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A deficiência de adenina fosforibosiltransferase leva à disfunção do aloenxerto renal em receptores de transplante renal: uma revisão sistemática

Resumo

Antecedentes:

A deficiência de adenina fosforibosiltransferase (APRT) tem grandes implicações na sobrevida do enxerto em pacientes transplantados renais. Esta revisão sistemática investigou o padrão diagnóstico, a abordagem de tratamento e os desfechos do transplante renal entre pacientes transplantados renais com deficiência de adenina fosforibosiltransferase.

Material e métodos:

Os artigos que relatam sobre a enzima APRT e a disfunção do aloenxerto renal foram recuperados do PubMed/Medline, ScienceDirect, Biblioteca Cochrane e bancos de dados do Google Acadêmico. Utilizou-se a análise descritiva para extrair inferências.

Resultados:

Foram incluídos participantes que receberam 39 enxertos, a maioria dos quais provenientes de doadores vivos seguidos por doadores falecidos e doadores cadáveres. Foi relatado tempo de sobrevida do enxerto superior a 6 meses em 23 (76,7%) pacientes, enquanto outros 7 (23,3%) pacientes tiveram tempo de sobrevida do enxerto inferior a 6 meses. Apenas 4 (13,3%) pacientes apresentaram deficiência de APRT antes do transplante. Após acompanhamento, um terço dos pacientes, 10 (33,3%) apresentaram função do enxerto estável, 1 paciente teve perda do aloenxerto, 8 (26,6%) pacientes apresentaram função retardada do enxerto, enquanto os 11 (36,6%) pacientes restantes tiveram disfunção crônica do enxerto renal.

Conclusões:

A deficiência de APRT é uma causa subestimada e reversível de nefropatia cristalina que leva à disfunção do aloenxerto renal ou à perda total do aloenxerto. Os resultados deste estudo pedem a inclusão desta condição no diagnóstico diferencial de nefropatia cristalina, mesmo na ausência de um histórico de nefrolitíase.

Descritores:
Adenine Phosphoribosyltransferase; Insuficiência renal; Deficiência de adenine fosforibosil transferase (APRT); disfunção do enxerto renal; 2,8 dihidroxiadenina; Nefropatia por cristal de 2,8 DHA; 2,8 dihidroxiadeninuria; Terapia renal substitutiva

Abstract

Background:

Adenine phosphoribosyl transferase (APRT) deficiency has great implications on graft survival in kidney transplant patients. This systematic review investigated the diagnostic pattern, treatment approach, and kidney transplant outcomes among kidney transplant patients with adenine phosphoribosyl transferase deficiency.

Material and methods:

Articles reporting the APRT enzyme deficiency and kidney allograft dysfunction were retrieved from PubMed/Medline, ScienceDirect, Cochrane library and Google scholar databases. Descriptive analysis was used to draw inferences.

Results:

The results from 20 selected studies covering 30 patients receiving 39 grafts had an average age of 46.37 years are presented. Graft survival time of more than 6 months was reported in 23 (76.7%) patients, while other 7 (23.3%) patients had graft survival time of less than 6 months. Only 4 (13.3%) patients had APRT deficiency before transplantation. After follow-up, one-third of the patients 10 (33.3%) had stable graft function, 1 patient had allograft loss, 8 (26.6%) patients had delayed graft function while the remaining 11 (36.6%) patients had chronic kidney graft dysfunction.

Conclusions:

APRT deficiency is an under-recognized, treatable condition that causes reversible crystalline nephropathy, leading to loss of allograft or allograft dysfunction. The study results showed that inclusion of genetic determination of APRT deficiency in the differential diagnosis of crystalline nephropathy, even in the absence of a history of nephrolithiasis, can improve renal outcomes and may improve allograft survival.

Keywords:
Adenina Fosforribosiltransferase; Renal Insufficiency; Adenine Phosphoribosyl Transferase (Aprt) Deficiency; Renal Allograft Dysfunction; 2,8-Dihydroxyadenine; 2,8-Dha Crystal Nephropathy; 2,8-Dihydroxyadeninuria; Renal Replacement Therapy

Introdução

A deficiência de adenina fosforibosiltransferase (APRT) é um raro distúrbio metabólico hereditário autossômico recessivo que gera 2,8-dihidroxiadenina em grande quantidade e pouco solúvel na urina, que se manifesta tipicamente como nefrolitíase recorrente, urolitíase, ou nefropatia cristalina, levando a lesão renal e/ou insuficiência renal11 Kaartinen K, Hemmilä U, Salmela K, Räisänen-Sokolowski A, Kouri T, Mäkelä S. Adenine phosphoribosyltransferase deficiency as a rare cause of renal allograft dysfunction. J Am Soc Nephrol. 2014 Apr;25(4):671-4.,22 Nasr SH, Sethi S, Cornell LD, Milliner DS, Boelkins M, Broviac J, et al. Crystalline nephropathy due to 2,8-dihydroxyadeninuria: an under-recognized cause of irreversible renal failure. Nephrol Dial Transplant. 2010 Jun;25(6):1909-15..

