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Bolivianos no Brasil: migração internacional pelo corredor fronteiriço Puerto Quijarro (BO)/Corumbá (MS)* * Artigo apresentado como resultado parcial da pesquisa no projeto interinstitucional "Análise do tráfico de pessoas e migração na fronteira do Mato Grosso do Sul: dinâmicas e modalidades (2012-2016)". Apoio CAPES – CNPq – FUNDECT.

Bolivians in Brasil: international migration by the border passage Puerto Quijarro (BO)/Corumbá (MS)

Boliviens au Bresil: migrations internationales par la frontière passage Puerto Quijarro (BO)/Corumbá (MS)

Bolivianos en Brasil: migración internacional por el pasillo fronterizo Puerto Quijarro (BO)/ Corumbá (MS)

O artigo é resultado parcial da pesquisa "Análise do tráfico de pessoas e migração na fronteira do Mato Grosso do Sul: dinâmicas e modalidades (2012-2016)" e tem por objetivo analisar a migração boliviana através do corredor Puerto Quijarro (BO)/Corumbá (MS). A pesquisa é sistêmica, qualitativa e quantitativa, com utilização de entrevistas e questionários de campo junto aos policiais federais e aos migrantes.

Imigração; Migração; Fronteira Brasil/Bolívia


The article is partially a result of the research "Analysis of the human trafficking and migration at the border of Mato Grosso do Sul: dynamics and modalities (2012-2016)" and aims to analyze the Bolivian migration by the corridor Puerto Quijarro (BO)/Corumbá (MS). The research is systemic, quantitative and qualitative, using interviews and questionnaires of field among federal police and migrants.

Immigration; Migration; Border Brazil/Bolivia


Résumé

L'article est en partie le résultat de la recherche "Analyse de trafic d'êtres humains et la migration à la frontière du Mato Grosso do Sul: la dynamique et les arrangements (2012-2016)" et vise à analyser la migration bolivienne dans le couloir Puerto Quijarro (BO)/Corumbá (MS) . La recherche est systémique, quantitative et qualitative, au moyen d'entrevues et de questionnaires champ entre la police et les migrants fédéraux.

Immigration; Les migrations; Le Brésil/Bolivie

El artículo es el resultado parcial de la pesquisa "Análisis de la trata de personas y la migración en la frontera del Mato Grosso do Sul: dinámicas y modalidades (2012-2016)" y tiene como objetivo analizar la migración boliviana por el pasillo Puerto Quijarro (BO)/Corumbá (MS). La pesquisa es sistémica, qualitativa y quantitativa, con utilización de entrevistas y cuestionarios de campo junto a los policías federales y a los migrantes.

Inmigración; Migración; Frontera Brasil/Bolivia


1 Introdução

A migração é entendida como movimento de população. Esse deslocamento é norteado por uma variedade de circunstâncias de ordem econômica, política, psicológica, cultural, religiosa e social. O migrante, por sua vez, é aquele indivíduo, de qualquer classe social, que resolveu abandonar o seu município de nascimento para fixar-se em outro.

Este artigo tem por objetivo central analisar o processo migratório de bolivianos na fronteira Brasil/Bolívia, corredor Puerto Quijarro (BO)/Corumbá (MS), em relação ao espaço de deslocamento específico, à forma de deslocamento, se espontâneo ou forçado, e ao tempo de permanência, se definitivo ou temporário.

A natureza da pesquisa é sistêmica, ou seja, busca-se a análise integrada dos aspectos do trabalho, articulando aspectos teóricos com dados de campo e dados estatísticos. Fez-se uma análise da legislação, dos decretos e das normas de migração brasileira contidos no site do Ministério da Integração, do Ministério das Relações Exteriores, do Itamaraty e do Governo da República do Brasil, articuladamente às competências da Polícia Federal, no controle ao processo migratório de bolivianos para o Brasil. Na pesquisa, foram coletados dados documentais e bibliográficos sobre fronteira, bem como realizadas quatro entrevistas semiestruturadas junto aos agentes da Polícia Federal que atuam na linha de fronteira com a Bolívia, e aplicados 100 questionários com imigrantes bolivianos na linha de fronteira Corumbá-Puerto Quijarro, que posteriormente foram analisados quantitativa e qualitativamente. A coleta de dados focou aspectos como a idade, o porquê da migração, o destino, o tempo de permanência e o objetivo da migração.

A pesquisa de campo foi realizada nos meses de fevereiro a abril de 2014, em que foram entrevistados trezentos migrantes bolivianos na fronteira Corumbá/Puerto Quijarro, no posto policial de Corumbá, escolhidos aleatoriamente entre homens e mulheres. No mesmo período, também foram entrevistados policiais federais que atuam na imigração em Corumbá. Os dados de campo foram interpretados à luz do corpo teóricometodológico e enriquecidos com dados estatísticos.

