Acessibilidade / Reportar erro

Desafios no estudo da prevalência da depressão pós-parto

Challenges in pos-partum depression studies

CARTAS

Desafios no estudo da prevalência da depressão pós-parto

Challenges in pos-partum depression studies

Patrícia FigueiraI; Leandro Malloy-DinizII; Humberto CorrêaIII

IUniversidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Programa de Pós-Graduação em Neurociências

IIUFMG, Departamento de Psicologia

IIIUFMG, Departamento de Saúde Mental

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Patrícia Figueira Rua Gustavo Pena, 44, sala 504, Horto 31015-060 – Belo Horizonte, MG E-mail: patriciafigueira@planetarium.com.br

Prezado editor,

Lemos com interesse o excelente artigo de Cantilino et al.1 abordando a prevalência da depressão pós-parto (DPP) em uma amostra de mulheres da cidade de Recife e suas associações com fatores biopsicossociais.

Os autores argumentam acertadamente que na maior parte dos estudos já realizados utiliza-se como instrumento diagnóstico uma escala, geralmente a de Depressão Pós-parto de Edimburg1. Essa, embora seja um bom instrumento de triagem, certamente não é um instrumento diagnóstico2. Esse fato, entre muitos outros fatores, pode ajudar a entender o porquê de prévios estudos apresentarem alta variabilidade da prevalência de diagnóstico de DPP no Brasil e no mundo1.

No estudo de Recife1, os autores utilizaram uma entrevista estruturada para o diagnóstico, encontrando uma prevalência de 7,2% de DPP (prévios estudos brasileiros encontraram prevalências de 16% a 46%)1. Os autores argumentam que a menor prevalência por eles encontrada se deve ao uso de uma entrevista estruturada, ao contrário dos estudos anteriores. Entretanto, já havíamos realizado estudo, anterior ao de Cantilino et al.1, usando uma entrevista estruturada para diagnóstico (MINI-PLUS3), segundo critérios do DSM-IV, e obtivemos uma prevalência de 26,9% de DPP2.

Há muitas explicações para as diferenças de prevalência observadas entre nosso estudo2 e o de Recife1.

Em primeiro lugar, as participantes de nosso estudo foram selecionadas aleatoriamente entre todas as que tiveram partos no período de agosto de 2005 a dezembro de 2006, em uma maternidade privada de Belo Horizonte. A entrevista foi realizada posteriormente em seus respectivos domicílios. No estudo de Recife, os dados foram obtidos a partir de uma amostra de conveniência, de mulheres atendidas em três instituições de saúde (duas públicas e uma privada). Em uma amostra randomizada como a nossa, potenciais vieses de seleção são reduzidos, enquanto em uma amostra de conveniência não estamos livres desses vieses. Por exemplo, poder-se-ia especular que mulheres deprimidas teriam menor motivação para procurar serviços de saúde por causa de seus sintomas depressivos e estariam dessa forma sub-representadas na amostra total.

No nosso estudo, as pacientes foram entrevistadas entre 40 e 90 dias após o parto (média de 58,2 ± 9,5 dias), enquanto no estudo de Recife1 foram incluídas mães a partir de duas semanas de pós-parto. Segundo O'Hara e Swain4, estudos feitos com oito semanas ou mais de pós-parto mostram taxas de prevalências mais elevadas do que aqueles feitos com quatro semanas, certamente por abranger um período maior de tempo de seguimento.

Finalmente, estudamos uma população atendida em uma instituição privada e que certamente não reflete o perfil socioeconômico de toda a população brasileira (por exemplo, em nossa amostra mais de 50% das mulheres tinham escolaridade de nível superior), enquanto no estudo de Recife a população estudada foi predominantemente aquela atendida em serviços públicos e com menor nível socioeconômico do que a nossa.

Concluindo, os estudos de prevalência de DPP são ainda um grande desafio. Diversas variáveis como o período a ser realizada a entrevista diagnóstica, critérios diagnósticos usados, perfil socioeconômico, entre muitos outros, parecem importantes. Novos estudos são necessários para melhor entendermos esse grave problema de saúde e assim melhorarmos nossas estratégias de detecção precoce, tratamento e compreensão de sua etiologia5.

Recebido em 6/7/2010

Aprovado em 12/7/2010

  • 1. Cantilino A, Zambaldi CF, Albuquerque T, et al. Postpartum depression in Recife Brazil: prevalence and association with bio-socio-demographic factors. J Bras Psiq. 2010;59(1):1-9.
  • 2. Figueira P, Correa H, Malloy-Diniz L, Romano-Silva MA. Edinburgh Postnatal Depression Scale for screening in the public health system. Rev Saude Publica. 2009;43(Supl 1):79-84.
  • 3. Amorim P. The Mini Neuropsychiatric Interview (MINI): desenvolvimento de um questionário diagnóstico padronizado breve para avaliação dos transtornos mentais do DSM-IV e da CID-10. Rev Bras Psiquiatr. 2003;22(3):26-39.
  • 4. O'Hara MW, Swain AM. Rates and risk of postpartum depression a meta-analysis. Int Rev Psychiatry. 1996;8(1):37-54.
  • 5. Figueira P, Malloy-Diniz L, Campos S, Miranda DM, Romano-Silva MA, Neves FS, et al. An association study between the Val66Met polymorphism 5 of the BDNF gene and postpartum depression. Arch Womens Ment Health. 2010;13(3):285-9.
  • Endereço para correspondência:
    Patrícia Figueira
    Rua Gustavo Pena, 44, sala 504, Horto
    31015-060 – Belo Horizonte, MG
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Nov 2010
    • Data do Fascículo
      2010
    Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro Av. Venceslau Brás, 71 Fundos, 22295-140 Rio de Janeiro - RJ Brasil, Tel./Fax: (55 21) 3873-5510 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
    E-mail: editora@ipub.ufrj.br