Acessibilidade / Reportar erro

Manifestações atípicas do vírus de Epstein-Barr em crianças: um desafio diagnóstico Como citar este artigo: Bolis V, Karadedos C, Chiotis I, Chaliasos N, Tsabouri S. Atypical manifestations of Epstein-Barr virus in children: a diagnostic challenge. J Pediatr (Rio J). 2016;92:113-21.

Resumo

Objetivo:

Esclarecimento da frequência e dos mecanismos patofisiológicos das manifestações raras da infecção por vírus de Epstein-Barr.

Fontes:

Estudos de pesquisas originais publicados em inglês entre 1985 e 2015 foram selecionados por meio de uma busca na literatura assistida por computador (Pubmed e Scopus). As buscas no computador usaram combinações de palavras-chave relacionadas a "infecções por VEB" e "manifestação atípica".

Resumo dos achados:

O vírus de Epstein-Barr é um herpesvírus responsável por uma infecção latente vitalícia em quase todo adulto. A infecção primária ocorre principalmente em crianças e se apresenta como síndrome clínica da mononucleose infecciosa. Contudo, a infecção por vírus de Epstein-Barr pode apresentar diversas manifestações raras, atípicas e de alto risco. Ela pode causar infecções secundárias e diversas complicações dos sistemas respiratório, cardiovascular, geniturinário, gastrointestinal e nervoso. O vírus de Epstein-Barr também desempenha um papel significativo na patogênese de doenças, alergias e neoplasias autoimunes. O linfoma de Burkitt é o principal representante das últimas. Os mecanismos dessas manifestações ainda não foram resolvidos. Portanto, as principais sugestões são invasão viral direta e resposta imune crônica devido à reativação do estado latente do vírus ou mesmo a diversas mutações do DNA.

Conclusões:

Os médicos devem tomar cuidado sobre apresentações incomuns de infecção viral e considerar o VEB um agente causador quando encontrarem situações clínicas semelhantes.

Palavras-chave
Vírus de Epstein-Barr; Mononucleose infecciosa; Crianças; Complicações

Abstract

Objective:

Clarify the frequency and the pathophysiological mechanisms of the rare manifestations of Epstein–Barr virus infection.

Sources:

Original research studies published in English between 1985 and 2015 were selected through a computer-assisted literature search (PubMed and Scopus). Computer searches used combinations of key words relating to "EBV infections" and "atypical manifestation.

Summary of the findings:

"Epstein–Barr virus is a herpes virus responsible for a lifelong latent infection in almost every adult. The primary infection concerns mostly children and presents with the clinical syndrome of infectious mononucleosis. However, Epstein–Barr virus infection may exhibit numerous rare, atypical and threatening manifestations. It may cause secondary infections and various complications of the respiratory, cardiovascular, genitourinary, gastrointestinal, and nervous systems. Epstein–Barr virus also plays a significant role in pathogenesis of autoimmune diseases, allergies, and neoplasms, with Burkitt lymphoma as the main representative of the latter. The mechanisms of these manifestations are still unresolved. Therefore, the main suggestions are direct viral invasion and chronic immune response due to the reactivation of the latent state of the virus, or even various DNA mutations.

Conclusions:

Physicians should be cautious about uncommon presentations of the viral infection and consider EBV as a causative agent when they encounter similar clinical pictures.

Keywords
Epstein–Barr virus; Infectious mononucleosis; Child; Complications

Introdução

O vírus de Epstein-Barr (VEB) é um agente infeccioso comum, encontrado em aproximadamente 95% da população mundial. A primeira infecção com o VEB é mais frequente durante a infância, consiste em uma infecção leve que normalmente não apresenta sintomas.11 Draborg AH, Duus K, Houen G. Epstein-Barr virus in systemic autoimmune diseases. Clin Dev Immunol. 2013;2013:535738. Contudo, quando a primeira infecção ocorre na adolescência, ela leva à mononucleose infecciosa (MI) em 30-70% dos casos, quando até 20% dos linfócitos B são infectados com o VEB.11 Draborg AH, Duus K, Houen G. Epstein-Barr virus in systemic autoimmune diseases. Clin Dev Immunol. 2013;2013:535738.,22 Carvalho LH. Mononucleose infecciosa. J Pediatr (Rio J). 1999;75:S115-25.

O VEB é um vírus de DNA pertencente à família do herpes e também é denominado herpesvírus humano tipo 4. Ele é composto por um genoma de DNA de cadeia dupla linear revestido por um capsídeo envolvido pelo tegumento e por um envelope derivado de membrana de uma célula hospedeira incorporado com glicoproteínas. O VEB tem uma extensa codificação do genoma de 87 proteínas. As funções de 72 dessas proteínas foram definidas até agora.11 Draborg AH, Duus K, Houen G. Epstein-Barr virus in systemic autoimmune diseases. Clin Dev Immunol. 2013;2013:535738.

A transmissão do VEB é feita por meio da saliva e inicialmente infecta células epiteliais na orofaringe e na nasofaringe. Daí por diante, o VEB penetra os tecidos subjacentes e infecta as células B. Após uma primeira infecção lítica, o VEB pode ser imortalizado em células B da memória em repouso, periodicamente reativadas por ele. A capacidade de reativação faz do VEB um constante desafio para o hospedeiro.11 Draborg AH, Duus K, Houen G. Epstein-Barr virus in systemic autoimmune diseases. Clin Dev Immunol. 2013;2013:535738.

A MI é a principal entidade clínica causada pelo VEB. O diagnóstico tem como base o exame clínico que revela a tríade clássica com febre, linfadenopatia e faringite33 Valachis A, Kofteridis DP. Mononucleosis and Epstein-Barr virus infection: treatment and medication. Dove Press J Virus Adapt Treat. 2012;4:23-8. e achados laboratoriais, incluindo a presença de linfocitose atípica e anticorpos heterófilos.22 Carvalho LH. Mononucleose infecciosa. J Pediatr (Rio J). 1999;75:S115-25. A doença é administrada principalmente com cuidado de suporte, uma vez que se trata de uma infecção autolimitada.33 Valachis A, Kofteridis DP. Mononucleosis and Epstein-Barr virus infection: treatment and medication. Dove Press J Virus Adapt Treat. 2012;4:23-8. Contudo, a MI tem sido associada a várias complicações precoces ou tardias com diversos agravantes.

Esta análise tem como foco as raras manifestações da MI nas crianças. Estudos de pesquisas originais publicados em inglês entre 1985 e 2015 foram selecionados por meio de uma busca na literatura assistida por computador (Pubmed e Scopus). As buscas no computador usaram combinações de palavras-chave relacionadas a "infecções por VEB" e "manifestação atípica". Além disso, as listas de referência dos artigos obtidos ajudaram na procura de outros artigos relevantes, que não foram encontrados durante o procedimento de busca. Assim, 48 estudos foram selecionados e discutidos aqui (24 relatos de caso, 14 análises, cinco estudos caso-controle, um estudo de base populacional, duas cartas ao editor, um estudo de coorte, uma metanálise). Os possíveis fatores que poderão influenciar os achados desta análise são artigos de restrição em inglês, juntamente com base de dados e viés de citação.

Infecção secundária

Dacriocistite aguda

Uma rara complicação da MI, com apenas cinco casos relatados. Ela é definida por uma massa dolorosa e palpável na área do canto medial, normalmente acompanhada de febre.44 Ghauri AJ, Keane PA, Scotcher SM, Clarke JL, Madge SN. Acute dacryocystitis associated with Epstein-Barr virus infec-tion. Orbit. 2011;30:245-8.

A etiologia é edema do epitélio nasal e hiperplasia linfoide a partir da MI, o que causa uma obstrução temporária do canal nasolacrimal. A colonização do conteúdo do saco lacrimal por patógenos respiratórios leva, por fim, à dacriocistite aguda. Essa complicação provavelmente acontece em crianças e jovens devido à anatomia nasal menor e à epidemiologia única do VEB.44 Ghauri AJ, Keane PA, Scotcher SM, Clarke JL, Madge SN. Acute dacryocystitis associated with Epstein-Barr virus infec-tion. Orbit. 2011;30:245-8.

Pacientes com MI e dacriocistite aguda devem ser tratados com antibióticos e pode ser necessária a drenagem do abscesso do saco lacrimal.44 Ghauri AJ, Keane PA, Scotcher SM, Clarke JL, Madge SN. Acute dacryocystitis associated with Epstein-Barr virus infec-tion. Orbit. 2011;30:245-8.

Complicações respiratórias

Obstrução das vias aéreas superiores

A obstrução das vias aéreas superiores é uma complicação da MI com um risco de vida considerável. A obstrução significativa das vias aéreas afeta 1-3,5% dos casos. A suspeita deve aumentar na presença de odinofagia, linfadenopatia cervical e sintomas de insuficiência respiratória.55 Glynn FJ, Mackle T, Kinsella J. Upperairway obstruction in infectious mononucleosis. Eur J Emerg Med. 2007;14:41-2.

