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Perfil de alta frequência em adolescentes e sua relação com o uso de MP3 players Como citar este artigo: Silvestre RA, Ribas Â, Hammerschmidt R, de Lacerda AB. High-frequency profile in adolescents and its relationship with the use of personal stereo devices. J Pediatr (Rio J). 2016;92:206-11. ☆☆ ☆☆ Este artigo foi escrito como parte da tese de mestrado da autora principal.

Resumo

Objetivo:

Analisar e correlacionar os achados audiométricos de altas frequências (9-16 kHz) em adolescentes com seus hábitos e atitudes de audição para prevenir perda auditiva induzida por ruído.

Método:

Este é um estudo transversal descritivo que incluiu 125 adolescentes em uma amostra de alunos ouvintes em uma escola estadual. Os indivíduos foram submetidos a testes de audiometria de altas frequências e responderam a um questionário autoadministrado que abordava informações sobre hábitos sonoros com relação ao uso de MP3 players. A amostra foi dividida de acordo com as características de exposição (tempo, duração, intensidade etc.) e os resultados foram comparados com os limites observados, por meio dos testes de diferença de proporções, qui-quadrado, t de Student e análise de variância (Anova), todos em um nível de significância de 0,05.

Resultados:

Foi registrada média de limiares de altas frequências abaixo de 15 dB HL e não foi encontrada correção significativa entre os achados audiométricos de altas frequências e o grau de exposição.

Conclusão:

A prevalência de hábitos sonoros prejudiciais devido ao uso de MP3 players é alta na população adolescente, porém não houve correlação entre a exposição a altos níveis de pressão sonora por meio de MP3 players e os limiares de altas frequências nessa população.

Palavras-chave
Audiometria; Adolescente; MP3 player; Perda auditiva; Prevenção primária

Abstract

Objective:

To analyze and correlate the audiometric findings of high frequencies (9–16 kHz) in adolescents with their hearing habits and attitudes, in order to prevent noise-induced hearing loss.

Method:

This was a descriptive cross-sectional study, which included 125 adolescents in a sample of normal-hearing students, at a state school. The subjects performed high-frequency audiometry testing and answered a self-administered questionnaire addressing information on sound habits concerning the use of personal stereo devices. The sample was divided according to the exposure characteristics (time, duration, intensity, etc.) and the results were compared with the observed thresholds, through the difference in proportions test, chi-squared, Student's t-test, and ANOVA, all at a significance level of 0.05.

Results:

Average high-frequency thresholds were registered below 15 dB HL and no significant correlation was found between high frequency audiometric findings and the degree of exposure.

Conclusion:

The prevalence of harmful sound habits due to the use of personal stereo devices is high in the adolescent population, but there was no correlation between exposure to high sound pressure levels through personal stereos and the high-frequency thresholds in this population.

Keywords
Audiometry; Adolescent; MP3 player; Hearing loss; Primary prevention

Introdução

Estudos relacionados aos hábitos recreativos com exposição a altos níveis de pressão sonora (SPL), especialmente por meio de aparelhos estéreo de uso pessoal, provaram ser recorrentes em diferentes populações adolescentes, com dados prevalentes acima de 90%.11 Vogel I, Verschuure H, Van der Ploeg CP, Brug J, Raat H. Esti-mated adolescent risk for hearing loss based on data from a large school-based survey. Am J Public Health. 2010;100: 1095-100.,22 Oghu DS, Asoegwu CN, Somefun OA. Subjective tinnitus and its association with use of ear phones among students of the Col-lege of Medicine, University of Lagos, Nigeria. Int Tinnitus J. 2012;17:169-72.

