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Correlação da dosagem de glicose por glicosímetro, dosagem laboratorial e de equipamento de inteligência artificial

RESUMO

Introdução

Com o número crescente de casos relacionados a Diabetes Mellitus (DM), é indispensável o controle glicêmico através de métodos laboratoriais ou testes rápidos.

Objetivo

Analisar a correlação de três metodologias de determinação de glicose (Glicosímetro, análise laboratorial e com o equipamento com inteligência artificial de point of care).

Método

Foram coletadas amostras de sangue da polpa digital e sangue venoso da fossa antecubital de 20 voluntários de diferentes idades e sexo. Dosagens de glicose sanguínea foram determinadas pelas 3 metodologias acima citadas.

Resultado

A análise de correlação de Spearman realizada entre todos os tipos de testes mostra que há uma correlação positiva forte e estatisticamente significante, indicando a compatibilidade de resultados independentemente do método aplicado.

Conclusão

As metodologias apresentam correlação, no entanto, os valores médios obtidos pela inteligência artificial mostraram-se 40% mais elevada que pode impactar na interpretação clínica dos resultados.

diabetes mellitus; inteligência artificial; glicemia; Automonitorização da Glicemia

ABSTRACT

Introduction

With the increasing number of cases related to Diabetes Mellitus (DM), glycemic control through laboratory methods or rapid tests is essential.

Objective

To analyze the correlation of three glucose determination methodologies (Glucometer, laboratory analysis and with point of care artificial intelligence equipment).

Method

Blood samples from the digital pulp and venous blood from the antecubital fossa were collected from 20 volunteers of different ages and sex. Blood glucose measurements were determined by the 3 methodologies mentioned above.

Result

Spearmans correlation analysis carried out between all types of tests shows that there is a strong and statistically significant positive correlation, indicating the compatibility of results regardless of the method applied.

Conclusion

The methodologies are correlated, however, the average values?? obtained by artificial intelligence were 40% higher, which can impact the clinical interpretation of results.

diabetes mellitus; artificial intelligence; blood glucose self-monitoring; blood glucose

INTRODUÇÃO

O diabetes mellitus (DM) é uma doença de elevada prevalência que acomete uma grande quantidade de pessoas no mundo todo. No Brasil há aproximadamente 5 milhões de casos confirmados( 11. De Cordova CMM, Valle JP, Yamanaka CN, et al. Determination of capillary and venous blood glucose with a glucometer versus laboratory measurement of plasma glucose. J Bras Patol Med Lab. 2009; 45(5): 379-84.

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- 33. Keller DL. Lowering blood glucose without increasing mortality. Am J Med. 2014; 127(5): e25. ), porém mesmo com orientações e a disponibilização de informação, é um assunto que ainda gera dúvidas e uma difícil eficácia de tratamento, pois o paciente com diabetes mellitus deve adaptar seu estilo de vida para conviver da melhor forma possível com essa doença através de mudanças de hábitos na alimentação, prática de exercícios físicos, uso de medicamentos e em alguns casos o uso da insulina( 44. Schmidt AM. Highlighting diabetes mellitus. Arterioscler Thromb Vasc Biol. 2018; 38(1): 1-8.

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A prevenção e o retardo das complicações crônicas se obtêm mediante controle glicêmicos e adesão terapêutica( 88. Nair AA, Velagapudi M, Behara L, et al. Hyper-G: An artificial intelligence tool for optimal decision-making and management of blood glucose levels in surgery patients. Methods Inf Med. 2019; 58(3): 79-85.

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- 1010. Narla SN, Jones M, Hermayer KL, et al. Critical Care Glucose Point-of-Care Testing. 1st ed. Advances in Clinical Chemistry. Elsevier Inc. 2016; 76: 97-121. ), e para isso, faz-se necessário a mensuração regular dos níveis de glicose através de testes rápidos, conhecidos como hemoglicoteste (HGT), normalmente comercializados em farmácias, ou com exames laboratoriais (realizados em conjunto com outros exames de rotina( 1111. Lisi F, Peterson JR, Gooding JJ. The application of personal glucose meters as universal point-of-care diagnostic tools. Biosens Bioelectron. 2020; 148: 111835.

