Resumo
Em 2019, a antropóloga Berta Ribeiro (1924-1997) foi homenageada com um vestido. Através do tributo pouco comum, procuramos mostrar como a roupa que a homenageia carrega relações e histórias da trajetória e da obra de Berta. Pretende-se também mostrar como interesses de pesquisa da antropóloga, como saberes ancestrais, técnicas de produção de cestaria indígena, plantas, pessoas e preservação da floresta, se relacionam com esse traje, criado pela estilista Flavia Aranha, e dialogam com discussões latentes tanto no conhecimento científico da antropologia e da filosofia contemporânea quanto com os saberes tradicionais indígenas. Neste sentido, através da homenagem vestível feita pelo evento “Selvagem: ciclo de estudos sobre a vida”, tomamos a antropóloga e seu vestido em um só feixe, cujas fibras serão estendidas ao longo deste artigo, buscando olhar mais de perto e mostrar seus fios reminiscentes, suas linhas têxteis, seus matizes tintórios, seus filamentos vegetais, suas gradações humanas, antropológicas e filosóficas.
Palavras-chave:
Berta Ribeiro; Trajetória; Ameríndios; Roupas; Plantas
Abstract
In 2019, anthropologist Berta Ribeiro (1924-1997) was honored with a dress. Through analyzing this unusual tribute, we show how the clothes that honor her carry the relationships and stories of Berta's trajectory and work. We also show how the research interests of the anthropologist, ancestral knowledge, indigenous basketry production techniques, plants, people, and forest preservation relate to this costume (created by stylist Flavia Aranha), and engaging in dialogue with latent discussions in anthropology and philosophy, as well as with traditional indigenous knowledge. Through the wearable homage made for the "Wild: Cycle of Studies of Life" event, we engage with the anthropologist and her dress as a single bundle, whose fibers will be extended throughout the present article, as we look more closely at and explore their reminiscent yarns, textile lines, dyed hues, vegetable filaments, and also their human, anthropological and philosophical gradations.
Keywords:
Berta Ribeiro; Trajectory; Amerindians; Clothing; Plants
Resumen
En 2019, la antropóloga Berta Ribeiro (1924-1997) fue homenajeada con un vestido. A través de este homenaje poco usual, tratamos de mostrar cómo la ropa que la honra contiene relaciones e historias de la trayectoria y obra de Berta. También se pretende mostrar cómo los intereses de investigación de la antropóloga, como los saberes ancestrales, las técnicas de producción de cestería indígena, las plantas, la gente y la preservación de los bosques se relacionan con este traje, creado por la estilista Flavia Aranha, que también dialogan con discusiones latentes tanto en el conocimiento científico de la antropología y filosofía como en los saberes tradicionales indígenas. En este sentido, a través del homenaje vestible realizado por el evento “Salvaje: ciclo de estudios sobre la vida”, tomamos a la antropóloga y su vestido en un mismo ovillo, cuyas fibras se extenderán a través de este artículo, buscando observarlas más de cerca para mostrar la reminiscencia de sus hilos, sus líneas textiles, sus tintes, sus filamentos vegetales y también sus gradaciones humanas, antropológicas y filosóficas.
Palabras clave:
Berta Ribeiro; Trayectoria; Amerindios; Ropa; Plantas
(Oswald de Andrade)
O ato mais corajoso ainda é pensar por si mesmo. Em voz alta.
(Coco Chanel)
Introdução
Quando uma antropóloga, Berta Ribeiro (1924-1997), é homenageada com um vestido, algo intrigante paira no ar: não se trata de um tributo feito por meio da palavra, mais comum entre os meios acadêmicos e intelectuais, mas sim por meio de uma roupa. A homenagem ocorreu no evento “Selvagem: ciclo de estudos sobre a vida”, no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, em 2019. O evento, com duração de quatro dias, apresentou-se como uma espécie de escola viva, que reúne saberes tradicionais e científicos, através do encontro entre pesquisadores de culturas aparentemente distantes em rodas de conversa, oficinas, lançamentos de livros. As atividades do evento também são divulgadas pelo canal na internet, procurando ampliar a extensão da experiência de edição para outros formatos, além da publicação impressa e digital.