A MI causa a inflamação do anel linfático de Waldeyer, edema da faringe e da epiglote e formação pseudomembranosa nas grandes vias aéreas. Os sinais de obstrução grave das vias aéreas superiores normalmente são ausentes nos primeiros estágios da doença. Os pacientes devem ser tratados com corticosteroides e, nos casos graves, amigdalectomia aguda, intubação endotraqueal ou traqueotomia poderão ser obrigatórias para proteger as vias aéreas.55 Glynn FJ, Mackle T, Kinsella J. Upperairway obstruction in infectious mononucleosis. Eur J Emerg Med. 2007;14:41-2.

Pneumonia

O envolvimento pulmonar é constatado em 5-10% dos casos de MI em crianças. Relatos de infecção pulmonar sintomática grave por VEB são raros e descritos com mais frequência em adultos imunossuprimidos. Cinco casos de envolvimento grave do pulmão foram relatados em infecções por VEB em crianças. Três dessas crianças sofriam de insuficiência respiratória e pneumonite intersticial, uma de consolidação do lóbulo inferior bilateral e derrame complicado por hemoptise e a última, de pleuropneumonia.66 Miron D, Merzel Y, Lev A, Meir JJ, Horowitz Y. Pleuropneumonia as the sole manifestation of Epstein-Barr virus-associated infectious mononucleosis. Isr Med Assoc J. 2002;4:733-4.

O mecanismo patofisiológico inclui linfócitos infectados por VEB, que se infiltram no pulmão durante a MI aguda. Contudo, o fato de esse envolvimento pulmonar resultar da invasão viral direta do pulmão ou representar uma reação imunológica ao vírus é questionável. Também se sugeriu que o VEB atua como um copatógeno ou induz uma imunossupressão temporária e torna o paciente suscetível a outra infecção.66 Miron D, Merzel Y, Lev A, Meir JJ, Horowitz Y. Pleuropneumonia as the sole manifestation of Epstein-Barr virus-associated infectious mononucleosis. Isr Med Assoc J. 2002;4:733-4.

Complicações cardiovasculares

Miocardite aguda

Estima-se que a prevalência do VEB é de menos de 1% na miocardite viral,33 Valachis A, Kofteridis DP. Mononucleosis and Epstein-Barr virus infection: treatment and medication. Dove Press J Virus Adapt Treat. 2012;4:23-8. ao passo que existem diversos relatos anedóticos de complicações do coração resultantes da MI nos últimos 60 anos.77 Sabbatani S, Manfredi R, Ortolani P. Trapani FF, Viale P. Myopericarditis during a primary Epstein-Barr virus infection in an otherwise healthy young adult. An unusual and insidious complication. Case report and a 60-year literature review. Infez Med. 2012;20:75-81. O VEB e o citomegalovírus (CMV) estão associados a essa patologia, especialmente após o transplante de coração.88 Andréoletti L, Lévêque N, Boulagnon C, Brasselet C, Fornes P. Viral causes of human myocarditis. Arch Cardiovasc Dis. 2009;102:559-68.

A progressão patofisiológica é composta de três fases. Na primeira fase, a destruição dos cardiomiócitos deriva diretamente da lise mediada por vírus ou indiretamente da resposta imune com expressão de citocinas pró-inflamatórias. Na segunda fase, as células T detectam o antígeno viral e destroem as células cardíacas infectadas por meio da secreção de citocinas ou perforinas. Na última fase, os miócitos destruídos são substituídos por fibrose difusa e levam a ventrículos dilatados e insuficiência cardíaca.88 Andréoletti L, Lévêque N, Boulagnon C, Brasselet C, Fornes P. Viral causes of human myocarditis. Arch Cardiovasc Dis. 2009;102:559-68.

A miocardite, bem como outras complicações cardíacas por VEB, como a pericardite, podem até mesmo preceder a MI clínica e prejudicar o diagnóstico.77 Sabbatani S, Manfredi R, Ortolani P. Trapani FF, Viale P. Myopericarditis during a primary Epstein-Barr virus infection in an otherwise healthy young adult. An unusual and insidious complication. Case report and a 60-year literature review. Infez Med. 2012;20:75-81.

Aterosclerose

O papel do VEB na patogênese de aterosclerose tem como base achados que sugerem que o DNA do VEB é comumente encontrado em placas ateromatosas. Contudo, a presença de DNA do VEB em ateromas varia de 12% a 80%. Portanto, esses achados são questionáveis.99 Kutikhin A, Brusina E, Yuzhalin AE. Viruses and stherosclerosis. New York: Springer; 2013.

Essa complicação atinge apenas adultos e o possível mecanismo tem como base a enzima desoxiuridina trifosfato nucleotidohidrolase (dUTPase) codificada pelo VEB. Foi demonstrado que a dUTPase induz a produção de citocinas pró-inflamatórias, como a interleucina-6 (IL-6), e a expressão de células endoteliais da molécula de adesão intercelular-1 (ICAM-1). Acredita-se que o estresse emocional e psicossocial desregula a repressão imune do vírus e permite sua replicação e produção de dUTPase. Esse mecanismo fornece uma explicação para a conexão entre estresse, VEB e eventos de artéria coronária.1010 Binkley PF, Cooke GE, Lesinski A, Taylor M, Chen M, Laskowski B, et al. Evidence for the role of Epstein-Barr virus infecti-ons in the pathogenesis of acute coronary events. PLOS ONE. 2013;8:e54008. O gene 3 induzido pelo vírus de Epstein-Barr (Ebi3) também está implicado na aterosclerose.1111 Kempe S, Heinz P Kokai E, Devergne O, Marx N, Wirth T. Epstein--Barr virus-induced gene-3 is expressed in human atheroma plaques. Am J Pathol. 2009;175:440-7.

Complicações hematológicas

Trombocitopenia

A trombocitopenia leve ocorre em 25-50% dos casos não complicados durante a fase aguda da doença. Um paciente ocasional pode ter trombocitopenia por oito semanas ou mais. Em contrapartida, a trombocitopenia grave (contagem de plaquetas < 20:109/L) é rara, com 38 casos relatados; 28 desses pacientes tinham menos de 21 anos. Dois vieram a óbito por complicações causadas pela trombocitopenia e hemorragia.1212 Walter RB, Hong TC, Bachli EB. Life-threatening thrombocyto-penia associated with acute Epstein-Barr virus infection in an older adult. Ann Hematol. 2002;81:672-5. Embora a trombocitopenia grave associada ao VEB seja rara, pode ter consequências fatais. Essa complicação deve ser considerada em qualquer paciente com infecção aguda por VEB e sangramentos das mucosas ou dérmico.1313 Pipp ML, Means ND, Sixbey JW, Morris KL, Gue CL, Baddour LM. Acute Epstein-Barr virus infection complicated by severe thrombocytopenia. Clin Infect Dis. 1997;25:1237-9.

Foi proposto que a fisiopatologia da trombocitopenia inclui a presença de uma aglutinina destruidora de plaquetas em resposta a uma ligação entre um agente viral e as plaquetas. Outros possíveis mecanismos incluem dano vascular devido aos agentes infecciosos e hiperesplenismo ou formação de anticorpos no baço e no sistema retículoendotelial.1212 Walter RB, Hong TC, Bachli EB. Life-threatening thrombocyto-penia associated with acute Epstein-Barr virus infection in an older adult. Ann Hematol. 2002;81:672-5.

Anemia aplásica

A anemia aplásica após a infecção primária por VEB ou em associação com a reativação da infecção por VEB foi relatada em 24 casos na literatura; 17 desses casos tinham menos de 18 anos. Contudo, é provável que alguns casos de anemia aplásica caracterizados como idiopáticos sejam, na verdade, acionados por uma infecção por VEB, pois a infecção por VEB em crianças jovens apresenta sintomas atípicos.1414 Khan I, Inoue S, Mushtaq R, Onwuzurike N. EBV infection resul-ting in aplastic anemia: a case report and literature review. J Blood Disord Transfus. 2013;4:141.

As células B infectadas pelo VEB poderão provocar expansão oligoclonal de células T supressoras (CD8 + , CD28–), que impedem o desenvolvimento de células-tronco hematopoéticas autólogas. O VEB associado e a anemia aplásica idiopática apresentam prognósticos semelhantes.1414 Khan I, Inoue S, Mushtaq R, Onwuzurike N. EBV infection resul-ting in aplastic anemia: a case report and literature review. J Blood Disord Transfus. 2013;4:141.

Agranulocitose

A neutropenia leve é uma manifestação comum em MI durante as primeiras semanas da doença, porém a agranulocitose ou neutropenia grave após a MI é muito rara, com apenas 29 casos relatados.1515 Yokoyama T, Tokuhisa Y,Toga A, Fujiki T Sakakibara Y.Mase S, et al. Agranulocytosis after infectious mononucleosis. J Clin Virol. 2013;56:271-3.