2 A fronteira Brasil/Bolívia como espaço constituído por territórios e territorialidades

A convivência como o "outro", com o diferente, constitui fonte de referência identitária na construção do território e do "ser fronteiriço" nos espaços fronteiriços (NOGUEIRA, 2007NOGUEIRA, Ricardo José Batista. Fronteira: espaço de referência identitária. Ateliê Geográfico, Goiânia, v. 1, n. 2, p. 27-41, dez. 2007.). São espaços construídos por relações de comunicação e de trocas cotidianas que envolvem populações de nacionalidades distintas e que perpassam limites políticoadministrativos e jurisdições estabelecidas no interior de cada Estado-Nação.

Conforme Machado (2010, p. 59)MACHADO, Lia Osorio. Cidades na fronteira internacional: conceitos e tipologia. In: NUNES, Angel; PADON, Maria Medianeira; OLIVEIRA, Tito Carlos. Dilemas e diálogos platinos: fronteiras. Dourados, MS: Ed. UFGD, 2010., a fronteira e as regiões de fronteira "requerem estudos localizados que deem conta da enorme variedade de seus usos e significados simbólicos e da diversidade de características e relações geográficas". Nessa mesma linha de pensamento, Oliveira (2005b, p. 377)OLIVEIRA, Marco Aurélio Machado de. Tempo, fronteira e imigrante: um lugar e suas "inexistências". In: OLIVEIRA, Tito Carlos Machado de (Org.). Territórios sem limites: estudos sobre fronteiras. Campo Grande: Ed. UFMS, 2005b. afirma que "nas regiões de fronteira há complementaridades de toda a ordem, o que as transforma em subsistemas abertos pouco condicionados às amarras das burocracias estatais".

O conceito de território, proposto por Souza (1995)SOUZA, Marcelo J. Lopes de. O território: sobre espaço e poder, autonomia e desenvolvimento. In: CASTRO, I. E.; GOMES, P. C. C.; CORRÊA, R. L. (Org.). Geografia: conceitos e temas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1995., se mostra mais adequado para explicar o campo de forças que compõe esse espaço em escala local. O autor entende o território como "um espaço definido e delimitado por e a partir de relações sociais de poder" (SOUZA, 1995SOUZA, Marcelo J. Lopes de. O território: sobre espaço e poder, autonomia e desenvolvimento. In: CASTRO, I. E.; GOMES, P. C. C.; CORRÊA, R. L. (Org.). Geografia: conceitos e temas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1995., p. 78). Segundo o mesmo estudioso, para que se possa compreender a territorialidade de maneira mais abrangente e crítica, é preciso observar o território como um campo de forças, uma teia ou rede de relações sociais. Dessa forma, rompe-se com a ideia de que território pressupõe exclusividade de poder.

A definição de Raffestin (1993)RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. São Paulo: Ática, 1993. colabora com a compreensão de como o território é constituído por usos conflitantes e engendram mais de uma relação de poder. Segundo o autor (1993, p. 60), "o território é o espaço político por excelência". O autor (1993, p. 160-161) define territorialidade como "um conjunto de reações que se originam num sistema tridimensional sociedade-espaço-tempo em vias de atingir a maior autonomia possível, compatível com os recursos do sistema". Segundo Costa (2008, p. 59)COSTA, Gustavo Lima. As fronteiras da identidade em Corumbá-MS: significados discursos e práticas. Corumbá, MS: Ed. UFMS, 2008.:

A territorialidade é entendida aqui como uma ação individual de um grupo, uma empresa ou um Estado sobre determinado espaço geográfico impondo suas vontades, suas virtudes. Não é necessário o domínio físico do território, mas sua submissão. Nesse sentido, essas territorialidades atravessam frequentemente outros territórios provocando distúrbios de variadas grandezas, mesmo nas zonas fronteiriças. Não existe um consenso sobre a definição de territorialidade e não se pode confundi-la com território. A territorialidade é uma ação própria do território, enquanto este é o resultado das ações dos seus atores endógenos em confronto com as territorialidades exógenas e com aquelas que o atravessam.

Albagli (2004)ALBAGLI, S. Território e territorialidade. In: LAGES, V.; BRAGA, C.; MORELLI, G. (Org.). Territórios em movimento: cultura e identidade como estratégia de inserção competitiva. Rio de Janeiro: Relume Dumará; Brasília: SEBRAE, 2004. p. 23-69. afirma que as interações se realizam por territorialidades. Haesbaert (2005)HAESBAERT, Rogério. Descaminhos e perspectivas do Território. In: RIBAS, A. D.; SPOSITO, E. S.; SAQUET, M. A. Território e desenvolvimento: diferentes abordagens. Francisco Beltrão, PR: Ed. Unioeste, 2005.apresenta as dimensões material e simbólica do território. A dimensão simbólica envolve o território apropriado pelas marcas da vida cotidiana. Lefebvre (1991)LEFEBVRE, Hery. A direito à cidade. São Paulo: Moraes, 1991. diferencia apropriação de dominação. A apropriação no sentido de possessão, de propriedade, portanto com um caráter mais simbólico, com as marcas do "vivido", do valor de uso. Já a dominação possui uma conotação de domínio, sendo mais concreto, funcional e vinculado ao valor de troca.

