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Resultados do tratamento das oclusões arteriais agudas de membros em hospital universitário – estudo retrospectivo

Resumo

Contexto

As oclusões arteriais agudas (OAA) de membros vêm crescendo paralelemente com a longevidade da população.

Objetivos

O objetivo deste estudo foi avaliar fatores de risco, salvamento de membros e sobrevida dos pacientes com OAA tratados em instituição universitária.

Métodos

Este é um estudo coorte retrospectivo de pacientes consecutivos. Os desfechos incluíram: sucesso técnico, sintomas, comorbidades, categoria Rutherford, artérias acometidas, complicações pós-operatórias, taxa de salvamento de membros em 30 dias e óbitos.

Resultados

Avaliou-se 105 prontuários, havendo predomínio do sexo masculino (65,7%) e idade entre 46 a 91 anos. As etiologias identificadas foram trombóticas (54,3%), embólicas (35,2%) e indefinidas (10,5%). Cerca de dois terços apresentavam-se nas Categorias II e III de Rutherford. Os sintomas associados encontrados foram dor (97,1%), esfriamento (89,5%), palidez (64,7%), parestesias (44,7%), paralisias (30,5%), anestesias (21,9%), edema (21,9%) e cianose (15,2%); e as comorbidades associadas observadas foram hipertensão (65,0%), tabagismo (59,0%), arritmias (26,6%), dislipidemias (24,0%) e diabetes (23,8%). O segmento femoral superficial-poplíteo-distal foi o mais acometido (80%). A tromboembolectomia com cateter Fogarty foi realizada em 73,3% dos casos (81,0% nas embolias, 71,9% nas tromboses e 54,5% nos indefinidos), sendo isoladamente em 41 pacientes (39,05%), nos quais ocorreram 11 reoclusões, 20 amputações e 14 óbitos. A reoclusão arterial foi mais frequente nas tromboses (12,9%; p = 0,054). Até 30 dias após tratamento, o óbito total foi de 14,6% e a amputação maior foi de 19,8%, sendo menos frequente na Classe I Rutherford (p = 0,0179).

Conclusão

O tratamento da OAA feito prioritariamente por meio de tromboembolectomia com cateter Fogarty, isolado e/ou associado, proporcionou taxas de amputação e complicações compatíveis com as apresentadas na literatura e progressivamente menores nas categorias Rutherford menos avançadas.

Palavras-chave:
embolectomia com balão; isquemia; extremidade inferior; extremidade superior

Abstract

Background

Acute arterial occlusions (AAO) in limbs have been increasing in parallel with population longevity.

Objective

To assess risk factors, limb salvage rates, and survival of patients with AAO treated at a University Hospital.

Methods

Retrospective cohort study of consecutive patients. Outcomes included: patency, symptoms, comorbidities, Rutherford category, arteries occluded, postoperative complications, and 30-day limb salvage and mortality rates.

Results

Medical records were evaluated from 105 patients, predominantly males (65.7%), with ages ranging from 46 to 91 years. Etiology: thrombotic (54.3%), embolic (35.2%), and undefined (10.5%). About 2/3 of the patients were assessed as Rutherford category II or III. Associated symptoms: pain (97.1%), coldness (89.5%), pallor (64.7%), sensory loss (44.7%), paralysis (30.5%), anesthesia (21.9%), edema (21.9%), and cyanosis (15.2%). Associated comorbidities: hypertension (65.0%), smoking (59.0%), arrhythmias (26.6%), dyslipidemia (24.0%), and diabetes (23.8%). The distal superficial femoral-popliteal segment was the most affected (80%). Thromboembolectomy with a Fogarty catheter was performed in 73.3% of cases (81.0% of embolic cases, 71.9% of thrombotic cases, and 54.5% of cases with undefined etiology) and was the only treatment used in 41 cases (39.05%), among which there were 11 reocclusion, 20 amputations, and 14 deaths. Arterial reocclusion was more frequent in thrombosis cases (12.9%, p = 0.054). Within 30 days of treatment, total mortality was 14.6%, and 19.8% of cases underwent major amputation, which was less frequent among Rutherford Class I patients (p = 0.0179).

Conclusion

Treatment of AAO was primarily performed by thromboembolectomy with a Fogarty catheter, either alone or in combination with other treatments, achieving amputation and complication rates compatible with the best results in the literature and were progressively lower in less advanced Rutherford categories.

Keywords:
Balloon Embolectomy; Ischemia; Lower Extremity; Upper Extremity

INTRODUÇÃO

A oclusão arterial aguda (OAA) é definida como um súbito decréscimo da perfusão sanguínea, que ameaça a viabilidade do membro11 Norgren L, Hiatt WR, Dormandy JA, Nehler MR, Harris KA, Fowkes FG. Inter-society consensus for the management of peripheral arterial disease (TASC II). J Vasc Surg. 2007;45(1, Suppl. S):S5-67. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2006.12.037. PMid:17223489.
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. Os sintomas dolorosos em geral são abruptos e variam desde claudicação intermitente de início súbito ou piora da claudicação, dor em repouso, frialdade (poiquilotermia), parestesias, fraqueza muscular ou paralisia. No exame físico, os pulsos estão ausentes distais à oclusão, com esfriamento, palidez ou cianose da pele e perda de sensibilidade do membro acometido22 Creager MA, Kaufman JA, Conte MS. Clinical practice. Acute limb ischemia. N Engl J Med. 2012;366(23):2198-206. http://dx.doi.org/10.1056/NEJMcp1006054. PMid:22670905.
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. Sem intervenção vascular precoce em tempo hábil, a evolução, na maioria dos casos, tem um prognóstico reservado quanto ao salvamento do membro, podendo-se instaurar isquemia irreversível do membro com a necessidade de amputações.

