Índice de Vulnerabilidade Social: uma análise econômica nos municípios de Mato Grosso do Sul no período de 2000 até 2023

Social Vulnerability Index: an economic analysis in the municipalities of Mato Grosso do Sul from 2000 to 2023

Índice de Vulnerabilidad Social: un análisis económico en los municipios de Mato Grosso do Sul de 2000 a 2023

Resumo

A Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos do Governo do Estado de Mato Grosso do Sul conduziu uma pesquisa de campo abrangendo todos os municípios do estado, visando avaliar o Índice de Vulnerabilidade Social para o ano de 2023. Nesse contexto, o presente artigo analisou os dados inéditos obtidos, os quais foram comparados com iniciativas de anos anteriores, estabelecendo uma série histórica. Após as análises, pode-se afirmar que ocorreu uma redução da vulnerabilidade entre 2000 e 2010, seguida por uma reversão até 2023. A despeito desta reversão entre 2010 e 2023, na comparação entre 2000 e 2023, Mato Grosso do Sul reduziu a vulnerabilidade na grande maioria dos municípios. A infraestrutura urbana foi a dimensão mais crítica. O crescimento econômico significativamente alto entre 2000 e 2010 pode ter contribuído para a redução da vulnerabilidade, mas desde então a magnitude do crescimento reduziu-se. Recomenda-se priorizar melhorias e investimentos massivos na infraestrutura urbana para reduzir a vulnerabilidade do estado.

Palavras-chave:
vulnerabilidade social; administração pública; políticas públicas; Índice de Vulnerabilidade Social.

Abstract

The Secretary of Social Assistance and Human Rights of the State of Mato Grosso do Sul conducted a field survey covering all municipalities, aiming to evaluate the Social Vulnerability Index for the year 2023. In this context, this article analyzed the unpublished data obtained, which were compared with initiatives from previous years, establishing a historical series. After the analysis, it can be stated that there was a reduction in vulnerability between 2000 and 2010, followed by a reversal until 2023. Despite this, in the comparison between 2000 and 2023, Mato Grosso do Sul reduced vulnerability in most municipalities. Urban infrastructure was the most critical dimension. Significantly high economic growth between 2000 and 2010 apparently contributed to the reduction of vulnerability, but since then the magnitude of growth has reduced. It is recommended to prioritize improvements and massive investments in urban infrastructure to reduce the state's vulnerability.

Keywords:
social vulnerability; public administration; public policy; Social Vulnerability Index.

Resumen

La Secretaría de Estado de Asistencia Social y Derechos Humanos del Gobierno del Estado de Mato Grosso do Sul realizó un estudio de campo que abarcó todos los municipios del estado, con el objetivo de evaluar el Índice de Vulnerabilidad Social para el año 2023. En este contexto, en este artículo se analizaron los datos inéditos obtenidos, los cuales se compararon con iniciativas de años anteriores, estableciendo una serie histórica. Tras el análisis, se puede afirmar que hubo una reducción de la vulnerabilidad entre 2000 y 2010, seguida de una reversión hasta 2023. A pesar de esta reversión entre 2010 y 2023, en la comparación entre 2000 y 2023, Mato Grosso do Sul redujo la vulnerabilidad en la vasta mayoría de los municipios. La infraestructura urbana fue la dimensión más crítica. El crecimiento económico significativamente alto entre 2000 y 2010 puede haber contribuido a reducir la vulnerabilidad, pero desde entonces la magnitud del crecimiento se ha reducido. Se recomienda priorizar mejoras e inversiones masivas en infraestructura urbana para reducir la vulnerabilidad del estado.

Palabras clave:
vulnerabilidad social; administración pública; políticas públicas; Índice de Vulnerabilidad Social.

1 INTRODUÇÃO

Reduzir a vulnerabilidade social de determinada região é um desafio muito importante⁴ e objeto de estudo e ação tanto da sociedade civil como do estado. Nesse contexto, uma grande questão é justamente identificar adequadamente esta vulnerabilidade, bem como sua localização no território. Isso pode contribuir sobremaneira para a atuação cirúrgica dos programas, dos projetos e das ações para mitigar a vulnerabilidade.

