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O Fotojornalismo em pauta* * A entrevista é parte da pesquisa de pós-doutorado intitulada O Fotojornalismo nas Ciências Sociais, com supervisão da profa. dra. Mar

The Fotojournalism at the agenda

El Fotoperiodismo en pauta

Professor catedrático e investigador da Universidade Fernando Pessoa e do Centro de Investigação Media & Jornalismo, o português Jorge Pedro Sousa discute em seus trabalhos os diferentes aspectos do Jornalismo como teoria, história, técnicas de produção e publicações, tendo atuado como repórter em rádio e em dois jornais de Porto: o Primeiro de Janeiro e o Jornal de Notícias.

Recentemente, o pesquisador tornou-se membro do Colégio dos Brasilianistas da Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. Sua presença no Brasil tem sido recorrente desde a década de 90, pois já participou como professor visitante em cursos de Comunicação de diversas instituições de ensino brasileiras, como a Universidade Federal de Santa Catarina, Universidade Metodista de São Paulo, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Universidade Federal do Rio Grande do Norte e na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, entre outras.

Participa de sociedades científicas de Comunicação tanto no Brasil, como é o caso da Sociedade Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo (SBPJor), da qual é membro fundador; quanto na Europa, como é o caso da Asociación de Historiadores de la Comunicación e da Associação Portuguesa de Ciências da Comunicação (SOPCOM), da qual também é membro fundador. É ainda membro fundador da Associação Iberoamericana de Ciências da Comunicação (AssIBERCOM).

O professor tem diversas publicações discutindo assuntos como história do jornalismo, jornalismo de guerra, elementos do jornalismo e teorias do Jornalismo. Sua pesquisa mais recente trata da história da introdução do jornalismo em Portugal e analisa os primeiros dispositivos jornalísticos e pré-jornalísticos portugueses, bem como recupera a história da teorização sobre o Jornalismo em Portugal. Os seus livros mais conhecidos na Europa são os de língua inglesa, como Telling the World in the 17th Century, Surrogate Narratives, Print Journalim in Early Modern Portugal e o capítulo sobre a história da imprensa portuguesa na Monarquia do livro A History of the Press in the Portuguese Speaking Countries. Já no Brasil, o autor publicou Teorias da notícia e do jornalismo (Argos) e Uma história crítica do fotojornalismo ocidental (Argos e Letras Contemporâneas em 2004). Este último é quase uma leitura obrigatória para quem se interessa por fotografia.

A entrevista a seguir foi realizada em fevereiro de 2014, em visita técnica realizada a Universidade Fernando Pessoa, em Porto, Portugal, e trata sobre a discussão atual sobre a formação acadêmica, produção e a profissionalização do fotojornalismo e sua relação com os inúmeros cidadãos-repórteres. Após as mudanças no cenário profissional brasileiro nos últimos tempos, o contato com o professor Jorge Pedro Sousa foi retomado em agosto de 2016, por e-mail, para uma atualização das principais questões a respeito da atuação dos fotojornalistas, seja na Europa ou na América Latina.

Revista Intercom – Como foi passar de um profissional que produz tanto matérias e, eventualmente, fotos, para um profissional que analisa e pensa o jornalismo ou o fotojornalismo?

Jorge Pedro Souza – Eu não senti uma transformação muito radical porque o jornalista usa essencialmente a palavra para comunicar, assim como o pesquisador, principalmente os das ciências humanas e das ciências sociais. O jornalista recorre à realidade, de alguma maneira como o pesquisador também escreve sobre a realidade e analisa realidades. Por isso, há algumas semelhanças entre o ofício de pesquisador e o ofício de jornalista. Eu, sinceramente, não senti como uma transição real. Foi quase como uma sequência daquilo que eu já vinha fazendo como jornalista.

Revista Intercom – Como você pensa o processo reflexivo entre a profissão de jornalista e pesquisador uma vez que o jornalista trabalha com o imediato?

J.P.S. - É uma questão de adaptação. Nós desempenhamos vários papéis sociais na vida e, portanto, o jornalista pode assumir o papel social de pesquisador. Ele tem que se preparar para isso. E só quem pode preparar um jornalista para ser um pesquisador é a universidade. Portanto, a universidade age na formação de jornalista, mas, concomitantemente, também dá a esse jornalista, ou aos jornalistas em formação, as ferramentas para depois irem pesquisar sobre o jornalismo.