Haesbaert (1999)______. Identidades territoriais. In: ROSENDAHL, Z.; CORRÊA, R. L. Manifestações da cultura no espaço. Rio de Janeiro: Ed. UERJ, 1999. menciona que, para o grupo social, o território é construído por forte sentimento de pertencimento e de identidade. Assim, ao assumir uma dimensão simbólica, afetiva, por identificação o território revela-se dotado de símbolos e de sentimentos, conforme (VARGAS, 2009VARGAS, Icléia Albuquerque de. Porteiras assombradas do paraíso: embates da sustentabilidade socioambiental no Pantanal. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2009., p. 95):

O território é o chão e mais a população, isto é, uma identidade, o fato e o sentimento de pertencer àquilo que nos pertence. O território é a base do trabalho, da residência, das trocas materiais e espirituais e da vida, sobre os quais ele influi (SANTOS, 2003 apud VARGAS, 2009VARGAS, Icléia Albuquerque de. Porteiras assombradas do paraíso: embates da sustentabilidade socioambiental no Pantanal. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2009., p. 100).

Bentancor (2010)BENTANCOR, Gladys. Una frontera singular. La vida cotidiana em ciudades gemelas: Rivera (Uruguay) y Sant'Ana do Livramento (Brasil). In: NÚÑES, Ângela; PADOIN, Maria Medianeira; OLIVEIRA, Tito Carlos Machado de. Dilemas e diálogos platinos: fronteiras. Dourados, MS: Ed. UFGD, 2010. propõe um enfoque de fronteira, não como partes contrapostas ou conflitivas, mas como espaços sistêmicos de possibilidades de relações. Esse território relacional é fomentado por uma teia cultural, representada e projetada por identidades regionais em constante movimento de trocas e interferências. Gardin (2008)GARDIN, Cleonice. Território e cultura: manifestações da comunidade paraguaia em Dourados. In: OSÓRIO, Antônio C. Nascimento; PEREIRA, Jacira H. do Valle; OLIVEIRA, Tito Carlos Machado de. América Platina: educação, integração e desenvolvimento territorial. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2008. afirma que o sentimento de pertencimento nacional é enaltecido na dinâmica territorial fronteiriça, mas as trocas culturais são igualmente fortalecidas. Nesse movimento, a identidade nacional fronteiriça incorpora elementos socioculturais daqueles considerados "de fora". O espaço é territorializado por identidades binacionais ou multinacionais, fortalecendo as trocas e as experiências de vida.

Os povos podem se expandir para além do limite jurídico do Estado, desafiar a lei territorial de cada Estado limítrofe e às vezes criar uma situação de facto, potencialmente conflituosa, obrigando a revisão de acordos diplomáticos.

A fronteira é pulsante nas relações humanas, com culturas e identidades que se entrelaçam e se sobrepõem, muitas vezes, aos limites nacionais (GARDIN, 2008GARDIN, Cleonice. Território e cultura: manifestações da comunidade paraguaia em Dourados. In: OSÓRIO, Antônio C. Nascimento; PEREIRA, Jacira H. do Valle; OLIVEIRA, Tito Carlos Machado de. América Platina: educação, integração e desenvolvimento territorial. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2008., p. 180). Assim, o limite - enquanto linha divisória onde o Estado nacional exerce sua soberania - é invariavelmente quebrado pelos habitantes fronteiriços, no seu constante ir e vir, nas trocas comerciais e nas relações afetivas que são estabelecidas. Faz-se uma apropriação do espaço físico e de hábitos cotidianos, importantes para a identidade regional (MACHADO, 2010MACHADO, Lia Osorio. Cidades na fronteira internacional: conceitos e tipologia. In: NUNES, Angel; PADON, Maria Medianeira; OLIVEIRA, Tito Carlos. Dilemas e diálogos platinos: fronteiras. Dourados, MS: Ed. UFGD, 2010.; OLIVEIRA, 2008OLIVEIRA, Tito Carlos Machado. Os elos da integração: o exemplo da fronteira Brasil-Bolívia. In: SEMINÁRIO DE ESTUDOS FRONTEIRIÇOS. Campo Grande: UFMS, 2008.; LAURIN, 2001LAURIN, Alicia. Lãs transformaciones territoriales fronterizas según la concepción ideológica de la frontera. Boletin Geográfico, Neuquén, n. 21, 2001, Dept. de Geografía da Fac. de Humanidades; Universidad Nacional del Comahue, .).