A patogênese de agranulocitose após a MI pode envolver redução da produção ou maturação de células mieloides na medula como resultado do efeito direto da destruição periférica de células mieloides mediada por anticorpos ou VEB. A hipótese de parada da maturação de células mieloides foi sugerida porque células mieloides maduras desaparecem na medula óssea do paciente. Os anticorpos antígeno neutrofílico humano 1a (anti-HNA-1a) e anti-HNA-1b estão ambos associados à fisiopatologia na agranulocitose após a MI, embora seja desconhecido se os anticorpos antineutrófilos são produzidos em células B infectadas por VEB.1515 Yokoyama T, Tokuhisa Y,Toga A, Fujiki T Sakakibara Y.Mase S, et al. Agranulocytosis after infectious mononucleosis. J Clin Virol. 2013;56:271-3.

Linfo-histiocitose

A síndrome hemofagocítica ou linfo-histiocitose hemofagocítica (LHH) é uma doença rara e fatal causada por uma disfunção de células T citotóxicas e células NK.1616 Maakaroun NR, Moanna A, Jacob JT, Albrecht H. Viral infecti-ons associated with haemophagocytic syndrome. Rev Med Virol. 2010;20:93-105. A incidência de LHH é estimada em um caso em 800.000 pessoas, metade dos quais foi associada ao VEB. A LHH associada a VEB foi observada em neonatos, crianças e adultos, porém 80% dos casos ocorreram em pessoas até 14 anos. A LHH pode ser tanto primária, ou seja, devido a um defeito genético subjacente, quanto ou secundária, relacionada a malignidades, doenças autoimunes (síndrome de ativação macrofágica) ou infecções. Os fatores infecciosos desencadeantes são principalmente o vírus da herpes e o VEB é o mais comum.1717 Luzuriaga K, Sullivan JL. Infectious mononucleosis. N Engl J Med. 2010;362:1993-2000.

Um possível mecanismo inclui a desregulação de células T/NK, o que leva ao aumento da liberação de citocinas e resulta em ativação de histiócitos, seguida de hemofagocitose. A infiltração histiocitária do sistema reticuloendotelial causa hepatomegalia, esplenomegalia, linfadenopatia e pancitopenia e leva, consequentemente, à disfunção múltipla de órgãos.1616 Maakaroun NR, Moanna A, Jacob JT, Albrecht H. Viral infecti-ons associated with haemophagocytic syndrome. Rev Med Virol. 2010;20:93-105.

Complicações do sistema geniturinário

Disfunção renal

O envolvimento dos rins na infecção por VEB varia entre a hematúria microscópica e a proteinúria leve e a insuficiência renal aguda.1818 Araya CE, González-Peralta RP, Skoda-Smith S, Dharnidharka VR. Systemic Epstein-Barr virus infection associated with membra-nous nephropathy in children. Clin Nephrol. 2006;65:160-4. A disfunção renal na MI não é frequente, é majoritariamente autolimitada e raramente está associada à insuficiência da função renal. Evidências de um leve envolvimento dos rins podem estar presentes em até 16% dos pacientes com MI, porém a insuficiência renal grave é rara.1919 Verma N, Arunabh S, Brady TM, Charytan C. Acute interstitial nephritis secondary to infectious mononucleosis. Clin Nephrol. 2002;58:151-4.

A hematúria ou a proteinúria pode ser encontrada em 2% e 18% dos casos de MI, ao passo que a azotemia foi relatada em apenas oito casos. A nefrite intersticial é a anomalia histológica mais comum. Acredita-se que o VEB tenha um papel vital na patogênese da nefropatia IgA. Também ocorreram relatos ocasionais de síndrome nefrótica, síndrome hemolítico-urêmica, síndrome hepatorrenal e rabdomiólise em pacientes com MI.1818 Araya CE, González-Peralta RP, Skoda-Smith S, Dharnidharka VR. Systemic Epstein-Barr virus infection associated with membra-nous nephropathy in children. Clin Nephrol. 2006;65:160-4. A insuficiência renal aguda, embora menos comum, esteve associada principalmente com a rabdomiólise e a nefrite intersticial.1919 Verma N, Arunabh S, Brady TM, Charytan C. Acute interstitial nephritis secondary to infectious mononucleosis. Clin Nephrol. 2002;58:151-4.

Por fim, a nefropatia membranosa é resultado de uma proliferação viral sistêmica prolongada e da antigenemia persistente em pacientes com MI que não têm um sistema imunológico completamente competente, o que leva à deposição de complexos imunes no rim.1919 Verma N, Arunabh S, Brady TM, Charytan C. Acute interstitial nephritis secondary to infectious mononucleosis. Clin Nephrol. 2002;58:151-4.

A possibilidade da MI deve ser levada em consideração quando os pacientes apresentam insuficiência renal aguda, principalmente se outras características como febre, anemia hemolítica, hepatite ou trombocitopenia estiverem presentes.1818 Araya CE, González-Peralta RP, Skoda-Smith S, Dharnidharka VR. Systemic Epstein-Barr virus infection associated with membra-nous nephropathy in children. Clin Nephrol. 2006;65:160-4.

Úlceras genitais

A ulceração genital é uma manifestação incomum da infecção primária pelo VEB. Identificada pelo dermatologista austríaco Lipschütz como uma doença aguda com febre, ulceração genital e linfadenomegalia em jovens mulheres em 1913, chamada na época de úlcera de Lipschütz, atualmente é atribuída à infecção por VEB.2020 Halvorsen JA, Brevig T, Aas T, Skar AG, Slevolden EM Moi H. Genital ulcers as initial manifestation of Epstein-Barr virus infection: two new cases and a review of the literature. Acta Derm Venereol. 2006;86:439-42. Foram relatados 41 casos, cuja vasta maioria era de mulheres.2121. Jerdan K, Aronson I, Hernandez C, Fishman PM, Groth JV. Genital ulcers associated with Epstein-Barr virus. Cutis. 2013;91:273-6.2323 Sárdy M, Wollenberg A, Niedermeier A, Flaig MJ Genital ulcers associated with Epstein-Barr virus infection (ulcus vulvae acu-tum). Acta Derm Venereol. 2011;91:55-9.

Os pacientes desenvolvem uma ou mais úlceras grandes, com diâmetro entre 0,3 e 4 cm.2424 Crum NF. Epstein-Barr virus hepatitis: case series and review. South Med J. 2006;99:544-7. As úlceras associadas ao VEB são frequentemente bem profundas e necróticas, com bordas irregulares, e podem causar dor e sintomas urinários. O tempo médio de cura é de 18 dias.2020 Halvorsen JA, Brevig T, Aas T, Skar AG, Slevolden EM Moi H. Genital ulcers as initial manifestation of Epstein-Barr virus infection: two new cases and a review of the literature. Acta Derm Venereol. 2006;86:439-42.

Três hipóteses foram sugeridas para a patogênese das úlceras genitais causadas pelo VEB. A primeira inclui a reação de hipersensibilidade tipo III a complexos imunes produzidos na fase aguda da infecção por VEB. As úlceras genitais causadas pelo VEB também podem resultar da citólise devido à replicação do VEB nos queratinócitos da vulva, juntamente com a resposta inflamatória a agentes virais. Por fim, essas úlceras podem ser um tipo de aftose.2323 Sárdy M, Wollenberg A, Niedermeier A, Flaig MJ Genital ulcers associated with Epstein-Barr virus infection (ulcus vulvae acu-tum). Acta Derm Venereol. 2011;91:55-9.

O VEB também está presente em outros locais do trato genital feminino; contudo, seu papel patogênico no cérvix, no útero, nas trompas de Falópio e nos ovários é pouco compreendido.2222 Leigh R, Nyirjesy P. Genitourinary manifestationsof Epstein-Barr virus infections. Curr Infect Dis Rep. 2009;11:449-56.

Complicações gastrointestinais

Hepatite

A hepatite colestática com disfunção leve do fígado foi relatada em mais de 90% dos pacientes com infecção primária por VEB, porém a disfunção grave do fígado ou o envolvimento da vesícula é raro.2525 Arya SO, Saini A, El-Baba M, Salimnia H, Abdel-Haq N. Epstein-Barr virus-associated acute acalculous cholecystitis: a rare occurrence but favorable outcome. Clin Pediatr (Phila). 2010;49:799-804. A infecção primária por VEB pode causar uma hepatite autolimitada leve, que normalmente desaparece sem importância clínica; a icterícia pode ser observada em 5-10% dos casos. As anomalias da função hepática ocorrem com mais frequência durante a 2ª semana da doença e desaparecem dentro de 2-6 semanas.2525 Arya SO, Saini A, El-Baba M, Salimnia H, Abdel-Haq N. Epstein-Barr virus-associated acute acalculous cholecystitis: a rare occurrence but favorable outcome. Clin Pediatr (Phila). 2010;49:799-804.

