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Asma pediátrica: o impacto das internações hospitalares

EDITORIAL

Asma pediátrica - o impacto das internações hospitalares

Renato Tetelbom Stein

Departamento de Pediatria - Pneumologia Pediátrica, Faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS - Porto Alegre (RS) Brasil

A asma é uma doença de alta prevalência, com impacto importante nos sistemas de saúde público e privado do Brasil. Estima-se que a prevalência de sintomas relacionados à asma seja aproximadamente de 20%, enquanto que a freqüência de asma ativa esteja ao redor de 10%.(1) Estes números não são muito diferentes dos encontrados em países desenvolvidos onde asma é encarada como um problema importante de saúde pública.

Segundo o DATASUS, foram internadas quase 200.000 crianças menores de 14 anos com o diagnóstico de asma no Sistema Único de Saúde brasileiro no ano de 2004, mesmo considerando-se uma provável e importante subnotificação da doença em várias regiões do país. Se considerarmos que a redução das internações é um dos objetivos a serem atingidos com o controle adequado da doença, podemos concluir, mesmo utilizando-se um dado isolado, que os programas de manejo da asma no Brasil estão longe de serem adequados, com impacto importante na faixa etária pediátrica.

Ainda mais significativo é o dado de que a asma é responsável por uma em cada 250 mortes em todo o mundo. Muitas destas mortes são evitáveis, pois estão relacionadas a cuidado médico inapropriado, falta de informações adequadas e atraso na obtenção de ajuda nas crises mais graves. No Brasil foram registradas 3.000 mortes por asma apenas no SUS no ano de 2004.

Um estudo recente(2) avaliou a situação do manejo de asma na América Latina. Com boa parte dos dados coletados em população brasileira, o estudo AIRLA mostrou em 1.376 adultos e 808 crianças com asma (estas com idade média de 7,5 anos) que mais de 50% apresentaram internações hospitalares ou visitas médicas não programadas por asma, no ano anterior à pesquisa. Uma parcela pequena da população estudada utilizava medicações compatíveis com a gravidade de sua doença, sendo que apenas 6% faziam uso de corticóides inalatórios. Estes dados revelam um grande descompasso entre a necessidade de medicações de uso continuado e seu uso real. Por falta, de políticas públicas adequadas acabam superlotando serviços de sala de emergência.

Neste contexto, Lasmar et al., da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), publicam neste número do Jornal Brasileiro de Pneumologia(3) avaliação de uma população de 202 crianças menores de 15 anos. Os autores demonstraram que 65,3% dos pacientes internados por asma em um hospital de Belo Horizonte foram readmitidos com o mesmo diagnóstico nos 18 meses seguintes, números estes semelhantes aos encontrados por outros pesquisadores brasileiros, mas significativamente maiores que os observados em países desenvolvidos. Outro achado importante do estudo é que a idade de início dos sintomas de asma é precoce (antes do primeiro ano de vida), sendo este um dos principais fatores de risco para reinternação hospitalar. Programas como o que vem sendo executado pelo grupo da Universidade Federal de Minas Gerais, voltado para uma população de risco, apresentam diminuição significativa de internações por asma em pacientes incluídos no sistema. Estes dados indicam que a faixa etária pediátrica deveria ser um dos focos centrais dos programas públicos de prevenção, providenciando acesso mais universal a estratégias de educação e tratamento que contemplem acompanhamento adequado.

Um dos programas, modelo no atendimento ao paciente asmático vem sendo desenvolvido exatamente por esse grupo de pesquisadores da UFMG, com sucesso marcado na redução de índices de internação das crianças acompanhadas por médicos treinados, em postos de saúde da prefeitura. Iniciativas como esta, em alguns municípios brasileiros, devem-se principalmente ao esforço e dedicação de alguns profissionais da área da saúde e de gestores públicos sensibilizados para o problema. Não se consegue, porém, perceber uma estratégia em nível nacional colocando o manejo de asma no patamar de importância que esta tem no impacto de custos do sistema público de saúde, atendendo demandas de melhor qualidade de vida de nossas populações.

Embora haja um grande esforço das sociedades médicas em gerar diretrizes para o manejo da doença e oferecer consultoria aos órgãos públicos para o manejo adequado da asma, estas ações ainda estão longe de mostrar-se consistentes em diminuir o impacto de internações ou grande utilização do sistema de saúde através de atendimentos não planejados. A falta de um programa nacional para o manejo da asma, eficiente e abrangente, é um empecilho para que se possa detectar impacto imediato na diminuição de internações ou de gastos relacionados à doença.

Tão importante quanto a elaboração de diretrizes ou guias para o manejo de asma é a divulgação, aos colegas de especialidade e à população leiga, de dados de programas já implantados no país, como os aqui apresentados por Lasmar et al. Esperamos que em futuro próximo o Jornal Brasileiro de Pneumologia possa comemorar em suas páginas a implantação efetiva de um programa nacional de acesso às medicações de asma. O Jornal Brasileiro de Pneumologia tem papel fundamental ao divulgar estratégias distintas para o manejo de asma, discutindo e criticando seus achados, sucessos e suas falhas, dando valiosa contribuição científica ao aperfeiçoamento desses processos.

REFERÊNCIAS

1. Mallol J, Sole D, Asher I, Clayton T, Stein R, Soto-Quiroz M. Prevalence of asthma symptoms in Latin America: the International Study of Asthma and Allergies in Childhood (ISAAC). Pediatr Pulmonol. 2000;30(6):439-44. Comment in: Pediatr Pulmonol. 2001;32(3):263-4.

2. Neffen H, Fritscher C, Schacht FC, Levy G, Chiarella P, Soriano JB, Mechali D; the AIRLA Survey Group. Asthma control in Latin America: the asthma insights and reality in Latin America (AIRLA) survey. Rev Panam Salud Publica. 2005;17(3):191-7.

3. Lasmar LMLBF, Camargos PAM, Goulart E, Sakurai E. Fatores de risco para readmissão hospitalar de crianças e adolescentes asmáticos. J Bras Pneumol. 2006;32(5) 391-9.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Mar 2007
  • Data do Fascículo
    Out 2006
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