Segundo Nogueira (2007, p. 32-33)NOGUEIRA, Ricardo José Batista. Fronteira: espaço de referência identitária. Ateliê Geográfico, Goiânia, v. 1, n. 2, p. 27-41, dez. 2007.:

Isto significa que a fronteira deve ser interpretada a partir da compreensão que seus habitantes têm dela e de como se relacionam, quando se relacionam, com seus vizinhos e mesmo com seus compatriotas das regiões centrais. A fronteira vivida busca compreender o cotidiano deste lugar nos seus mais variados aspectos: lazer, trabalho, contravenção, consumo, defesa, disputas, reconhecendo ainda que o outro lado tenha outra lei. Assim, acreditamos que a fronteira seja capaz de refletir o grau de interação ou ruptura entre sociedades fronteiriças. Como esta perspectiva da fronteira vivida nos re-mete para a relação entre o ser e o lugar, não poderíamos passar ao largo da questão da identidade com o lugar, pensar na fronteira como espaço de referência identitária, ou seja, uma identidade territorial cuja manifestação empírica é a própria experiência de habitar este lugar.

Os habitantes vão cruzando relações variadas e construindo identidades, como afirmam Dorfman e Bentancor (2005, p. 196)DORFMAN, Adriana; BENTANCOR, Gladys Teresa. Regionalismo fronteiriço e o "acordo para os nacionais fronteiriços brasileiros uruguaios". In: OLIVEIRA, Tito Carlos Machado de (Org.). Territórios sem limites: estudos sobre fronteiras. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2005. "atividades econômicas, sociais e culturais aí se encontram, criando práticas compartilhadas que podem construir uma identidade fronteiriça". Segundo Costa (2008)COSTA, Gustavo Lima. As fronteiras da identidade em Corumbá-MS: significados discursos e práticas. Corumbá, MS: Ed. UFMS, 2008., os moradores desses espaços comumente cruzam a linha de espaço delimitado com a naturalidade de quem não vê essa linha divisória. O "ir e vir" da população é tão natural, que o limite e a legislação a ele relacionados passam despercebidos. O território e a territorialidade, expressos por práticas materiais e simbólicas, garantem o sentido de pertencimento e a apropriação do espaço.

Entretanto, quando nesse espaço de relações cotidianas e de construção de identidade distinta que desafiam as leis territoriais de cada Estado limítrofe ocorre desvantagem para uma das partes, a identidade nacional é ressaltada como um componente imediato de diferenciação, e o Estado deve dar conta da solução de problemas que afetam o nacional. A fronteira é, portanto, um ambiente de relações ambíguas, movidas por interesses que nem sempre convergem (OLIVEIRA, 2008OLIVEIRA, Tito Carlos Machado. Os elos da integração: o exemplo da fronteira Brasil-Bolívia. In: SEMINÁRIO DE ESTUDOS FRONTEIRIÇOS. Campo Grande: UFMS, 2008., p. 78):

Meio geográfico é movido por interesses que nem sempre convergem: um, de natureza interna, que demanda necessidades de convivência (inda que conflitiva) entre culturas; e outro, de natureza externa, cuja dinâmica está atada aos grilhões dos interesses da expansão capitalista. Nesses termos se apresentam muito mais como pontos que promovem a integração sócio-cultural entre os estados nações (OLIVEIRA, 2008OLIVEIRA, Tito Carlos Machado. Os elos da integração: o exemplo da fronteira Brasil-Bolívia. In: SEMINÁRIO DE ESTUDOS FRONTEIRIÇOS. Campo Grande: UFMS, 2008., p. 90)

As diferenças são reveladas, e o limite é estabelecido entre o grupo, os membros da coletividade ou "comunidade", denominados insiders e os "outros", os de fora, os estranhos, denominados outsiders. O "outro" é percebido como o "inimigo" e a preocupação primordial com a defesa do território torna-se o dado fundamental da fronteira.

No Brasil, o território fronteiriço é estabelecido pela Lei 6.634/79 e Decreto 85.064/79, e representa uma área de 15.719 km, com largura de 150 km, que abrange 588 municípios e cerca de 10 milhões de habitantes (Ministério da Integração Nacional1 1 Disponível na internet via: http://www.integracao.gov.br/ ) (figura 1).

Figura 1
Faixa de fronteira brasileira.

O território fronteiriço é definido e delimitado pelo poder nacional da República Federativa do Brasil, institucionalizado e com formas de controle estabelecidas por normas jurídicas que definem e normatizam legalidade e ilegalidade, nacional e internacional, indo ao encontro da interpretação de território apresentada por Andrade (1995, p. 19) "o conceito de território não pode ser confundido com o de espaço ou de lugar, estando muito ligado à ideia de domínio ou de gestão de determinada área". Essa interpretação traz a concepção de território político-administrativo, no qual o Estado exerce o poder soberano e os limites entre nações definem a territorialidade desse poder.

É justamente com o advento do Estado moderno, entendido como Estado entidade político-social juridicamente organizada para executar os objetivos da soberania nacional, que a fronteira exerce a função de limite. A integração do território nacional leva à construção mais clara entre o nacional e o não nacional. A construção da faixa de fronteira é acompanhada por progressos na Cartografia, no conceito de território e na prática militar (SILVA, 2008SILVA, Gutemberg de Vilhena. A fronteira política. Revista Acta Geográfica, Boa Vista, RR, ano II, n. 4, jul./dez. 2008.). Com o advento do Estado, a preocupação com a defesa e com a construção da identidade torna-se necessária e prioritária. Essa preocupação manifesta-se hoje.