A sua incidência varia entre 14/100.000 habitantes e 17/100.000 habitantes ou 1,5 casos por 10.000 pessoas por ano11 Norgren L, Hiatt WR, Dormandy JA, Nehler MR, Harris KA, Fowkes FG. Inter-society consensus for the management of peripheral arterial disease (TASC II). J Vasc Surg. 2007;45(1, Suppl. S):S5-67. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2006.12.037. PMid:17223489.
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,33 Costantini V, Lenti M. Treatment of acute occlusion of peripheral arteries. Thromb Res. 2002;106(6):V285-94. http://dx.doi.org/10.1016/S0049-3848(02)00104-4. PMid:12359341.
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,44 Bergqvist D, Troeng T, Elfstrom J, et al. Auditing surgical outcome: ten years with the Swedish Vascular Registry--Swedvasc. The Steering Committee of Swedvasc. Eur J Surg Suppl. 1998;581(581):3-8. PMid:9755403. e vem crescendo com o aumento da longevidade da população. As causas mais frequentes são as embolias oriundas de alterações cardíacas ou aórticas e tromboses de placas ateroscleróticas, consequentes de complicações aterotrombóticas nas artérias periféricas ou por oclusões de restaurações arteriais, além dos traumas em pacientes não ateroscleróticos, especialmente os iatrogênicos33 Costantini V, Lenti M. Treatment of acute occlusion of peripheral arteries. Thromb Res. 2002;106(6):V285-94. http://dx.doi.org/10.1016/S0049-3848(02)00104-4. PMid:12359341.
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.

A restauração do fluxo sanguíneo pode ser feita por técnicas endovasculares (trombólise mecânica ou farmacológica, angioplastias e stents) ou por meio de cirurgias abertas, como tromboembolectomias com cateter Fogarty, pontes (bypass), endarterectomias com ou sem remendos arteriais ou técnicas híbridas11 Norgren L, Hiatt WR, Dormandy JA, Nehler MR, Harris KA, Fowkes FG. Inter-society consensus for the management of peripheral arterial disease (TASC II). J Vasc Surg. 2007;45(1, Suppl. S):S5-67. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2006.12.037. PMid:17223489.
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. Os pacientes com embolias femorais e poplíteas têm maiores taxas de amputações, diretamente relacionadas com o tempo entre a oclusão e o tratamento55 Karapolat S, Dag O, Abanoz M, Aslan M. Arterial embolectomy: a retrospective evaluation of 730 cases over 20 years. Surg Today. 2006;36(5):416-9. http://dx.doi.org/10.1007/s00595-005-3156-7. PMid:16633747.
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. Nos casos de tromboses arteriais relacionadas à doença arterial periférica (DAP), o tratamento da placa de ateroma complicada subjacente ao trombo é fundamental para manter o sucesso na revascularização.

Um dos métodos mais consagrados de tratamento é a tromboembolectomia com cateter balão complacente, introduzido por Fogarty et al.66 Fogarty TJ, Cranley JJ, Krause RJ, Strasser ES, Hafner CD. A method for extraction of arterial emboli and thrombi. Surg Gynecol Obstet. 1963;116:241-4. PMid:13945714. (1963), sendo mais efetivo nas embolias do que em outras etiologias11 Norgren L, Hiatt WR, Dormandy JA, Nehler MR, Harris KA, Fowkes FG. Inter-society consensus for the management of peripheral arterial disease (TASC II). J Vasc Surg. 2007;45(1, Suppl. S):S5-67. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2006.12.037. PMid:17223489.
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,77 Rossi FH, Izukawa NM, Oliveira LA, et al. O valor atual da trombólise na oclusão arterial aguda do membro inferior. J Vasc Bras. 2003;2:129-40.. Embora essas técnicas tenham revolucionado o tratamento das OAAs, ainda ocorrem muitas complicações, e as taxas de amputações variam de cerca de 6 a 30% e a de mortalidade, de 18 a 25%11 Norgren L, Hiatt WR, Dormandy JA, Nehler MR, Harris KA, Fowkes FG. Inter-society consensus for the management of peripheral arterial disease (TASC II). J Vasc Surg. 2007;45(1, Suppl. S):S5-67. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2006.12.037. PMid:17223489.
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,33 Costantini V, Lenti M. Treatment of acute occlusion of peripheral arteries. Thromb Res. 2002;106(6):V285-94. http://dx.doi.org/10.1016/S0049-3848(02)00104-4. PMid:12359341.
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.

Há poucas informações sobre resultados e evolução de pacientes com OAA tratados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil. Nas publicações nacionais, sobressaem estudos com uso de fibrinolíticos77 Rossi FH, Izukawa NM, Oliveira LA, et al. O valor atual da trombólise na oclusão arterial aguda do membro inferior. J Vasc Bras. 2003;2:129-40.