Revista Intercom – E como isso aparece nessa formação que é bastante voltada para o mercado?

J.P.S. – Vocês têm um trabalho de conclusão de curso, não? No qual já têm que pesquisar sobre alguma coisa, e depois o mestrado, em que também se pesquisa. Portanto, é à universidade que compete formar jornalistas em termos de conhecimentos teóricos e metodológicos para a pesquisa. Penso que a universidade dá as ferramentas essenciais para que um jornalista que também queira fazer pesquisa em Jornalismo consiga desenvolver apropriadamente essa profissão. A prova disto é que você e eu fazemos pesquisa sobre jornalismo. Outros formados em Jornalismo também fazem pesquisas em outras áreas. Isso mostra que a universidade, de maneira geral, dá aos candidatos à formação jornalística, competências e conhecimentos suficientes para desenvolver pesquisas.

Revista Intercom – Existe uma questão hoje que é a da interdisciplinaridade. Como você percebe isso já que o jornalista tem uma formação que passa por diferentes disciplinas?

J.P.S. – A interdisciplinaridade pode ser relevante para estudar determinados fenômenos desde que as diferentes disciplinas científicas não percam onde está o seu objeto e as suas técnicas específicas de pesquisa. Mas penso que o Jornalismo, sendo uma área das Ciências Sociais aplicadas e das humanidades, dá efetivamente ferramentas para o jornalista poder desenvolver pesquisa em áreas afins não circunscritas somente aos estudos jornalísticos. A própria formação universitária do jornalista leva em conta que os jornalistas vão atuar em diferentes setores da sociedade e precisam apreender conhecimentos das outras ciências sociais como da Antropologia, da História, da Economia... Quero dizer com isso que a própria formação universitária em Jornalismo é plural para permitir também que um profissional formado em Jornalismo possa desenvolver pesquisa e se aprofundar em áreas afins.

Revista Intercom – Ao longo do século 20 o jornalismo sofreu transformações técnicas de texto e imagem. Quais são as influências da formação em Comunicação Social nessa mudança da produção?

J.P.S. – Bem, nas universidades nós nos tornamos aptos a produzir diferentes tipos de enunciados jornalísticos determinados pelas técnicas da profissão, mas eu penso que a universidade também dá contribuições ao pensamento criativo. Isto é, contribui para que os jornalistas sejam capazes de violar as técnicas ou ultrapassá-las para conseguir produzir enunciados jornalísticos com outros valores ou que agreguem valores à informação. De qualquer modo, penso que para violar as técnicas, sabendo o que se faz, é preciso, em primeiro lugar, dominá-las. Dessa forma, continua a ser importante que as universidades ensinem as técnicas fundamentais da enunciação jornalística, da imagem, do texto e das diferentes ferramentas midiáticas.

Revista Intercom – Atualmente, há um canal de participação ou de produção do leitor ou do ouvinte para os jornais, principalmente, em termos de imagem e notas para o rádio. Como você percebe essa novidade na produção?

J.P.S. – Eu penso que os jornalistas não detêm o monopólio da informação, no entanto, há que se separar a informação produzida por um profissional. O jornalista, ao menos teoricamente, tem que respeitar os princípios éticos e os princípios da atuação profissional e da fabricação da informação. Já os cidadãos não são submetidos às mesmas questões de responsabilidade profissional e aos mesmos princípios éticos profissionais. Há que se separar a informação produzida pelo cidadão da informação produzida por jornalistas. A avaliação dessa informação deve ser necessariamente diferente. Quando ela é muito semelhante, é porque algo está errado com o jornalismo e não com os cidadãos. Quando os jornalistas não verificam a informação ou não contrastam a informação com base em princípios éticos, estão subvertendo sua profissão e demonstrando à sociedade que não são assim tão importantes já que o cidadão-repórter poderia substituí-los. Bom, mas eu não compartilho dessa posição, pois só o jornalista é capaz de aprofundar a informação, ser rigoroso e verificar a informação que dizem. O jornalista que se rege por princípios éticos produz sempre a informação com uma qualidade e uma utilidade para a sociedade muito diferente daquela que é produzida por um cidadão-repórter. Mas eu penso que o cidadãorepórter tem o seu lugar e pode ser acolhido. É acolhido. É inevitável devido às novas tecnologias da informação. O cidadão-repórter é acolhido em uma esfera condicional...

Revista Intercom –Você percebe que em alguns momentos, há uma entonação e uma pausa que é muito semelhante a do repórter profissional?