Esta pesquisa tem como objetivo principal realizar um estudo histórico do índice de vulnerabilidade social para o estado de Mato Grosso do Sul (MS), incorporando, na análise, dados inéditos obtidos pela Secretaria de Estado de Assistência Social e dos Direitos Humanos (SEAD) em pesquisa de campo primária, realizada em 2023, em todos os municípios de MS. O presente estudo também busca analisar possíveis relações econômicas com a vulnerabilidade.

Para alcançar tal objetivo, a pesquisa se baseou na análise de estatísticas descritivas, bem como nos fatos estilizados. Os resultados estão apresentados por meio de gráficos, tabelas e mapas. Os dados e indicadores foram obtidos de forma secundária, ou seja, coletados por meio de importantes institutos de pesquisa e estatística, como: Fundação Getúlio Vargas (FGV), Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e, principalmente, por meio dos dados obtidos pela pesquisa socioassistencial realizada e publicizada pela SEAD em 2023. Além disso, foi realizada uma análise multivariada⁵ das bases de dados disponibilizadas pelo IBGE e Ipea, para os anos de 2000 e 2010, bem como de 2023, a partir dos dados da SEAD.

Portanto, esta pesquisa é composta por 3 seções, além da introdução e das considerações finais. Primeiramente, há um levantamento da discussão de literatura sobre o conceito de vulnerabilidade social e seus indicadores. Posteriormente, é analisado o histórico do índice de vulnerabilidade no estado de MS. Já na terceira seção, é analisado estática e dinamicamente o IVS de Mato Grosso do Sul, a partir de dados inéditos para o ano de 2023, com adoção de análise estatística multivariada.

2 O ÍNDICE DE VULNERABILIDADE SOCIAL (IVS) E A PESQUISA SOCIOASSISTENCIAL NO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL

A despeito de ter sido objeto de análise nos últimos anos, a expressão “vulnerabilidade social” ainda carece de uma definição única e consolidada na literatura. Esta lacuna é evidenciada pelo estudo de Prowse (2003), que investiga os diversos modos como essa categoria é empregada em uma série de artigos produzidos pelo Centre for Chronic Poverty, no Reino Unido. O autor examina as implicações dessa multiplicidade de significados para a interpretação das análises apresentadas, assim como para o debate sobre a pobreza crônica. Conforme Prowse (2003), enquanto alguns trabalhos referem-se à vulnerabilidade como suscetibilidade à pobreza, outros a descrevem como um sintoma da pobreza. Há, ainda, aqueles que a concebem como uma das dimensões intrínsecas à própria pobreza.

De acordo com Costa et. al. (2018), o Índice de Vulnerabilidade Social (IVS) foi concebido como uma métrica sintética complementar ao Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), funcionando como um reflexo inverso ao IDHM ao identificar situações de vulnerabilidade social no território.

O IVS é uma medida sintética que varia de 0,000 a 1,000, sendo que valores próximos de 1,000 indicam níveis mais elevados de vulnerabilidade social. Esse índice foi categorizado em três dimensões: i) IVS-Infraestrutura Urbana (IVS.IU), formado por 3 indicadores; ii) IVS-Capital Humano (IVS.CH), contemplando 8 indicadores; iii) IVS-Renda e Trabalho (IVS. RT), composto por 5 indicadores. Na Tabela 1, pode-se verificar os pesos de todos os indicadores que compõem o IVS nas três diferentes dimensões de abordagem.