Mediado pelo líder, pensador e escritor indígena Ailton Krenak (2019, 2020, para mencionar alguns) e coordenado por Anna Dantes, diretora da Editora Dantes, e por sua equipe, o evento proporcionou conversas sobre “Biosfera”, “Metamorfose”, “Céu”, “Amazônia” e “Plantas perfumosas”, reunindo diversos convidados. Biosfera foi o tema versado entre a filósofa, professora e artesã Cristine Takuá, o neurobiólogo chileno Humberto Maturana, o ecólogo Fábio Scarano e o filósofo da ciência Dorion Sagan. Metamorfoses foi a temática abordada pelo pajé Huni Kuï Duá Busë, o filósofo italiano Emanuele Coccia e a ecóloga Katia Torres. O tema Céu reuniu a liderança espiritual guarani Carlos Papá, a escultora Iole de Freitas e o físico Luiz Alberto Oliveira. Amazônia foi tratado entre Ketty Marcelo López, presidenta da Organização Nacional de Mulheres Indígenas Andinas e Amazônicas do Peru (Onamiap), Rafaela Forzza, curadora do herbário do Jardim Botânico onde ocorreu o evento, e Bia Saldanha, empresária e ambientalista. Perfumosas reuniu os estudiosos de plantas da floresta amazônica acriana Isaka e Thiago Ibã Huni Kuï e a pesquisadora de plantas medicinais Vera Fróes.
Boa parte dos temas do evento, senão todos, pode ser observada na trajetória de Berta: a Amazônia, onde esteve em trabalho de campo; as metamorfoses, vistas na arte indígena, por exemplo, com a transformação das plantas em cestos trançados por meio de técnicas ancestrais; as plantas, e não só as perfumosas, observadas por ela na vida indígena como um todo. Enquanto os temas do “Selvagem” nos remetem aos estudos de Berta, os elementos da homenagem nos levam a outros pontos de sua trajetória. A proposta do tributo nasceu a partir da visita de Anna Dantes à Fundação Darcy Ribeiro, no Rio de Janeiro, instituição que homenageia o antropólogo que foi também esposo de Berta e onde estão os arquivos bibliográficos e fotográficos de ambos. Nessa visita, Anna viu a fotografia dos anos 1940, registrada por Darcy, que mostra a antropóloga entre os indígenas kadiwéu (ver Figura 1). Esta imagem impulsiona o tributo e ganha uma exposição no evento. 1
O vestido que Berta trajava na fotografia é reproduzido de forma livre pela estilista Flavia Aranha a convite de Anna Dantes (ver Figura 2). Flavia Aranha, por sua vez, desde 2009 está à frente de sua marca homônima, que, com design de cunho minimalista2 e atemporal, procura criar roupas que independem de tendências de moda e são compostas de fibras e cores oriundas de plantas de diversos biomas brasileiros. Com uma rede ampla de parceiros - composta, entre outros, por agricultores, artesãs de diferentes regiões do país e uma equipe que atua no ateliê e nas lojas da marca em São Paulo capital -, desde o início a marca propôs caminhar na contramão do sistema fast-fashion, a moda rápida e dominante que, às custas de longas jornadas de trabalho remuneradas a baixos custos, veste e reveste as vitrines das lojas quinzenalmente. Após se formar em Moda na Faculdade Santa Marcelina, em São Paulo, de trabalhar em marcas brasileiras e visitar países como China e Índia, onde o fast-fashion é produzido, a estilista baseia sua marca no sistema de moda lenta, o slow fashion, que, em síntese, procura respeitar o tempo das pessoas e da natureza, apresentar um número menor de coleções por ano e fazer remunerações mais justas de trabalho. Ao longo do tempo a marca vem sendo reconhecida como sustentável por seus pares, jornalistas, revistas especializadas, semanas de moda, feiras, exposições nacionais e internacionais. Esse reconhecimento também se traduziu em certificações, como o Selo B, 3 atribuído a empresas que, por meio de seu poder de mercado, buscam solucionar temas sociais e ambientais. Para o “Selvagem”, junto à sua equipe, Flavia criou e fez o vestido usando tecido de algodão tingido naturalmente com as plantas urucum, pau-brasil e acácia-negra. Durante o evento, a equipe organizadora e algumas convidadas trajaram a reprodução do vestido.