8 Mandelli NCB, Nhuch C, Fontes PR, et al. O uso da estreptoquinase no tratamento da oclusão arterial aguda pós-cateterização da artéria femoral em crianças com menos de 10 kg. J Vasc Bras. 2007;6(1):42-9. http://dx.doi.org/10.1590/S1677-54492007000100007.
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9 Pitta GBB, Silva CRA, Medeiros JD, et al. Isquemia grave de membros inferiores por arterite por HIV. J Vasc Bras. 2011;10(4):319-24. http://dx.doi.org/10.1590/S1677-54492011000400012.
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-1010 Duda NT, Tumelero RT, Tognon AP. Tratamento percutâneo das oclusões arteriais agudas periféricas. Rev Bras Cardiol Invasiva. 2005;13:301-6., embora esse tratamento não seja facilmente disponível em hospitais vinculados ao SUS. Não se encontrou na literatura qualquer estudo brasileiro com os resultados do uso sistemático e prioritário de tromboembolectomia com cateter Fogarty nas OAAs de extremidades independentemente da etiologia, o que justificou a realização do presente estudo.

OBJETIVO

O objetivo deste estudo foi avaliar retrospectivamente os casos de OAAs tratados em serviço público universitário de referência em alta complexidade cardiovascular do SUS, analisando os fatores de risco, os resultados de salvamento de membros e a sobrevida perioperatória desses pacientes.

MÉTODOS

Foi realizado um estudo de coorte retrospectivo de série consecutiva de casos. Foram incluídos os pacientes com diagnóstico de OAA de membros inferiores ou superiores que receberam tratamento no período entre 2012 e 2017, através da análise de dados de prontuários eletrônicos de um único centro universitário. Foram excluídos pacientes menores de 18 anos, com oclusões de derivações arteriais, gestantes, portadores de neoplasias e arterites e prontuários incompletos. Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa local (Parecer: 737.804).

Em todos casos, foi preenchido prospectivamente um formulário específico para OAA, cujos dados faltantes foram completados por revisão retrospectiva dos prontuários. Foram tabulados dados demográficos, fatores de risco, sinais e sintomas, categorias da classificação clínica de Rutherford para o grau de isquemia do membro acometido (classificação da Society of Vascular Surgery/The International Society of Cardiovascular Surgery)1111 Rutherford RB. Clinical staging of acute limb ischemia as the basis for choice of revascularization method: when and how to intervene. Semin Vasc Surg. 2009;22(1):5-9. http://dx.doi.org/10.1053/j.semvascsurg.2008.12.003. PMid:19298929.
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(Tabela 1), tratamentos efetuados e suas principais complicações (amputações, reoclusões, necessidade de fasciotomia, insuficiência renal, complicações pulmonares e cardíacas, amputações e mortalidade operatória).

Tabela 1
Classificação clínica de acordo com a evolução da isquemia do membro acometido, adaptado de Rutherford (classificação da Society of Vascular Surgery/The International Society of Cardiovascular Surgery)33 Costantini V, Lenti M. Treatment of acute occlusion of peripheral arteries. Thromb Res. 2002;106(6):V285-94. http://dx.doi.org/10.1016/S0049-3848(02)00104-4. PMid:12359341.
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.

Os pacientes foram divididos em três grupos, de acordo com a etiologia das OAAs: grupo 1 – embolias; grupo 2 – tromboses; e grupo 3 – indefinido. Foram considerados para esse diferencial: o início do quadro como agudo ou gradual; dor como intensa ou moderada; antecedente de claudicação intermitente ausente ou presente; arritmia cardíaca presente ou ausente; pulsos contralaterais presentes ou ausentes; achados intraoperatórios compatíveis com embolia ou trombose11 Norgren L, Hiatt WR, Dormandy JA, Nehler MR, Harris KA, Fowkes FG. Inter-society consensus for the management of peripheral arterial disease (TASC II). J Vasc Surg. 2007;45(1, Suppl. S):S5-67. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2006.12.037. PMid:17223489.
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. Foram considerados como indefinidos os pacientes que não se encaixaram nos critérios característicos de embolia ou trombose.

O protocolo de tratamento realizado no hospital foi o uso prioritário da tromboembolectomia com cateter Fogarty para alívio imediato da isquemia aguda, tanto nas embolias como em casos de trombose. A via preferencial para o acesso cirúrgico foi a dissecção e exposição, conforme o caso, das artérias femoral comum, femoral superficial ou braquial, complementados por acessos distais quando necessário. O protocolo incluiu a realização rotineira de arteriografia intraoperatória após a tromboembolectomia para a avaliação do resultado e identificação de outras estratégias durante a cirurgia.

A heparina não fracionada (HNF) foi utilizada no pós-operatório dos casos embólicos para prevenção de recorrência. Nos casos trombóticos tratados por procedimentos endovasculares ou pontes, o uso de dupla antiagregação plaquetária foi o tratamento indicado. Nos casos Rutherford III, a tromboembolectomia com cateter Fogarty foi indicada em algumas situações para aliviar o quadro isquêmico e/ou para restaurar o fluxo sanguíneo em artérias colaterais a fim de tentar realizar uma amputação mais distal e/ou preservação osteoarticular, visando melhor reabilitação. Os desfechos primários foram: óbito, reoclusão arterial e necessidade de amputação maior (transtibial e/ou transfemoral ou de membro superior).

CASUÍSTICA

A amostra foi de conveniência, avaliando-se todos os casos consecutivos do período que preencheram os critérios de inclusão. Tomando-se por base informações da literatura entre 18 a 25% de mortalidade (considerando o valor mediano de 22%) e esperando-se diminuição dessa taxa para 15%, o tamanho amostral foi calculado em 135 pacientes, com 80% do poder do teste e 5% de nível de significância.