Tabela 1
Indicadores e pesos componentes do IVS em cada dimensão

Dimensão	Indicador	Peso
IVS infraestrutura urbana	Percentual de pessoas em domicílios com abastecimento de água e esgotamento sanitário inadequados	0,300
	Percentual da população que vive em domicílios urbanos em serviço de coleta de lixo	0,300
	Percentual de pessoas que vivem em domicílios com renda per capita inferior a meio salário mínimo e gastam mais de uma hora até o trabalho, no total de pessoas ocupadas, vulneráveis e que retornam diariamente	0,300
IVS capital humano	Mortalidade até 1 ano de idade	0,125
	Percentual de crianças de 0 a 5 anos de idade que não frequentam a escola	0,125
	Percentual de pessoas de 6 a 14 anos de idade que não frequentam a escola	0,125
	Percentual de mulheres de 10 a 17 anos de idade que tiveram filhos	0,125
	Percentual de mães chefes de família sem fundamental completo e com pelo menos um filho menor de 15 anos de idade, no total de mães chefes de família	0,125
	Taxa de analfabetismo da população de 15 anos ou mais de idade	0,125
	Percentual de crianças que vivem em domicílios em que nenhum dos moradores tem o ensino fundamental completo	0,125
	Percentual de pessoas de 15 a 24 anos de idade que não estudam, não trabalham e possuem renda domiciliar per capita igual ou inferior a meio salário mínimo (2010), na população total dessa faixa etária	0,125
IVS renda e trabalho	Proporção de pessoas com renda domiciliar per capita igual ou inferior a meio salário mínimo (2010)	0,200
	Taxa de desocupação da população de 18 anos ou mais de idade	0,200
	Percentual de pessoas de 18 anos ou mais de idade sem fundamental completo e em ocupação informal	0,200
	Percentual de pessoas em domicílios com renda per capita inferior a meio salário mínimo (de 2010) e dependentes de idosos	0,200
	Taxa de atividade das pessoas de 10 a 14 anos de idade	0,200

Com o propósito de melhor compreender a vulnerabilidade social em seu território de atuação, a Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos (SEAD) do Governo do Estado de Mato Grosso do Sul (MS) conduziu uma pesquisa de campo abrangendo todos os municípios do estado, visando avaliar o IVS para o ano de 2023.

Baseando-se nesses indicadores, pôde-se avançar na construção do IVS. Foi desenvolvida uma normalização dos indicadores nos municípios para que seus valores fiquem entre 0 e 1. Após a normalização dos indicadores, obtém-se a média ponderada para cada dimensão, baseada nos pesos apresentados na Figura 1. A única dimensão que apresenta pesos diferentes é IVS-Infraestrutura Urbana; nesse caso, um peso maior é dado para o indicador de tempo de deslocamento casa-trabalho. Desse modo, em seguida, o IVS pode ser obtido através de uma média aritmética das três dimensões:

Figura 1
Categorização do IVS

(1) $$\mathrm{IVS}=\mathrm{IVS}=\frac{IVS.IU+IVS.CH+IVS.RT}{3}$$

Assim, pode-se obter os valores do IVS em nível municipal. É fundamental destacar que o IVS não objetiva demonstrar o nível de vulnerabilidade absoluta de cada município. Seu principal ganho é justamente mostrar em referências com a normalização dos melhores padrões de cada indicador de municípios do Brasil. Isto é, o IVS é muito mais um indicador de priorização de políticas públicas para contribuir para a redução da vulnerabilidade do que um “ranqueador” de municípios, como muitas vezes a mídia apresenta.

Os dados do IVS 2000 e 2010 foram desenvolvidos com base no Censo desses anos. Já o IVS 2023 foi estimado utilizando os dados da pesquisa de campo realizada pela SEAD em Mato Grosso do Sul (2023, p.2), via Diário Oficial Eletrônico n. 11.254, de 30 de agosto de 2023, por meio do decreto nº 16.263, de 29 de agosto de 2023, que “Institui o Grupo de Trabalho Interinstitucional responsável por realizar a Pesquisa Socioassistencial no Estado de Mato Grosso do Sul”.

A pesquisa foi desenvolvida pela Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos (SEAD) do Governo do Estado de Mato Grosso do Sul (MS), em parceria com a Superintendência de Inteligência de Dados (SID) da Secretaria-Executiva de Gestão Estratégica e Municipalismo (SEGEM-SEGOV), abrangendo todos os municípios do estado, visando avaliar o IVS para o ano de 2023. Esta pesquisa consistiu em amostra aleatória simples dos domicílios das bases de dados obtidas pela Secretaria de Estado de Saúde (SES) e pela Empresa de Saneamento Básico de Mato Grosso do Sul (SANESUL) nos 79 municípios do estado.