Esta forma genética subestimada de cálculo renal e/ou insuficiência renal ocorre devido a uma mutação p.Gln147X no gene da adenina fosforibosiltransferase33 Valaperta R, Rizzo V, Lombardi F, Verdelli C, Piccoli M, Ghiroldi A, et al. Adenine phosphoribosyltransferase (APRT) deficiency: identification of a novel nonsense mutation. BMC Nephrol. 2014 Jul 1;15:102.. Este gene (p.Gln147X) tem aproximadamente 2,6 kb de comprimento, contém cinco éxons e quatro íntrons, codifica uma proteína de 180 resíduos de aminoácidos44 Broderick TP, Schaff DA, Bertino AM, Dush MK, Tischfield JA, Stambrook PJ. Comparative anatomy of the human APRT gene and enzyme: nucleotide sequence divergence and conservation of a nonrandom CpG dinucleotide arrangement. Proc Natl Acad Sci U S A. 1987 May;84(10):3349-53., e está posicionado no cromossomo 16q2455 Tischfield JA, Ruddle FH. Assignment of the gene for adenine phosphoribosyltransferase to human chromosome 16 by mouse-human somatic cell hybridization. Proc Natl Acad Sci U S A. 1974 Jan;71(1):45-9..

Mais de 40 mutações na região de codificação do gene da adenina fosforibosiltransferase foram detectadas nas variantes alélicas patológicas de 300 indivíduos afetados de mais de 25 países, a maioria dos quais (200) eram do Japão33 Valaperta R, Rizzo V, Lombardi F, Verdelli C, Piccoli M, Ghiroldi A, et al. Adenine phosphoribosyltransferase (APRT) deficiency: identification of a novel nonsense mutation. BMC Nephrol. 2014 Jul 1;15:102.; mas estudos in vitro e in vivo revelaram que apenas cinco variantes alélicas são atualmente responsáveis pela inativação completa da proteína APRT. Alterações no gene APRT têm sido descritas como mutações frameshift, missense, nonsense e pequenas deleções/inserções que variam em tamanho de 1 a 8 pares de bases33 Valaperta R, Rizzo V, Lombardi F, Verdelli C, Piccoli M, Ghiroldi A, et al. Adenine phosphoribosyltransferase (APRT) deficiency: identification of a novel nonsense mutation. BMC Nephrol. 2014 Jul 1;15:102.. Este distúrbio é comumente observado em adultos, mas pode ocorrer em todas as faixas etárias e estágios da doença, com a maioria dos pacientes diagnosticados em insuficiência renal em fase terminal ou após transplante renal.

A enzima APRT pertence à família de enzimas Fosforibosil Transferase (PRTase) do Tipo 1. Ela catalisa a formação de adenosina 5'-monofosfato (5'-AMP) e pirofosfato (PP) a partir de adenina e 5-fosforibosil-1-pirofosfato.

A conversão de adenina em adenosina é interrompida na ausência de atividade da enzima APRT. A adenina é então impulsionada para metabolização através de uma via alternativa onde é transformada em 8-hidroxiadenina e 2,8-dihidroxiadenina (DHA) por xantina oxidase66 WYNGAARDEN JB, DUNN JT. 8-Hydroxyadenine as the intermediate in the oxidation of adenine to 2, 8-dihydroxyadenine by xanthine oxidase. Arch Biochem Biophys. 1957 Jul;70(1):150-6.. O DHA não é sistemicamente depositado77 Li J, Shingde M, Nankivell BJ, Tchan MC, Bose B, Chapman JR, et al. Adenine Phosphoribosyltransferase Deficiency: A Potentially Reversible Cause of CKD. Kidney Int Rep. 2019 May 7;4(8):1161-1170. e é insolúvel em qualquer pH fisiológico da urina. Leva à formação de cristais de 2,8-DHA na urina, resultando eventualmente em nefrolitíase por 2,8-DHA e/ou nefropatia cristalina. O DHA normalmente não ocorre como um produto metabólico em humanos.

A recidiva desta doença após o transplante renal e os desfechos clínicos ruins relatados até o momento para os pacientes são motivo de preocupação. Se reconhecido precocemente, o tratamento com uma dieta pobre em purinas, alta ingestão de líquidos, e análogos de xantina pode prevenir e reverter a insuficiência renal, ao reduzir a formação de 2,8-DHA.

No entanto, tem sido relatado que o diagnóstico de deficiência de APRT é extremamente variável devido à natureza radiolúcida dos cristais de DHA, e muitas vezes é diagnosticada erroneamente como cálculos de ácido úrico. Além disso, os cristais de DHA comportam-se da mesma forma que os cristais de oxalato na biópsia renal, uma vez que ambos são altamente birrefringentes e se depositam em citoplasma de células tubulares, lúmen tubular, levando a um diagnóstico equivocado de oxalose e doença renal crônica de etiologia desconhecida88 Rajput P, Virani ZA, Shah BV. Crystalline Nephropathy due to APRT Deficiency: A Preventable Cause of Renal and Renal Allograft Failure. Indian J Nephrol. 2020 Jul-Aug;30(4):290-292..

Para pacientes com urolitíase ou nefropatia por cristais, os seguintes testes diagnósticos foram usados para avaliar a deficiência de APRT: (i) análise do gene APRT, (ii) medição da enzima APRT em eritrócitos ou lisados de células vermelhas, (iii) caracterização de cristais de 2,8-DHA no sedimento urinário usando espectroscopia de infravermelho na biópsia, (iv) medição dos níveis de adenina em uma amostra de urina de 24 horas33 Valaperta R, Rizzo V, Lombardi F, Verdelli C, Piccoli M, Ghiroldi A, et al. Adenine phosphoribosyltransferase (APRT) deficiency: identification of a novel nonsense mutation. BMC Nephrol. 2014 Jul 1;15:102..