ANÁLISE ESTATÍSTICA

Foram calculadas estatísticas descritivas para as variáveis quantitativas, as quais foram estratificadas pelo diagnóstico final (embolia, trombose e indefinido). A comparação entre as médias para os diagnósticos foi feita utilizando a análise de variância (ANOVA), seguida do teste de Tukey. As comparações de dados contínuos entre os momentos pré e pós-operatórios foram feitas pelo teste t de Student, pareado para cada diagnóstico. Para as variáveis categorizadas, as associações com o diagnóstico final foram avaliadas através do teste qui-quadrado ou de Fisher. Foi considerado o nível de significância de 5% ou o p-valor correspondente. Todas as análises foram feitas pelo programa SAS for Windows, v.9.4 (SAS Institute Inc., Carolina do Norte, EUA).

RESULTADOS

Dos 288 registros de OAA encontrados, 183 foram excluídos devido aos fatores explicitados na Figura 1. Portanto, foram analisados 105 prontuários. A Tabela 2 apresenta os dados demográficos e desfechos de acordo com a etiologia (por grupos). A etiologia trombótica foi a mais prevalente (54,3%), seguida pela etiologia embólica (35,2%) e de origem indefinida (10,5%), sem diferença entre os sexos. A etnia branca foi a mais frequente (85,7%), e os membros inferiores foram os mais acometidos (89,5%). A classificação de Rutherford teve menor número absoluto de pacientes no grupo III, porém sem diferença estatística entre os grupos. Em relação aos desfechos reoclusão, amputação e óbito em 30 dias, não houve diferença estatística entre os grupos. A fibrilação atrial (FA) esteve mais presente associada estatisticamente ao grupo 1 – embolia (p = 0,0001), e a presença de aneurisma de artéria poplítea, DAP e tabagismo foram estatisticamente mais frequentes no grupo 2 – trombose (p = 0,0138, p = 0,0125 e p = 0,0161, respectivamente).

Figura 1
Fluxograma de inclusão dos pacientes selecionados para este estudo.
Tabela 2
Dados demográficos e principais desfechos, de acordo com a etiologia da oclusão arterial aguda (OAA).

A Figura 2 apresenta os principais fatores de risco e os sinais e sintomas encontrados, sendo hipertensão o fator de risco mais presente (65,71%) (Figura 2A) e a dor o sintoma presente na quase totalidade dos casos (97,14%) (Figura 2B). A Figura 3 apresenta as artérias acometidas e os tratamentos efetuados, sendo as principais artérias ocluídas as artérias da perna (tibiais e fibular) (78,1%), o segmento femoral superficial-poplíteo (79,05%) e a artéria femoral comum (54,29%) (Figura 3A). A HNF foi empregada isoladamente ou em associação em 75,23% dos casos e a tromboembolectomia com cateter Fogarty, empregado em 73,33% dos casos (Figura 3B).

Figura 2
A) Fatores de risco associados; B) Sinais e sintomas associados.
Figura 3
Artérias ocluídas e tratamentos efetuados.

A Figura 4 apresenta algumas particularidades dos procedimentos cirúrgicos empregados neste estudo. Destaca-se que as fasciotomias foram necessárias em 15,2% dos casos e a anticoagulação exclusiva foi realizada em apenas 4 pacientes (3,81%) (Figura 4A). A tromboembolectomia com cateter Fogarty isoladamente foi empregada em 41 casos, sendo associada a amputação mais prevalente em casos trombóticos, excetuando-se o único caso indefinido que sofreu amputação (Figura 4B). Já a angioplastia foi necessária em 29 casos e o implante de stent, em 16 casos, predominantemente no grupo trombose (p < 0,05) (Figura 4C). A reoclusão relacionada ao tratamento endovascular ocorreu em duas angioplastias com balão e em três implantes de stent, todos do grupo 2 – trombose.

Figura 4
Tratamentos realizados de acordo com a etiologia. A) Procedimentos realizados por etiologia; B) Evolução da tromboembolectomia com cateter Fogarty exclusivo; C) Tratamentos endovasculares por etiologia.

A Figura 5 apresenta a correlação entre os desfechos e a classificação de Rutherford. Quanto a reoclusão, ela ocorreu em maior número de pacientes da classe IIa (8,57%), sendo estatisticamente significante em relação às outras classes (p = 0,0323). Quanto à amputação, ocorreu menos frequentemente na classe I (14,3%; p = 0,0002) e foi maior (100%) nos pacientes da classe III (p < 0,0001). Quanto ao óbito em até 30 dias, não houve diferença estatisticamente significativa entre as classes. A Tabela 3 apresenta demográficos, etiologia e restaurações arteriais encontrados na literatura, para comparação com os dados do presente estudo.

Figura 5
Desfechos por classes Rutherford.
Tabela 3
Dados demográficos, etiologia e restaurações arteriais na literatura em comparação com os do presente artigo.

DISCUSSÃO

A casuística deste estudo foi similar aos registros da literatura com relação a idade, sexo, etiologia e a realização de tromboembolectomia arterial com uso do cateter Fogarty como forma de tratamento mais frequente. A taxa de óbitos e o período de seguimento foram variáveis na literatura, sendo que o presente estudo avaliou esse desfecho em até 30 dias. Pela palpação dos pulsos, o acometimento arterial foi mais frequente no segmento fêmoro-poplíteo (79,0%) e nas artérias tibiais (78,1%), o que também é verificado na literatura1212 Antusevas A, Aleksynas N. The surgical treatment of acute ischemia of the lower limb. Medicina (Kaunas). 2003;39(7):646-53. PMid:12878818..

