, intermediação e proximidade, e as duas variáveis menos comuns, a centralidade de informação (LAGO JUNIOR, 2005LAGO JÚNIOR, M. W. Redes sociais informais intraorganizacionais e os processos e mudanças organizacionais: estudo em uma empresa de tecnologia da informação. 2005. 250f. Dissertação (Mestrado em Administração) - Universidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador, BA, 2005.; TOMAÉL; MARTELETO, 2006TOMAÉL, M. I., MARTELETO, R. M. Redes Sociais: posições dos atores no fluxo da informação. Encontros Bibli - Revista Eletrônica de Biblioteconomia e Ciências da Informação, Florianópolis, n. esp., 2006.; STEPHENSON; ZELEN, 1989STEPHENSON, K.; ZELEN, M. Rethinking centrality: methods and examples. Social Networks, v. 11, n. 1, p. 1-37, mar. 1989.) e a centralidade de Bonacich (HANNEMAN; RIDDLE, 2005HANNEMAN, R. A; RIDDLE, M. Introduction to social network methods. Riverside: University of California, 2005.; CARSTENS, 2005CARSTENS, D. D. S. Estrutura de Relacionamentos Interorganizacionais e estratégias das empresas da rede Hiperfarma. 2005. 249f. Dissertação (Mestrado em Administração) - Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, 2005.; BONACICH, 1987BONACICH, P. Power and centrality: a family of measures. American Journal of Sociology, v. 92, p. 1170-82, mar. 1987.).

Para o cálculo da centralidade de grau entre dois nós, Wasserman e Faust (1994)WASSERMAN, S; FAUST. K. Social Network Analysis: methods and applications. Cambridge: Cambridge University Press, 1994. apresentam a seguinte fórmula:

C i = j = 1 N L ij N 1

Onde: N = Número de nós da rede analisada; Lij = 1 se existe uma ligação entre os nós i e j, e Lij = 0 caso não existe tal ligação.

Para o cálculo da centralidade de intermediação, Wasserman e Faust (1994)WASSERMAN, S; FAUST. K. Social Network Analysis: methods and applications. Cambridge: Cambridge University Press, 1994. apresentam a seguinte fórmula:

b ij V k = g ij k g ij

Onde:gijk = Número de caminhos geodésicos entre vi e vj que passam por vk; gij = Número total de caminhos geodésicos entre vi e vj.

O cálculo da centralidade de proximidade, de acordo com o conceito de Carstens (2005, p. 151)CARSTENS, D. D. S. Estrutura de Relacionamentos Interorganizacionais e estratégias das empresas da rede Hiperfarma. 2005. 249f. Dissertação (Mestrado em Administração) - Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, 2005., “pode ser calculada pelo levantamento do número mínimo de ligações que um ator deve percorrer para entrar em contato com qualquer outro membro da rede”. De acordo com Wasserman e Faust (1994)WASSERMAN, S; FAUST. K. Social Network Analysis: methods and applications. Cambridge: Cambridge University Press, 1994., a centralidade de proximidade é calculada pela seguinte fórmula:

Cc p k 1 = i = 1 n d p i , p k

Onde:dpi,pk = representa a distância entre os nóspi,pk;Σi=1n somatório das distâncias de todos os nós entre i e k.

O cálculo das variáveis de centralidade proposto por Wasserman e Faust (1994)WASSERMAN, S; FAUST. K. Social Network Analysis: methods and applications. Cambridge: Cambridge University Press, 1994. segue as abordagens geral da rede e a abordagem centrada em egos, propostas pelos autores Scott (2000)SCOTT, J. Social network analysis: a handbook. 2. ed. London: Sage Publications, 2000. 208 p., Scott (2001)SCOTT, W. R. Institutions and organizations. 2. ed. London: Sage Publications, 2001., Lago Júnior (2005)HANNEMAN, R. A; RIDDLE, M. Introduction to social network methods. Riverside: University of California, 2005., Wasserman e Faust (1994)WASSERMAN, S; FAUST. K. Social Network Analysis: methods and applications. Cambridge: Cambridge University Press, 1994., Hanneman (2001)HANNEMAN, R. A. Introduction to social network methods. Riverside: University of California, 2001., Carstens (2005)CARSTENS, D. D. S. Estrutura de Relacionamentos Interorganizacionais e estratégias das empresas da rede Hiperfarma. 2005. 249f. Dissertação (Mestrado em Administração) - Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, 2005., Hanneman e Riddle (2005)HANNEMAN, R. A; RIDDLE, M. Introduction to social network methods. Riverside: University of California, 2005. e Freeman (1979)FREEMAN, L. C. Centrality in social networks: conceptual clarification. Social networks, v. 1, n. 3, p. 215-39, 1979..