A deficiência de APRT parece ser um determinante importante em pacientes com nefrolitíase inexplicada ou nefropatia cristalina. As evidências existentes sugerem que este distúrbio metabólico tem grandes implicações na sobrevida do enxerto em receptores de transplante renal. Diante do exposto, esta revisão visa investigar o padrão diagnóstico, a abordagem de tratamento e os desfechos em receptores de transplante renal com deficiência de APRT.

Materiais e Métodos

Métodos de Pesquisa e Critérios para a Consideração de Estudos

Esta revisão sistemática seguiu as diretrizes da Meta-Analysis of Observational Studies in Epidemiology (MOOSE)99 Stroup DF, Berlin JA, Morton SC, Olkin A, Williamson GD, Rennie D, et al. Meta analysis of Observational Studies in Epidemiology: A Proposal for Reporting. JAMA. 2000;283(15):2008-2012. e o protocolo foi publicado em (PROSPERO: CRD42021234784) no Registro Prospectivo Internacional de Revisões Sistemáticas. A estratégia de pesquisa foi mantida após uma consulta detalhada com um especialista para uma sensibilidade de inclusão ideal. Para identificar os artigos desejados publicados desde o início, foi realizada uma extensa pesquisa bibliográfica nas seguintes bases de dados: PubMed, Biblioteca Cochrane, Google Acadêmico, e ScienceDirect. A estratégia de busca também foi estendida a periódicos relevantes para localizar os artigos que não estavam disponíveis nas bases de dados.

A busca eletrônica no banco de dados PubMed/Medline foi realizada por meio de filtros avançados e termos do Medical Science Heading (MeSH): (“deficiência de adenina fosforibosiltransferase (APRT)”[tiab] OU “cálculo renal recorrente”[tiab] OU “ 2,8-dihidroxiadenina”[tiab] OU nefropatia por cristais de 2,8-DHA OU 2,8-dihidroxiadeninúria OU deficiência de APRT tipo I OU Urolitíase, 2, 8-Dihidroxiadenina) E (transplante de rim OU transplante renal OU pacientes com transplante renal OU “disfunção do aloenxerto renal” [tiab] OU “homozigosidade” [tiab] OU “lesão renal induzida por cristal”[tiab] OU “Terapia renal substitutiva”[Mesh] OU “Transplante renal*”[tiab] OU “Diálise renal”[Mesh] OU “Hemodiafiltração”[Mesh] OU “Hemodiálise”[tiab] OU “Diálise peritoneal”[Mesh] OU “Enxerto renal”[tiab])). A verificação de similaridade para todos os artigos selecionados foi realizada por referência cruzada.

Critérios de Inclusão e Exclusão

Foram selecionados artigos sobre deficiência da enzima APRT em pacientes com transplante renal de todas as faixas etárias. Os critérios de exclusão foram discrepâncias não resolvidas nos dados ou repetição de dados em diferentes estudos ou deficiência de APRT não relatada, dados ausentes, duplicados ou barreira linguística [Figura 1].

Figura 1
Fluxograma PRISMA (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analysis) para seleção de estudos sobre disfunção do aloenxerto renal em receptores de transplante renal devido à deficiência de adenina fosforibosiltransferase.

Desfechos

Os desfechos do estudo incluíram características demográficas do paciente, histórico médico, diagnóstico, natureza dos cristais de 2,8-DHA, abordagem de tratamento e desfechos do transplante renal (número de enxertos renais recebidos, tempo de sobrevida do enxerto e status do aloenxerto renal).

Extração e Análise de Dados

Todos os artigos recuperados das bases de dados e na busca manual foram primeiro selecionados por dois autores [IR e AV] independentemente, através do título e resumo, para verificar a elegibilidade. Em seguida, os artigos elegíveis foram selecionados pelos autores [IR e AV] por meio do texto na íntegra com base na população do estudo, tamanho da amostra, variável de desfecho, localização do estudo, etc., de acordo com os critérios predefinidos.

Durante a fase de extração de dados, dois autores [PT, SD] foram designados para lidar com qualquer tipo de discrepância no estudo e nos dados. Foram excluídos os artigos com dados incompletos. A planilha do Microsoft Excel foi utilizada para gerenciar os dados extraídos sob os cabeçalhos das colunas: título do estudo, nome do periódico, ano de estudo, desenho do estudo, nome do 1º autor, localização do estudo, método diagnóstico utilizado, tempo de sobrevida do enxerto, doador de rim, tratamento, etc., dos artigos elegíveis. Utilizou-se análise estatística descritiva para extrair as inferências.

Avaliação Qualitativa

As ferramentas de Avaliação Crítica do Joanna Briggs Institute (JBI) foram utilizadas para avaliar a qualidade dos relatos de casos e das séries de casos. A ferramenta de Avaliação Crítica do JBI para relatos de casos apresenta uma lista de verificação de 8 itens que inclui dados demográficos do paciente, histórico, testes diagnósticos ou métodos de avaliação, intervenção, condição clínica, condição clínica pós-intervenção, eventos adversos e mensagem de remoção. A ferramenta de Avaliação Crítica do JBI para relatos de casos possui uma lista de verificação de 10 itens que inclui critérios de inclusão, métodos válidos usados para identificação da condição, condição medida de maneira padrão, inclusão completa de participantes, dados demográficos dos pacientes, inclusão consecutiva de participantes, informações clínicas, desfechos, dados demográficos específicos do local e análise estatística. A pontuação foi realizada utilizando a lista de verificação de itens e foram incluídos estudos que pontuaram acima de 50%.