Considerando que o desenvolvimento tecnológico proporcionou aumento na qualidade e na potência dos fones de ouvido e headsets, com amplificadores que atingem 130 dB SPL sem distorção na intensidade sonora,33 Breinbauer HA, Anabalón JL, Gutierrez D, Cárcamo R, Oliva-res C, Carol J. Output capabilities of personal musi players and assessment of preferred listening levels of test subjecti-ves: outlining recommendations for preventing noise-induced hearing loss. Laryngoscope. 2012;122:2549-56.,44 Levey S, Fligor BJ, Cutler C, Harushimana I. Portable music player users: cultural differences and potential danger. Noise Health. 2013;15:296-300. e associados a MP3 players baratos, altamente portáteis, com grande capacidade de armazenamento de músicas e baterias de longa duração, há uma situação na qual o MP3 players se tornou particularmente prevalente e prejudicial entre a população jovem urbana.44 Levey S, Fligor BJ, Cutler C, Harushimana I. Portable music player users: cultural differences and potential danger. Noise Health. 2013;15:296-300.,55 Luz TS, Borja AL. Sintomas auditivos em usuários de estéreos pessoais. Int Arch Otorhinolaringol. 2012;16:163-9.

Algumas possíveis explicações para essa exposição envolvem: a necessidade de autoestima e aceitação social, que leva à adoção de modismos para se tornar membro de um grupo;66 Pellegrino E, Lorini C, Allodi G, Buonamici C, Garofalo G, Bonac-corsi G. Music-listening habits with MP3 player in a group of adolescents: a descriptive survey. Ann Ig. 2013;25:367-76. potencial de personalização de um ambiente sonoro que leva a isolamento pessoal;44 Levey S, Fligor BJ, Cutler C, Harushimana I. Portable music player users: cultural differences and potential danger. Noise Health. 2013;15:296-300. e mesmo sensação de prazer e euforia que poderão surgir da liberação de endorfina devido à reação fisiológica que acompanha a exposição em níveis sonoros acima de 80 dB SPL.77 Kim MG, Hong SM, Shim HJ, Kim YD, Che CII, Yec SG. Hea-ring threshold of Korean adolescents associated with the use of personal music players. Yonsei Med J. 2009;50:771 -6.

Apesar de a música ter sido considerada menos prejudicial ao sistema auditivo humano do que um ruído industrial equivalente, devido à natureza intermitente do primeiro, que permite um período de recuperação da audição, uma menor frequência dominante e reações de alerta mais discretas devido à interpretação pessoal de som agradável,66 Pellegrino E, Lorini C, Allodi G, Buonamici C, Garofalo G, Bonac-corsi G. Music-listening habits with MP3 player in a group of adolescents: a descriptive survey. Ann Ig. 2013;25:367-76. o indivíduo precisa se atentar à característica irreversível da perda auditiva induzida por alto SPL (HSPLIHL), à maior susceptibilidade de dano coclear nas populações jovens88 Khatter K. Personal music players and hearing loss: are we deaf to the risks? Open Med. 2011;5:137-8. e ao aumento da predisposição a desenvolver perda auditiva na vida adulta quando houver exposição precoce a altos níveis de ruído.99 Van Kamp I, Davies H. Noise and health in vulnerable groups: a review. Noise Health. 2013;15:153-9.

Tradicionalmente, o diagnóstico de HSPLIHL, bem como seu monitoramento e sua verificação, é feito pelo teste do limiar audiométrico subjetivo observado por meio da audiometria tonal liminar (ATL) e de avaliações audiológicas objetivas, como resposta auditiva do tronco cerebral (BERA) e testes de emissões otoacústicas (EOAs), principalmente emissões otoacústicas evocadas por produto de distorção (EOE/DP).1010 European Commission. Potential health risks of exposure to noise from personal music players and mobile phones including a music playing function. Disponível em: http://ec.europa.eu/health/ph_risk/committees/04_scenihr/docs/scenihr_o_018.pdf [acessado 16.11.14].
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Contudo, em vista da elevação precoce reconhecida dos limiares auditivos para altas frequências, em comparação com os limiares normais, em vista das condições possivelmente prejudiciais para o sistema coclear, como exposição a ruído ocupacional e/ou drogas ototóxicas, podem ocorrer certas doenças sistêmicas e ontológicas, bem como durante o processo de envelhecimento auditivo. A audiometria de altas frequências (AAF) tem sido indicada como instrumento no diagnóstico precoce de perda auditiva, em comparação com a ATL e EOAs.1111 Malucelli DA, Malucelli FJ, Fonseca VR, Zeigelboim B, Ribas A, de Trotta F. et al. Hearing loss prevalence in patients with diabetes mellitustype 1. Braz J Otorhinolaryngol. 2012;78:105-15.1515 Ottoni AO, Barbosa-Branco A, Boger ME, Garavelli SL. Study of the noise spectrum on high frequency thresholds in workers exposed to noise. Braz J Otorhinolaryngol. 2012;78:108-14.