No escopo da homenagem à Berta Ribeiro incluiu-se ainda a publicação da nova edição do livro de autoria desana, Antes o mundo não existia, dos autores indígenas Umusin Pârõmuru (1980, 2019), ou Firmiano Arantes Lana, e de seu filho Tõrãmũ Kêríri, ou Luiz Gomes Lana. Ele é considerado o primeiro livro de autoria indígena do Brasil (Pârõmuru & Kêríri 1980:9; Rama 1987; Bicalho 2010:206; Franca & Silveira 2014:72; C. Lima 2018:16). Berta revisou, datilografou, produziu conjuntamente e facilitou a publicação desta obra, o que permitiu ao antropólogo André Demarchi (2020) considerá-la como precursora da “antropologia compartilhada” 4 e chamá-la de “antropóloga do futuro”. 5 Publicada pela Editora Dantes, a nova edição faz dupla homenagem, aos Desana e à Berta. Dentre as vertentes da homenagem, o vestido não poderia deixar de chamar a atenção desta pesquisadora, que vem se dedicando a uma pesquisa sobre roupas sustentáveis na marca Flavia Aranha. 6
Cristine Takuá, durante sua apresentação, vestindo a reprodução livre do vestido de Berta Ribeiro feito pela estilista Flavia Aranha e por sua equipe.
A homenagem a Berta difere de outras, inclusive algumas dirigidas a intelectuais contemporâneas dela, como a socióloga e ensaísta Gilda de Mello e Souza (1919-2005). Gilda foi homenageada em 2006 no seminário organizado pelo sociólogo Sérgio Miceli e pelo filósofo Franklin de Mattos na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, que reuniu acadêmicos e debates, resultando depois em um livro (Miceli & Mattos 2007). Um ano depois foi homenageada através de exibição de filmes e de seus livros, leitura de contos, ciclo de palestras e sarau, desta vez fora da universidade, no Serviço Social do Comércio (Sesc) da cidade de Araraquara, interior de São Paulo. Em 2023, o Programa de Pós-Graduação Interunidades em Estética e História da Arte da Universidade de São Paulo e o Centro de Pesquisa e Formação do Sesc homenagearam Gilda de Mello e Souza em um evento com um prelúdio fílmico, seguido por mesas de debates com diversos intelectuais refletindo sobre a obra da autora. Gilda é reconhecida como pioneira nos estudos de moda, e seu livro O espírito das roupas: a moda no século dezenove (Souza 1987) é um marco relevante neste tema. Apesar de sua forte presença intelectual no assunto, não havia nesses eventos nenhuma vestimenta ou traje feito para homenageá-la. No caso da homenagem à Berta, cujas obra e contribuições eram substancialmente dedicadas a artefatos indígenas e coleções de museus, a escolha do vestido como tributo nos convida a refletir e a olhar mais de perto, compreendendo as relações entre a obra, a trajetória e a homenagem, como procuramos deslindar neste artigo.
Nesta trilha encontramos uma Berta abundante em suas publicações (B. Ribeiro 1957, 1979, 1982a, 1982b, 1983, 1985, 1986a, 1986b, 1988, 1992, 1993, 1994, 1995; B. Ribeiro & Velthem 1992; B. Ribeiro & D. Ribeiro 1957, entre outros), experiente em trabalhos de campo, perspicaz na observação e sagaz nos detalhes, sem perder a dimensão do todo e registrando minúcias pelas lentes de câmeras fotográficas, uma antropóloga cujas análises imbricam arte, cestaria e plumagens, plantas, pessoas e teorias, redigindo, em sua máquina de escrever, os artigos, os livros e as cartas dirigidas aos amigos. Como veremos, suas análises nos remetem a reflexões contemporâneas em antropologia e nos colocam em contato com temas atuais, como a biodiversidade e as relações entre humanos e não humanos. Se a lembrança de Berta muitas vezes aparece na antropologia brasileira através da figura de seu esposo, o antropólogo Darcy Ribeiro (1962, 1975, 1995, 1996a, 1996b, 2001, 2007, entre outros), ora como sua acompanhante, ora secretária, essa imagem se desfaz em sua trajetória e em suas publicações, e se desvanece quando mergulhamos em sua obra, que revela fecundidade, acurácia e sagacidade aplicadas à arte indígena e muitos dos meandros que a cercam.