Colecistite aguda acalculosa

Onze casos de colecistite aguda acalculosa (CAA) foram relatados durante a infecção primária por VEB, 10 dos quais eram crianças ou jovens adultos.2424 Crum NF. Epstein-Barr virus hepatitis: case series and review. South Med J. 2006;99:544-7.

A principal causa da CAA é a estase da vesícula e a estagnação da bile. O aumento da viscosidade biliar, a isquemia da parede da vesícula e os mediadores pró-inflamatórios, como os eicosanoides, também estavam envolvidos na patogênese. Podem ocorrer espessamento das paredes da vesícula e formação de barro biliar durante a hepatite viral. A hidropisia da vesícula pode se desenvolver ocasionalmente durante a MI. Não se estabelece se o aumento da espessura da parede da vesícula é resultado da invasão direta da mucosa da vesícula pelo VEB ou se a colestase associada ao VEB causa irritação da parede da vesícula ou ambos.2424 Crum NF. Epstein-Barr virus hepatitis: case series and review. South Med J. 2006;99:544-7.

A recuperação em todos os casos relatados foi excelente sem qualquer tratamento cirúrgico. Os médicos devem estar cientes de que a CAA poderá complicar a MI e evitar, assim, cirurgias invasivas desnecessárias e terapia antibiótica.2424 Crum NF. Epstein-Barr virus hepatitis: case series and review. South Med J. 2006;99:544-7.

Insuficiência hepática aguda

A infecção aguda por VEB é uma causa rara de insuficiência hepática aguda em jovens adultos, porém os dados disponíveis são insuficientes e não há relatos de crianças. Conforme evidenciado por um estudo de coorte de pacientes de 1887, o VEB é responsável por apenas 0,21% dos casos de IHA. A maioria dos casos ocorre após o transplante ou está associada a síndromes de imunodeficiência.2626 Mellinger JL, Rossaro L, Naugler WE, Nadig SN, Appelman H, Lee WM, et al. Epstein-Barr virus (EBV) related acute liver failure: a case series from the US Acute Liver Failure Study Group. Dig Dis Sci. 2014;59:1630-7. Como o VEB é um vírus ubíquo e não tem um tratamento específico, há um risco significativo de que crianças que não apresentam o VEB antes do transplante de fígado sejam infectadas por um fígado de adulto com VEB. O aumento dos títulos do VEB deve ser feito com a redução da imunossupressão.2727 Kelly D. Liver transplantation in children. J Pediatr (Rio J). 2008;84:381-2. É questionável se a fisiopatologia da IHA relacionada ao VEB se deve a uma resposta imune generalizada do hospedeiro a antígenos do VEB ou a um aumento da replicação viral.2626 Mellinger JL, Rossaro L, Naugler WE, Nadig SN, Appelman H, Lee WM, et al. Epstein-Barr virus (EBV) related acute liver failure: a case series from the US Acute Liver Failure Study Group. Dig Dis Sci. 2014;59:1630-7.

Ruptura esplênica

A esplenomegalia é uma complicação comum de MI e de outras doenças infecciosas. Frequentemente é autolimitada. A ruptura esplênica espontânea, contudo, é uma manifestação rara de MI, estimada em 0,1% a 0,5% de casos de MI.2828 Stephenson JT, DuBois JJ. Nonoperative management of sponta-neous splenic rupture in infectious mononucleosis: a case report and review of the literature. Pediatrics. 2007;120:e432-5. A maioria das rupturas esplênicas relatadas ocorreu em até três semanas após o diagnóstico de MI, porém a ruptura parece ocorrer até mesmo após sete semanas.1717 Luzuriaga K, Sullivan JL. Infectious mononucleosis. N Engl J Med. 2010;362:1993-2000.

Acredita-se que a infecção por VEB prejudica a arquitetura esplênica ao invadir o baço com linfócitos e células linfoides atípicas. Essa infiltração enfraquece o sistema de suporte fibroso do baço, a cápsula esplênica se torna mais fina e promove a ruptura. A ruptura pode ocorrer após um trauma insignificante ou espontaneamente. A ruptura espontânea pode ser resultado do aumento agudo na pressão venosa portal causado pela manobra de Valsalva ou pela compressão do baço aumentado pelo diafragma ou parede abdominal contraídos.2828 Stephenson JT, DuBois JJ. Nonoperative management of sponta-neous splenic rupture in infectious mononucleosis: a case report and review of the literature. Pediatrics. 2007;120:e432-5.

A maioria dos casos relata resolução completa do hematoma de quatro semanas até um ano. Há evidências que justificam que o baço pode manter a função completa ao mesmo tempo em que mantém um baixo risco de repetir a ruptura mesmo após o rompimento do parênquima. Assim, o manejo não operatório da ruptura esplênica durante a MI em um paciente traumatizado estável parece ser o tratamento ideal, se consideramos também os riscos após a esplenectomia.2828 Stephenson JT, DuBois JJ. Nonoperative management of sponta-neous splenic rupture in infectious mononucleosis: a case report and review of the literature. Pediatrics. 2007;120:e432-5.

Como a ruptura esplênica é mais frequente dentro de três semanas após o acometimento da infecção, sugere-se que os pacientes se abstenham de esportes por no mínimo três semanas ou assim que os sintomas e achados clínicos forem resolvidos.1717 Luzuriaga K, Sullivan JL. Infectious mononucleosis. N Engl J Med. 2010;362:1993-2000.

Complicações neurológicas

Paralisia do nervo facial

Houve apenas 14 casos de paralisia do nervo facial (PNF) associada ao VEB; 36% eram bilaterais, embora PNF bilateral entre pacientes com PNF varie de 0,3% a 2%. A otomastoidite causada pelo VEB pode transmitir a infecção para o nervo facial e levar a esse tipo de PNF, já que foi reconhecida em dois desses casos. Outra possível explicação é a invasão viral direta ou a resposta imunológica do sistema nervoso central ao VEB. A idade média desses pacientes em comparação com pacientes com PNF não associada ao VEB era muito menor. Isso está associado à maior incidência de infecção por VEB durante a infância.2929 Terada K, Niizuma T, Kosaka Y,Inoue M, Ogita S, Kataoka N. Bilateral facial nerve palsy associated with Epstein-Barr virus infection with a review of the literature. Scand J Infect Dis. 2004;36:75-7.

Deve-se suspeitar de infecção por VEB em pacientes com PNF, principalmente quando for bilateral, mesmo quando não houver manifestações sistêmicas de infecção por VEB. Esses pacientes não exigem tratamento especial.3030 Coddington CT, Isaacs JD, Siddiqui AQ, Andrews TC. Neurological picture. Bilateral facial nerve palsy associated with Epstein--Barr virus infection. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2010;81: 1155-6.

Síndrome de Guillain-Barré

Existem diversos relatos de casos desde 1947 a respeito de infecção por VEB que precede a síndrome de Guillain-Barré (GBS). Também foi relatado que o VEB é responsável por 10% dos casos de GBS. Contudo, os critérios usados nesses relatos são questionáveis, pois o VEB é ubíquo.3131. Yuki N. Infectious origins of, and molecular mimicry in, Guillain-Barré and Fisher syndromes. Lancet Infect Dis. 2001;1: 29 -37. Acredita-se que o risco de GBS aumenta 20 vezes nos dois meses seguintes à infecção por VEB.3232 Tam CC, O'Brien SJ, Petersen I, Islam A, Hayward A, Rodrigues LC. Guillain-Barré syndrome and preceding infection with campylobacter, influenza and Epstein-Barr virus in the general practice research database. PLoS ONE. 2007;2:e344.

Encefalite

A incidência de encefalite por VEB é menor do que 0,5%, porém pode aumentar para 7,3% entre crianças internadas com MI.3333 Doja A, Bitnun A, Ford Jones EL, Richardson S, Tellier R, Petric M, et al. Pediatric Epstein-Barr virus-associated encephalitis: 10-year review. J Child Neurol. 2006;21:384-91. Ocorrem fatalidades em 0,1% a 1% desses casos.22 Carvalho LH. Mononucleose infecciosa. J Pediatr (Rio J). 1999;75:S115-25. A encefalite por VEB se manifesta comumente por confusão, redução no nível de consciência, febre e convulsões epilépticas. As manifestações de encefalite por VEB podem ocorrer antes, durante ou mesmo após os sintomas de MI.3434 Abul-Kasim K, Palm L, Maly P Sundgren PC. The neuroanatomic localization of Epstein-Barr virus encephalitis may be a predic-tive factor for its clinical outcome: a case report and review of 100 cases in 28 reports. J Child Neurol. 2009;24:720-6. Contudo, a maioria dos pacientes com encefalite por VEB não apresenta os sintomas típicos de MI e, portanto, o VEB deve ser considerado uma possível causa de encefalite infantil aguda, independentemente da ocorrência de sintomas de MI.3333 Doja A, Bitnun A, Ford Jones EL, Richardson S, Tellier R, Petric M, et al. Pediatric Epstein-Barr virus-associated encephalitis: 10-year review. J Child Neurol. 2006;21:384-91. O prognóstico da encefalite por VEB pode variar da completa recuperação ao óbito.3434 Abul-Kasim K, Palm L, Maly P Sundgren PC. The neuroanatomic localization of Epstein-Barr virus encephalitis may be a predic-tive factor for its clinical outcome: a case report and review of 100 cases in 28 reports. J Child Neurol. 2009;24:720-6.