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES

Com base na análise documental e informações de instituições de apoio, foi elaborado o delineamento da cadeia produtiva do pescado de Mundo Novo. Na Figura 1, são apresentados os elos da cadeia produtiva do pescado de Mundo Novo e as relações entre eles.

Figura 1
Relações sociais na cadeia do pescado de Mundo Novo

As relações comerciais entre os elos ocorrem em sua maioria, através de contratos informais, em que prezam a confiança nas transações ou alguns procedimentos de segurança, como o pagamento antecipado em caso de venda, ou pagamento no ato da compra. Visualiza-se, na Figura 1, que um determinado agente ou elo possui relações comerciais com outros elos distribuídos ao longo da cadeia, como é o caso da indústria de ração, que abastece os elos de produção de alevinos, engorda e pesque-pague.

Com base nas relações entre os elos e as relações indicadas nas entrevistas, foi construída a rede de relações sociais entre os indivíduos que compõem a cadeia produtiva como um todo, demonstrando a Social Netchain da cadeia do pescado de Mundo Novo. A Figura 2, a seguir, apresenta o sociograma das relações sociais da cadeia do pescado de Mundo Novo, a partir dos resultados obtidos no estudo.

Figura 2
Social Netchain da cadeia do pescado de Mundo Novo

Conforme pode ser visualizado na Figura 2, a cadeia é formada por 10 classificações de elos, relacionadas à atividade desempenhada. A Social Netchain é formada por 42 indivíduos, sendo 12 produtores, 3 representantes de supermercados, 3 de restaurantes, 9 representantes de pesqueiros, 2 de fornecedores de embalagens, 4 fornecedores de rações, 2 de peixarias, 5 fornecedores de alevinos, 1 da assistência técnica e 1 representante da indústria.

A Tabela 1 apresenta as principais variáveis para a análise da rede de forma geral, através dos aspectos estruturais, relacionais e posicionais.

Tabela 1
Medidas de análise estrutural e relacional da Social Netchain

O número de ligações ou tamanho da rede consiste no total de relações efetivas em um grupo de indivíduos. Conforme mencionado anteriormente e de acordo com a Tabela 1, a Social Netchain do pescado é formada por 42 indivíduos. O número de ligações reflete o perfil da rede, visto que, do total de ligações possíveis, estão sendo efetivadas 212 ligações, com uma média de 5 ligações por indivíduo.

Com base nas quantidades de ligações existentes e nas ligações potenciais, é calculada a densidade da rede formadora da Social Netchain. A densidade de uma rede é obtida através da divisão do número de laços existentes pelo número total de possíveis laços. A rede da COOPISC possui uma densidade baixa, com um percentual de 12% das ligações possíveis, indicando que cada associado individualmente possui laços com uma minoria dos membros da rede. A baixa densidade da Social Netchain, relacionada ao fator comunicação entre os agentes, pode causar a dependência da rede em alguns agentes, visto que os agentes que possuem maior número de ligações são de extrema importância para a transmissão de informações na rede. No entanto, se retirá-los do fluxo de informações, pode ocasionar a quebra da rede ou a dificuldade na transmissão de informações.