Temos, então, Berta altiva, com sua porção “eminentemente desbravadora” (Velthem 1997:365), poderíamos dizer “selvagem”, que não se contenta em ficar longe do campo, em uma época em que os colegas intelectuais, no fundo, desacreditavam da vocação intelectual das mulheres que tentaram inventar um destino diferente daquele para o qual haviam sido socialmente preparadas, que as restringia à esfera doméstica e à maternidade, como nos mostra a antropóloga Heloisa Pontes (2004:27-28; 2006:98). Isso ocorria também na antropologia, dentro e fora do Brasil (Corrêa 1998, 2003). Berta faz parte da história da antropologia brasileira e é tirando-a de uma espécie de silêncio que, a um só tempo, acionamos a arte indígena, os conhecimentos tradicionais, as plantas, ampliando, assim, o contato com diversos saberes do mundo amazônico. Nosso ponto de partida é a homenagem que recoloca Berta como antropóloga em diálogo com os povos indígenas e com seus saberes, sua arte e sua floresta. Vívida, fértil e atual, Berta se mostra não só a nós, mas alhures: ela está na memória da antropologia, do povo Desana, está ainda entremeada com plantas, vestes, trançados, livros, diários, imagens, pessoas e memórias selvagens.
Berta Ribeiro
Na primeira edição do “Selvagem”, em 2018, o nome de Berta Ribeiro foi referenciado pelo povo Desana, com o qual ela conviveu e atuou. Um ano depois ela recebeu a homenagem no mesmo evento, na cidade do Rio de Janeiro, onde viveu e escreveu grande parte de sua obra. Nascida na Romênia, em 1924, Berta chegou ao Brasil ainda pequena, quando a família se mudou para a capital fluminense. 7 Lá, conheceu Darcy Ribeiro, antropólogo que seria seu esposo, e junto com ele, a antropologia, como nos mostra a cientista social e museóloga Lucia van Velthem (1997:365-366), que conviveu com Berta. Como antropóloga que se tornaria, Berta atuou como professora no Museu Nacional, uma das mais prestigiadas escolas de antropologia do país, publicou livros e artigos, colaborou com publicações indígenas e contribuiu efetivamente com museus em coleções de arte indígena.
As viagens eram também uma constante. Nas primeiras idas a aldeias indígenas acompanhava Darcy em seu trabalho de campo, e entre 1948 e 1973, tempo em que estiveram casados, viajaram juntos, tendo a colaboração intelectual entre eles permanecido após esse período (Mattos 2007:10). 8 Berta afirmava ter aprendido antropologia nas viagens e ao datilografar por anos os manuscritos de seu marido (B. Ribeiro 1995:14; Mattos 2007:10), que resultaram em alguns dos trabalhos dele, como Religião e Mitologia Kadiwéu, publicado em 1950. Entre o final dos anos de 1940 e o começo da década de 1950, Berta realizou estágio no Museu Nacional. Em 1953 se graduou em História e Geografia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Em 1958 ela deixou o Museu para colaborar com Darcy Ribeiro e Eduardo Galvão na constituição do Departamento de Antropologia da Universidade de Brasília, no Distrito Federal (Vogas 2011:394). Na companhia de Darcy ela esteve no Pantanal Mato-Grossense, em 1948, entre os Kadiwéu, com os quais foi fotografada (Figura 1, acima), e também entre os Kaiwá, os Terena, os Ofaié-Xavante, os Kaingang e os Xokleng (Mattos 2007:87). Em seguida estiveram entre os Ka’apor no Maranhão. No Alto e Médio Rio Xingu estiveram entre os Yawalapiti, os Kaiabi, os Juruna, os Araweté e os Asurini (Velthem 1997:366). Depois, em diferentes épocas, Berta viajou para estar entre os Tukano e os Desana na região do Alto Rio Negro (Velthem 1997:366).
Quando não estava em campo, Berta se refugiava em seu escritório no apartamento em Copacabana que, como mostra Velthem (1997:366), “constituía o seu verdadeiro local de ‘estar-no-mundo’”. Da máquina de escrever que manejava com perícia, herança dos tempos como datilógrafa em São Paulo, “tudo brotava: os artigos, os livros, as cartas” (:366), além de instrumentos para os estudos de cultura material, tendo uma produção fértil com nove livros e mais de quarenta artigos publicados, dentre os quais aqui destacamos alguns. Também em seu apartamento Berta mantinha um de seus interesses capitais: os objetos da cultura material indígena. A antropóloga os lia, colecionava e cuidadosamente armazenava em “um acervo de, aproximadamente, quinhentas peças pacientemente reunido ao longo dos anos, com contribuições tanto de Darcy Ribeiro quanto do antropólogo Eduardo Galvão” (:367). Dentre suas diversas publicações, há o livro Bases para uma Classificação dos Adornos Plumários dos Índios do Brasil (B. Ribeiro 1957), estudo museológico e bibliográfico à época bastante inédito (Velthem 1997:367), e também Arte plumária dos índios Kaapor, escrito em conjunto com Darcy (B. Ribeiro & D. Ribeiro 1957), que recebeu o prêmio da Academia Brasileira de Letras. Como afirmava Velthem (1997:366), tratava-se de “uma vida devotada ao estudo das culturas indígenas”.