Este artigo visa a analisar os achados da audiometria de altas frequências (AAF) em adolescentes e correlacioná-los com o uso de MP3 players.

Material e métodos

Este é um estudo transversal descritivo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa registrado sob o número CEP 2576.183/2011-08. Todos os participantes assinaram o formulário de consentimento e autorizaram o uso de dados coletados após o esclarecimento com relação aos objetivos e procedimentos da pesquisa.

Todos os indivíduos convidados a participar do estudo eram alunos adolescentes de ambos os sexos matriculados em uma escola estadual em Curitiba, Brasil, e estavam presentes durante os dias de avaliação. Os critérios de inclusão estabelecidos foram: assinatura do termo de consentimento, exame otorrinolaringológico normal, avaliação da impedância acústica e audiometria tonal liminar (n = 134). Os alunos que não tinham hábito de escutar música em MP3 players foram excluídos do corpo de pesquisa final (n = 9).

A avaliação feita por um médico otorrinolaringologista deu um enfoque especial às estruturas nasais e dos seios da face e às estruturas do ouvido externo e médio e limpou o canal auditivo externo quando necessário.

Na avaliação audiológica, os limiares normais foram considerados até 25 dB HL por classificação por Lloyd e Kaplan (1978)1616 Sistemas de Conselhos Federal e Regionais de Fonoaudiologia. Manual de procedimentos em audiometria tonal, logo audiometria e medidas de imitância acústica. Disponível em: http://www.fonoaudiologia.org.br/publicacoes/Manual%20de%20Audiologia.pdf [acessado 16.11.14].
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e obtidos por meio de audiometria tonal liminar (500 Hz-8000 Hz), feita com um aparelho da marca Otometrics (Madsen Itera II®, Taastrup, Dinamarca), com fones de ouvido TDH39® (MedRx, Inc, RD, EUA), calibrado em uma cabine acústica de acordo com os padrões exigidos pelo Conselho Federal de Fonoaudiologia.1616 Sistemas de Conselhos Federal e Regionais de Fonoaudiologia. Manual de procedimentos em audiometria tonal, logo audiometria e medidas de imitância acústica. Disponível em: http://www.fonoaudiologia.org.br/publicacoes/Manual%20de%20Audiologia.pdf [acessado 16.11.14].
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Para avaliar a impedância acústica, foi usado um analisador de ouvido médio da marca Interacoustics, modelo AT22® (Otometrics®, Middelfart, Dinamarca) e os resultados normais foram considerados aqueles compatíveis com o timpanograma tipo A, segundo Jerger.1616 Sistemas de Conselhos Federal e Regionais de Fonoaudiologia. Manual de procedimentos em audiometria tonal, logo audiometria e medidas de imitância acústica. Disponível em: http://www.fonoaudiologia.org.br/publicacoes/Manual%20de%20Audiologia.pdf [acessado 16.11.14].
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Os alunos incluídos nos critérios de seleção foram convidados a responder a um questionário autoadministrado composto de perguntas abertas e fechadas que abordava hábitos sonoros relacionados ao uso de MP3 players, incluindo informações sobre características de exposição (tempo de exposição em anos, dias por semana e horas por dia, fones de inserção ou com abafadores de ruído, hábito de dormir com o aparelho ligado, hábito de falar enquanto usa o aparelho, intensidade comumente usada) e os sintomas associados à exposição. Foi usada uma escala visual analógica para estimar a faixa de volume comumente usada pelos indivíduos do estudo. Quaisquer dúvidas dos indivíduos foram esclarecidas pela equipe de pesquisa.

A seguir, foi feita uma avaliação audiométrica de altas frequências nas condições acústicas descritas acima, com o audiômetro mencionado e fones de ouvido KOSS HV/PRO (KOSS®, EUA), nos limiares expressos em dB HL, nas frequências de 9.000, 11.200, 12.500, 14.000 e 16.000 Hz.

Os resultados forem analisados estatisticamente pelos testes qui-quadrado, de diferença de proporções, t de Student e Anova no nível de significância de 0,05.