A preocupação com a defesa e a segurança nacional na região de fronteira levou o Ministério da Integração Nacional do Brasil a desenvolver o Programa de Promoção do Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (PPDF), que logo no inicio revelou que:

[...] a Constituinte de 1988 manteve a praxe constitucional iniciada em 1934 de dotar o Estado de uma estrutura de Governo (CSSN, CSN, CDN) voltada para a segurança e defesa da nação, por meio da manutenção de sua soberania e preservação da ordem constitucional. (BRASIL, 2005BRASIL. Ministério da Integração Nacional. Proposta de Reestruturação do Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira – Bases de uma política integrada de desenvolvimento regional para a faixa de fronteira. Brasília: Ministério da Integração Nacional, 2005., p. 19).

Nesse documento, a imagem da região de fronteira apresenta uma conotação fortemente marcada pela falta de desenvolvimento econômico e ausência do Estado. Pelo relatório, a ilegalidade e a violência são características centrais que deverão ser eliminadas a partir do desenvolvimento regional, via atores locais, e a partir da integração com os países vizinhos:

[...] a Faixa de Fronteira configura-se como uma região pouco desenvolvida economicamente, historicamente abandonada pelo Estado, marcada pela dificuldade de acesso a bens e serviços públicos, pela falta de coesão social, pela inobservância de cidadania e por problemas peculiares às regiões fronteiriças. (BRASIL, 2005BRASIL. Ministério da Integração Nacional. Proposta de Reestruturação do Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira – Bases de uma política integrada de desenvolvimento regional para a faixa de fronteira. Brasília: Ministério da Integração Nacional, 2005., p. 8).

[...] O Ministério da Integração Nacional envida esforços em parceria com organizações públicas e privadas no intuito de consolidar as informações existentes sobre a Faixa de Fronteira e produzir as que forem necessárias, possibilitando a realização de ações que levem em conta sua missão institucional de integração nacional e desenvolvimento regional, num esforço de desenvolvimento articulado com os países da América do Sul. (BRASIL, 2005BRASIL. Ministério da Integração Nacional. Proposta de Reestruturação do Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira – Bases de uma política integrada de desenvolvimento regional para a faixa de fronteira. Brasília: Ministério da Integração Nacional, 2005., p. 26).

Essa visão é simétrica à imagem que a população não fronteiriça possui da região. No vocabulário popular, a fronteira é "terra de ninguém", ou seja, cenário de crimes de pistolagem, de tráfico de drogas, de tráfico de pessoas, de contrabando de mercadorias. Wong-Gonzáles (2005), em sua análise sobre as fronteiras, faz alusão ao fato de que elas normalmente são vistas como corredores de contrabando, do narcotráfico e da violência. Nogueira (2007)NOGUEIRA, Ricardo José Batista. Fronteira: espaço de referência identitária. Ateliê Geográfico, Goiânia, v. 1, n. 2, p. 27-41, dez. 2007., ao trabalhar os conceitos de fronteira percebida e fronteira vivida, revela:

A percepção da fronteira, principalmente para aqueles que estão localizados fora dela, no interior do Estado-nacional, é carregada de imagens depreciativas, pois é pela fronteira que ingressam no país as diversas mazelas, mercadorias ilegais, mãode-obra ilegal e toda sorte de contravenção (NOGUEIRA, 2007NOGUEIRA, Ricardo José Batista. Fronteira: espaço de referência identitária. Ateliê Geográfico, Goiânia, v. 1, n. 2, p. 27-41, dez. 2007., p. 32).

Oliveira (2008, p. 233)OLIVEIRA, Tito Carlos Machado. Os elos da integração: o exemplo da fronteira Brasil-Bolívia. In: SEMINÁRIO DE ESTUDOS FRONTEIRIÇOS. Campo Grande: UFMS, 2008. apresenta uma reflexão semelhante, ao analisar a atuação dos meios de comunicação em geral, que reforçam a imagem do contrabando, do narcotráfico, do bandidismo impune.

O Ministério da Integração Nacional propõe a integração com outros órgãos nacionais de intervenção, como o Ministério das Relações Exteriores e o Itamaraty, para a realização de ações conjuntas de desenvolvimento regional e, em escala internacional, a criação e revitalização dos chamados Comitês de Fronteira (CF), visando a acordos binacionais que possam dar conta da diversidade que envolve a faixa de fronteira brasileira. Esses Comitês atuam em escala local, identificando problemas específicos e buscando estratégias de desenvolvimento socioeconômico a partir do diagnóstico para cada região fronteiriça.