Foram aplicados sete blocos de perguntas nos questionários, sendo: a) Bloco 1 - Sobre o chefe de família; b) Bloco 2 - Sobre a moradia; c) Bloco 3 - Sobre as pessoas; d) Bloco 4 - Sobre os estudos; e) Bloco 5 - Sobre o trabalho e renda; f) Bloco 6 - Sobre segurança alimentar e nutricional; e g) Bloco 7 - Sobre os valores e temas que mais preocupam o entrevistado. Foram realizadas 25.850 entrevistas em todo estado, com erro de estimação entre 5% e 7% nos municípios e de apenas 1% para o estado todo. Na Tabela 2, é possível verificar os valores para padronização dos indicadores no estado de MS.

Tabela 2
Valores de referência para padronização IVS

Indicador	Valores de referência do indicador
	Melhor situação (0,000)	Pior situação (1,000)
Percentual de pessoas em domicílios com abastecimento de água e esgotamento sanitário inadequados	0,0	40,2
Percentual da população que vive em domicílios urbanos sem serviço de coleta de lixo	0,0	50,5
Percentual de pessoas que vivem em domicílios com renda per capita inferior a meio salário mínimo e gastam mais de uma hora até o trabalho, no total de pessoas ocupadas, vulneráveis e que retornam diariamente	0,0	17,8
Mortalidade até 1 ano de idade	0,0	52,5
Percentual de crianças de 0 a 5 anos de idade que não frequentam a escola	0,0	98,5
Percentual de pessoas de 6 a 14 anos de idade que não frequentam a escola	0,0	15,2
Percentual de mulheres de 10 a 17 anos de idade que tiveram filhos	0,0	7,6
Percentual de mães chefes de família sem fundamental completo e com pelo menos um filho menor de 15 anos de idade, no total de mães chefes de família	0,0	35,5
Taxa de analfabetismo da população de 15 anos ou mais de idade	0,0	42,1
Percentual de crianças que vivem em domicílios em que nenhum dos moradores tem o ensino fundamental completo	0,0	87,3
Percentual de pessoas de 15 a 24 anos de idade que não estudam, não trabalham e possuem renda domiciliar per capita igual ou inferior a meio salário mínimo (2010), na população total dessa faixa etária	0,0	34,3
Proporção de pessoas com renda domiciliar per capita igual ou inferior a meio salário mínimo (2010)	0,0	100,0
Taxa de desocupação da população de 18 anos ou mais de idade	0,0	18,0
Percentual de pessoas de 18 anos ou mais de idade sem fundamental completo e em ocupação informal	0,0	89,9
Percentual de pessoas em domicílios com renda per capita inferior a meio salário mínimo (de 2010) e dependentes de idosos	0,0	10,5
Taxa de atividade das pessoas de 10 a 14 anos de idade	0,0	30,1

Além dos valores de referência, também se tem uma categorização de acordo com os resultados e o enquadramento da vulnerabilidade em muito baixa, baixa, média, alta e muito alta.

3 A VULNERABILIDADE SOCIAL EM MS E SEUS MUNICÍPIOS EM 2000, 2010 E 2023

Ao analisar o comportamento da vulnerabilidade no estado de MS e em seus municípios, fica explícita a tendência de diminuição da vulnerabilidade entre 2000 e 2010, saindo de 0,42 para 0,29. Posteriormente, ocorreu um regresso para o nível muito próximo ao de 2000, ficando em 0,41. Isto é, no período de 2000 até 2023, ocorreu uma diminuição da vulnerabilidade bastante sensível, como pode ser observada na Tabela 3. Uma hipótese a ser investigada seria o impacto da pandemia do coronavírus na vulnerabilidade. Entretanto, esse não é o escopo desta pesquisa.