Resultados

Mediante o estabelecimento dos critérios de inclusão com perspectivas de normalidade clínica e audiológica (n = 134), bem como o uso de MP3 players (n = 125), foi encontrada prevalência do uso de MP3 players entre adolescentes com audição normal (93,28%). Uma comparação da amostra por idade e sexo é mostrada na tabela 1.

Tabela 1
Descrição da amostra por idade e sexo

Ao analisar a amostra por tempo de exposição a MP3 players, foi constatado que 58,4% (n = 73) dos indivíduos fazem uso diário de seus aparelhos, com respostas equivalentes de ambos os sexos. Contudo, ao usar o teste qui-quadrado, em um nível de significância de 0,05, observou-se que há um uso significativamente mais longo de MP3 players por mulheres, de acordo com a tabela 2.

Tabela 2
Descrição da amostra por hábitos de uso de MP3 players

Além disso, ao usar o teste qui-quadrado, foram identificados hábitos mais prejudiciais entre mulheres para as seguintes variáveis: hábito de dormir com o MP3 player ligado (p = 0,0037) e volume percebido por outros (p = 0,0458). E, por meio do teste de diferença de proporções, foi mostrada uma preferência por fones de ouvido de inserção (p = 0,0150), com ambos os textos no nível de significância de 0,05.

Observamos que quase 40% dos adolescentes (n = 49) apresentaram pelo menos um sintoma otológico devido ao uso de MP3 players, com prevalência de zumbido de 21,6%, seguido de dor no ouvido, plenitude auricular, prurido, tontura e perda auditiva. Ao tentar correlacionar a prevalência de queixas otológicas com o uso habitual de MP3 players, com a aplicação dos testes qui-quadrado e de diferença de proporções, em um nível de significância de 0,05, não foi encontrada diferença significativa entre os indivíduos mais e menos expostos.

Ao avaliar os resultados dos limiares auditivos para as altas frequências testadas, foram obtidos valores médios abaixo de 15 dB HL, com resultados ligeiramente melhores para mulheres de 11.200 Hz. Com relação às desigualdades entre os ouvidos, não houve diferença estatisticamente significativa, apesar de terem sido observadas respostas ligeiramente melhores para o ouvido direito, apenas entre mulheres.

Considerando as duas faixas etárias, houve uma média de maiores limiares no grupo de indivíduos mais velhos, para todas as frequências testadas, exceto em 11.200 Hz. Contudo, houve apenas uma diferença significativa em 14.000 Hz e o teste t de Student mostrou um nível de significância de 0,05. A caracterização dos altos limiares de frequência é mostrada na tabela 3.

Tabela 3
Descrição dos limites de audição em decibéis a frequências de 9.000-16.000 Hz por faixa etária

Para descrever e analisar os resultados por sexo, houve uma diferença estatisticamente significativa nas frequências com início em 12,5 KHz para a faixa entre 15-17 anos, com a pior média entre homens.

A análise dos limiares audiométricos em termos de exposição a MP3 players não mostrou diferença significativa em qualquer frequência testada, seja para as variáveis de duração do uso de MP3 players em anos, dias por semana ou horas por dia, com o teste t de Student ou para as variáveis de intensidade ou tipos de fone de ouvido com o teste Anova, com ambos os testes no nível de significância de 0,05, apesar de ter havido uma média maior em todas as frequências testadas, nos dois ouvidos, entre aqueles que escutam MP3 player cinco ou mais dias por semana.

As correlações sobre exposição são descritas na tabela 4, na qual houve menos uso de MP3 players em dias por semana e horas por dia para os indivíduos que começaram a usar MP3 players mais recentemente. Também foi observada uma preferência para maior intensidade de nível de som (volume) entre aqueles que escutam os aparelhos pelo menos cinco dias por semana.