Resultados

Características do Estudo e de Pacientes

Quarenta e um artigos elegíveis foram recuperados do MEDLINE/PubMed e dezessete (17) artigos elegíveis de outras fontes de dados [Figura 1]. A triagem inicial com base no título e no resumo encontrou um total de 58 artigos, dos quais 25 não preencheram os critérios de inclusão. A triagem final com base no texto na íntegra envolveu os 33 artigos restantes, dos quais 13 foram excluídos devido a desfechos indesejados, dados incompletos e duplicação. Os 20 estudos contendo 30 amostras foram considerados para revisão final e análise qualitativa11 Kaartinen K, Hemmilä U, Salmela K, Räisänen-Sokolowski A, Kouri T, Mäkelä S. Adenine phosphoribosyltransferase deficiency as a rare cause of renal allograft dysfunction. J Am Soc Nephrol. 2014 Apr;25(4):671-4.,22 Nasr SH, Sethi S, Cornell LD, Milliner DS, Boelkins M, Broviac J, et al. Crystalline nephropathy due to 2,8-dihydroxyadeninuria: an under-recognized cause of irreversible renal failure. Nephrol Dial Transplant. 2010 Jun;25(6):1909-15.,77 Li J, Shingde M, Nankivell BJ, Tchan MC, Bose B, Chapman JR, et al. Adenine Phosphoribosyltransferase Deficiency: A Potentially Reversible Cause of CKD. Kidney Int Rep. 2019 May 7;4(8):1161-1170.,88 Rajput P, Virani ZA, Shah BV. Crystalline Nephropathy due to APRT Deficiency: A Preventable Cause of Renal and Renal Allograft Failure. Indian J Nephrol. 2020 Jul-Aug;30(4):290-292.,1111 Bagai S, Khullar D, Bansal B. Rare crystalline nephropathy leading to acute graft dysfunction: a case report. BMC Nephrol. 2019 Nov 21;20(1):428.

12 George SA, Al-Rushaidan S, Francis I, Soonowala D, Nampoory MRN. 2,8-Dihydroxyadenine Nephropathy Identified as Cause of End-Stage Renal Disease After Renal Transplant. Exp Clin Transplant. 2017 Oct;15(5):574-577.

13 Nanmoku K, Kurosawa A, Shinzato T, Shimizu T, Kimura T, Yagisawa T. Febuxostat for the Prevention of Recurrent 2,8-dihydroxyadenine Nephropathy due to Adenine Phosphoribosyltransferase Deficiency Following Kidney Transplantation. Intern Med. 2017;56(11):1387-1391.

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20 Stratta P, Fogazzi GB, Canavese C, Airoldi A, Fenoglio R, Bozzola C, et al. Decreased kidney function and crystal deposition in the tubules after kidney transplant. Am J Kidney Dis. 2010 Sep;56(3):585-90.

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23 Benedetto B, Madden R, Kurbanov A, Braden G, Freeman J, Lipkowitz GS. Adenine phosphoribosyltransferase deficiency and renal allograft dysfunction. Am J Kidney Dis. 2001 May;37(5):E37.

24 Brown HA. Recurrence of 2,8-dihydroxyadenine tubulointerstitial lesions in a kidney transplant recipient with a primary presentation of chronic renal failure. Nephrol Dial Transplant. 1998 Apr;13(4):998-1000.

25 De Jong DJ, Assmann KJ, De Abreu RA, Monnens LA, van Liebergen FJ, Dijkman HB, et al. 2,8-Dihydroxyadenine stone formation in a renal transplant recipient due to adenine phosphoribosyltransferase deficiency. J Urol. 1996 Nov;156(5):1754-5.
-2626 Gagné ER, Deland E, Daudon M, Noël LH, Nawar T. Chronic renal failure secondary to 2,8-dihydroxyadenine deposition: the first report of recurrence in a kidney transplant. Am J Kidney Dis. 1994 Jul;24(1):104-7.. A visão geral detalhada de todos os 20 estudos elegíveis é fornecida como Arquivo Suplementar.

A maioria dos pacientes era do sexo masculino (66,7%). No momento do diagnóstico, a média de idade dos pacientes foi de 46,37 anos. Dos 30 pacientes, 5 eram idosos/geriátricos (≥ 60 anos de idade), enquanto 23 eram adultos (de 18 a 59 anos), 1 paciente tinha ≤18 anos de idade, e os dados referentes à idade de 1 paciente não estavam disponíveis. O acompanhamento médio foi de 20,4 meses (Tabela 1).

Tabela 1
Características demográficas

Os pacientes com deficiência de APRT foram avaliados quanto às características demográficas, histórico médico, diagnóstico, natureza dos cristais de 2,8-DHA, abordagem do tratamento e desfechos do transplante renal (tempo de sobrevida do enxerto e status do aloenxerto renal).