Tabela 3
Valores do IVS 2000, 2010 e 2023

Período	2000	2010	2023
IVS - Geral	0,42	0,29	0,41
IVS - Estrutura urbana	0,29	0,22	0,53
IVS - Capital Humano	0,51	0,37	0,44
IVS - Renda e Trabalho	0,46	0,27	0,27

A infraestrutura urbana é a dimensão que fica mais crítica ao longo da série temporal. Ocorreu uma sensível melhora entre 2000 e 2010, saindo de 0,29 para 0,22. Entretanto, ela passou a ter valores categorizados como muito altos em 2023, sendo 0,53. No Gráfico 1, a seguir, fica mais evidente a evolução dessas dimensões ao longo do período.

Gráfico 1
IVS Geral e suas dimensões em MS em 2000, 2010 e 2023

A única dimensão que conseguiu manter a diminuição da vulnerabilidade do período de 2000 até 2010 foi justamente a de Renda e Trabalho. Nela, de fato ocorreu um avanço importante na redução do indicador. Já o capital humano seguiu a lógica do IVS - Geral, com uma melhora importante de 2000 até 2010, mas com uma queda até 2023. Isso fica mais evidente para os municípios quando se observa a Figura 2 a seguir, com a espacialização dos valores de IVS pelo estado de MS.

Figura 2
IVS - Geral 2023, 2010 e 2000

Analisando a evolução do IVS - Geral, fica claro que, no ano de 2010, teve-se o maior número de municípios enquadrados em vulnerabilidade baixa e muito baixa. Em 2023, alguns municípios com vulnerabilidade baixa e muito baixa retrocederam para médio ou alta. Nesse mesmo ano, apenas um município ficou com a vulnerabilidade muito baixa e dez municípios apresentaram um índice de vulnerabilidade baixo; vinte e três tiveram um índice considerado médio, trinta e um enfrentaram índice alto e quatorze foram enquadrados na pior categoria de vulnerabilidade, com um índice muito alto. Ou seja, mais da metade dos municípios do estado de MS estão com a vulnerabilidade do IVS elevada.

Na dimensão de infraestrutura urbana, demonstrada pela Figura 3, a elevação da vulnerabilidade fica ainda mais clara. No período de 2010 a 2023, observa-se que uma grande quantidade de municípios com vulnerabilidade baixa e muito baixa passaram a ser enquadrados nos índices de média, alta e muito alta vulnerabilidade em 2023.

Figura 3
IVS - Estrutura Urbana 2023, 2010 e 2000

No que se refere ao capital humano, apesar de haver patamares de vulnerabilidade ainda médios, altos e muito altos, pode-se observar, na Figura 4, uma melhora no período de 2000 até 2023. Alguns municípios com “muito alta” vulnerabilidade, em 2000, reduziram para vulnerabilidade alta e média, alguns até reduzindo o índice para baixa.

Figura 4
IVS - Capital Humano

Na dimensão IVS - Renda e Trabalho, representada pela Figura 5, o avanço foi significativo. Praticamente em todo o estado ocorreram avanços entre 2000 para 2023, com significativa redução da vulnerabilidade.

Figura 5
IVS - Renda e trabalho

Na Figura 6, pode-se observar a espacialização do IVS - Geral em comparação de 2023 com 2000 e 2023 com 2010. A coloração azul indica os municípios com redução de vulnerabilidade; já em vermelho são aqueles que apresentaram aumento da vulnerabilidade no período comparado. De um modo geral, os municípios de MS reduziram sua vulnerabilidade na comparação entre 2023 e 2000. Entretanto, ocorreu uma elevação da vulnerabilidade entre 2010 e 2023.

Figura 6
Comparações IVS - Geral

Quando é analisada a taxa de crescimento do PIB, na Tabela 3, pode-se verificar que a média de crescimento anual tem uma redução significativa entre os períodos de 2002 a 2010 e os períodos subsequentes. Então, de fato, tem-se alguns indícios de que foi vivenciada uma espécie de “era de ouro” econômica nos anos 2000. Esse pode ser um dos fenômenos por trás da boa redução da vulnerabilidade do estado entre os IVSs de 2000 e 2010, o que pode ser verificado de modo mais claro no gráfico a seguir, com os valores do estado como um todo.