A partir de meados de 1970 Berta buscou uma carreira independente. Ao final dos anos 1980, época da publicação de Antes o mundo não existia, já mencionado, ela se tornou professora adjunta e pesquisadora do Departamento de Antropologia do Museu Nacional, pertencente à Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde orientou e ministrou disciplinas sobre arte indígena e cultura material, museologia e etnobiologia, e se associou ainda ao Museu do Índio e ao Museu Nacional, onde pesquisou e formou coleções etnográficas (Velthem 1997:367). Em 1974 ela retornou ao Brasil junto com Darcy, depois de dez anos de exílio no Uruguai, na Venezuela, no Chile e no Peru (Vogas 2011:394; Velthem 1997:367; Brito 2017:36). Nesse período tanto trabalhou na organização da documentação etnográfica de Darcy quanto em projetos próprios, como em seu projeto de doutorado em Antropologia Social (Laraia 2008:22; Brito 2017:36-37). No retorno ao Brasil, em 1974, atuou na Editora Paz e Terra com editoração e revisão de textos (Vogas 2011:394). Com o apoio do Museu Nacional, em 1976, apresentou ao Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq) seu projeto de doutorado, cuja tese A Civilização da Palha: a arte do trançado dos índios do Brasil foi defendida na Universidade de São Paulo em 1980. Para tanto, visitou o Parque Nacional do Xingu (PNX) em 1977, e esteve entre os Yawalapiti, os Txikão e com os Kaiabi. Viajou também ao Ceará, observando o trançado sertanejo da palha de carnaúba (Vogas 2011:394). Em 1978 foi aos afluentes do rio Negro (rios Uaupés e Tiquié) e do rio Içana (rio Aiari) para estudar o trançado indígena, quando conheceu os Desana. Sua tese (B. Ribeiro 1980) foi considerada uma das mais completas sobre arte indígena alto-xinguana e alto-rionegrina, abordando aspectos tecnológicos, produtivos e estéticos e lançando luz sobre o sistema de trocas existentes nessas regiões (Velthem 1997:367).
Um ano antes do título, em 1979, Berta publicou Diário do Xingu. Neste livro narra sua viagem de campo pelo PNX e descreve uma de suas caminhadas junto aos indígenas pela mata buscando plantas para extrair palha e também material tintório natural para pintura dos cestos. No “Índice e glossário” (B. Ribeiro 1979:261-262), a autora localiza as páginas onde estão os principais termos e conceitos, e na letra “P” apresenta “Pigmentos e Mordentes”, “Plantas corantes”, “Plantas medicinais” e “Plantas úteis não cultivadas”. Em 1981, Berta visitou as aldeias dos povos Asuriní e Araweté, e junto ao médico e fotógrafo Frederico Ribeiro realizou quatro documentários, Asuriní: fuso e fio, Asuriní: barro e corpo, Araweté: técnicas primitivas e Araweté: a índia vestida, como parte do projeto “Artes têxteis indígenas do Brasil”, do Museu Nacional/UFRJ. Em 1982, a antropóloga publicou “A oleira e a tecelã: o papel social da mulher na sociedade Asurini”, tratando mais detidamente da arte têxtil e ceramista feita pelas mulheres. Ainda em 1982 e também em 1985, Berta publicou dois trabalhos levando o mesmo título, “Tecelãs Tupi do Xingu” (B. Ribeiro 1982b, 1985), nos quais, de modo geral, examina alguns aspectos da técnica de tecelagem e fiação dos povos Juruna, Kaiabi, Assuriní e Araweté.