Foi avaliado um total de 4 séries de casos e 16 relatos de casos. A maioria dos casos (6 cada) foram relatados da França e Itália, 5 casos foram dos EUA, 3 casos da Índia, 2 casos do Canadá, enquanto 1 caso cada foi da Turquia, Japão, Finlândia, Alemanha, Reino Unido e Holanda (Arquivo Suplementar).

Histórico Médico

Um total de 8 (26,6%) pacientes relataram histórico familiar de doença renal, 3 dos quais apresentaram deficiência de APRT na família (Tabela 1). Dos 30 pacientes, 28 (93,3%) apresentaram algum tipo de doença renal, com 12 (40,0%) pacientes apresentando histórico de insuficiência renal crônica, 7 (23,3%) com histórico de nefrolitíase, urolitíase e litíase renal por cálculos coraliformes, enquanto os 9 restantes (30,0%) apresentaram algum nível de hipertensão juntamente com outras complicações como diabetes, obesidade (3 pacientes), cálculos renais (2 pacientes), cólica renal (2 pacientes), pielonefrite (1 paciente) e doença renal desconhecida (1 paciente) (Arquivo Suplementar).

Status da Doença Renal

A maioria dos pacientes (23; 76,6%) apresentou doença renal em estágio terminal. Os níveis médios de creatinina antes do transplante foram de 7,51 mg/dL para 10 amostras, enquanto os dados para as 20 amostras restantes não estavam disponíveis. Os níveis médios de creatinina pós-transplante foram de 2,60 mg/dL para 22 amostras, enquanto não houve dados suficientes para as 8 amostras restantes. Após o término do acompanhamento, os níveis médios de creatinina foram de 2,35 mg/dL para 18 amostras, enquanto os dados para as 12 amostras restantes não estavam disponíveis. Quinze (50,0%) pacientes estavam em alguma forma de diálise antes do transplante renal. A duração da diálise foi menor ou igual a 1 ano para 6 pacientes, enquanto foi superior a 1 ano para os 9 pacientes restantes. Os dados relativos à diálise para os outros 15 pacientes não estavam disponíveis. Os dados disponíveis para as características genéticas da maioria dos pacientes eram insuficientes, mas alguns indivíduos (6) eram homozigotos e heterozigotos (3 cada). Com base nessas evidências, os pesquisadores não podem descartar a possibilidade de que a deficiência de APRT possa ser genética.

Abordagens Diagnósticas

O diagnóstico da deficiência de APRT foi realizado principalmente por análise genética e biópsia do enxerto. Mais da metade dos pacientes (16; 53,3%) tiveram análise genética do gene APRT. A análise da biópsia do enxerto foi realizada individualmente ou em combinação com espectroscopia no infravermelho por transformada de Fourier (FTIR, por sua sigla em inglês), espectroscopia no infravermelho (IV), cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE), ensaio de hemácias (RBC, do inglês red blood cells), cromatografia e difração de raios X. FTIR e IV também foram realizados separadamente.

A biópsia do enxerto foi realizada em 9 pacientes, a FTIR em 3 pacientes, a espectroscopia IV em 4 pacientes. A biópsia do enxerto em combinação com a FTIR foi realizada em 7 pacientes. A biópsia renal com IV, biópsia renal com CLAE, biópsia renal com ensaio RBC, biópsia renal com cromatografia, e biópsia renal com difração de raios X também foram realizadas em 1 paciente cada.

A deficiência de APRT foi encontrada em 25 pacientes (83,3%) após o transplante renal e em 4 pacientes (13,3%) antes do transplante. Os dados sobre deficiência de APRT não estavam disponíveis para 1 paciente (Tabela 2).

Tabela 2
Métodos diagnósticos e desfechos clínicos de estudos em pacientes com deficiência de APRT

Natureza dos Cristais de 2,8-DHA

A biópsia do aloenxerto revelou diferentes características morfológicas dos cristais de 2,8-DHA: um glomérulo normal com múltiplos cristais intratubulares anulares marrons claros depositados no lúmen tubular, cristais marrom-avermelhados em vários túbulos e no interstício, necrose tubular aguda com deposição intratubular e/ou obstrução de cristais de 2,8-DHA típicos e em forma de agulha. No entanto, em alguns pacientes, a biópsia do enxerto mostrou leve proliferação mesangial com depósitos granulares difusos de imunoglobulina A (IgA) e complemento 3 (C3) e alguns cristais intratubulares escassos. Também notou-se nefropatia por IgA leve e persistente, cristais intratubulares marrons com infiltrado inflamatório intersticial, e fibrose por ácido úrico. Nefropatia cristalina por oxalato com abundantes cristais tubulares e intersticiais marrons, birrefringentes, atrofia tubular mínima e deposição de cristais intersticiais com formações difusas de cilindros de cristais intratubulares também foram observados na análise da biópsia do enxerto.

A biópsia do aloenxerto também mostrou nefrite intersticial crônica moderada a grave com deposição intratubular e parenquimatosa perceptível de cristais em forma de agulha altamente birrefringentes dispostos em um padrão anular (Tabela 2).