Os CFs – co-presididos pelos titulares das repartições consulares brasileira e do país vizinho respectivo e integrados pelas "forças vivas" locais (prefeitos, vereadores, empresários, associações comerciais, representantes militares e das polícias federais, etc.) – funcionam como fórum de discussão dos problemas típicos de cidades de fronteira, permitindo que as demandas locais em termos de saúde, educação, meio ambiente, segurança, comércio fronteiriço, projetos de infra-estrutura (manejo de lixo, esgotos, tratamento de água, malha viária, etc.) tenham ressonância e boa acolhida nos órgãos das administrações estaduais, departamentais, provinciais e federais sediados nas cidades de fronteira. (BRASIL, 2005BRASIL. Ministério da Integração Nacional. Proposta de Reestruturação do Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira – Bases de uma política integrada de desenvolvimento regional para a faixa de fronteira. Brasília: Ministério da Integração Nacional, 2005., p. 23).

A fronteira é, assim, um espaço constituído de territórios e territorialidades, cuja complexidade não se desvenda apenas por Leis e Decretos, logo, torna-se tarefa complexa entender os processos migratórios nesses espaços.

3 Migração Internacional na Fronteira Brasil-Bolívia

Oliveira (2008, p. 27)OLIVEIRA, Tito Carlos Machado. Os elos da integração: o exemplo da fronteira Brasil-Bolívia. In: SEMINÁRIO DE ESTUDOS FRONTEIRIÇOS. Campo Grande: UFMS, 2008., ao analisar o intercâmbio entre Corumbá-Puerto Quijarro, revela que "o limite do território seja cada vez mais, uma abstração, que por efeito, criam relações de poder e de identidade naquele ambiente". Em sua interpretação, a fronteira é o começo, e não o fim, da perspectiva de incorporar o novo. Ela representa um território caracterizado por interações, contatos e fluxos sociais.

A presença de instrumentos de controle ao "ir" e "vir" das pessoas na fronteira Brasil/ Bolívia, corredor Puerto Quijarro (BO)/ Corumbá (MS), pensada como um território apropriado pela população que vivencia e trabalha no local e que estabelece relações cotidianas, apresenta-se contraditória.

Por outro lado, a intensificação dos fluxos imigratórios para o Brasil, a partir da última década, associada ao tráfico ilegal de bolivianos2 2 Entrevista de Campo, 2011. Realizada junto aos agentes da Polícia Federal que atuam na linha de fronteira. Base da Polícia Federal Brasileira na cidade de Corumbá (MS). , gerou a necessidade de controle efetivo do território nacional brasileiro. Tal controle é realizado pela Polícia Federal Brasileira, entendida como um instrumento do Estado construído para estabelecer limites entre o nacional e o "outro", bem como fiscalizar a entrada de imigrantes bolivianos no Brasil3 3 No presente trabalho, foram colhidos dados junto à Polícia Federal e entrevistados policiais federais que atuam em Corumbá com a imigração. .

Através do Acordo bilateral entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República da Bolívia, aprovado internamente pelo Decreto Legislativo n. 64, de 18 de abril de 2006, e promulgado pelo Decreto n. 6.737, de 12 de janeiro de 2009, foram estabelecidas as regras para "permissão de residência, estudo e trabalho a nacionais fronteiriços brasileiros e bolivianos" e que permite em seu art. 1º, "o ingresso, residência, estudo, trabalho, previdência social e concessão de documento especial de fronteiriço a estrangeiros residentes em localidades fronteiriças".

O documento necessário para o ingresso e permanência legal de bolivianos no Brasil é conhecido como "documento especial fronteiriço", que propicia a figura legal do "cidadão fronteiriço" e possibilita que ele estude e/ ou trabalhe na cidade de Corumbá, no Brasil. Cita-se, porém, que os bolivianos residentes no lado brasileiro não têm direito ao documento em pauta, e há ainda os bolivianos que ingressam livremente no país apenas com o documento de identidade, mas não possuem o direito de residência, em conformidade com o art. 21, da Lei 6.815, de 19 de agosto de 1980.

Nesse processo, o uso de infraestrutura urbana e serviços públicos em Corumbá é intenso e exige investimentos que devem ser calculados levando-se em consideração a população residente na cidade brasileira de Corumbá e a população de bolivianos, imigrantes pendulares, que utilizam essa infraestrutura. Porém isso não ocorre, pois os dados oficiais não registram as flutuações, o que resulta em relações nem sempre "amigáveis" entre os brasileiros e bolivianos na fronteira.

Nas escolas públicas de Corumbá, no ano de 2011, foram matriculados 548 alunos bolivianos, conforme dados da Secretaria Municipal de Educação de Corumbá. Muitos desses alunos bolivianos, mesmo morando em Puerto Quijarro, possuem dupla nacionalidade, condição que facilita a matrícula escolar. De qualquer forma, são constantemente hostilizados pelos alunos brasileiros e enfrentam dificuldades de toda ordem e que ultrapassam os limites do espaço escola, como dificuldade de transporte, o idioma, a estrutura didático-pedagógica.