A encefalite por VEB envolve uma ampla diversidade de locais no sistema nervoso central, com o cerebelo, o hemisfério cerebral e os gânglios da base são os mais frequentes. Pacientes com envolvimento isolado do tronco cerebral são caracterizados pela maior mortalidade, ao passo que pacientes com envolvimento do tálamo foram reconhecidos como os que apresentam mais sequelas. O envolvimento isolado do córtex e da medula espinhal foram associados a um prognóstico excelente.3434 Abul-Kasim K, Palm L, Maly P Sundgren PC. The neuroanatomic localization of Epstein-Barr virus encephalitis may be a predic-tive factor for its clinical outcome: a case report and review of 100 cases in 28 reports. J Child Neurol. 2009;24:720-6.

A patogênese de lesões neurológicas induzidas por VEB não foi elucidada, embora seja sugerido que os mecanismos imunológicos sejam mais responsáveis que a maior replicação viral.3333 Doja A, Bitnun A, Ford Jones EL, Richardson S, Tellier R, Petric M, et al. Pediatric Epstein-Barr virus-associated encephalitis: 10-year review. J Child Neurol. 2006;21:384-91.

Síndrome de Alice no País das Maravilhas

A síndrome de Alice no País das Maravilhas (AIWS) é caracterizada pela metamorfopsia, presença autorrelatada da alteração somatossensorial, como distorção na percepção do tamanho e da forma do corpo de um paciente, e ilusões quanto a alterações no tamanho, na distância, na forma ou mesmo nas cores ou nas relações espaciais de objetos.3535 Asensio-Sánchez VM. Alice in Wonderland syndrome. Arch Soc Esp Oftalmol. 2014;89:77-8. As ilusões e alucinações são semelhantes aos estranhos incidentes pelos quais Alice passou em As aventuras de Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll.3636 Fine EJ. The Alice in Wonderland syndrome. Prog Brain Res. 2013;206:143-56.

A AIWS foi descrita pela primeira vez em pacientes com epilepsia ou enxaqueca ou com histórico de abuso de drogas e raramente foi descrita em associação ao VEB e a outras infecções virais.3535 Asensio-Sánchez VM. Alice in Wonderland syndrome. Arch Soc Esp Oftalmol. 2014;89:77-8. Foram relatados quatro casos de AIWS secundária à MI, incluindo dois adolescentes, um menino de 9,5 anos e uma menina de sete anos com encefalopatia causada pelo VEB.3636 Fine EJ. The Alice in Wonderland syndrome. Prog Brain Res. 2013;206:143-56.,3737 Lahat E, Eshel G, Arlazoroff A. Alice in Wonderland'syndrome and infectious mononucleosis in children. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 1990;53:1104.

A metamorfopsia pode anteceder o acometimento ou ocorrer após a resolução de todos os sinais e sintomas clínicos. A duração da ilusão visual varia entre duas semanas e sete meses, porém com recuperação completa em todos os casos descritos.3535 Asensio-Sánchez VM. Alice in Wonderland syndrome. Arch Soc Esp Oftalmol. 2014;89:77-8.

O diagnóstico da AIWS poderá ser complicado caso os distúrbios visuais antecedam os sintomas clássicos da MI ou caso a MI ocorra após um curso subclínico.3838 Cinbis M, Aysun S. Alice in Wonderland syndrome as an initial manifestation of Epstein-Barr virus infection. Br J Ophthalmol. 1992;76:316. Assim, pacientes compatíveis com sintomas de AIWS devem suspeitar de uma infecção por VEB.3535 Asensio-Sánchez VM. Alice in Wonderland syndrome. Arch Soc Esp Oftalmol. 2014;89:77-8.

Complicações psiquiátricas

Episódios psicóticos

Diversos estudos sugerem um vínculo entre a infecção precoce e a esquizofrenia na idade adulta e o aumento na prevalência do VEB no segundo caso. O VEB é um agente infeccioso neurotrópico conhecido, pois é membro da família Herpesviridae. O cérebro humano continua a se desenvolver durante a infância e a pré-adolescência. Assim, a infecção nesse período, especialmente com os agentes neurotrópicos, pode aumentar o risco de anomalias neurológicas.3939 Khandaker GM, Stochl J, Zammit S, Lewis G, Jones PB. Childhood Epstein-Barr virus infection and subsequent risk of psychotic experiences in adolescence: a population-based pros-pective serological study. Schizophr Res. 2014;158:19-24.

Os possíveis mecanismos patofisiológicos incluem citocinas inflamatórias, que afetam o cérebro após a ativação do sistema imunológico inato. A infecção precoce prejudica a micróglia, distorce a sobrevivência e o funcionamento neuronal. Também se acredita em uma relação entre o histórico genético de psicose e a vulnerabilidade à infecção.3939 Khandaker GM, Stochl J, Zammit S, Lewis G, Jones PB. Childhood Epstein-Barr virus infection and subsequent risk of psychotic experiences in adolescence: a population-based pros-pective serological study. Schizophr Res. 2014;158:19-24.

Fadiga

A MI é um fator de risco específico e forte para o desenvolvimento da fadiga posteriormente. Contudo, é possível que os médicos sejam parciais e superestimem, assim, a prevalência de fadiga após a MI em comparação com as de outras infecções virais. Por outro lado, os médicos poderão não ter registrado fadiga após a MI e levado em consideração uma sequela esperada de qualquer infecção por vírus. A fadiga é um sintoma subjetivo e, portanto, é difícil ser calculada como uma característica da doença. Os possíveis marcadores de risco de fadiga após a MI são o sexo feminino, o transtorno pré-mórbido do humor, a ausência de forma física, a inatividade e a percepção da doença. Esses marcadores poderão ser usados para visar estratégias de prevenção e explorar mecanismos etiológicos.4040 Petersen I, Thomas JM, Hamilton WT, White PD. Risk and pre-dictors of fatigue after infectious mononucleosis in a large primary-care cohort. QJM. 2006;99:49-55.

Depressão

A associação entre agentes infecciosos e depressão foi controversa. Estudos clínicos iniciais confirmaram uma associação de títulos de anticorpos criados em comparação com o vírus do herpes simples (HSV) e VEB com a depressão. Contudo, também foram relatados resultados opostos, que não revelam associação significativa entre anticorpos e HSV, gripe ou vírus neurotrópicos com a depressão. Achados sugerem que estudos com amostras menores tendem a gerar resultados negativos e identificar uma associação significativa entre infecção por VEB e depressão poderá exigir um tamanho de amostra suficientemente grande.4141 Wang X, Zhang L, Lei Y,Liu X, Zhou X, Liu Y, et al. Meta-analysis of infectious agents and depression. Sci Rep. 2014;4:4530.

Autoimunidade

Os principais fatores de risco ambiental de doenças autoimunes sistêmicas são as infecções.11 Draborg AH, Duus K, Houen G. Epstein-Barr virus in systemic autoimmune diseases. Clin Dev Immunol. 2013;2013:535738. Foi sugerido que o VEB fosse associado a doenças autoimunes, como artrite reumatoide (AR), lúpus eritematoso sistêmico, esclerose múltipla (EM), doenças inflamatórias intestinais, tireoidite autoimune, diabetes mellitus insulinodependente, síndrome de Sjögren, doenças hepáticas autoimunes, esclerose sistêmica e miastenia grave.4242 Lossius A, Johansen JN, Torkildsen 0, Vartdal F. Holm0y T. Epstein-Barr virus in systemic lupus erythematosus, rheuma-toid arthritis and multiple sclerosis - association and causation. Viruses. 2012;4:3701-30.

Um dos principais mecanismos de como infecções podem causar autoimunidade é o mimetismo molecular. Acredita-se que semelhanças sequenciais ou estruturais entre autoantígenos e antígenos microbianos reagem de forma cruzada com células B, células T e anticorpos. Esses exemplos são anticorpos antiproteínas citrulinadas (ACPA) em AR e autoanticorpos em comparação a αB-cristalina em EM.4242 Lossius A, Johansen JN, Torkildsen 0, Vartdal F. Holm0y T. Epstein-Barr virus in systemic lupus erythematosus, rheuma-toid arthritis and multiple sclerosis - association and causation. Viruses. 2012;4:3701-30.