Os fatores de risco da presente casuística foram similares aos encontrados por Donato et al.1313 de Donato G, Setacci F, Sirignano P, Galzerano G, Massaroni R, Setacci C. The combination of surgical embolectomy and endovascular techniques may improve outcomes of patients with acute lower limb ischemia. J Vasc Surg. 2014;59(3):729-36. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2013.09.016. PMid:24342067.
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em 322 pacientes com OAA, mas os perfis de risco variaram em função de características peculiares da população estudada. A diminuição da frequência de valvulopatias causadas por febre reumática e o crescente uso de anticoagulantes orais em pacientes com FA têm reduzido as ocorrências de OAA embólicas, porém a incidência de DAP vem crescendo pelo aumento da expectativa de vida33 Costantini V, Lenti M. Treatment of acute occlusion of peripheral arteries. Thromb Res. 2002;106(6):V285-94. http://dx.doi.org/10.1016/S0049-3848(02)00104-4. PMid:12359341.
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. O diagnóstico diferencial entre embolia e trombose pode ser difícil de estabelecer em cerca de 10 a 15% dos casos, o que é corroborado no presente estudo (10,45% dos casos)33 Costantini V, Lenti M. Treatment of acute occlusion of peripheral arteries. Thromb Res. 2002;106(6):V285-94. http://dx.doi.org/10.1016/S0049-3848(02)00104-4. PMid:12359341.
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. Nos casos em que a etiologia pôde ser confirmada, a presença de FA foi a causa mais frequente de OAA de origem embólica, sendo provável que ocorra por ineficácia ou falta de aderência ao tratamento anticoagulante. As frequências da etiologia embólica ou trombótica variam conforme as características populacionais regionais de cada estudo e a forma de confirmação desse diagnóstico1414 Davies B, Braithwaite BD, Birch PA, Poskitt KR, Heather BP, Earnshaw JJ. Acute leg ischaemia in Gloucestershire. Br J Surg. 1997;84(4):504-8. PMid:9112902.,1515 Yeager RA, Moneta GL, Taylor LM Jr, Hamre DW, McConnell DB, Porter JM. Surgical management of severe acute lower extremity ischemia. J Vasc Surg. 1992;15(2):385-91. http://dx.doi.org/10.1016/0741-5214(92)90260-F. PMid:1735899.
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.

No presente estudo, aproximadamente dois terços dos pacientes apresentavam isquemia avançada (classes Rutherford II e III), refletindo uma situação clínica mais grave (Tabela 2 e Figura 5). O tratamento cirúrgico predominantemente empregado foi a tromboembolectomia com cateter Fogarty, independentemente da etiologia, como apresentado por Borioni et al.1616 Borioni R, Garofalo M, Albano P, et al. Thromboembolectomy with a Fogarty catheter. Our clinical experience. Minerva Cardioangiol. 2000;48(4-5):111-6. PMid:10959147. Nos casos de etiologia trombótica, a técnica é dificultada pela presença da placa de ateroma, mas, quando bem-sucedida, pode remover o trombo secundário, permitindo a avaliação das condições da parede arterial por meio de arteriografia rotineira no intraoperatório. A tromboembolectomia pode amenizar um quadro isquêmico agudo, possibilitando a realização de procedimentos complementares por técnicas endovasculares (híbridos) ou cirúrgicas (endarterectomias ou pontes), reduzindo a indicação do tratamento endovascular primário.

A opção pela tromboembolectomia com cateter Fogarty para a maioria dos casos (73,3%) apresentou taxas de reoclusão similares entre as etiologias embólica e trombótica e as complicações da tromboembolectomia isolada foram semelhantes às encontradas na literatura88 Mandelli NCB, Nhuch C, Fontes PR, et al. O uso da estreptoquinase no tratamento da oclusão arterial aguda pós-cateterização da artéria femoral em crianças com menos de 10 kg. J Vasc Bras. 2007;6(1):42-9. http://dx.doi.org/10.1590/S1677-54492007000100007.
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. No entanto, os casos trombóticos, em decorrência da maior complexidade do tratamento e comorbidades, parecem estar mais sujeitos à reoclusão que os embólicos, segundo Mandelli et al.88 Mandelli NCB, Nhuch C, Fontes PR, et al. O uso da estreptoquinase no tratamento da oclusão arterial aguda pós-cateterização da artéria femoral em crianças com menos de 10 kg. J Vasc Bras. 2007;6(1):42-9. http://dx.doi.org/10.1590/S1677-54492007000100007.
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, que apresentaram taxas de 15,5% vs. 8,9%, respectivamente, por vezes necessitando de procedimentos complementares no intraoperatório.

Alguns autores preferem o tratamento de OAA trombótica por pontes ou técnicas endovasculares (trombólise farmacológica ou mecânica associada ou não a angioplastia), mas deve-se observar que a trombólise farmacológica por cateter não associada a dispositivos mecânicos apresenta risco hemorrágico relacionado à dose de trombolíticos e pode deteriorar o quadro isquêmico pelo tempo de aplicação, limitando-se às classes Rutherford I/IIA33 Costantini V, Lenti M. Treatment of acute occlusion of peripheral arteries. Thromb Res. 2002;106(6):V285-94. http://dx.doi.org/10.1016/S0049-3848(02)00104-4. PMid:12359341.
http://dx.doi.org/10.1016/S0049-3848(02)...
,1717 Aune S, Trippestad A. Operative mortality and long-term survival of patients operated on for acute lower limb ischaemia. Eur J Vasc Endovasc Surg. 1998;15(2):143-6. http://dx.doi.org/10.1016/S1078-5884(98)80135-4. PMid:9551053.
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. Quando associada a dispositivos mecânicos, ela reduz o tempo de revascularização e a exposição ao agente fibrinolítico, porém eleva o custo do procedimento e limita sua aplicação aos pacientes do SUS.