J.P.S. – O cidadão está aprendendo na convivência com os media. Eles foram interiorizando as técnicas da edição jornalística devido a sua convivência diária com a mídia. Estão imitando-as, pois estão submersos cotidianamente em milhares de mensagens midiáticas. Esse convívio diário e permanente com mensagens midiáticas, claro, tem efeito de levar o cidadão a habituar-se às mensagens jornalísticas, tornando-os capaz de imitar as técnicas de expressão do jornalismo.

Revista Intercom – Como você vê a produção da “verdade” do acontecimento em questões mais complexas como a política? 1 1 A pergunta foi sugerida pela coautora Marcilia Mendes em sua leitura da primeira versão da entrevista.

J.P.S. – Eu penso que estamos, então, em outra esfera. Tanto pode ser verdadeiro o cidadão como o jornalista. O que interessa aqui é a verdade como verdade discursiva. Isto é, uma articulação entre o que é dito ou mostrado e a realidade. Portanto, quando há uma articulação entre o que é dito ou mostrado e a realidade, quanto à essência então, podemos falar e considerar como uma verdade. Muito embora eu não esteja tratando a verdade como princípio filosófico, mas como aquilo que há de comum da realidade com aquilo que é falado ou dito. A verdade não é monopólio dos jornalistas. Nesse sentido, a verdade pode ser enunciada por um cidadão ou por um jornalista que pode deter o monopólio da verdade. Agora, eu penso que quando a verdade produz diferentes enunciados, então os enunciados têm que ser semelhantes independentemente de quem faz a enunciação. Entretanto, como disse há pouco, o jornalista é regido por princípios éticos e de verificação da informação que lhe conferem maior probabilidade de enunciar coisas verdadeiras em relação àquilo que pode fazer um cidadão.

Revista Intercom – Você analisou como pesquisador ou orientador de pesquisas alguns temas como guerra e política. Eu gostaria que você falasse sobre a importância desses temas no jornalismo atual.

J.P.S. – Bem, a guerra é um tema atemporal. O próprio fotojornalismo nasce com a cobertura de guerra e são as guerras que afirmam o fotojornalismo para além da política. A política também foi importante, por retratar as personalidades, as individualidades, as pessoas que tinham uma vida política, tudo o que pautava a vida das outras pessoas, mas a guerra também foi um tema que cultuou o meu interesse sobre a iconografia informativa, como em minha última pesquisa sobre a grande guerra de Portugal. A guerra da Crimeia, a guerra da Secessão e também a guerra do Paraguai, na América Latina, todas foram travadas num espaço de cerca de 30 anos. Não foi apenas o detonante do interesse pelo fotojornalismo, transformou-se em uma constante de interesse do fotojornalismo até os dias de hoje, com vários tipos de abordagem. Uns fotojornalistas que suavizam o horror da guerra, outros que acentuam os efeitos devastadores da guerra, mas a guerra se manteve como uma constante e, ainda hoje, a forma como se faz a cobertura é objeto de debate. Tanto para os fotojornalistas livres, como para os fotodocumentaristas de guerra se exige muito tempo em determinadas posições, como, por exemplo, para ter a fotografia do “instante decisivo” 2 2 Expressão cunhada pelo fotógrafo Henri Cartier-Bresson. .

Há variadíssimas formas de abordagem da guerra que ainda hoje continuam a ser discutidas, tal como foram discutidas no passado: deve o fotojornalista mostrar o horror da conflito ou deve suavizar o discurso? A verdade é tentar mostrar o horror sugerindo apenas, como, por exemplo, uma foto do espanto das pessoas? O fotojornalista deve aceitar em termos éticos o compromisso de se submeter a um funcionário numa unidade militar para cobrir uma guerra? Portanto, a questão do jornalismo são questões que já vêm há vários anos e que continuam muito presentes hoje.

Revista Intercom – No fotojornalismo atual ou cotidiano o que mais chama a sua atenção?