Tabela 4
Relação entre o tempo de uso de MP3 player e características de uso (em número de dias por semanas, número de horas por dia e nível do volume)

Discussão

A popularização do uso de MP3 players, principalmente nas populações jovens, e a falta de regulamentação sobre a intensidade máxima de saída de som dos aparelhos têm contribuído para o aumento da exposição recreativa a som em alta intensidade nessa faixa etária.44 Levey S, Fligor BJ, Cutler C, Harushimana I. Portable music player users: cultural differences and potential danger. Noise Health. 2013;15:296-300. A alta prevalência do hábito de uso do MP3 player observada (93,28%) tem-se repetido em estudos que envolvem populações adolescentes em diferentes continentes e atinge 95,6% dos indivíduos em algumas amostras.11 Vogel I, Verschuure H, Van der Ploeg CP, Brug J, Raat H. Esti-mated adolescent risk for hearing loss based on data from a large school-based survey. Am J Public Health. 2010;100: 1095-100.,22 Oghu DS, Asoegwu CN, Somefun OA. Subjective tinnitus and its association with use of ear phones among students of the Col-lege of Medicine, University of Lagos, Nigeria. Int Tinnitus J. 2012;17:169-72.,77 Kim MG, Hong SM, Shim HJ, Kim YD, Che CII, Yec SG. Hea-ring threshold of Korean adolescents associated with the use of personal music players. Yonsei Med J. 2009;50:771 -6.

O perfil de uso de MP3 player (tabela 2), uso pelo menos cinco dias por semana, no mínimo duas horas por dia, apesar de por menos de três anos, reflete a presença de atitudes positivas para ruído na população adolescente. Esse é um padrão de mau uso dos aparelhos que foi identificado em vários estudos.44 Levey S, Fligor BJ, Cutler C, Harushimana I. Portable music player users: cultural differences and potential danger. Noise Health. 2013;15:296-300.,66 Pellegrino E, Lorini C, Allodi G, Buonamici C, Garofalo G, Bonac-corsi G. Music-listening habits with MP3 player in a group of adolescents: a descriptive survey. Ann Ig. 2013;25:367-76.,1717 Gilliver M, Carter L, Macoun D, Rosen J, Williams W. Music to whose ears? The effect to social norms on young people's risks perception of hearing damage resulting from their music liste-ning behavior. Noise Health. 2012;14:47-51.1919 Martin AH, Griest SE, Sobel JL, Howarth LC. Randomized trial of four noise-induced hearing loss and tinnitus prevention inter-ventions for children. Int J Audiol. 2013;52:41-9.

Contudo, diferentemente do que é comumente mencionado nos estudos,2020 Gilles A, van Hal G, de Ridder D, Wouters K, van de Heyning P. Epidemiology of noise-induced tinnitus and the attitudes and beliefs towards noise and hearing protection in adolescents. PLoS ONE. 2013;8:1-8.,2121 Sulaiman AH, Seluakumaran K, Husain R. Hearing risk associated with a usage of personal listening devices among urban high school students in Malaysia. Public Health. 2013;127:710-5. a observação de hábitos mais deletérios no grupo de mulheres pode ser explicada pela maior necessidade de isolamento e uma prevalência de sintomas que relacionam a ansiedade e a depressão entre as meninas.2222 Coelho CB. Epidemiology of tinnitus in children. In: M0ller AR, Langguth B, Deridder D, Kleinjung T, editors. Textbook of tinnitus. New York: Springer; 2011. p. 39-45.,2323 Juul JA. Hearing symptoms in children and adolescents: tinnitus and temporary thresholds shifts. [thesis]. 85 f. Sweden: University of Gothenburg; 2013.

Considerando o conhecimento do potencial deletério de alto SPL sobre a saúde auditiva, é relevante estimar que 10-30% dos usuários de MP3 players correm risco de perda auditiva induzida por ruído após cinco anos ou mais de uso devido à exposição a ruído de alta intensidade por um longo período.11 Vogel I, Verschuure H, Van der Ploeg CP, Brug J, Raat H. Esti-mated adolescent risk for hearing loss based on data from a large school-based survey. Am J Public Health. 2010;100: 1095-100. Como a ocorrência de sintomas otológicos pode significar dano auditivo subclínico temporário ou permanente, a alta prevalência de queixas otológicas (39,2%) entre nossos indivíduos se destaca, apesar de alguns estudos terem mostrado resultados de até 67,2%.55 Luz TS, Borja AL. Sintomas auditivos em usuários de estéreos pessoais. Int Arch Otorhinolaringol. 2012;16:163-9.