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No entanto o custo, qualidade e manuseio é diferente para cada equipamento de point of care. Essas diferenças tecnológicas podem provocar insegurança na interpretação dos resultados da glicemia por pacientes, médicos e cuidadores. A determinação de glicose utilizando a tecnologia de “point-of-care” em farmácias surgiu como mais uma alternativa de oferta de exames rápidos, baratos e acessíveis a população( 1414. Goble JA, Rocafort PT. Point-of-care testing: Future of chronic disease state management? J Pharm Pract. 2017; 30(2): 229-37. , 1111. Lisi F, Peterson JR, Gooding JJ. The application of personal glucose meters as universal point-of-care diagnostic tools. Biosens Bioelectron. 2020; 148: 111835. ).

O glicosímetro é um aparelho de testes rápidos de glicose, um equipamento de fácil acesso e com grande praticidade, já que é possível fazer a dosagem em casa com apenas uma gota de sangue, amplamente usado por diabéticos no controle da glicemia( 1515. Li FF, Xie Y, Shi BY, et al. The real world of blood glucose point-of-care testing (POCT) system running in China teaching hospital. Expert Rev Med Devices. 2018; 15(6): 445-51. , 1616. Larsson A, Greig-Pylypczuk R, Huisman A. The state of point-of-care testing: A European perspective. Ups J Med Sci. 2015; 120(1): 1-10. ). No entanto, há diferenças na precisão deste dispositivo comparado com testes Laboratoriais( 1717. Kristensen T, Waldorff FB, Nexøe J, et al. Variation in point-of-care testing of HbA1c in diabetes care in general practice. Int J Environ Res Public Health. 2017; 14(11): 1-14. ). De Cordova et al. (2009)( 11. De Cordova CMM, Valle JP, Yamanaka CN, et al. Determination of capillary and venous blood glucose with a glucometer versus laboratory measurement of plasma glucose. J Bras Patol Med Lab. 2009; 45(5): 379-84. )compararam a glicemia de pacientes utilizando o método do glicosímetro e a dosagem laboratorial para medir sua correlação e diferenças. Foi utilizado o aparelho de teste rápido Accu-Chek Advantage®(Roche) com amostras de sangue capilar e venoso, relacionando com a dosagem glicêmica venosa. A análise dos resultados mostrou uma diferença significante entre a dosagem glicêmica venosa e os dois métodos usados no teste rápido, entre a glicemia de sangue capilar e glicemia venosa em plasma (r=0,6543) e entre sangue venoso e glicemia venosa em plasma (r=0,5038) (p<0,001). Estudos realizados por Neves et al., (2016)( 1818. Neves RFB, Neves VM, Costa RR da, et al. Comparison between capillary and venous blood glucose measurements with glucometers and laboratory measurements of venous plasma glucose. Average Rev Minas Gerais. 2016; 26: 7. )foram utilizados os aparelhos Accu-Chek Performa®(Roche) e Optium Xceed®(Abott) e comparados com a glicemia plasmática venosa laboratorial convencional, concluindo que houve diferenças entre os glicosimetros e o método laboratorial, uma média geral de glicemia de 119,57 mg/dL, variando de 74 a 285 mg/dL, um coeficiente de variação de 7,10% no qual o aparelho Accu-Chek Performa®(Roche) obteve melhores resultados usando sangue venoso, já o Optium Xceed®(Abott) obteve melhores resultados usando sangue capilar, mesmo os dois equipamentos tendo forte correlação com exame laboratorial (r ≥ 0,95).

Os métodos laboratoriais utilizam o método de glicose oxidase, uma técnica espectrofotométrica em que o sangue é analisado através de um produto de cor vermelha 505nm, determinando precisamente a concentração de glicose da amostra( 1919. Rajendran R, Rayman G. Point-of-care blood glucose testing for diabetes care in hospitalized patients: An evidence-based review. J Diabetes Sci Technol. 2014; 8(6): 1081-90. , 2020. Sobolesky PM, Smith BE, Saenger AK, Schulz K, Apple FS, Scott MG, et al. Multicenter assessment of a hemoglobin A1c point-of-care device for diagnosis of diabetes mellitus. Clin Biochem. 2018; 61:18-22. ). As exigências de controle de qualidade laboratorial preconizadas pela RDC 302 faz desta metodologia o “padrão-ouro” destes exames.

Com a evolução tecnológica e expansão das start ups, novos equipamentos point- of-care vem sendo ofertados no mercado brasileiro e mundial( 2121. Foerster V, Severn M. Point-of-care glycated hemoglobin testing to diagnose type 2 diabetes. CADTH Issues Emerg Heal Technol. 2016; 1-8.