Nos casos da classe Rutherford III, no presente estudo, a tromboembolectomia foi usada para aliviar o quadro isquêmico e/ou restaurar o fluxo sanguíneo em artérias colaterais, objetivando melhorar o nível de uma amputação. Entretanto, para a situação de isquemia irreversível, a amputação primária foi a escolha33 Costantini V, Lenti M. Treatment of acute occlusion of peripheral arteries. Thromb Res. 2002;106(6):V285-94. http://dx.doi.org/10.1016/S0049-3848(02)00104-4. PMid:12359341.
http://dx.doi.org/10.1016/S0049-3848(02)...
.

Outros autores têm apresentado a trombólise química como superior à modalidade cirúrgica aberta11 Norgren L, Hiatt WR, Dormandy JA, Nehler MR, Harris KA, Fowkes FG. Inter-society consensus for the management of peripheral arterial disease (TASC II). J Vasc Surg. 2007;45(1, Suppl. S):S5-67. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2006.12.037. PMid:17223489.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2006.12....
,1414 Davies B, Braithwaite BD, Birch PA, Poskitt KR, Heather BP, Earnshaw JJ. Acute leg ischaemia in Gloucestershire. Br J Surg. 1997;84(4):504-8. PMid:9112902.,1818 Ouriel K, Shortell CK, DeWeese JA, et al. A comparison of thrombolytic therapy with operative revascularization in the initial treatment of acute peripheral arterial ischemia. J Vasc Surg. 1994;19(6):1021-30. http://dx.doi.org/10.1016/S0741-5214(94)70214-4. PMid:8201703.
http://dx.doi.org/10.1016/S0741-5214(94)...
,1919 Working Party on Thrombolysis in the Management of Limb Ischemia. Thrombolysis in the management of lower limb peripheral arterial occlusion--a consensus document. Working Party on Thrombolysis in the Management of Limb Ischemia. Am J Cardiol. 1998;81(2):207-18. PMid:9591906.. Comerota et al.2020 Comerota AJ, Weaver FA, Hosking JD, et al. Results of a prospective, randomized trial of surgery versus thrombolysis for occluded lower extremity bypass grafts. Am J Surg. 1996;172(2):105-12. http://dx.doi.org/10.1016/S0002-9610(96)00129-8. PMid:8795509.
http://dx.doi.org/10.1016/S0002-9610(96)...
compararam o tratamento fibrinolítico à confecção de nova ponte para casos de oclusões de pontes sintéticas ou autólogas, sendo 48% de oclusões agudas e 52% de oclusões crônicas. Observaram 39% de insucesso no tratamento fibrinolítico, concluindo que o tratamento cirúrgico por ponte foi mais eficaz em 30 dias (p = 0,023) e 1 ano (p = 0,04), com 84% de salvamento de membro em 12 meses (p = 0,026). O mesmo autor avaliou 174 casos de OAA (DAP trombótica ou oclusão de pontes, com sintomas há menos de 2 semanas) e obteve 59% de sucesso na terapia trombolítica (lise superior a 50%), porém com taxa de eventos adversos graves variando de 24 a 29%2121 Comerota AJ, Davidovic L, Hanna K, Courtney KL, Shlansky-Goldberg RD. Phase 2, randomized, open-label study on catheter-directed thrombolysis with plasmin versus rtPA and placebo in acute peripheral arterial occlusion. J Drug Assess. 2019;8(1):43-54. http://dx.doi.org/10.1080/21556660.2019.1586402. PMid:31069128.
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. A hemorragia é uma complicação preocupante relacionada ao uso de trombolíticos, incluindo a hemorragia intracraniana em 1 a 2% dos casos33 Costantini V, Lenti M. Treatment of acute occlusion of peripheral arteries. Thromb Res. 2002;106(6):V285-94. http://dx.doi.org/10.1016/S0049-3848(02)00104-4. PMid:12359341.
http://dx.doi.org/10.1016/S0049-3848(02)...
,2222 McNamara TO, Dong P, Chen J, et al. Bleeding complications associated with the use of rt-PA versus r-PA for peripheral arterial and venous thromboembolic occlusions. Tech Vasc Interv Radiol. 2001;4(2):92-8. http://dx.doi.org/10.1016/S1089-2516(01)90002-2. PMid:11981794.
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. Além disso, essa técnica pode ser limitada pelos custos dos medicamentos e dos cateteres multiperfurados e pela necessidade de terapia intensiva, exames laboratoriais e angiografias sequenciais2323 Yoshida W, Rollo H, Lastoria S, et al. Tratamento das oclusões arteriais agudas com doses baixas de estreptoquinase: resultados iniciais. Cir Vasc Angiol. 1989;5:27-33.. Um trabalho recente de revisão sistemática não apontou a existência de evidência favorável a trombólise farmacológica em comparação com a cirurgia convencional e mostrou que a cirurgia convencional deve ser a preferida em termos de salvamento de membro e mortalidade aos 30 dias, 6 meses e 1 ano2424 Darwood R, Berridge DC, Kessel DO, Robertson I, Forster R. Surgery versus thrombolysis for initial management of acute limb ischaemia. Cochrane Database Syst Rev. 2018;8(8):CD002784. http://dx.doi.org/10.1002/14651858.CD002784.pub3. PMid:30095170.
http://dx.doi.org/10.1002/14651858.CD002...
.