A variável reciprocidade está associada às escolhas feitas par a par, ou seja, as relações entre dois agentes são mútuas. De acordo com o conceito proposto por Radomsky e Schneider (2007)RADOMSKY, G.; SCHNEIDER, S. Nas teias da economia: o papel das redes sociais e da reciprocidade nos processos locais de desenvolvimento. Revista Sociedade e Estado, Brasília, v. 22, n. 2, p. 249-84, maio/ago. 2007., a reciprocidade pode sedimentar as relações sociais, pois vincula os sujeitos por meio de suas condutas, ou seja, das obrigações morais e da liberdade do agir recíproco. Na Social Netchain do pescado o índice de reciprocidade é de 39,7%, ou seja, as relações são pouco recíprocas e, portanto, tendem a ser menos efetivas.

O coeficiente de agrupamento, junto com a variável média de cliques por membro, permite a análise da rede em aspecto relacional e, associado aos índices de densidade e reciprocidade da rede, demonstra a coesão da rede de relações. O coeficiente de agrupamento da Social Netchain é de 30,8%, ou seja, em uma escala de 0 a 100, o agrupamento do grupo é de 30,8. Considerando que o coeficiente de agrupamento expressa a probabilidade de dois vértices que estão conectados, possuírem uma conexão em comum com um terceiro vértice, é possível afirmar que a ocorrência dessa conexão comum é baixa, com uma média de apenas 30,8% dos casos. Ao analisar a variável de média de cliques por membro, verifica-se que a rede possui uma média de 2,857 cliques por membro. Os cliques são as denominadas panelinhas e representam o número médio de relações de um membro.

Com base nos dados de densidade, reciprocidade, coeficiente de agrupamento e cliques, é possível analisar a coesão da Social Netchain. A coesão possui uma natureza cognitiva e pode ser verificada através do grupo de relações que compõem a rede, por meio de relações homogêneas e recíprocas. Visualiza-se que a rede é pouco coesa, visto que todas as variáveis em questão apresentam índices bem baixos em relação à rede. Na Figura 2, é possível visualizar que a rede é formada por grupos mais coesos, com maior interação entre eles, contudo a rede possui diversos agentes isolados que possuem contato com apenas um ou dois agentes. A baixa coesão da rede pode causar a quebra da rede ou influenciar negativamente na transferência e compartilhamento de informações entre os agentes da cadeia. Os grupos mais coesos geralmente estão localizados próximos dos agentes mais centrais da rede, portanto a coesão de determinado grupo está relacionada à posição dos agentes que o compõem.

Para a análise do aspecto posicional da Social Netchain, serão consideradas as variáveis de centralidade, inicialmente pela abordagem da rede geral e posteriormente pela análise centrada em egos, com foco nos indivíduos, através das medidas de centralidade. Seguindo o conceito de Wasserman e Faust (1994)WASSERMAN, S; FAUST. K. Social Network Analysis: methods and applications. Cambridge: Cambridge University Press, 1994., verifica-se que a média de entradas e saídas de ligações na rede é bastante baixa, visto que a centralidade de grau da rede é de 22,7%.

A baixa centralidade da rede está associada aos baixos índices nas variáveis de densidade, reciprocidade e coeficiente de agrupamento. Uma rede com baixo aproveitamento das ligações potenciais tende a possuir menos relações de entrada e saída entre os agentes, diminuindo assim os índices de centralidade da rede. O índice de centralidade de grau demonstra, junto com as demais variáveis, a falta de coesão da rede, pois as relações são reduzidas em relação às possibilidades, indicando um baixo índice médio de centralidade de grau.

A centralidade de intermediação é conceituada por Lago Junior (2005)LAGO JÚNIOR, M. W. Redes sociais informais intraorganizacionais e os processos e mudanças organizacionais: estudo em uma empresa de tecnologia da informação. 2005. 250f. Dissertação (Mestrado em Administração) - Universidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador, BA, 2005. como a variável que avalia o potencial dos elos que servem de intermediários ou ponte na rede, sendo que estes são considerados facilitadores do fluxo da informação entre os elos da rede. Seguindo o conceito apresentado, quanto maior a centralidade de intermediação de uma rede, maior a possibilidade de que todos tenham acesso a informação, por intermédio de outros agentes. Na Social Netchain a centralidade de intermediação da rede é de 0,197%, ou seja, do total de relações existentes na rede, apenas 19,7% desempenham papel de intermediação entre dois agentes. A baixa intermediação na rede pode causar a quebra no fluxo das informações, impedindo o acesso de alguns agentes à informação. Além disso, pode proporcionar poderes superiores aos detentores das posições de intermediários na rede, pois estes têm o poder de decidir se compartilham e como transferem a informação.