Desfechos Clínicos: enxertos recebidos, tempo de sobrevida do enxerto e status do aloenxerto

O número de enxertos renais (39) recebidos excede o número de pacientes (30) inscritos para análise. A maioria dos pacientes (24; 80,0%) recebeu 1 enxerto, 4 pacientes receberam 2 enxertos cada, 1 paciente recebeu 3 enxertos, e 1 recebeu 4 enxertos. Detalhes dos doadores de rim estavam disponíveis para 36 enxertos. Dez enxertos vieram de doadores vivos, 17 de doadores falecidos e 9 eram de doadores cadáveres.

O tempo de sobrevida do enxerto foi reportado em meses. A maioria dos pacientes (23; 76,7%) apresentou tempo de sobrevida do enxerto superior a 6 meses, enquanto 7 (23,3%) tiveram menos de 6 meses de sobrevida do enxerto. O tempo de sobrevida do enxerto mais curto foi de 1 mês e o mais longo foi de 132 meses. O tempo médio de sobrevida foi de 19,5±30,5 meses (média com desvio padrão).

Após o acompanhamento, um terço dos pacientes (10; 33,3%) apresentou status estável do enxerto, 1 paciente teve perda do enxerto, 8 pacientes (26,6%) apresentaram função retardada do enxerto, e 11 pacientes (36,6%) tiveram disfunção do enxerto renal (Tabela 2).

Abordagem de Tratamento

Os pacientes foram tratados com 3 opções terapêuticas diferentes: inibidores da enzima xantina oxidase (alopurinol 150, 200, 300, 400 e 500 mg e febuxostat 20, 40 e 80 mg), imunossupressores (Terapia de indução - basiliximab, Terapia de manutenção - prednisolona + micofenolato de sódio + ciclosprina/metilprednisolona/tacrolimus), e hidratação e dieta pobre em purinas. Uma grande proporção de pacientes (28; 93,3%) foi tratada com alopurinol após o transplante renal, e dados para os 2 (6,4%) pacientes restantes não estavam disponíveis. Cerca de um terço dos pacientes (20; 66,3%) foram tratados com imunossupressores, dos quais 10 (33,3%) estavam tanto em terapia de indução como de manutenção e os outros 10 (33,3%) apenas em terapia de manutenção. Os dados referentes ao tratamento dos outros 10 (33,4%) pacientes não estavam disponíveis. Além disso, 9 pacientes (30,0%) estavam em hidratação e dieta baixa em purinas, e os dados referentes a 15 pacientes (50,0%) não estavam disponíveis, enquanto os outros 6 pacientes (20,30%) não haviam recebido nenhuma hidratação e dieta pobre em purinas (Arquivo Suplementar).

Avaliação Qualitativa

Dez relatos de casos obtiveram uma pontuação 7 na ferramenta de Avaliação Crítica do JBI (de um total de 8), dois estudos tiveram pontuação 8, e 4 estudos tiveram pontuação 6. Para séries de casos, três (3) estudos tiveram uma pontuação de 7 pontos enquanto um (1) estudo teve uma pontuação de 9 pontos (de um total de 10) (Arquivo Suplementar).

Discussão

Foram incluídos na revisão vinte estudos com um total de 30 pacientes com nefropatia recorrente por deposição de 2,8-DHA. Na maioria dos casos, 25(83,3%), a deficiência de APRT foi diagnosticada após o transplante renal. Esta revisão sistemática teve como objetivo fornecer uma visão geral valiosa deste raro distúrbio metabólico hereditário no contexto do transplante renal, enfatizando a necessidade de um entendimento abrangente sobre a deficiência de APRT entre todas as partes interessadas da saúde.

O diagnóstico de deficiência de APRT geralmente permanece despercebido durante anos, o que representa um grande desafio em seu manejo, especialmente quando não há suspeita clínica. Isto também é sustentado pelo resultado deste estudo, já que cerca de 83,3% dos pacientes foram diagnosticados com deficiência de APRT após o transplante renal.

Os testes genéticos confirmam a deficiência de APRT pela presença de mutações funcionais significativas em ambos os alelos. Uma vez que o sequenciamento de éxons e sequências intrônicas flanqueadoras do gene APRT permite identificar cerca de 90% das mutações2727 Ceballos-Picot I, Daudon M, Harambat J, Bensman A, Knebelmann B, Bollee G. 2,8-dihydroxyadenine urolithiasis: a not so rare inborn error of purine metabolism. Nucleosides, Nucleotides Nucleic Acids. 2014;33(4-6):241-52., a análise da mutação do gene APRT pode ser usada como teste de primeira linha para o diagnóstico deste raro distúrbio metabólico quando outras técnicas não são consideradas ou não estão disponíveis. Os achados deste estudo corroboram esta afirmação, visto que a análise genética da deficiência de APRT foi realizada em mais da metade dos pacientes.

Um dos importantes determinantes para o diagnóstico de nefropatia cristalina surge ao definir a natureza dos cristais detectados na biópsia renal. Isto está em consonância com a deficiência de APRT, uma vez que a presença de cristais de 2,8-DHA é patognomônica da doença. Neste estudo, foram adotadas diferentes abordagens para descrever a natureza do 2,8-DHA.