Ao longo de sua vida, Berta coordenou várias exposições, dentre elas: “Cultura indígena do Brasil”, pertencente ao projeto “Inventário do acervo etnográfico brasileiro na Itália” e que resultou no livro A Itália e o Brasil Indígena (B. Ribeiro 1983); e “Amazônia: Urgente: cinco séculos de história e ecologia”, montada em Brasília, Salvador, São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e no Pará. No ano de 1985 a antropóloga coordenou o setor de museologia do Museu do Índio da Fundação Nacional do Índio. Atuou ainda como professora visitante, em 1987, na Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro no âmbito do mestrado em História e Crítica da Arte e, em outros anos, na Universidade de Campina Grande, na Paraíba, na Universidade Católica de Goiás, no Museu Histórico Nacional do Rio de Janeiro e na Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais (Flacso), em Quito, no Equador. Alguns de seus trabalhos lhe renderam premiações, como os documentários do projeto “Artes têxteis indígenas do Brasil”, exibidos no XV Festival do Filme Científico do Rio de Janeiro, de 1982, e o trabalho “Artesanato indígena: para quê, para quem?”, vencedor do concurso Ano Interamericano do Artesanato, de 1983. Berta recebeu ainda o prêmio “Erico Vanucci Mendes”, de 1988, oferecido pela Sociedade Brasileira de Progresso da Ciência (SBPC), que reconheceu sua dedicação à preservação das culturas de minorias no Brasil, e a medalha de Comendadora da Ordem do Mérito Científico, conferida a ela em 1995 pelo Ministério da Ciência e Tecnologia.
Em 1986, Berta coordenou os três volumes da Suma Etnológica Brasileira, editados por Darcy. No volume intitulado Etnobiologia, que contou com a tradução de partes de Handbook of South American Indians, série monográfica de estudos etnográficos publicados entre 1946 e 1959, foram reunidos ainda outros artigos sobre a vida material indígena e também a respeito da arte dos trançados e da tecelagem (Velthem 1997:367), bem como sobre plantas, manejo, fauna e flora (B. Ribeiro & D. Ribeiro 1986). Em outra de suas publicações, o Dicionário do Artesanato Indígena, de 1988, um desdobramento de sua tese, apresenta as “bases metodológicas e classificatórias indispensáveis nas pesquisas de cultura material e na documentação etnomuseológica dos acervos etnográficos” (Velthem 1997:367). Também enveredou pela antropologia da arte, contribuindo com Arte Indígena, Linguagem Visual, livro de 1989, no qual as análises de casos concretos permitem abordar conteúdos e significados das manifestações estéticas dos índios brasileiros (:368). Estudos museológicos eram para Berta um meio de apoiar a causa indígena e de refletir sobre como os museus poderiam ser instituições mediadoras na educação pública (:368). Cinco anos depois, ela publicou o artigo “Ao Vencedor, as Batatas!”, 9 em que mostra que nosso conhecimento sobre plantas e cultivos vegetais é proveniente dos saberes dos indígenas.
Em 1995 Berta publicou seu último livro, Os índios das Águas Pretas: modo de produção e equipamento produtivo, escrito dois anos antes de sua morte. Neste livro tratou de temas relacionados à ecologia e à cultura material, assuntos centrais em seu trabalho, e analisou a criatividade das culturas indígenas, seu saber ecológico e legado (Velthem 1997:366). Também mostrou que os indígenas do Alto Rio Negro participam de uma tradição comum, incluindo diversas etnias, e que, além de identificarem recursos florísticos e faunísticos de seu ambiente, desenvolveram estratégias e técnicas adequadas ao seu manejo, visando à sua preservação (B. Ribeiro 1995:12-13). Dentre esses povos, os Desana são destaque por sua habilidade na identificação e no manejo das plantas e profundo conhecimento de técnicas tradicionais indígenas, como a cestaria (:28). O glossário do livro traz alguns “termos regionais amazônicos” (:239-244), incluindo, dentre outros, os de plantas para cestaria, como aramã, carauá, marantáceas, plantas fixadoras de cores, onde estão cumati, ingá, mangabeira, mordente, plantas tintórias como carajuru, jequitibá, muirapiranga (pau-brasil), urucu (urucum) e plantas para confecção de indumentária, como a imbaúba e o líber. No índice remissivo, entre outros, estão os termos “biodiversidade”, “ecossistemas”, “etnobotânica”, “tecelagem”, “urucu” que remetem a plantas, florestas e materiais tintórios (:265-270). Além disso, parte da publicação é dedicada à “etnobotânica desana”, tendo como foco as “plantas artesanais”, espécies vegetais empregadas em canoas, artefatos cesteiros e têxteis, implementos de caça e pesca, objetos rituais e coingredientes vegetais na produção e na ornamentação da cerâmica (:203, sic).