A variável centralidade de proximidade foi conceituada por Carstens (2005)CARSTENS, D. D. S. Estrutura de Relacionamentos Interorganizacionais e estratégias das empresas da rede Hiperfarma. 2005. 249f. Dissertação (Mestrado em Administração) - Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, 2005. como a medida calculada pelo levantamento do número mínimo de ligações que um agente deve percorrer, para entrar em contato com qualquer outro membro da rede. Na Social Netchain, de acordo com a Tabela 1, a centralidade de proximidade da rede é de 38,1%, ou seja, para que um agente atinja todos os demais agentes da rede, é necessário que ele atravesse aproximadamente 38% das ligações da rede. No caso da centralidade de proximidade, quanto maior o índice obtido, maior é a dependência dos agentes aos demais, visto que, para atingir todos os agentes, o caminho é mais longo e mais demorado.

Os índices de centralidade de grau, proximidade e intermediação da rede são calculados com base nas posições dos agentes que a compõem, e, por isso, a centralidade de cada agente interfere no prestígio geral da rede. Sendo assim, a análise de rede central focada nos indivíduos, denominada abordagem centrada em egos, pode, de certa forma, justificar os valores adquiridos na rede de forma geral. Após a análise geral, foi realizada a análise centrada em egos, com a identificação dos índices de centralidade de todos os agentes envolvidos na cadeia. A Tabela 2 apresenta os indivíduos que possuíram maiores índices em cada centralidade.

Tabela 2
Ranking posicional da Social Netchain

Na Tabela 2, são apresentados os dez agentes com maiores índices de centralidade em cada uma das variáveis, de acordo com os resultados obtidos na análise centrada em egos. Na centralidade de grau, que considera o número de ligações de entrada e saída dos agentes, verifica-se que o agente com maior centralidade é o Jorge, seguido pelo Alexandre e pelo Marcos. Ao considerar todos os agentes envolvidos na Social Netchain, os percentuais de centralidade de grau variam bastante, sendo 1,2% para o menor índice e 33,7% para o produtor Jorge, sendo que o elo dos produtores é onde se concentra os agentes com maiores índices de centralidade de grau de toda a cadeia produtiva.

Na centralidade de intermediação, o agente que ocupa a primeira posição é o agente Márcio, tendo em vista que possui ligações com diversos agentes isolados na rede, pertencentes ao elo dos supermercados, restaurantes, pesqueiros e fornecedores de alevinos, e, portanto, faz a intermediação desses agentes com a rede. Assim como ocorre na centralidade de grau, na centralidade de intermediação os agentes com maior poder de intermediação são os produtores. Contudo, dos 42 componentes da Social Netchain, apenas 25 possuem algum tipo de intermediação nas relações. Os índices variam de 0,04% a 21,8%.

Na centralidade de proximidade, o agente com maior índice é o produtor Pedro, seguido pela Rita e pelo Roberto. Ao considerar os valores obtidos por todos os agentes classificados na Tabela 2, verifica-se que existe uma homogeneidade dos percentuais de centralidade de proximidade, variando de 46,6% a 53,2%. Assim como ocorre na centralidade de proximidade, na centralidade de informação, o acesso às informações na Social Netchain ocorre de forma homogênea, com índices variando entre 3,7% e 4,3%.