Como o Brasil representa um espaço hegemônico numa relação de autoridade e/ ou dependência, a Bolívia se configura como um país dependente e subordinado às relações existentes. Fato que interfere nas relações entre brasileiros e bolivianos na fronteira. Essa relação de autoridade-dependência estimula, muitas vezes, comportamentos hierarquizados nas relações cotidianas. Costa (2008)COSTA, Gustavo Lima. As fronteiras da identidade em Corumbá-MS: significados discursos e práticas. Corumbá, MS: Ed. UFMS, 2008. apresenta registros de bolivianos residentes no Brasil, ou de seus descendentes, sobre o descontentamento ou, nas palavras deles, o "não sentir-se à vontade" ao serem identificados como "bugres" por brasileiros, termo considerado pejorativo e discriminatório.

Entretanto informações da Polícia Federal têm revelado que, nos últimos anos, o fluxo migratório de bolivianos no Brasil vai além da região fronteiriça e, portanto, não se traduz em movimentos pendulares (ou diários). No ano de 2013, do total de bolivianos que entraram no país por Corumbá (MS), cerca de 85% migraram para a cidade de São Paulo (figura 2). Em geral, essas pessoas já possuem familiares e amigos trabalhando na cidade, e buscam emprego e melhores condições de vida no Brasil.

Figura 2
Fluxo migratório na fronteira Brasil – Bolívia corredor Corumbá (MS)/ Puerto Quijarro (Departamento de Santa Cruz), elaborado a partir de dados de campo, 2013.

Neste mesmo ano, segundo dados da Polícia Federal, passaram pela fronteira de Corumbá cerca de 8.200 bolivianos, o que significa uma média de 700 imigrantes/mês. Essa região de Corumbá/Ladário (do lado brasileiro) e Puerto Suarez/Puerto Quijaro (do lado boliviano) é vista como o ponto de contato de maior expressão entre o Brasil e a Bolívia, isso devido ao gasoduto, à hidrovia, à malha ferroviária e rodoviária que servem a região4 4 "Me voy porque no puedo trabajar aquí. Mi hermano ya pasaron y funcionó, así que voy a llevar a mi familia a lo largo. Vamos a São Paulo para trabajar con niño ropa" (Joaquin B. D. Suárez - imigrante boliviano, relato de campo, maio de 2013). .

São dados significativos, mas é provável que não revelem o número real de imigrantes que atravessaram a fronteira pelo corredor Puerto Quijarro - Corumbá, pois uma parcela considerável entra no país em situação irregular,através dos chamados "coiotes": brasileiros e bolivianos que fomentam a migração ilegal através de documentos falsos e agenciam o deslocamento, o tipo e o local de trabalho na cidade de São Paulo.

Em paralelo, a Polícia Federal investiga o tráfico ilegal de pessoas nessa fronteira. Os atores do tráfico atuam articulando diferentes escalas geográficas, onde recrutam, transportam, transferem e alojam o imigrante, através de ameaça ou uso da força, da coerção, da fraude, do engano, do abuso de poder ou de vulnerabilidade, ou ainda a partir de pagamentos ou benefícios em troca do controle da vida da vítima para fins de exploração, que inclui prostituição, exploração sexual, trabalhos forçados, escravidão, remoção de órgãos e práticas semelhantes.

Nesse processo, formam-se redes que articulam a escala local, a nacional e a global. As redes constituem apenas uma parte do espaço e o espaço de alguns, e se sobrepõem ao espaço onde se configuram territórios e territorialidades simbólicas. Nesse caso, pode-se pensá-lo como um espaço para o qual confluem forças locais e/ou exógenas. O poder pode ser exercido tanto exclusivamente por lideranças endógenas, quanto por elas mesmas no papel de representantes de grupos de poder de fora do local (podendo essas externalidades, ser mais ou menos controladoras), ou ainda somente por forças exógenas.

É nesse campo de forças estabelecido sobre o espaço fronteiriço de Puerto Quijarro-Corumbá, que pessoas migram por tempo indeterminado para enfrentar a precariedade das condições de trabalho, caracterizadas pelo excesso de horas e os baixos salários, geralmente em setores como confecções de roupas e comércio. O mais preocupante é que, segundo relatos de campo, a vinda para o Brasil significa para famílias de bolivianos uma oportunidade para melhorar as suas condições de vida.

Devido à influência da globalização, o crescimento econômico da Bolívia é um dos menores da América do Sul5 5 Disponível na internet via: https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/ . O país está na 108º posição no índice de desenvolvimento humano (tabela 1). E o percentual de população abaixo do índice de pobreza é de 51,3% (PNUD, 2013PROGRAMA DE PROMOÇÃO DE DESENVOLVIMENTO DA FAIXA DE FRONTEIRA - PPDF. Brasília: Ministério da Integração Nacional, 2009.).