Devido à sua raridade, os cristais de DHA são frequentemente confundidos com cristais de oxalato, urato e cistina, e evidências sugerem que esta doença é gravemente subdiagnosticada2828 Ceballos-Picot I, Perignon JL, Hamet M, Daudon M, Kamoun P. 2,8-Dihydroxyadenine urolithiasis, an underdiagnosed disease. Lancet. 1994;339:1050-1051.. Nesta revisão, foram descritas diferentes características morfológicas dos cristais de 2,8-DHA. A presença de birrefringência e características de coloração como múltiplas colorações verde-acastanhadas ou marrons com HE e PAS, colorações azuis claras com TRI, e colorações pretas com JMS. Os cristais foram encontrados em forma de agulha, bastão ou romboide, presentes isoladamente, como formações anulares de cristais estriados, ou como aglomerados irregulares ou em forma de leque. Estes cristais mostram uma reação de células gigantes e estão distribuídos principalmente no lúmen tubular e no citoplasma, e às vezes no interstício (mais abundante no córtex). Em alguns pacientes, os cristais de 2,8-DHA apresentaram nefrite intersticial crônica moderada a grave, com acentuada deposição intratubular e parenquimatosa de cristais em forma de agulha altamente birrefringentes, atrofia tubular mínima, necrose tubular aguda e fibrose intersticial. Este estudo também revelou uma característica única dos cristais de 2,8-DHA em algumas biópsias do aloenxerto de pacientes com nefropatia recorrente por depósição de DHA1616 Zaidan M, Palsson R, Merieau E, Cornec-Le Gall E, Garstka A, Maggiore U, et al. Recurrent 2,8-dihydroxyadenine nephropathy: a rare but preventable cause of renal allograft failure. Am J Transplant. 2014 Nov;14(11):2623-32..

Os resultados também destacaram que a microscopia no infravermelho com transformada de Fourier (FTIR) combinada com a microscopia óptica polarizada pode caracterizar os cristais em biópsias renais melhor do que o exame com microscopia óptica polarizada isoladamente2929 Dessombz A, Bazin D, Dumas P, Sandt C, Sule-Suso J, Daudon M. Shedding light on the chemical diversity of ectopic calcifications in kidney tissues: diagnostic and research aspects. PLoS One. 2011;6(11):e28007..

Um terço dos enxertos foi de doadores vivos, enquanto o restante foi de doadores falecidos. Os enxertos renais recebidos pelos pacientes foram bem superiores em comparação com o número de participantes, o que sugere que a rejeição do enxerto é bastante comum nestes pacientes. O tempo de sobrevida do enxerto variou de 1 mês a 132 meses e a maioria (76,7%) dos pacientes teve sobrevida do enxerto superior a 6 meses. Estes achados são consistentes com os de Runolfsdottir et al.3030 Runolfsdottir HL, Palsson R, Agustsdottir IMS, Indridason OS, Li J, Dao M, et al. Kidney Transplant Outcomes in Patients With Adenine Phosphoribosyltransferase Deficiency. Transplantation. 2020 Oct;104(10):2120-2128. que concluíram que o diagnóstico e o tratamento oportunos com terapia com inibidores da xantina oxidorredutase antes do transplante podem melhorar os desfechos do aloenxerto, como o tempo de sobrevida do enxerto, enquanto a demora em tal tratamento provou ser uma causa frequente de perda prematura do aloenxerto.

Após o acompanhamento, um terço dos pacientes apresentou status estável do enxerto, enquanto mais de um terço dos pacientes apresentou disfunção do enxerto renal, o que mostra que a disfunção do aloenxerto é bastante comum entre esses pacientes.

O manejo deste distúrbio metabólico envolve a redução da produção sistêmica de dihidroxiadenina pela diminuição da ingestão de purinas (embora a maior parte da produção ocorra por via de salvamento) e pela inibição da xantina oxidase/dehidrogenase com alopurinol ou febuxostat (um inibidor seletivo não-purina), que é a principal terapia da deficiência de APRT. Neste estudo, 93,3% dos pacientes foram tratados com alopurinol após o transplante renal. Isto é corroborado pelos achados de Bollée et al.3131 Bollee G, Dollinger C, Boutaud L, Guillemot D, Bensman A, Harambat J, et al. Phenotype and genotype characterization of adenine phosphoribosyltransferase deficiency. J Am Soc Nephrol. 2010;21(4):679-88. e Harambat et al.3232 Harambat J, Bollee G, Daudon M, Ceballos-Picot I, Bensman A. Adenine Phosphoribosyltransferase deficiency in children. Pediatr Nephrol. 2012;27(4):571-9. que relataram que a maioria dos pacientes adultos tratados com 200-600mg por dia e crianças tratadas com 5-10 mg/kg por dia esgotam drasticamente a geração de cristais. O febuxostat é preferido em pacientes alérgicos ao alopurinol3333 Arnadottir M. Febuxostat in adenosine phosphoribosyltransferase deficiency. Am J Kidney Dis. 2014;64(2):316..

O manejo oportuno deste distúrbio metabólico com o inibidor da xantina desidrogenase, alopurinol, reduz a formação de cristais na urina, melhorando assim a taxa de perda do enxerto3434 Bollée G, Harambat J, Bensman A, Knebelmann B, Daudon M, Cebbalos-Picot I. Adenine phosphoribosyltransferase deficiency. Clin J Am Soc Nephrol. 2012;7:1521-1527.. A adesão do paciente ao tratamento desempenha um papel importante na deficiência de APRT. Como uma queda sustentada de cristais na urina é esperada durante o tratamento, a análise quantitativa repetida de cristais na urina pode ser um guia útil para o manejo perfeito desta doença.