Considerando os conceitos de centralidade associados ao poder, proposto por Bonacich, o agente com maior poder na rede é o agente Marcos, seguido pelos agentes Alexandre e Roberto. A posição de poder dos agentes pode ser verificada na Figura 2, que demonstra o número de relações dos agentes, principalmente com agentes que não estão bem relacionados com o restante da rede. Na centralidade de Bonacich, todos os agentes possuem resultados acima de zero, contudo os valores variam bastante, sendo 1,4% o menor índice, e 45,9%, o maior índice obtido. Pelos conceitos de Bonacich e considerando os resultados da análise centrada em egos, é possível afirmar que os agentes mais poderosos da cadeia do pescado pertencem ao grupo dos produtores, com algumas exceções, como o Alexandre, o Fernando, a Rita e o Geraldo, representantes dos elos de fornecimento de rações, alevinos, assistência técnica e pesqueiros, respectivamente.

Ao analisar a Tabela 2, verifica-se que as posições dos agentes variam de uma variável para outra, contudo alguns se repetem ao avaliar as primeiras posições do ranking, como é o caso dos agentes Jorge e Márcio que se encontram entre as quatro primeiras posições do ranking, em três variáveis de centralidade. Ao retirar esses agentes da rede, poderia causar a desintegração de toda a cadeia, visto que muitos dos agentes estão ligados a esses indivíduos.

Nas entrevistas, foi solicitado aos produtores a indicação das pessoas com quais possui relações sociais com maior frequência, de cada um dos ramos de atividades da cadeia do pescado, e o grau de confiança que possui com os agentes, em uma escala de 1 a 5, sendo 5 alta confiança e 1 baixa confiança. A partir das respostas dos entrevistados, foi mensurado o nível de confiança de cada agente nas relações sociais que possui na rede. Os resultados obtidos pelos agentes ocupantes de posição de destaque na Social Netchain podem ser visualizados na Figura 3, a seguir.

Figura 3
Níveis de confi ança dos agentes ocupantes de destaque na Social Netchain

A Figura 3 apresenta o nível de confiança dos nove agentes que ocupam posições de destaque nos índices da Social Netchain. A mensuração do nível de confiança de cada um dos agentes foi realizada através da média das notas atribuídas pelos agentes que possuem relações sociais. Os níveis de confiança dos nove agentes, em destaque, variam de 4,13 a 4,83, demonstrando um alto nível de confiança dos agentes.

Verificou-se, durante as entrevistas, que as pessoas com as quais o entrevistado possuía maiores contatos eram associadas à nota máxima em confiança, enquanto as demais eram associadas a notas menores, demonstrando que as relações sociais na cadeia são regidas pela confiança em muitos dos casos. Associado a isso, os indivíduos com maiores índices de confiança são os produtores e os agentes diretamente ligados ao elo dos produtores, como a assistência técnica, que realiza apoio direto a todos os produtores.

A agente Rita é a que possui o maior nível de confiança entre os indivíduos mais centrais da rede. A agente possui um alto índice de confiança entre os produtores, que formam a maioria de suas relações sociais, devido às suas atividades de apoio e assistência técnica ao grupo de produtores. A agente é representante da assistência técnica e oferece apoio na elaboração de projetos para obtenção de recursos, licenças e equipamentos para a cooperativa. Além disso, a agente realiza um acompanhamento pessoal aos produtores, estabelecendo, em alguns casos, relações de amizade com os cooperados, conforme visualizado nas entrevistas.

De acordo com os resultados obtidos, verifica-se que o fato de um indivíduo ser o mais central na rede não significa que ele seja o mais confiável dos agentes da Social Netchain. Alexandre pertence ao elo de fornecedores de ração e possui relações com diversos elos, inclusive com a assistência técnica, demonstrando que o agente não realiza somente transações comerciais, mas também se envolve com as atividades da cadeia, garantindo assim a confiança de diversos agentes espalhados pelos elos da cadeia produtiva.