Tabela 3
Taxas de crescimento do PIB Municipal - preços de mercado (preços de 2010), agrupados por microrregião

Microrregião	Taxa de crescimento
	2002-2010	2010-2018	2018-2021
Baixo Pantanal	76%	-2%	4%
Aquidauana	40%	10%	12%
Alto Taquari	17%	23%	6%
Campo Grande	61%	18%	-1%
Cassilândia	30%	49%	24%
Paranaíba	77%	13%	-20%
Três Lagoas	45%	68%	-3%
Nova Andradina	53%	24%	18%
Bodoquena	36%	29%	27%
Dourados	45%	47%	23%
Iguatemi	58%	50%	27%
Média total	49%	30%	11%
Média anual no período	5,43%	3,32%	2,65%

O Gráfico 2 mostra o comportamento da variação anual do PIB do estado entre 2000 e 2021. A reta apresenta a média do período; até 2013, tivemos percentuais de crescimento acima da média, mais predominantes do que após 2013. Depois de 2014, praticamente todo o período é marcado por um crescimento abaixo da média, exceto no período da pandemia, que foi bastante atípico, marcado por uma forte demanda por commodities, boa safra e preços em dólar em elevação, somados à taxa de câmbio desvalorizada. Ou seja, uma conjunção de fatores atípicos.

Gráfico 2
PIB Mato Grosso do Sul - preços de mercado - variação anual

Quando se observa as mesorregiões, algumas questões importantes emergem. Uma queda relativa da taxa de crescimento anual entre os períodos é observada, na Tabela 3; entretanto, no último período (2018-2021), verifica-se uma taxa de crescimento na região sudoeste do estado importante, destacando-a das demais. O IVS demonstra que essa região concentra bastante vulnerabilidade social, ao mesmo tempo que o IVS - Renda e Trabalho apresentou grande melhora no mesmo local.

Tabela 3
Taxas de crescimento do PIB Municipal - preços de mercado (preços de 2010), agrupados por Mesorregião

Mesorregião	2002-2010	2010-2018	2018-2021
Pantanal Sul-Mato-Grossense	62%	2%	6,68%
Centro Norte de Mato Grosso do Sul	54%	18%	-0,43%
Leste de Mato Grosso do Sul	50%	45%	0,39%
Sudoeste de Mato Grosso do Sul	47%	46%	24,31%
Média	53%	28%	7,74%
Média anual	5,89%	3,11%	1,93%

Nesse sentido, tem-se que a vulnerabilidade está majoritariamente concentrada na infraestrutura urbana, leia-se água e esgotamento sanitário, coleta de lixo e deslocamento ao trabalho da população vulnerável. Esses indicadores apresentam influência de variáveis econômicas, mas não uma relação direta. Portanto, é fundamental a priorização da melhora desses dados, para que o índice de vulnerabilidade apresente uma queda mais significativa.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho teve como objetivo principal apresentar o IVS em perspectiva histórica para o estado de MS, para os anos de 2000, 2010 e 2023, e analisar possíveis interfaces entre os indicadores de vulnerabilidade e o crescimento econômico no período. De um modo geral, ocorreu uma redução da vulnerabilidade entre 2000 e 2010, seguida por uma reversão até 2023. A despeito desta reversão, entre 2010 e 2023, na comparação entre 2000 e 2023, MS reduziu a vulnerabilidade na grande maioria dos municípios. Resumidamente, as dimensões se caracterizaram:

• Infraestrutura Urbana: foi a dimensão mais crítica ao longo do tempo, com melhora entre 2000 e 2010, mas apresentando valores muito altos em 2023.

• Capital Humano: houve melhora importante de 2000 até 2010, mas depois ocorreu uma piora até 2023.

• Renda e Trabalho: foi a única dimensão que manteve a redução da vulnerabilidade do período de 2000 até 2010, com um avanço importante na redução do indicador. Caso as outras dimensões apresentassem a mesma performance deste IVS, a vulnerabilidade do estado cairia significativamente.