J.P.S. – A pornografia de imagens (risos). Isto é, no momento, há tantas imagens circulando na internet que o fotojornalismo enquanto profissão tende a ser desvalorizado. Mais do que isso, a especialização em fotojornalismo também está sendo desvalorizada mesmo dentro do jornalismo profissional, porque se privilegia gente com menos competência. O jornalista é hoje multimídia. Faz tanto fotojornalismo como vídeo-jornalismo, como redação e, portanto, isso gerou certa desvalorização prática, mas também simbólica do fotojornalismo com texto. Essa desvalorização ainda vai se acentuar mais devido à proliferação de dispositivos que permitem a todas as pessoas fazerem fotografias com celular. Como sabemos muito bem, agora temos smartphones muito inteligentes por meio dos quais se obtém fotografias com muita qualidade que podem ser disponibilizadas imediatamente nas redes sociais. É a isso que eu chamo de uma pornografia de imagens. Uma vastidão de produção de imagens pelos mais diferentes tipos de pessoas que dificulta e vulgariza... Uma vulgarização da imagem fotográfica que dificulta o entendimento do trabalho do fotojornalista como uma especificidade. E ainda tem mais. Com essa vulgarização torna-se difícil entender a qualidade fotográfica ou onde é que está a qualidade fotográfica. A maioria das pessoas não sabe o que é. Não tem letramento visual para entender o que é uma imagem com qualidade, especialmente, com qualidade fotojornalística. Existe uma novidade que é o fato de que apesar disso tudo o fotojornalismo tem ganhado uma importância em relação ao texto. É uma contradição. Na internet, temos os slideshows e algumas reportagens que conseguem ter valor informativo e acabam publicando essas imagens.

Revista Intercom – Você considera também isso uma pornografia? Digo, o jornal começou com o relato oral, que era uma fonte de informação para aquele que não sabia ler, e a sociedade retorna a isso quase um século depois com a fotografia e um texto curto... Gostaria que você falasse sobre isso.

J.P.S. – De certa forma, essa vulgarização das imagens dificulta o pensamento crítico sobre a realidade, e talvez esse pensamento seja mais bem exercido pelo consumo de texto escrito, mas ainda assim nós podemos encontrar no fotojornalismo com qualidade e com autoria uma vulgarização das imagens. Nesse fotojornalismo, nós encontramos fotografias que comentam a própria realidade e que assumem um ponto de vista sobre ela. Não são aquelas fotografias apenas enfáticas, bem expostas, nítidas. São fotografias que, às vezes, revelam os lados mais escondidos das coisas, os pormenores e os detalhes. As fotografias que dão pistas para a compreensão do que está em causa no acontecimento. Este tipo de imagens são imagens que não apenas documentam de uma forma enfática. Imagens que tendem a apreciar melhor a realidade, comentando, construindo ponto de vista sobre ela... São imagens que só se consegue obter depois de um grande estudo e na obtenção de um grande letramento visual. Por isso, é que o fotojornalismo ou a especificidade do fotojornalismo deveria ser mais valorizado. Tal como as outras especificidades ou especialidades dentro do jornalismo. É preciso ser especialista e no caso do fotojornalismo é preciso um grande letramento visual. Eu até diria um grande letramento fotovisual informativo, ou fotoinformativo, se quisermos fazer fotografias com qualidade.

Revista Intercom– Não sei se você soube, mas houve uma demissão em massa de fotojornalistas da grande imprensa no Brasil. Você poderia fazer uma análise dessa mudança?

J.P.S. – Essa mudança é negativa, mas era esperada, dada a proliferação de celulares inteligentes. O jornalismo, no entanto, precisa de fotojornalistas profissionais que aliem uma sólida formação em Jornalismo a uma sólida formação em Fotografia e se comprometam eticamente com a profissão.

Revista Intercom – Quais diferenças você percebe na produção do fotojornalismo europeu e da América Latina? E quais são as consequências destas para o público em geral e nos aspectos políticos, sociais e econômicos para os chefes de Estado?

J.P.S. - A professora Dra. Zaclis Veiga, que foi minha orientanda de doutorado, descobriu que, inversamente ao que sustenta Nelson Traquina, os fotojornalistas portugueses e brasileiros, por exemplo, não são uma tribo. Têm, tendencialmente, formação e práticas diferentes. Os fotojornalistas brasileiros tendem a ser formados em Jornalismo e em ver a fotografia como um dispositivo predominantemente informativo; os fotojornalistas portugueses têm, geralmente, formação em Fotografia e tendem a situar a imagem fotojornalística na fronteira entre a informação e a arte. Por isso, os fotojornalistas brasileiros tendem a ser mais realistas e “objetivos” do que os portugueses na representação fotográfica da realidade material. Assim, os fotojornalistas portugueses tendem a dessacralizar mais os políticos e a política por meio da fotografia.