Mais uma teoria é denominada ativação do espectador. Nesse caso, o histórico inflamatório de uma infecção promove ativação ou expansão de linfócitos autorreativos previamente ativados. A ativação e a expansão de células T autorreativas são conhecidas por ocorrer devido à inflamação local grave induzida por vírus e produção local intensa de citocinas.11 Draborg AH, Duus K, Houen G. Epstein-Barr virus in systemic autoimmune diseases. Clin Dev Immunol. 2013;2013:535738. As proteínas de VEB envolvidas na evasão e supressão imune de apoptose de linfócitos infectados transformados provavelmente resultarão em perda de tolerância e desenvolvimento de autoimunidade.4242 Lossius A, Johansen JN, Torkildsen 0, Vartdal F. Holm0y T. Epstein-Barr virus in systemic lupus erythematosus, rheuma-toid arthritis and multiple sclerosis - association and causation. Viruses. 2012;4:3701-30.

Foi sugerido que o aumento de títulos séricos de anticorpos em relação ao VEB em doenças autoimunes pode ser o resultado da ativação de células B poliespecíficas. Em resposta a estímulos policlonais, as células B de memória proliferam e se diferenciam como células plasmáticas e isso representa um mecanismo natural de perpetuação de uma imunidade sorológica vitalícia.4242 Lossius A, Johansen JN, Torkildsen 0, Vartdal F. Holm0y T. Epstein-Barr virus in systemic lupus erythematosus, rheuma-toid arthritis and multiple sclerosis - association and causation. Viruses. 2012;4:3701-30.

Outra hipótese é o acúmulo de células T devido à reativação frequente do VEB. As células T CD8 + específicas do VEB são enriquecidas dentro ou próximo de órgãos doentes de pacientes com AR e EM e também acumulam em fluido sinovial de pacientes com artrite psoriática, osteoartrite e síndrome de Reiter. Isso pode refletir uma resposta imune local contra o VEB em órgãos doentes.4242 Lossius A, Johansen JN, Torkildsen 0, Vartdal F. Holm0y T. Epstein-Barr virus in systemic lupus erythematosus, rheuma-toid arthritis and multiple sclerosis - association and causation. Viruses. 2012;4:3701-30.

Após muitos anos de pesquisa epidemiológica, imunológica e viral, ainda é debatido se o VEB é um agente causador dessas entidades autoimunes.4242 Lossius A, Johansen JN, Torkildsen 0, Vartdal F. Holm0y T. Epstein-Barr virus in systemic lupus erythematosus, rheuma-toid arthritis and multiple sclerosis - association and causation. Viruses. 2012;4:3701-30.

Alergias

Hipersensibilidade a picadas de mosquito

Essa doença tem aparecido principalmente em crianças japonesas. Mais de 50 casos de hipersensibilidade a picadas de mosquito (HPM) foram relatados no Japão e há vários relatos de casos em Taiwan e no México. A HPM é identificada por sintomas intensos locais da pele, o que inclui bolhas, eritema e ulceração ou cicatrizes, e sintomas sistêmicos como linfadenopatia, febre alta e hepatoesplenomegalia.4343 Asada H. Hypersensitivity to mosquito bites: a unique pathoge-nic mechanism linking Epstein-Barr virus infection, allergy and oncogenesis. J Dermatol Sci. 2007;45:153-60.

As células T CD4 + de pacientes com HPM reagem a extratos da glândula salivar (EGS) específicos de mosquitos. Essas células T induzem a reativação de infecção por VEB latente em células NK. As células NK portadoras do VEB em pacientes com HPM superexpressam o ligante FAS superficial (Fas L), e o Fas L aprimorado pode estar relacionado a dano no tecido, como lesões excessivas na pele em locais da picada do mosquito e disfunção hepática. Sugere-se que esses pacientes apresentam uma expressão cada vez maior de LMP1 viral oncogênica em células NK infectadas pelo VEB e o antígeno do mosquito também aumenta a expressão e induz à proliferação de células NK. A LMP1 ativa várias vias de sinalização durante a transformação, incluindo PI3 quinase, rac, NF-kB e sinalização reativa de oxigênio.4343 Asada H. Hypersensitivity to mosquito bites: a unique pathoge-nic mechanism linking Epstein-Barr virus infection, allergy and oncogenesis. J Dermatol Sci. 2007;45:153-60.

Observações epidemiológicas sugerem a possibilidade de desenvolvimento endêmico de HPM como resultado do histórico genético de pacientes ou do impacto de múltiplos fatores ambientais.4343 Asada H. Hypersensitivity to mosquito bites: a unique pathoge-nic mechanism linking Epstein-Barr virus infection, allergy and oncogenesis. J Dermatol Sci. 2007;45:153-60.

Neoplasias

Estima-se que o VEB seja responsável por 84.000 casos de carcinomas gástricos, 78.000 de carcinoma da nasofaringe e 28.000 de linfoma de Hodgkin a cada ano. É notável que o risco de VEB positivo para linfoma de Hodgkin culmine em quatro anos após a MI, ao passo que diminui para normal depois de 10 anos. Houve mais de 6.000 casos de VEB associados ao linfoma de Burkitt (LB) em países menos desenvolvidos a cada ano. A prevalência de LB na África Central é de 20 casos em 100.000 crianças entre cinco e nove anos.4444 Cohen JI, Mocarski ES, Raab-Traub N, Corey L, Nabel GJ. The need and challenges for development of an Epstein-Barr virus vaccine. Vaccine. 2013;31:B194-6.

O VEB também é associado a malignidades em pacientes imunocomprometidos. O linfoma do VEB, por exemplo, é a segunda malignidade mais comum que se desenvolve após um transplante de órgão devido à respectiva imunodeficiência.4444 Cohen JI, Mocarski ES, Raab-Traub N, Corey L, Nabel GJ. The need and challenges for development of an Epstein-Barr virus vaccine. Vaccine. 2013;31:B194-6.

A neoplasia infantil mais relevante derivada do VEB é o linfoma de Burkitt.4545 McLaughlin-Drubin ME, Munger K. Viruses associated with human cancer. Biochim Biophys Acta. 2008;1782:127-50. Denis Burkitt observou uma forma de LB, LB endêmico, visto mais comumente em regiões da África Subsaariana. As regiões de LB endêmico apresentam frequência muito elevada de doenças, cerca de 5-10 casos em 100.000 crianças. Os genomas virais podem ser encontrados em 100% de tumores de LB endêmicos.4646 Bieging KT, Swanson-Mungerson M, Amick AC, Longnecker R. Epstein-Barr virus in Burkitt's lymphoma: a role for latent mem-brane protein 2A. Cell Cycle. 2010;9:901-8.

O LB ocorre em todo o mundo em uma incidência muito menor de uma forma conhecida como LB eventual, também observado principalmente em crianças, porém teve uma associação menor com infecção por VEB. O LB eventual varia de 15 a 85% de tumores virais.4646 Bieging KT, Swanson-Mungerson M, Amick AC, Longnecker R. Epstein-Barr virus in Burkitt's lymphoma: a role for latent mem-brane protein 2A. Cell Cycle. 2010;9:901-8.

A contribuição do VEB para a patogênese do LB é enigmática da mesma forma. O VEB leva ao desenvolvimento de linhagens de células linfoblastoides (LCL) transformadas, porém não malignas, ativa a proliferação de células B. LCLs são responsáveis pela expressão de várias proteínas de latência codificadas pelo VEB, muitas das quais modulam importantes vias reguladoras como PI3K e NF-kB, solidamente vinculadas ao câncer. Na ausência de células T funcionais ou na presença contínua de antígenos, LCLs induzidas pelo VEB crescem sem impedimento.4747 Schmitz R, Ceribelli M, Pittaluga S, Wright G, Staudt LM. Oncoge-nic mechanisms in Burkitt lymphoma. Cold Spring Harb Perspect Med. 2014;4:a014282. O VEB também inibe a apoptose de células tumorais pré-malignas e permite que eventos transformadores ocorram.11 Draborg AH, Duus K, Houen G. Epstein-Barr virus in systemic autoimmune diseases. Clin Dev Immunol. 2013;2013:535738. As etapas finais da via oncogênica são as translocações nos genes MYC e TCF-3. Essas são as mutações mais comuns causadas pelo VEB, que levam à produção de fatores de transcrição oncogênicos no LB.4747 Schmitz R, Ceribelli M, Pittaluga S, Wright G, Staudt LM. Oncoge-nic mechanisms in Burkitt lymphoma. Cold Spring Harb Perspect Med. 2014;4:a014282.

Doença linfoproliferativa ligada ao cromossomo X

A infecção primária pelo VEB em meninos com a doença linfoproliferativa ligada ao cromossomo X (XLPD) leva a doenças fulminantes, muitas vezes até mesmo fatais. Além disso, a doença predispõe a incidência consideravelmente elevada de linfomas.4848 Nagy N, Klein E. Deficiency of the proapoptotic SAP function in X-linked lymphoproliferative disease aggravates Epstein-Barr virus (EBV) induced mononucleosis and promotes lymphoma development. Immunol Lett. 2010;130:13-8.