No geral, os agentes da Social Netchain do pescado de Mundo Novo possuem bons níveis de confiança, contudo, em alguns casos, o nível de confiança de determinado agente é atribuído levando em conta somente o fato de ter, ou não, gerado prejuízo para o produtor. No entanto, durante a aplicação dos questionários, foi possível verificar que essas situações ocorrem somente nos casos de contatos mais esporádicos. Nos casos de relações sociais frequentes, os indivíduos indicavam os níveis de confiança facilmente, justificando que, sem confiança no fornecedor ou comprador, não é possível realizar transações comerciais.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo foi realizado com o objetivo de analisar a configuração da Social Netchain da cadeia do pescado do município de Mundo Novo, MS, considerando os aspectos estruturais, posicionais e relacionais da rede formada pelos indivíduos em cada elo e entre os diferentes elos da cadeia produtiva. Através da análise das redes de relações sociais formadas pelos elos componentes da cadeia, foi possível identificar a aplicabilidade da metodologia de análise de redes sociais nos conceitos propostos de Social Netchain, demonstrando que esta pode ser um importante instrumento para compreensão das relações sociais existentes em uma cadeia produtiva, e na forma como ocorrem as transações e troca de informações.

A partir da caracterização da cadeia e das respostas obtidas nos questionários, foi possível elaborar as redes de relações pessoais presentes nas transações entre os elos componentes da cadeia. Verificou-se que as relações sociais existentes entre os indivíduos de determinado elo, são praticamente inexistentes nos elos associados a fornecimento e comercialização. As relações horizontais são frequentes apenas no elo dos produtores, justificadas pela organização em forma de cooperativa, permitindo assim a troca de experiências e informações entre o grupo de cooperados. As relações de amizade e parentesco também impulsionam os índices de relações sociais, visto que, entre os produtores, existem diversos laços de parentesco, que diretamente influenciam nas redes de relações sociais.

A Social Netchain como um todo é formada por pequenos grupos mais coesos, com maior interação entre eles, contudo a rede possui diversos agentes isolados que possuem contato com apenas um ou dois agentes. Os grupos mais coesos geralmente estão localizados próximos dos agentes mais centrais da rede, portanto a saída desses agentes da rede poderia ocasionar uma ruptura na rede. A fragilidade da Social Netchain pode estar associada principalmente à baixa eficiência da COOPISC como unidade cooperativa, devido a conflitos anteriores relatados pelos entrevistados.

Os resultados obtidos neste estudo podem ser amplamente utilizados para a gestão da cadeia produtiva do pescado, principalmente ao considerar a posição dos agentes. No ambiente do agronegócio, em que as fontes de aprendizagem mais utilizadas são a troca de experiências entre os produtores, vizinhos e parceiros, a rede de relações sociais pode ser um terreno fértil para a obtenção de vantagens competitivas e para a criação e compartilhamento do conhecimento. Nesse caso, a identificação dos indivíduos centrais no acesso à informação e na intermediação entre os agentes, pode facilitar o processo de transmissão de conhecimentos, ao utilizar esses indivíduos no repasse de informações. A identificação dos agentes centrais na Social Netchain também pode servir de apoio a implementação de políticas públicas e ações de desenvolvimento da cadeia do pescado da região, visto que esses agentes podem exercer poder sobre os demais, facilitando o processo de aceitação e envolvimento dos agentes.

Neste estudo, durante a fase de coleta de dados, ocorreram algumas limitações, como a falta de informações necessárias para localização dos indivíduos pertencentes à cadeia do pescado, visto que os produtores somente sabiam indicar o primeiro nome e não tinham nenhum contato da pessoa. Nos casos de pessoas da própria região, através de informações com os moradores, era possível identificar e contatar a pessoa. Contudo foi impossível localizar as pessoas enquadradas nessa situação, que moravam fora do estado, mesmo diante de diversas buscas com profissionais ligados à atividade de piscicultura.

Apesar das limitações descritas, foi possível obter respostas em quantidade satisfatória para a análise da Social Netchain, desconsiderando apenas o elo dos consumidores finais. Sugere-se a aplicação dessa metodologia em outras cadeias produtivas do agronegócio, a fim de realizar análises e comparações entre a Social Netchain obtidas nas diversas cadeias produtivas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2018

Histórico

  • Recebido
    10 Abr 2017
  • Revisado
    16 Ago 2017
  • Aceito
    23 Ago 2017
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