O conhecimento sobre plantas, floresta e vegetais vem de convivência, conversas e trabalhos com indígenas e cientistas que conheciam muito a floresta, como seu principal informante, o desana Tolamãn Kenhíri. Berta sugere que ele talvez devesse assinar com ela o livro de 1995 (B. Ribeiro 1995:14-15). Ela agradece ainda a Luiz Fernandes Rodrigues, mateiro amazonense, zelador das matas e conhecido como “guardião da biodiversidade”, que fez “a identificação científica das plantas trazidas” nos anos 1990 e “das quais é feita a cultura material”, como as cestarias e outras mais. Ela também estende a autoria dese livro aos desana Firmino e Luiz Lana, e destina o livro “aos 14 mil alfabetizados de fala Desana, Tukano, Baníwa, Makú e Nheengatu” para que sua história e conhecimento sigam vivos. Para Berta “a vocação da Amazônia é a biodiversidade, a policultura em pequenas glebas, à maneira indígena, produtos florestais amazônicos, artesanatos e o ecoturismo”, algo, portanto, distante do “absurdo da substituição da mata por pastagens” (:237). Ela mostra que “além de desenvolver conhecimentos sobre a biologia amazônica, índios e caboclos criaram mecanismos de autocontenção para protegê-la e preservá-la”, mantendo vivas castanheiras, seringueiras, mogno, madeiras de lei e outras espécies vegetais (238). As reservas de biodiversidade são os territórios indígenas e o manejo da floresta precisa ser inteligente, ela afirma, “porque aí se conservam ecossistemas inteiros”, preservando a biodiversidade, o mais rico patrimônio da floresta e algo essencial para o futuro (236-237).
Vestido de plantas
Se de longe o vestido não era o foco das investigações antropológicas de Berta Ribeiro, as plantas, o manejo, a técnica de produção artesanal e a preservação da floresta eram, de perto, de seu profundo interesse. Quando um vestido reúne esses elementos em sua homenagem, em certa medida, ele materializa pontos relevantes de sua trajetória, reafirmando o que o sociólogo Georg Simmel 2014 ([1905 ]:25) destaca sobre a moda e, por conseguinte, sobre roupas, ao afirmar que “a moda nada mais é do que uma forma particular entre muitas formas de vida”. Quando os quinze vestidos da homenagem vestem as organizadoras e as convidadas, como a violoncelista Nana Carneiro da Cunha, Cristine Takuá, Anna Dantes e a própria estilista Flavia Aranha, durante o evento, todas elas experimentam Berta pela via do vestir, ainda que diferenciadas entre si por acessórios e sapatos, por exemplo. Vestir-se como Berta é também experimentar, deixar a pele do corpo entrar em contato com o modelo do vestido que a antropóloga usava em 1940 e, ao mesmo tempo, deixar-se tocar pelas fibras das plantas.
O tecido utilizado pela estilista e sua equipe para confeccionar o vestido é de algodão. Nele, por meio de silkagem, processo de impressão quente do material tintório extraído das plantas, são impressas listras maiores em laranja e outras, menores, em preto. O laranja vem da mistura de serragem residual de pau-brasil, oriunda da produção de arcos de violinos com madeira legalizada pela Arcos Brasil, 10, e de urucum, cultivado nas veredas de Minas Gerais por agricultores familiares da Copabase. 11 As listras menores, em preto, foram feitas com casca da acácia-negra, espécie que colabora para a recuperação de solos degradados, plantada no sul do Brasil pela Tanac. 12 A um só tempo as plantas permitem aproximar os interesses tanto da antropóloga quanto da estilista e da proposta do evento. Flavia Aranha e sua equipe mantêm uma pesquisa frequente sobre a obtenção de tecidos e o tingimento natural com plantas através de um caminho que procura ser sustentável, abarcando a dimensão da origem das roupas como uma informação que compartilha com o público, bem como com os cuidados relativos ao uso e, depois, com a dimensão do descarte que ocorre no pós-consumo. As plantas e as pessoas são, portanto, elementos essenciais para Flavia Aranha, que trabalha com o fazer artesanal (handmade) e com os conhecimentos tradicionais de tingimento, fazendo uma moda lenta (slow fashion) em que o processo importa, seja no fazer das roupas, no tingir, e também no usar, no cuidar, para que as roupas durem e, quando forem degradadas, possam se tornar parte da fertilidade do solo.