Comparando a presença de zumbido dentre grupos mais e menos afetados, não observamos diferença na prevalência dos sintomas otológicos, o que coincide com outros estudos,2121 Sulaiman AH, Seluakumaran K, Husain R. Hearing risk associated with a usage of personal listening devices among urban high school students in Malaysia. Public Health. 2013;127:710-5. apesar de alguns autores terem identificado uma correlação positiva com o abuso no uso de MP3 players quando o indivíduo foi exposto a um período mais longo,55 Luz TS, Borja AL. Sintomas auditivos em usuários de estéreos pessoais. Int Arch Otorhinolaringol. 2012;16:163-9.,2222 Coelho CB. Epidemiology of tinnitus in children. In: M0ller AR, Langguth B, Deridder D, Kleinjung T, editors. Textbook of tinnitus. New York: Springer; 2011. p. 39-45. em maiores intensidades, e uso de fones de ouvido de inserção.22 Oghu DS, Asoegwu CN, Somefun OA. Subjective tinnitus and its association with use of ear phones among students of the Col-lege of Medicine, University of Lagos, Nigeria. Int Tinnitus J. 2012;17:169-72.

Limiares médios abaixo de 15 dB HL foram identificados para ambos os sexos em todas as frequências testadas, o que comprova a sugestão de adoção desses valores como parâmetros de normalidade para a população adolescente.2424 Anastasio AR, Radael RD, Cavalcante JM, Hatzopoulos S. A report of extended high frequency audiometry thresholds in school-age children with no hearing complaints. Audiol Res. 2012;2:39-42. A identificação de resultados ligeiramente melhores no grupo de mulheres com início em 11.200 Hz também tem sido recorrente em estudos de altas frequências, o que demonstra dependência dos limiares auditivos em homens já na adolescência.2525 Le Prell CG, Spankovich C, Lobarinas E, Griffiths SK. Extended high-frequency thresholds in college students: effects of music player use and other recreational noise. J Am Acad Audiol. 2013;24:725-39.,2626 Klagenberg KF, Oliva FC, Gonçalves CG, Lacerda AB, Garofani VG, Zeigelboim BS. Audiometria de altas frequências no diagnóstico complementar em audiologia: uma revisão da literatura nacional. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16:109-14. A observação de alto nível na frequência de 11.200 Hz para os resultados em meninos não encontrou referência na literatura, apesar de Sulaiman et al.2121 Sulaiman AH, Seluakumaran K, Husain R. Hearing risk associated with a usage of personal listening devices among urban high school students in Malaysia. Public Health. 2013;127:710-5. terem observado uma correlação positiva entre o volume do MP3 player usado e os limiares em 11,2 e 14 kHz.

Com relação à disparidade entre os ouvidos, não foi encontrada diferença nos limiares, apesar de terem sido vistas respostas ligeiramente melhores no ouvido direito no grupo de homens. Os achados são bastante controversos na literatura e, apesar de alguns autores apresentarem resultados semelhantes aos identificados,2727 Mehrparvar AH, Mirmohammadi SJ, Davari MH, Mostaghaci M, Mollasadegh A, Bahaloo M, et al. Conventional audiometry, extended high-frequency audiometry, and DPOAE for early diag-nosis of NIHL. Iranian Red Crescent Med J. 2014;16:1-6. não há um consenso a esse respeito, incluindo os achados de piores limiares no ouvido direito.2828 Lopes AC, Melo ADP, Santos CC. Estudo dos limiares de audibilidade nas altas frequências em trabalhadores da área odontológica. Int Arch Otorhinolaryngol. 2012;16:226-31. A ausência de concordância sobre essa variável na AAF poderá resultar de uma falta de especificação e processamento estatístico de limiares interaurais encontrados em alguns estudos.