Revista Intercom – Em um trecho do seu livro “Uma história crítica do fotojornalismo ocidental”, você escreve sobre o visível que se transforma em legível através da imagem fotográfica. “O mundo sofre uma metamorfose que o torna um conjunto de signos exploráveis através da fotografia, ou seja, da linguagem da fotografia”. E, num outro momento, você afirma que existem notícias que não são fotografáveis. Coisas que são contraditórias. Queria que você falasse sobre esse mundo que se pensa todo fotografável e desse outro mundo que não se conta em imagens porque precisa de outra forma de compreensão.

J.P.S. – Eu continuo a me ver naquilo que escrevi, isto é, há ocorrências e fatos no mundo que infelizmente não são fotografáveis. Aliás, o que acontece é que as imagens têm algumas debilidades em termos fotogênicos. Por exemplo, as imagens não conseguem mostrar conceitos abstratos. Nós não podemos fotografar a inflação. Nós podemos sugerir a inflação com fotografias dos preços, das lojas, enfim, a imagem tem algumas habilidades, mas ela não é tão versátil como o texto e a palavra no registro do real.

Revista Intercom – Nesse sentido, gostaria de saber como funcionam os prêmios de fotojornalismo, porque essas imagens circulam o mundo inteiro como “as imagens” ou “o registro do real” do ano que passou...

J.P.S. – É verdade. Pelo menos há uma valorização do fotojornalismo e tudo aquilo que valoriza o fotojornalismo para mim é importante. Isto porque... Vamos à primeira parte da sua pergunta que é importante. Nós vivemos em um mundo em que o fotojornalismo está lutando... O fotojornalista está lutando pela sua legitimidade e pelo seu espaço especializado dentro do jornalismo num momento em que é olhado com crescente desinteresse, com desconfiança, mas, principalmente, com desinteresse. Isso ocorre porque de alguma forma se instalou o entendimento de que todos podem ser fotojornalistas mesmo que não possuam um abundante letramento visual, mesmo que não seja um especialista nesta técnica do jornalismo. Os prêmios valorizam a especialização de fotorrepórter, mas podem ser criticados. Por exemplo, há fotojornalistas que criticam o prêmio em que é preciso mandar as fotografias para serem objetos de avaliação. Uma vez um fotojornalista disse: “ah, eu não concordo porque os avaliadores deviam ir observando ao longo do ano as fotografias produzidas pelos fotorrepórteres”. Bem, mas isso é impossível, é impossível observar a produção de todas as milhares de fotografias realizadas por fotojornalistas no mundo. Portanto, os concursos têm esta faceta de valorização da profissão do fotojornalista, de relembrar e marcar a importância do fotojornalismo na produção simbólica profissional e na produção de informação sobre a atualidade, sobre os problemas e os acontecimentos que marcam o cotidiano e, por conseguinte, marcam a história. Então, essa questão das imagens... As imagens do ano funcionam como imagens-símbolo daquilo que aconteceu. Os seres humanos de alguma forma precisam de símbolos. Estão sempre significando o mundo. Esse simbolismo está nessas imagens que são selecionadas... Elas próprias simbolizam também acontecimentos e problemas passados. Tem outra dignidade enquanto imagens simbólicas sobre aquilo que aconteceu.

Revista Intercom – Isso implica algumas questões sociais e políticas de uma produção de realidade e de um registro oficial, que acaba sendo uma memória do país ou daquilo que o prêmio envolve. Como o fotojornalismo pode contribuir na produção de conhecimento?

J.P.S. – O fotojornalismo tem a ver com as imagens. Nós podemos produzir conhecimento sobre a realidade. As imagens não apelam apenas para a emoção. Apelam também para a cognição. Nós apreendemos aspectos da realidade utilizando imagens. Entre as imagens estão necessariamente a fotografia e a iconografia. O fotojornalismo, como outras formas de compreensão da realidade que utilizam imagens, é uma maneira de produzir conhecimento sobre a atualidade, sobre aquilo que se passa, os problemas e os acontecimentos.

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    A pergunta foi sugerida pela coautora Marcilia Mendes em sua leitura da primeira versão da entrevista.
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    Expressão cunhada pelo fotógrafo Henri Cartier-Bresson.
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    A entrevista é parte da pesquisa de pós-doutorado intitulada O Fotojornalismo nas Ciências Sociais, com supervisão da profa. dra. Mar

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2016
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