O tratamento com altas doses de alopurinol (até 600 mg)22 Nasr SH, Sethi S, Cornell LD, Milliner DS, Boelkins M, Broviac J, et al. Crystalline nephropathy due to 2,8-dihydroxyadeninuria: an under-recognized cause of irreversible renal failure. Nephrol Dial Transplant. 2010 Jun;25(6):1909-15.,1616 Zaidan M, Palsson R, Merieau E, Cornec-Le Gall E, Garstka A, Maggiore U, et al. Recurrent 2,8-dihydroxyadenine nephropathy: a rare but preventable cause of renal allograft failure. Am J Transplant. 2014 Nov;14(11):2623-32.,3030 Runolfsdottir HL, Palsson R, Agustsdottir IMS, Indridason OS, Li J, Dao M, et al. Kidney Transplant Outcomes in Patients With Adenine Phosphoribosyltransferase Deficiency. Transplantation. 2020 Oct;104(10):2120-2128. e febuxostat3535 Nanmoku K, Kurosawa A, Shinzato T, Shimizu T, Kimura T, Yagisawa T. Febuxostat for the Prevention of Recurrent 2,8-dihydroxyadenine Nephropathy due to Adenine Phosphoribosyltransferase Deficiency Following Kidney Transplantation. Intern Med. 2017;56(11):1387-1391. (80 mg) é obrigatório para alcançar a inibição efetiva dos cristais de dihidroxiadenina na urina. A titulação da dose (para cima) é necessária se uma resposta satisfatória não for obtida com a dose inicial e também se pacientes com nefropatia por DHA apresentarem recidiva22 Nasr SH, Sethi S, Cornell LD, Milliner DS, Boelkins M, Broviac J, et al. Crystalline nephropathy due to 2,8-dihydroxyadeninuria: an under-recognized cause of irreversible renal failure. Nephrol Dial Transplant. 2010 Jun;25(6):1909-15..

Os imunossupressores desempenham um papel fundamental na rejeição do enxerto. Neste estudo, cerca de um terço dos pacientes foram tratados com imunossupressores combinados com a terapia principal com alopurinol. Pacientes gestantes requerem atenção especial no uso de medicamentos imunossupressores (pós-transplante), pois esses medicamentos são conhecidos por terem efeitos adversos no feto em desenvolvimento.

Recomenda-se também a ingestão adequada de líquidos e uma dieta pobre em purinas. Nove pacientes neste estudo foram tratados com hidratação e dieta baixa em purinas. Uma ingestão de líquidos de pelo menos 2,5-3,0 litros por dia para adultos deve ser encorajada, mas é necessário um cuidado especial para pacientes em diálise, pois uma alta ingestão de líquidos é contraindicada. Uma dieta baixa em purinas deve diminuir a excreção de 2,8-DHA. A alcalinização da urina também é contraindicada, já que os cristais de 2,8-DHA são muito insolúveis em pH elevado.

Conclusões

Em conclusão, este raro distúrbio metabólico autossômico recessivo é uma condição subestimada e uma causa reversível de nefropatia cristalina, que leva à rejeição do enxerto. Esta revisão fornece a todas as partes interessadas da saúde uma visão geral detalhada da demografia, diagnóstico e testes diagnósticos, morfologia dos cristais de 2,8-DHA, abordagens de tratamento, desfechos tais como frequência de enxertos recebidos, tempo de sobrevida do enxerto e status do aloenxerto renal em pacientes com deficiência de APRT que receberam transplante renal.

Devido à sua natureza rara e à falta de estudos de longo prazo, esta descrição detalhada da deficiência de APRT em receptores de transplante renal pode permitir que todas as partes interessadas da saúde apliquem as abordagens diagnósticas e terapêuticas necessárias, como inibidores de XOR antes ou no momento do transplante renal, visando alcançar bons desfechos clínicos. Também pode ajudá-las a compreender melhor o risco de recidiva de nefropatia cristalina em receptores de transplante renal com deficiência de APRT.

Como foi relatado, o diagnóstico tardio da deficiência de APRT é uma das principais causas de perda prematura do enxerto nestes pacientes. Portanto, a deficiência de APRT deve ser incluída no diagnóstico diferencial de nefropatia cristalina, mesmo sem histórico de nefrolitíase, uma vez que um diagnóstico oportuno tem implicações terapêuticas.

Limitações do Estudo

Os dados relativos aos desfechos a longo prazo associados à deficiência de APRT após transplante renal são escassos e a disponibilidade de testes diagnósticos também varia de região para região. Como há somente relatos de casos e séries de casos disponíveis sobre este tema, a falta de dados suficientes nos permitiu realizar apenas uma revisão sistemática.

Material Suplementar

O seguinte material online está disponível para este artigo:

Suplemento A - Características do estudo e de pacientes.

https://minio.scielo.br/documentstore/2175-8239/f8W3tTWVTB49M7tQj7dPdpJ/4d5d97262f642d2ff275f92f0e8837ef5cb7f2ea.pdf

Suplemento B - Avaliação qualitativa dos estudos e abordagem de tratamento dos participantes do estudo.

https://minio.scielo.br/documentstore/2175-8239/f8W3tTWVTB49M7tQj7dPdpJ/e85877a049a8baac0ac446c43b044f27cb230c41.pdf

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2022

Histórico

  • Recebido
    30 Dez 2021
  • Aceito
    22 Mar 2022
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