22. Ellahham S. Artificial Intelligence: The Future for Diabetes Care. Am J Med. 2020; 133(8): 895-900.

23. Shibata Y, Himeno T, Kamiya T, et al. Validity and reliability of a point-of-care nerve conduction device in diabetes patients. J Diabetes Investig. 2019; 10(5): 1291-8.
- 2424. Dankwa-Mullan I, Rivo M, Sepulveda M, et al. Transforming diabetes care through artificial intelligence: the future is here. Popul Health Manag. 2019; 22(3): 229-42. ). Uma star up do sul do Brasil desenvolveu um leitor de testes rápidos utilizando métodos de colorimetria e imunocromatografia utilizando princípios da inteligência artificial (I.A.) e “internet das coisas”, com capacidade de realização de diversos testes rápidos por serem ágeis, práticos e rápidos (oficio circular n° 4/2019/SEI/GGTES/DIRE1/ANVISA processo n° 25351.934427/2018-91). O equipamento desta star up, é um equipamento disponível em diversas redes de farmácias que apesar da garantia e certificação de qualidade do fabricante, não há estudos científicos relacionados a tecnologia deste equipamento com outras já existentes, o que pode provocar insegurança e desconfiança nos usuários e cuidadores. A análise de correlação positiva do equipamento com outras metodologias poderia garantir segurança ao paciente, ao cuidador e na garantia de qualidade dos resultados desta nova tecnologia( 1818. Neves RFB, Neves VM, Costa RR da, et al. Comparison between capillary and venous blood glucose measurements with glucometers and laboratory measurements of venous plasma glucose. Average Rev Minas Gerais. 2016; 26: 7. , 2525. Shahim B, Kjellstrom B, Gyberg V, et al. The Accuracy of point-of-care equipment for glucose measurement in screening for dysglycemia in patients with coronary artery disease. Diabetes Technol Ther. 2018; 20(9): 596-602. , 2626. Yu KH, Beam AL, Kohane IS. Artificial intelligence in healthcare. Nat Biomed Eng. 2018; 2(10): 719-31. ).

Partindo destes princípios, o objetivo do presente estudo é analisar a correlação dos resultados de glicemia de polpa digital do equipamento de inteligência artificial (EIA) e com o uso de glicosímetro, com a glicemia de sangue venoso mediante análises laboratoriais (gold standard).

MATERIAL E MÉTODO

Delineamento: Trata-se de um estudo experimental, descritivo de corte transversal mediante a análise de sangue de glicose de polpa digital e de sangue venoso utilizando 3 diferentes tecnologias: método laboratorial glicose oxidase (gold standard), glicosímetro (HGT) e do equipamento de inteligência artificial (EIA).

Casuística: 20 indivíduos de ambos sexos, de idades entre 18 e 50 anos foram recrutados para participação voluntária para doação de amostras de sangue de polpa digital e de sangue venoso. Incluiu-se pacientes sadios, diabéticos com e sem jejum para fins de obtenção de amostras com a maior flutuação glicêmica possível em razão da faixa analítica dos métodos.

Procedimento Experimental: Seguindo as normas dos fabricantes, procedeu-se a calibração dos aparelhos de HGT (Accu-Check - Roche) e equipamento de inteligência artificial (EIA). Amostras de sangue de polpa digital foram coletadas da lateral do dedo anelar da mão não-dominante do paciente e imediata e simultanemante analisados no glicosímetro e no equipamento de inteligência artificial (EIA). Para análise no EIA, uma gota de sangue foi colocada numa cápsula com reativos e introduzidas num leitor conectado à internet; após a análise os resultados foram mandados para o laboratório central do fabricante e analisado; após análise e conferencia o laudo foi enviado por um aplicativo no celular do paciente. Estas determinações foram realizadas no estabelecimento farmacêutico em condições reais de análise.

A seguir, amostras 5mL de sangue venoso foram coletadas assepticamente da fossa antecubital dos voluntários e acondicionados em um tubo de ensaio com fluoreto de sódio (agente antiglicolítico); as amostras foram centrifugadas a 1500 rpm durante 15 minutos; o plasma foi extraído e acondicionado em frascos Eppendorff para realização da dosagem bioquímica de glicose. A concentração de glicose foi determinada por ensaio de ponto final pelo princípio glicose oxidase utilizando kits de análise bioquímica comercial (Labtest®) seguindo as recomendações do fabricante. Aplicou-se o qualidade interno (Qualitrol - Labtest®) e externo (Controllab®) para confiabilidade do método. A análise espectrofotométrica se deu com a leitura em espectrofotômetro semi automatizado Biosystems BTS350®. As determinações foram realizadas em duplicata e as médias utilizadas para fins de análise estatística.