A anticoagulação com HNF evita a progressão de trombos secundários, preservando a circulação colateral e melhorando o prognóstico da restauração arterial, sendo recomendada tão logo o diagnóstico de OAA seja feito (100-150 UI/kg)1515 Yeager RA, Moneta GL, Taylor LM Jr, Hamre DW, McConnell DB, Porter JM. Surgical management of severe acute lower extremity ischemia. J Vasc Surg. 1992;15(2):385-91. http://dx.doi.org/10.1016/0741-5214(92)90260-F. PMid:1735899.
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,2525 Eliason JL, Wainess RM, Proctor MC, et al. A national and single institutional experience in the contemporary treatment of acute lower extremity ischemia. Ann Surg. 2003;238(3):382-9. http://dx.doi.org/10.1097/01.sla.0000086663.49670.d1. PMid:14501504.
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. A heparinização deve ser mantida no pós-operatório dos quadros embólicos, prevenindo a recorrência; porém, nos casos trombóticos revascularizados por pontes ou técnicas endovasculares, preconiza-se a antiagregação. No presente estudo, frequentemente os pacientes eram referenciados sem anticoagulação, prejudicando o prognóstico. Entretanto, a anticoagulação foi prescrita na admissão do paciente na maioria dos casos (75,24%). Blaisdell et al.2626 Blaisdell FW, Steele M, Allen RE. Management of acute lower extremity arterial ischemia due to embolism and thrombosis. Surgery. 1978;84(6):822-34. PMid:715701. recomendaram a amputação primária para o membro inviável e a terapia anticoagulante isolada para o tratamento do membro viável, o que foi empregado em quatro pacientes dessa casuística que apresentavam membro viável e impossibilidade cirúrgica. O tratamento apenas com HNF também foi menos relacionado à ocorrência de síndrome compartimental e a menor necessidade de fasciotomias2525 Eliason JL, Wainess RM, Proctor MC, et al. A national and single institutional experience in the contemporary treatment of acute lower extremity ischemia. Ann Surg. 2003;238(3):382-9. http://dx.doi.org/10.1097/01.sla.0000086663.49670.d1. PMid:14501504.
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, o que foi realizado em 15,24% dos casos na presente casuística. Ressalta-se que a utilização de heparinas não sintéticas pode estar relacionada a trombocitopenia induzida por heparina, que é um evento adverso raro, porém grave2727 Pimenta REF, Yoshida WB, Rollo HA, et al. Heparin induced thrombocytopenia in a patient with acute arterial occlusion. J Vasc Bras. 2016;15:138-41. http://dx.doi.org/10.1590/1677-5449.004215. PMid:29930579.
http://dx.doi.org/10.1590/1677-5449.0042...
.

Apesar dos progressos, o índice de amputações entre 10 a 30% e mortalidade perioperatória (30 dias) de cerca de 15% ainda são muito expressivos1313 de Donato G, Setacci F, Sirignano P, Galzerano G, Massaroni R, Setacci C. The combination of surgical embolectomy and endovascular techniques may improve outcomes of patients with acute lower limb ischemia. J Vasc Surg. 2014;59(3):729-36. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2013.09.016. PMid:24342067.
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. Não obstante o atendimento majoritário a pacientes com classificação clínica mais grave, os índices deste estudo se equipararam aos da literatura2828 Dormandy J, Heeck L, Vig S. Acute limb ischemia. Semin Vasc Surg. 1999;12(2):148-53. PMid:10777242.. Em um grande estudo multicêntrico conduzido por Eliason et al.2525 Eliason JL, Wainess RM, Proctor MC, et al. A national and single institutional experience in the contemporary treatment of acute lower extremity ischemia. Ann Surg. 2003;238(3):382-9. http://dx.doi.org/10.1097/01.sla.0000086663.49670.d1. PMid:14501504.
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(n = 23.168), foram feitas 47,3% de tromboembolectomias, 12,7% de amputações, 10,6% de trombólises e 12,5% de angioplastias, relatando 9,3% de mortalidade intra-hospitalar. Um subgrupo desse mesmo estudo (Universidade de Michigan, n = 105) observou 14,3% de amputações, 72,4% de tromboembolectomias, 24,8% de fasciotomias, 38,1% de trombólises e 7,7% de pontes, com mortalidade de 11,4%, demonstrando a heterogeneidade de resultados dependentes de fatores próprios de cada população. Para esses autores, a escolha da embolectomia foi associada com menores taxas de amputações e mortalidade2525 Eliason JL, Wainess RM, Proctor MC, et al. A national and single institutional experience in the contemporary treatment of acute lower extremity ischemia. Ann Surg. 2003;238(3):382-9. http://dx.doi.org/10.1097/01.sla.0000086663.49670.d1. PMid:14501504.
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. No entanto, a síndrome compartimental e a necessidade de fasciotomia é um parâmetro mais variável entre os estudos, frequentemente associadas ao tempo de isquemia e à etiologia embólica, mas no presente estudo foi mais frequente nos trombóticos, provavelmente em função de tempo da isquemia prolongada.