A infraestrutura urbana foi a dimensão mais crítica, enquanto a de renda e trabalho apresentou melhorias consistentes. Em 2023, mais da metade dos municípios ainda tem alta vulnerabilidade. O crescimento econômico significativamente alto entre 2000 e 2010 parece ter contribuído para a redução da vulnerabilidade, mas desde então a magnitude do crescimento foi reduzida. Recomenda-se priorizar melhorias na infraestrutura urbana para reduzir a vulnerabilidade, especialmente no acesso à água, ao esgotamento sanitário, à coleta de lixo e ao deslocamento ao trabalho da população vulnerável, para que o índice de vulnerabilidade apresente uma queda mais significativa, pois esta dimensão tem prejudicado mais significativamente a busca pela redução da vulnerabilidade do estado.

DISPONIBILIDADE DE DADOS

Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.

• 4
  Uma compreensão mais ampla de pobreza e vulnerabilidade no contexto global pode ser obtida em Sen (1999 e 2001).
• 5
  Largamente baseada em Cochran (1977), Crease (2011), Hair et al. (2009) e Klein (2012).
• FINANCIAMENTO
  Agradecimentos à Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul (FUNDECT), pelo financiamento da pesquisa.

REFERÊNCIAS

• COCHRAN, William Gemmell. Sampling techniques New York: John Wiley & Sons, 1977.
• COSTA, Marco Aurélio; SANTOS, Maria Paula Gomes dos; MARGUTI, Bárbara Oliveira; PIRANI, Nikolas de Camargo; PINTO, Carlos Vinícius da Silva; CURI, Rodrigo Luis Comini; RIBEIRO, Clarisse Coutinho; ALBUQUERQUE, Clayton Gurgel de. Vulnerabilidade social no Brasil: conceitos, métodos e primeiros resultados para municípios e regiões metropolitanas brasileiras. Texto para Discussão IPEA 2364. Rio de Janeiro: IPEA, 2018.
• COSTA, Marco Aurélio; MARGUTI, Bárbara Oliveira. Atlas da vulnerabilidade social nos municípios brasileiros Brasília-DF: IPEA, 2015.
• CREASE, Robert P. World in the balance: the historic quest for an absolute system of measurement. New York: WW Norton & Company, 2011.
• HAIR, Joseph F., Jr.; BLACK, William C.; BABIN, Barry J.; ANDERSON, Rolph E.; TATHAM, Ronald L. Análise multivariada de dados Porto Alegre: Bookman Editora, 2009.
• INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA [IBGE]. Produto Interno Bruto dos Municípios Rio de Janeiro: IBGE, 2024. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/contas-nacionais/9088-produto-interno-bruto-dos-municipios.html?=&t=resultados . Acesso em: 29 dez. 2024.
  » https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/contas-nacionais/9088-produto-interno-bruto-dos-municipios.html?=&t=resultados
• KLEIN, Herbert Arthur. The science of measurement: A historical survey. Mineola: Courier Corporation, 2012.
• MATO GROSSO DO SUL. Decreto nº 16.263, de 29 de agosto de 2023. Institui o Grupo de Trabalho Interinstitucional responsável por realizar a Pesquisa Socioassistencial no Estado de Mato Grosso do Sul. Diário Oficial Eletrônico, n. 11.254, Campo Grande, MS, 30 ago. 2023.
• PROWSE, Martin. Towards a clearer understanding of ‘vulnerability’ in relation to chronic poverty Oxford: University of Manchester, 2003.
• SEN, Amartya. Democracia e justiça social. In: Iqbal, Farrukh; You, Jong-il (Org.). Democracy, market economics and development: an Asian perspective. Washington: World Bank, 2001.
• SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade São Paulo: Companhia das Letras, 1999.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  17 Nov 2025
• Data do Fascículo
  Jan-Dec 2025

Histórico

• Recebido
  30 Abr 2025
• Revisado
  12 Jun 2025
• Aceito
  12 Jun 2025