Aspectos éticos: O trabalho foi desenvolvido segundo declarações e diretrizes sobre pesquisas que envolvem seres humanos: o Código de Nuremberg, Declaração de Helsinque e resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012 do Conselho Nacional de Saúde, bem como aprovado e regulamentado pelo Comitê de Ética da instituição executora aprovado sob nº de Parecer C.A.A.E. 33154620.2.0000.5342.

Análise estatística: Os resultados foram reunidos e compilados numa planilha de trabalho. Previamente a análise estatística, realizou-se a preparação dos dados, com intenção de detectar erros de digitação e dados omissos (missing) que poderiam comprometer as análises. Os resultados foram transcritos para uma planilha de trabalho seguida de análise estatística descritiva e inferencial para determinação das medidas de tendência central (média) e de dispersão (desvio padrão).

A normalidade da amostra foi testada mediante o teste de Shapiro-Wilk. Apresentando distribuição não-paramétrica, procedeu-se a análise de correlação baseada em processo de comparação de postos, pela determinação do coeficiente de correlação de Spearman com nível mínimo de significância de p < 0,05.

A partir da compilação dos dados, procedeu-se análise de correlação em comparação de postos, que se consiste em ordenar os elementos que compõem os dois conjuntos de valores em análise, calculando-se então o coeficiente de correlação de Spearman. Resultados expressos em número absoluto onde:

  • 0.9 positivo ou negativo indica uma correlação muito forte;

  • 0.7 a 0.9 positivo ou negativo indica uma correlação forte;

  • 0.5 a 0.7 positivo ou negativo indica uma correlação moderada;

  • 0.3 a 0.5 positivo ou negativo indica uma correlação fraca;

  • 0 a 0.3 positivo ou negativo indica uma correlação desprezível.

Para a análise de comparação de médias dos diferentes métodos aplicou-se o teste de Kruskal-Wallis. Para comparação de métodos de forma pareada entre as amostras, aplicou-se o teste de Wilcoxon pareado com nível mínimo de significância de p < 0,05.

RESULTADOS

A análise de correlação de Spearman realizada entre todos os tipos de testes mostra que há uma correlação positiva forte e estatisticamente significante, indicando a compatibilidade de resultados independentemente do método aplicado.

A Figura 1 mostra a representação gráfica da distribuição de resultados da análise de correlação das dosagens de glicose por glicosímetro (HGT) e equipamento de inteligência artificial (EIA) apresentando um coeficiente de correlação de Spearman (R2) igual a 0,847 com uma forte correlação positiva e estatisticamente significante (p<0,001).

FIGURA 1
– Análise gráfica da correlação linear por classificação entre as medidas de glicose por hemoglicoteste (HGT), equipamento de inteligência artificial (EIA)

A Figura 2 mostra a representação gráfica da distribuição de resultados da análise de correlação das dosagens de glicose por hemoglicoteste (HGT) e dosagem laboratorial convencional apresentando um coeficiente de correlação de Spearman (R2) igual a 0,822 com uma forte correlação positiva e estatisticamente significante (p<0,001).

FIGURA 2
– Análise gráfica da correlação linear por classificação entre as medições de glicose por glicosímetro (HGT) e medições laboratoriais convencionais

A Figura 3 mostra a representação gráfica da distribuição de resultados da análise de correlação das dosagens de glicose por equipamento de inteligência artificial (EIA) e dosagem laboratorial convencional apresentando um coeficiente de correlação de Spearman (R2) igual a 0,755 com uma forte correlação positiva e estatisticamente significante (p<0,001).

FIGURA 3
– Análise gráfica da correlação linear por classificação entre as medições de glicose com equipamentos de inteligência artificial e medições laboratoriais convencionais

O coeficiente mais alto foi da correlação entre o HGT e o EIA (R2= 0,847) provavelmente em razão de ter se usado a mesma amostra de sangue total de polpa digital, enquanto que a dosagem laboratorial utilizou a dosagem em plasma fluoretado de sangue venoso. Mesmo com diferentes amostras a correlação do HGT com o laboratório (R2= 0,822) foi mais alta quando comparada com o EIA e o laboratório (R2= 0,755).