Tabela 1
Índice de desenvolvimento humano da América do Sul - 2013

Como o Brasil se apresenta como um país hegemônico na escala regional, desperta o interesse da população vizinha. Dados do IBGE revelam que houve um crescimento no fluxo (quantidade de imigrantes chegando ao país) e no estoque (quantidade de imigrantes presentes no Brasil) de bolivianos no Brasil no período de 2001 a 2010 (gráfico 1). Foram 15.753 bolivianos vivendo regularmente no país, com residência fixa em 2010, data do último censo demográfico, e 3.954 filhos de bolivianos nascidos no Brasil. Esse número representa 8% do total de imigrantes no Brasil, em 2010.

Gráfico 1
Número de imigrantes bolivianos no Brasil 2000-2010.

Além das condições precárias de trabalho, a migração internacional significa a penetração do imigrante em um novo tecido social que requer tempo para adaptação, uma vez que novos códigos e valores precisarão ser incorporados. Trata-se de um novo território, configurando uma nova territorialidade, expressa por práticas materiais e simbólicas que irão garantir ao imigrante o sentido de pertencimento e a apropriação do espaço. Como afirma Albagli (2004)ALBAGLI, S. Território e territorialidade. In: LAGES, V.; BRAGA, C.; MORELLI, G. (Org.). Territórios em movimento: cultura e identidade como estratégia de inserção competitiva. Rio de Janeiro: Relume Dumará; Brasília: SEBRAE, 2004. p. 23-69., a territorialidade expressa o modo de agir espacialmente e é, portanto, um fenômeno relacional derivado da vivência humana, de relações, sobretudo de poder, entre os indivíduos.

Numa relação de autoridade-dependência, como a existente entre Brasil e Bolívia, os comportamentos hierarquizados nas relações cotidianas podem levar a tratamentos discriminatórios e à utilização de termos pejorativos em relação aos bolivianos.

Nas entrevistas realizadas com imigrantes no posto da Polícia Federal em Corumbá, o que se verificou é que o imigrante não possui tempo de permanência estabelecido, variando de acordo com as possibilidades que o Brasil oferece. Todavia, no momento de entrada no Brasil, os bolivianos entrevistados manifestaram o desejo em retornar à Bolívia.

Conclusão

A migração internacional de bolivianos para o Brasil se intensificou nos últimos quatro anos e apresenta características novas: antes concentrado nas cidades fronteiriças, hoje o fluxo segue majoritariamente em direção à cidade de São Paulo. Em 2013, registraramse aproximadamente 85% (oitenta e cinco por cento) dos imigrantes com destino a São Paulo, caracterizando Corumbá apenas como porta de entrada.

Em 2013, foram 8.200 imigrantes bolivianos que ingressaram no Brasil pelo corredor Puerto Quijarro/Corumbá, espontaneamente, em busca de uma vida melhor em termos de renda e emprego. Entretanto a realidade significa condições precárias de trabalho, baixos salários e muitas horas em confecções de roupas, submetendo-os a várias violações de direitos humanos.

Para os bolivianos que migram por Corumbá (MS), isso significa melhoria nas condições de vida, mesmo diante das dificuldades socioespaciais e econômicas. Porém o desejo de voltar à nação de origem permanece, inclusive entre aqueles que consolidaram famílias no Brasil.

Essa dinâmica revela os efeitos negativos da globalização, a reprodução em escala regional das relações de autoridade–dependência exercida pelo centro econômico mais dinâmico e a construção de novas identidades territoriais a partir das relações que são estabelecidas com o "outro", em um tecido social totalmente diferente.

A questão central que se coloca pretende saber se há interesse na reprodução do modelo existente, ou se há necessidade de ser proposta uma nova dinâmica nas relações socioterritoriais que possibilitem a integração e a dignidade humana, pois a imigração gera a necessidade de construção de novas territorialidades, nem sempre viáveis em função da discriminação e da desvalorização da população de imigrantes no Brasil. E isso ocorre também nas cidades de fronteira.

  • *
    Artigo apresentado como resultado parcial da pesquisa no projeto interinstitucional "Análise do tráfico de pessoas e migração na fronteira do Mato Grosso do Sul: dinâmicas e modalidades (2012-2016)". Apoio CAPES – CNPq – FUNDECT.
  • 1
    Disponível na internet via: http://www.integracao.gov.br/
  • 2
    Entrevista de Campo, 2011. Realizada junto aos agentes da Polícia Federal que atuam na linha de fronteira. Base da Polícia Federal Brasileira na cidade de Corumbá (MS).
  • 3
    No presente trabalho, foram colhidos dados junto à Polícia Federal e entrevistados policiais federais que atuam em Corumbá com a imigração.
  • 4
    "Me voy porque no puedo trabajar aquí. Mi hermano ya pasaron y funcionó, así que voy a llevar a mi familia a lo largo. Vamos a São Paulo para trabajar con niño ropa" (Joaquin B. D. Suárez - imigrante boliviano, relato de campo, maio de 2013).
  • 5

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Jun 2015

Histórico

  • Recebido
    22 Mar 2014
  • Revisado
    28 Jul 2014
  • Aceito
    23 Ago 2014
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