A mutação ou deleção do gene SH2D1A causa falta de proteína associada a molécula de sinalização de ativação linfocitária (SLAM) (PAS), que regula a apoptose de células T. A falta de SAP resulta em proliferação descontrolada de linfócitos T CD8 + e leva a XLPD. A apoptose das células T, também ineficiente na MI devido principalmente à função antiapoptótica do antígeno nuclear de Epstein-Barr (ANEB), aprimora os efeitos da falta de PAS.4848 Nagy N, Klein E. Deficiency of the proapoptotic SAP function in X-linked lymphoproliferative disease aggravates Epstein-Barr virus (EBV) induced mononucleosis and promotes lymphoma development. Immunol Lett. 2010;130:13-8.

Discussão

O VEB infecta praticamente todas as pessoas até a vida adulta e sua latência vitalícia é mantida. Ele infecta crianças de forma silenciosa, ao passo que a maioria dos adolescentes desenvolve MI quando infectada.1717 Luzuriaga K, Sullivan JL. Infectious mononucleosis. N Engl J Med. 2010;362:1993-2000. Em raras ocasiões, os sintomas de MI podem persistir de forma crônica ou recorrente e a mononucleose infecciosa fatal ocorre raramente. A depender do tipo e grau de imunodeficiência e do momento em que a infecção por VEB ocorre no ciclo de vida, podem ocorrer diversos resultados atípicos.11 Draborg AH, Duus K, Houen G. Epstein-Barr virus in systemic autoimmune diseases. Clin Dev Immunol. 2013;2013:535738.

Essas manifestações podem ser agudas, como úlceras genitais e dacriocistite aguda,44 Ghauri AJ, Keane PA, Scotcher SM, Clarke JL, Madge SN. Acute dacryocystitis associated with Epstein-Barr virus infec-tion. Orbit. 2011;30:245-8.,2020 Halvorsen JA, Brevig T, Aas T, Skar AG, Slevolden EM Moi H. Genital ulcers as initial manifestation of Epstein-Barr virus infection: two new cases and a review of the literature. Acta Derm Venereol. 2006;86:439-42. ou tardias, como autoimunidade e aterosclerose.1010 Binkley PF, Cooke GE, Lesinski A, Taylor M, Chen M, Laskowski B, et al. Evidence for the role of Epstein-Barr virus infecti-ons in the pathogenesis of acute coronary events. PLOS ONE. 2013;8:e54008.,4242 Lossius A, Johansen JN, Torkildsen 0, Vartdal F. Holm0y T. Epstein-Barr virus in systemic lupus erythematosus, rheuma-toid arthritis and multiple sclerosis - association and causation. Viruses. 2012;4:3701-30. Algumas podem ser inocentes, como fadiga, alergias e paralisia do nervo facial,13 13 Pipp ML, Means ND, Sixbey JW, Morris KL, Gue CL, Baddour LM. Acute Epstein-Barr virus infection complicated by severe thrombocytopenia. Clin Infect Dis. 1997;25:1237-9.,3030 Coddington CT, Isaacs JD, Siddiqui AQ, Andrews TC. Neurological picture. Bilateral facial nerve palsy associated with Epstein--Barr virus infection. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2010;81: 1155-6.,4343 Asada H. Hypersensitivity to mosquito bites: a unique pathoge-nic mechanism linking Epstein-Barr virus infection, allergy and oncogenesis. J Dermatol Sci. 2007;45:153-60. e outras podem acarretar risco de óbito, como ruptura esplênica e insuficiência hepática aguda.1717 Luzuriaga K, Sullivan JL. Infectious mononucleosis. N Engl J Med. 2010;362:1993-2000. O resto das complicações por VEB inclui miocardite, disfunção renal, hepatite, colecistite aguda acalculosa88 Andréoletti L, Lévêque N, Boulagnon C, Brasselet C, Fornes P. Viral causes of human myocarditis. Arch Cardiovasc Dis. 2009;102:559-68.,1919 Verma N, Arunabh S, Brady TM, Charytan C. Acute interstitial nephritis secondary to infectious mononucleosis. Clin Nephrol. 2002;58:151-4.,2424 Crum NF. Epstein-Barr virus hepatitis: case series and review. South Med J. 2006;99:544-7.,2525 Arya SO, Saini A, El-Baba M, Salimnia H, Abdel-Haq N. Epstein-Barr virus-associated acute acalculous cholecystitis: a rare occurrence but favorable outcome. Clin Pediatr (Phila). 2010;49:799-804. e diversas entidades hematológicas, neurológicas e respiratórias.1616 Maakaroun NR, Moanna A, Jacob JT, Albrecht H. Viral infecti-ons associated with haemophagocytic syndrome. Rev Med Virol. 2010;20:93-105. Embora essas manifestações sejam bem raras, médicos e, principalmente, pediatras devem estar cientes desses casos para evitar tratamentos e procedimentos desnecessários, já que a MI seria tratada facilmente apenas com cuidados de suporte.1717 Luzuriaga K, Sullivan JL. Infectious mononucleosis. N Engl J Med. 2010;362:1993-2000.,2424 Crum NF. Epstein-Barr virus hepatitis: case series and review. South Med J. 2006;99:544-7. Quando houver sinais e sintomas semelhantes aos mencionados acima, o diagnóstico diferenciado deve incluir o VEB como agente causador. O histórico dos pacientes tem muita importância e pode fornecer as primeiras indicações para o diagnóstico adequado. A individualização e o aprimoramento do acompanhamento dos pacientes também ajudaria a evitar e tratar possíveis complicações.33 Valachis A, Kofteridis DP. Mononucleosis and Epstein-Barr virus infection: treatment and medication. Dove Press J Virus Adapt Treat. 2012;4:23-8. Em outras palavras, o conhecimento desses cenários seria benéfico para a saúde das crianças e o custo do bem-estar e melhoraria, assim, a prática médica.

É notável que existam tantas dúvidas em aberto a respeito das manifestações mencionadas e são necessários estudos adicionais para elucidar o papel do mecanismo imunológico do VEB em diversos órgãos-alvo.4242 Lossius A, Johansen JN, Torkildsen 0, Vartdal F. Holm0y T. Epstein-Barr virus in systemic lupus erythematosus, rheuma-toid arthritis and multiple sclerosis - association and causation. Viruses. 2012;4:3701-30. O entendimento integral desses mecanismos e a correlação entre o VEB e as entidades patológicas ajudará o tratamento e a prevenção de morbidez grave.

Entretanto, o sistema imunológico é fundamental na prevenção da progressão da doença por VEB, já que o estado imunológico do paciente desempenha um papel essencial no desenvolvimento posterior de patologias.11 Draborg AH, Duus K, Houen G. Epstein-Barr virus in systemic autoimmune diseases. Clin Dev Immunol. 2013;2013:535738. Conforme a expectativa de vida aumenta e mais manipulações do sistema imunológico são feitas, ainda veremos manifestações mais incomuns da infecção por VEB, que serão um desafio ao diagnóstico no futuro.

  • Como citar este artigo: Bolis V, Karadedos C, Chiotis I, Chaliasos N, Tsabouri S. Atypical manifestations of Epstein-Barr virus in children: a diagnostic challenge. J Pediatr (Rio J). 2016;92:113-21.