A caracterização de limiares de altas frequências por faixa etária (tabela 3) mostra respostas piores na faixa etária mais velha, exceto na frequência de 11,2 kHz, o que reforça a relação direta de idade nos resultados da AAF na adolescência;2525 Le Prell CG, Spankovich C, Lobarinas E, Griffiths SK. Extended high-frequency thresholds in college students: effects of music player use and other recreational noise. J Am Acad Audiol. 2013;24:725-39.,2929 Lee J, Dhar S, Abel R, Banakis R, Grolley E, Lee J, et al. Behavioral hearing thresholds between 0.125 and 20 kHz using depth-compensated era simulator calibration. Ear Hear. 2012;33:315-29. apesar de estudos não mostrarem concordância sobre o período exato do início dessa redução.2424 Anastasio AR, Radael RD, Cavalcante JM, Hatzopoulos S. A report of extended high frequency audiometry thresholds in school-age children with no hearing complaints. Audiol Res. 2012;2:39-42.,2626 Klagenberg KF, Oliva FC, Gonçalves CG, Lacerda AB, Garofani VG, Zeigelboim BS. Audiometria de altas frequências no diagnóstico complementar em audiologia: uma revisão da literatura nacional. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16:109-14.

A análise de limiares audiométricos relacionados às características de exposição (duração de uso do MP3 players, tipo de fone de ouvido, volume utilizado, sexo etc.) não mostrou diferença significativa em qualquer frequência testada. Apesar disso, foi observado que, nos dois ouvidos, em todas as frequências, houve respostas piores no grupo com uso habitual por cinco dias por semana ou mais, contudo com nenhuma diferença estatística.

Alguns estudos identificaram limiares de até 6 dB HL a mais em indivíduos com pelo menos cinco anos de uso de MP3 players, em comparação com indivíduos não expostos.2525 Le Prell CG, Spankovich C, Lobarinas E, Griffiths SK. Extended high-frequency thresholds in college students: effects of music player use and other recreational noise. J Am Acad Audiol. 2013;24:725-39. Além disso, apesar de esses estudos terem demonstrado uma correlação positiva, mesmo fraca, com relação ao uso de MP3 players e aumento nas respostas em 11.2 e 14 KHz,2323 Juul JA. Hearing symptoms in children and adolescents: tinnitus and temporary thresholds shifts. [thesis]. 85 f. Sweden: University of Gothenburg; 2013. outros fatores não deixaram de identificar essa correlação.3030 Figueiredo RR, Azevedo AA, Oliveira PM, Amorim RP, Rios AG, Baptista V. Incidence of tinnitus in MP3 player users. Braz J Otorhinolaryngol. 2011;77:293-8.

Além das diferenças metodológicas e nos grupos amostrados entre vários estudos, a possibilidade é que os indivíduos com maior exposição a MP3 players que foram investigados nesta pesquisa não mostraram dano auditivo devido ao início recente no uso de MP3 players (60% com uso por menos de três anos). Mesmo apesar de as correlações relacionadas às características de exposição terem mostrado que os usuários com maior tempo de uso também apresentam mais horas de uso semanalmente e com maior intensidade (volume) entre os usuários regulares.

Por fim, durante as análises, percebemos que alguns fatores que podem ter limitado este estudo, como a homogeneidade da amostra, apesar da seleção aleatória dos indivíduos, não possibilitaram grupos com grandes diferenças de exposição.

Assim, acreditamos que estudos adicionais devem ser conduzidos com o público jovem, porém em faixas etárias mais amplas e incluindo um tamanho da amostra maior. Recomendamos também estudos longitudinais e transversais entre os grupos de exposição para esclarecer ou reduzir resultados conflitantes.

Foi constatado que os achados da AAF foram analisados com sucesso, com ênfase na observação de limiares abaixo de 15 dB HL, provavelmente para funcionar como valores de referência normais na adolescência com uma relação positiva com a idade em homens a partir dos 15 anos.

Paralelamente, houve uma alta prevalência de hábitos sonoros prejudiciais com relação ao uso de MP3 players. Contudo, apesar de nenhuma correlação ter sido observada entre a exposição a MP3 players e limiares de altas frequências na população estudada, considerando a natureza irretratável da perda auditiva induzida por ruído, é importante um monitoramento audiológico e medidas educacionais que contenham esses hábitos e atitudes.

  • Como citar este artigo: Silvestre RA, Ribas Â, Hammerschmidt R, de Lacerda AB. High-frequency profile in adolescents and its relationship with the use of personal stereo devices. J Pediatr (Rio J). 2016;92:206-11.
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    Este artigo foi escrito como parte da tese de mestrado da autora principal.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2016

Histórico

  • Recebido
    14 Maio 2015
  • Aceito
    13 Jul 2015
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