No estudo de Davies et al.1414 Davies B, Braithwaite BD, Birch PA, Poskitt KR, Heather BP, Earnshaw JJ. Acute leg ischaemia in Gloucestershire. Br J Surg. 1997;84(4):504-8. PMid:9112902., a trombólise intra-arterial apresentou ótimos resultados, com 85% de salvamento de membros, 9% de amputações e 6% de óbito, sendo que, para a tromboembolectomia, houve 71% de salvamento de membros, 3% de amputações e 26% de óbito (em 30 dias). Comerota et al.2121 Comerota AJ, Davidovic L, Hanna K, Courtney KL, Shlansky-Goldberg RD. Phase 2, randomized, open-label study on catheter-directed thrombolysis with plasmin versus rtPA and placebo in acute peripheral arterial occlusion. J Drug Assess. 2019;8(1):43-54. http://dx.doi.org/10.1080/21556660.2019.1586402. PMid:31069128.
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observaram 59% de sucesso na terapia trombolítica em pacientes com DAP ou oclusão de pontes (menos de duas semanas de sintomas) e eventos adversos graves variando de 24 a 29% (n = 174). Davies et al.1414 Davies B, Braithwaite BD, Birch PA, Poskitt KR, Heather BP, Earnshaw JJ. Acute leg ischaemia in Gloucestershire. Br J Surg. 1997;84(4):504-8. PMid:9112902., Ouriel et al.1818 Ouriel K, Shortell CK, DeWeese JA, et al. A comparison of thrombolytic therapy with operative revascularization in the initial treatment of acute peripheral arterial ischemia. J Vasc Surg. 1994;19(6):1021-30. http://dx.doi.org/10.1016/S0741-5214(94)70214-4. PMid:8201703.
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e consensos2929 Working Party on Thrombolysis in the Management of Limb I. Thrombolysis in the management of lower limb peripheral arterial occlusion - A consensus document. J Vasc Interv Radiol. 2003;14:S337-49. http://dx.doi.org/10.1016/S1051-0443(07)61244-5.
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relataram a trombólise como potencialmente vantajosa em relação à modalidade cirúrgica, em qualquer etiologia. Porém, para Costantini et al.33 Costantini V, Lenti M. Treatment of acute occlusion of peripheral arteries. Thromb Res. 2002;106(6):V285-94. http://dx.doi.org/10.1016/S0049-3848(02)00104-4. PMid:12359341.
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, a revascularização cirúrgica imediata estaria indicada no membro criticamente isquêmico e a trombólise direcionada por cateter nos casos não clinicamente ameaçados pela isquemia.

Yeager et al.1515 Yeager RA, Moneta GL, Taylor LM Jr, Hamre DW, McConnell DB, Porter JM. Surgical management of severe acute lower extremity ischemia. J Vasc Surg. 1992;15(2):385-91. http://dx.doi.org/10.1016/0741-5214(92)90260-F. PMid:1735899.
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submeteram 86% dos seus pacientes à anticoagulação com HNF, 70% realizaram angiografia pré-operatória, 65% foram submetidos à cirurgia de revascularização, 12%, à tromboembolectomia, com 70% de salvamento de membros e 15% de óbito (em um mês), sem relação com a reperfusão do membro.

O presente estudo apresenta as possíveis limitações: 1) a avaliação de somente 105 dos 288 prontuários, de forma parcialmente retrospectiva e levemente abaixo da amostra calculada; 2) o diagnóstico etiológico não totalmente respaldado por algum padrão-ouro de diagnóstico; e 3) os dados incompletos para exames laboratoriais.

CONCLUSÕES

O tratamento predominante foi a tromboembolectomia com cateter Fogarty em 73,3% dos casos, tendo sido realizado isoladamente e/ou em associação na maioria dos casos independentemente da etiologia. Foi o tratamento exclusivo em 41 casos (39,05%), dentre os quais: 70,27% nas embolias, 24,56% nas tromboses e 9,09% nos indefinidos. Os casos de etiologia trombótica tiveram tendência a maior frequência de reoclusões, mas sem correspondentes maiores taxas de amputações e óbito hospitalar.

A amputação maior em até 30 dias após restauração foi de 19,05%, similar à da literatura (16 a 30%)77 Rossi FH, Izukawa NM, Oliveira LA, et al. O valor atual da trombólise na oclusão arterial aguda do membro inferior. J Vasc Bras. 2003;2:129-40., e a mortalidade em até 30 dias foi de 13,34%, inferior da que é encontrado na literatura (18 a 25%)77 Rossi FH, Izukawa NM, Oliveira LA, et al. O valor atual da trombólise na oclusão arterial aguda do membro inferior. J Vasc Bras. 2003;2:129-40.. Assim, a tromboembolectomia arterial com cateter Fogarty, isolado e/ou associada com outros tratamentos, proporcionou índices de amputação e complicações comparáveis com aos encontrados na literatura.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos ao Prof. José Eduardo Corrente, professor adjunto de Bioestatística do Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP) e do Escritório de Apoio à Pesquisa de nossa Instituição, pela análise estatística de nossos dados.

  • Como citar: Teodoro C, Bertanha M, Girard FPCM, et al. Resultados do tratamento das oclusões arteriais agudas de membros em hospital universitário – estudo retrospectivo. J Vasc Bras. 2020;19:e20200031. https://doi.org/10.1590/1677-5449.200031.
  • Fonte de financiamento: Bolsa de Iniciação cientifica PIBIC – CNPq-UNESP - Processo 38.591.
  • O estudo foi realizado no Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Botucatu, SP, Brasil.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Nov 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    21 Mar 2020
  • Aceito
    25 Jun 2020
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