References

  • 1
    Draborg AH, Duus K, Houen G. Epstein-Barr virus in systemic autoimmune diseases. Clin Dev Immunol. 2013;2013:535738.
  • 2
    Carvalho LH. Mononucleose infecciosa. J Pediatr (Rio J). 1999;75:S115-25.
  • 3
    Valachis A, Kofteridis DP. Mononucleosis and Epstein-Barr virus infection: treatment and medication. Dove Press J Virus Adapt Treat. 2012;4:23-8.
  • 4
    Ghauri AJ, Keane PA, Scotcher SM, Clarke JL, Madge SN. Acute dacryocystitis associated with Epstein-Barr virus infec-tion. Orbit. 2011;30:245-8.
  • 5
    Glynn FJ, Mackle T, Kinsella J. Upperairway obstruction in infectious mononucleosis. Eur J Emerg Med. 2007;14:41-2.
  • 6
    Miron D, Merzel Y, Lev A, Meir JJ, Horowitz Y. Pleuropneumonia as the sole manifestation of Epstein-Barr virus-associated infectious mononucleosis. Isr Med Assoc J. 2002;4:733-4.
  • 7
    Sabbatani S, Manfredi R, Ortolani P. Trapani FF, Viale P. Myopericarditis during a primary Epstein-Barr virus infection in an otherwise healthy young adult. An unusual and insidious complication. Case report and a 60-year literature review. Infez Med. 2012;20:75-81.
  • 8
    Andréoletti L, Lévêque N, Boulagnon C, Brasselet C, Fornes P. Viral causes of human myocarditis. Arch Cardiovasc Dis. 2009;102:559-68.
  • 9
    Kutikhin A, Brusina E, Yuzhalin AE. Viruses and stherosclerosis. New York: Springer; 2013.
  • 10
    Binkley PF, Cooke GE, Lesinski A, Taylor M, Chen M, Laskowski B, et al. Evidence for the role of Epstein-Barr virus infecti-ons in the pathogenesis of acute coronary events. PLOS ONE. 2013;8:e54008.
  • 11
    Kempe S, Heinz P Kokai E, Devergne O, Marx N, Wirth T. Epstein--Barr virus-induced gene-3 is expressed in human atheroma plaques. Am J Pathol. 2009;175:440-7.
  • 12
    Walter RB, Hong TC, Bachli EB. Life-threatening thrombocyto-penia associated with acute Epstein-Barr virus infection in an older adult. Ann Hematol. 2002;81:672-5.
  • 13
    Pipp ML, Means ND, Sixbey JW, Morris KL, Gue CL, Baddour LM. Acute Epstein-Barr virus infection complicated by severe thrombocytopenia. Clin Infect Dis. 1997;25:1237-9.
  • 14
    Khan I, Inoue S, Mushtaq R, Onwuzurike N. EBV infection resul-ting in aplastic anemia: a case report and literature review. J Blood Disord Transfus. 2013;4:141.
  • 15
    Yokoyama T, Tokuhisa Y,Toga A, Fujiki T Sakakibara Y.Mase S, et al. Agranulocytosis after infectious mononucleosis. J Clin Virol. 2013;56:271-3.
  • 16
    Maakaroun NR, Moanna A, Jacob JT, Albrecht H. Viral infecti-ons associated with haemophagocytic syndrome. Rev Med Virol. 2010;20:93-105.
  • 17
    Luzuriaga K, Sullivan JL. Infectious mononucleosis. N Engl J Med. 2010;362:1993-2000.
  • 18
    Araya CE, González-Peralta RP, Skoda-Smith S, Dharnidharka VR. Systemic Epstein-Barr virus infection associated with membra-nous nephropathy in children. Clin Nephrol. 2006;65:160-4.
  • 19
    Verma N, Arunabh S, Brady TM, Charytan C. Acute interstitial nephritis secondary to infectious mononucleosis. Clin Nephrol. 2002;58:151-4.
  • 20
    Halvorsen JA, Brevig T, Aas T, Skar AG, Slevolden EM Moi H. Genital ulcers as initial manifestation of Epstein-Barr virus infection: two new cases and a review of the literature. Acta Derm Venereol. 2006;86:439-42.
  • 21
    Jerdan K, Aronson I, Hernandez C, Fishman PM, Groth JV. Genital ulcers associated with Epstein-Barr virus. Cutis. 2013;91:273-6.
  • 22
    Leigh R, Nyirjesy P. Genitourinary manifestationsof Epstein-Barr virus infections. Curr Infect Dis Rep. 2009;11:449-56.
  • 23
    Sárdy M, Wollenberg A, Niedermeier A, Flaig MJ Genital ulcers associated with Epstein-Barr virus infection (ulcus vulvae acu-tum). Acta Derm Venereol. 2011;91:55-9.
  • 24
    Crum NF. Epstein-Barr virus hepatitis: case series and review. South Med J. 2006;99:544-7.
  • 25
    Arya SO, Saini A, El-Baba M, Salimnia H, Abdel-Haq N. Epstein-Barr virus-associated acute acalculous cholecystitis: a rare occurrence but favorable outcome. Clin Pediatr (Phila). 2010;49:799-804.
  • 26
    Mellinger JL, Rossaro L, Naugler WE, Nadig SN, Appelman H, Lee WM, et al. Epstein-Barr virus (EBV) related acute liver failure: a case series from the US Acute Liver Failure Study Group. Dig Dis Sci. 2014;59:1630-7.
  • 27
    Kelly D. Liver transplantation in children. J Pediatr (Rio J). 2008;84:381-2.
  • 28
    Stephenson JT, DuBois JJ. Nonoperative management of sponta-neous splenic rupture in infectious mononucleosis: a case report and review of the literature. Pediatrics. 2007;120:e432-5.
  • 29
    Terada K, Niizuma T, Kosaka Y,Inoue M, Ogita S, Kataoka N. Bilateral facial nerve palsy associated with Epstein-Barr virus infection with a review of the literature. Scand J Infect Dis. 2004;36:75-7.
  • 30
    Coddington CT, Isaacs JD, Siddiqui AQ, Andrews TC. Neurological picture. Bilateral facial nerve palsy associated with Epstein--Barr virus infection. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2010;81: 1155-6.
  • 31
    Yuki N. Infectious origins of, and molecular mimicry in, Guillain-Barré and Fisher syndromes. Lancet Infect Dis. 2001;1: 29 -37.
  • 32
    Tam CC, O'Brien SJ, Petersen I, Islam A, Hayward A, Rodrigues LC. Guillain-Barré syndrome and preceding infection with campylobacter, influenza and Epstein-Barr virus in the general practice research database. PLoS ONE. 2007;2:e344.
  • 33
    Doja A, Bitnun A, Ford Jones EL, Richardson S, Tellier R, Petric M, et al. Pediatric Epstein-Barr virus-associated encephalitis: 10-year review. J Child Neurol. 2006;21:384-91.
  • 34
    Abul-Kasim K, Palm L, Maly P Sundgren PC. The neuroanatomic localization of Epstein-Barr virus encephalitis may be a predic-tive factor for its clinical outcome: a case report and review of 100 cases in 28 reports. J Child Neurol. 2009;24:720-6.
  • 35
    Asensio-Sánchez VM. Alice in Wonderland syndrome. Arch Soc Esp Oftalmol. 2014;89:77-8.
  • 36
    Fine EJ. The Alice in Wonderland syndrome. Prog Brain Res. 2013;206:143-56.
  • 37
    Lahat E, Eshel G, Arlazoroff A. Alice in Wonderland'syndrome and infectious mononucleosis in children. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 1990;53:1104.
  • 38
    Cinbis M, Aysun S. Alice in Wonderland syndrome as an initial manifestation of Epstein-Barr virus infection. Br J Ophthalmol. 1992;76:316.
  • 39
    Khandaker GM, Stochl J, Zammit S, Lewis G, Jones PB. Childhood Epstein-Barr virus infection and subsequent risk of psychotic experiences in adolescence: a population-based pros-pective serological study. Schizophr Res. 2014;158:19-24.
  • 40
    Petersen I, Thomas JM, Hamilton WT, White PD. Risk and pre-dictors of fatigue after infectious mononucleosis in a large primary-care cohort. QJM. 2006;99:49-55.
  • 41
    Wang X, Zhang L, Lei Y,Liu X, Zhou X, Liu Y, et al. Meta-analysis of infectious agents and depression. Sci Rep. 2014;4:4530.
  • 42
    Lossius A, Johansen JN, Torkildsen 0, Vartdal F. Holm0y T. Epstein-Barr virus in systemic lupus erythematosus, rheuma-toid arthritis and multiple sclerosis - association and causation. Viruses. 2012;4:3701-30.
  • 43
    Asada H. Hypersensitivity to mosquito bites: a unique pathoge-nic mechanism linking Epstein-Barr virus infection, allergy and oncogenesis. J Dermatol Sci. 2007;45:153-60.
  • 44
    Cohen JI, Mocarski ES, Raab-Traub N, Corey L, Nabel GJ. The need and challenges for development of an Epstein-Barr virus vaccine. Vaccine. 2013;31:B194-6.
  • 45
    McLaughlin-Drubin ME, Munger K. Viruses associated with human cancer. Biochim Biophys Acta. 2008;1782:127-50.
  • 46
    Bieging KT, Swanson-Mungerson M, Amick AC, Longnecker R. Epstein-Barr virus in Burkitt's lymphoma: a role for latent mem-brane protein 2A. Cell Cycle. 2010;9:901-8.
  • 47
    Schmitz R, Ceribelli M, Pittaluga S, Wright G, Staudt LM. Oncoge-nic mechanisms in Burkitt lymphoma. Cold Spring Harb Perspect Med. 2014;4:a014282.
  • 48
    Nagy N, Klein E. Deficiency of the proapoptotic SAP function in X-linked lymphoproliferative disease aggravates Epstein-Barr virus (EBV) induced mononucleosis and promotes lymphoma development. Immunol Lett. 2010;130:13-8.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2016

Histórico

  • Recebido
    11 Maio 2015
  • Aceito
    17 Jun 2015
Sociedade Brasileira de Pediatria Av. Carlos Gomes, 328 cj. 304, 90480-000 Porto Alegre RS Brazil, Tel.: +55 51 3328-9520 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: jped@jped.com.br