A análise estatística dos resultados de glicose por diferentes metodologias não mostra diferença significativa pelo teste de Kruskal-Wallis para dados não paramétricos. Pela opção da realização de um estudo com uma população heterogênea para atingir baixas e elevadas concentrações de glicose, culminou num desvio padrão elevado que poderia interferir na interpretação desta análise em específico. Para dirimir este viés, procedeu-se uma análise de forma pareada do próprio paciente pelo teste de Wilcoxon pareado para dados não paramétricos, que também não mostrou diferença significante Figura 4 .

FIGURA 4
– Concentração média de glicose determinada por glicosímetro (HGT), equipamento de inteligência artificial (EIA) e dosagem laboratorial convencional. Resultados expressos como média ± desvio padrão

DISCUSSÃO

Neste estudo, valores levemente diferentes entre cada método (principalmente laboratorial e A.I.A) eram esperados, já que de acordo com Neves, et.al (2016)( 1919. Rajendran R, Rayman G. Point-of-care blood glucose testing for diabetes care in hospitalized patients: An evidence-based review. J Diabetes Sci Technol. 2014; 8(6): 1081-90. )há uma diferença entre a concentração sanguínea venosa comparada com a da polpa digital - onde são realizados os testes point of care padrão, além deste aparelho de inteligência artificial.

Como pode observa na Figura 1 e 22. Saldarriaga EM, Vodicka E, La Rosa S, et al. Point-of-care testing for anemia, diabetes, and hypertension: a pharmacy-based model in lima, peru. Ann Glob Heal. 2017; 83(2): 394-404. , os testes tem grande correlação entre sí, assim como De Cordova, et.al (2009) demonstra em seu estudo comparativo entre glicosímetro e teste laboratorial, foi observado grande correlação entre amostras de sangue capilar e de sangue venoso (r=0,8742), entretanto a Figura 3 , mesmo demonstrando forte correlação com exame laboratorial (p<0,001), a análise da Figura 4 mostra que que as médias e os desvio padrão da glicose determinada por HGT e pelo método laboratorial encontram-se próximas (114,2±28 e 117,9±30 mg/dL respectivamente), enquanto que a determinação média por EIA foi 40% mais elevada (159,0±48 mg/dL) quando comparado com o HGT e a dosagem laboratorial.

A análise estatística dos resultados não mostra diferença significativa dada a variabilidade analítica, mas do ponto de vista clínico, as médias aqui determinadas pode ser a diferença entre o diagnóstico de um pré-diabetes e um diabetes, indicando que uma correlação forte não é o suficiente para uma garantia de interpretação clínica confiável do resultado. A análise de correlação de Spearman considera valores de coeficientes maiores que 0,9 como sendo uma correlação positiva ou negativa muito forte. A correlação encontrada do EIA com o método laboratorial foi de R2= 0,755, que segundo análise de Spearman é considerada correlação forte, mas que muito próxima de uma correlação apenas moderada (R2entre 0,500 e 0,700). Para segurança do paciente, equipe de saúde e cuidadores, uma correlação superior a R2= 0,900 (muito forte) deve ser a meta desejável pelos fabricantes, não só pela precisão dos resultados, da redução da variabilidade e aumento da reprodutibilidade, mas principalmente pela exatidão dos mesmos.

O presente estudo se limita pelo número amostral uma vez que se trata de um estudo independente, de interesse acadêmico, de fomento próprio, sem patrocínio externo de qualquer natureza o qual os autores declaram sua ausência de conflito de interesse. Por outro lado, o presente estudo inova por não existir nenhum estudo na literatura promovendo a comparação dos três métodos em especial do equipamento de inteligência artificial utilizado no presente estudo.

A tecnologia proposta de análise bioquímica utilizando inteligência artificial é uma inovação muito promissora para a medicina laboratorial. No entanto, o aprimoramento e refinamento desta tecnologia se faz necessária bem como estudos futuros utilizando mesma rigidez metodológica, mas com maior número amostral.

CONCLUSÕES

O presente estudo mostra uma forte correlação entre os métodos, entretanto a concentração média do E.I.A em comparação com os métodos laboratoriais gold standard e glicosímetro apresentou em média valores 40% mais elevados, que pode ser determinante na identificação de um paciente normoglicêmico, pré-diabético ou diabético.

As agências reguladoras, usuários e demais profissionais da área da saúde devem estar atentos a novos aparelhos e procedimentos na área medica que possam facilitar o diagnóstico de doenças de forma rápida e fácil, contudo não se descarta o fato de que exames laboratoriais tendem a ser mais seguros e precisos em seus resultados.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    04 Abr 2021
  • Aceito
    10 Maio 2021
  • Publicado
    19 Maio 2021
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