Por vias e razões diferentes, as plantas são importantes para Berta e para Flavia. Ao se dedicar à antropologia, com grande interesse pela cestaria indígena e por sua produção, Berta Ribeiro via, diante de seus olhos, os cestos serem trançados pelos indígenas a partir de fibras de plantas e coloridos com materiais tintórios naturais. Depois, ao caírem em desuso, as fibras e as cores dos cestos voltavam ao solo, fertilizando-o. Diante dela estavam ainda a floresta e a preservação mantida pelos indígenas, bem como os saberes tradicionais cultivados. Criando moda que visa à sustentabilidade, a estilista, junto com sua equipe, alia o aprendizado oriundo do conhecimento tradicional, que está intimamente ligado ao tingimento natural e à tecelagem, por exemplo, a um processo de contínuo aprendizado e pesquisa, dedicando-se a produzir roupas com tecidos e cores oriundas prioritariamente de plantas de cultivo orgânico.
Berta (B. Ribeiro 1979:139) dedicava estudos e investigações às plantas. Em muitos momentos ela atuava em parceria com a bióloga taxonomista brasileira Margareth Emmerich, 13 uma das pioneiras em etnobotânica e sua colega no Museu Nacional. Em campo, Berta buscava acompanhar cada processo, inclusive indo à floresta para, por exemplo, encontrar uma árvore tintureira a fim de obter tinta para pintar os cestos, os urupem em língua kaiabi. Numa dessas empreitadas, depois de uma longa e dura caminhada, os indígenas e Berta encontraram uma árvore tintória a uma distância de três léguas da aldeia Kaiabi. Dessa árvore, um dos poucos exemplares da espécie, se extrai a tinta vermelha. Com o machado se faz um quadrado de um metro em sua casca e com o lado oposto da ferramenta se raspa vagarosamente a casca, retirando dela a entrecasca de fibras longas. Torcendo os maços de fibras, a tinta, de cor viva como sangue, escorre, e Berta ajuda nesse momento, vertendo a tinta na lata, que rende até a metade e depois é aplicada à cesta em repetidas camadas de vermelho-rubi, colorindo algumas das fibras em um tom vinho vermelho (:142).
Nessa trilha, a antropóloga fotografa e também colhe amostras de folhas e florescências para levar à bióloga e, enquanto registra, percebe que, diferente dela, os Kaiabi guardam “tudo na cabeça: os desenhos de urupem, o modo de fazê-lo, os nomes das plantas empregadas, onde encontrá-las” (B. Ribeiro 1979:139). Uma vez identificada a planta, um jequitibá (Cariniana estrellensis), Berta reflete sobre ela: não vira muitos desses exemplares na floresta e sua escassez a faz questionar se “terão os Kayabí de mudar sua tecnologia de pintura dos cestos por falta de matéria-prima [sic]” ou se “descobrirão outra tinta” (:142). Talvez pudessem usar “arumã, uma marantacea (Ischnosiphon sp) que impera sobranceiramente os trançados de toda a Amazônia brasileira e dos países vizinhos: Colômbia, Venezuela, Guianas” (:142-143), afirma ela. No entanto, mostra também que pôde, ao longo do tempo, observar que “é difícil mudar a tecnologia indígena”, pois os indígenas “aferram-se ao saber tradicional porque só ele lhes permite confeccionar os bens com maestria, só assim podem servir aos símbolos visíveis de sua individualidade como povo que quer ser único e singular” (:143).
Berta Ribeiro (1993:113) mostra ainda que regiões da América do Sul tropical, como o Brasil, o Planalto Andino, a América Central e o México, “podem ser qualificadas como ‘civilizações vegetais’”, uma vez que “priorizaram a domesticação da flora ao invés da fauna”. À época, Berta observava que “mais de cem espécies vegetais originárias da América foram aclimatadas pelos europeus”, sendo “empregadas para os mais diversos fins” (:113) e destaca que “as principais plantas que hoje nos alimentam e que são utilizadas industrialmente foram descobertas e domesticadas pelos ameríndios” (:118). Mostra ainda que ao longo do tempo eles “desenvolveram técnicas de manejo agrícola que culminaram na domesticação das plantas”, prática que leva em conta fatores essenciais como “a variação climática, a composição química dos solos, sua textura e a presença ou a introdução de nutrientes” (:114), fazendo com que solos como as chamadas “terras pretas” dos índios não sejam naturais, mas construídos por gerações de ameríndios (:115). 14 Referenciando a construção machadiana “ao vencedor, as batatas!”, Berta depreende que tubérculos, batatas, grãos, gramíneas e outras espécies úteis levadas pelos europeus no período colonial, no século XVI, “produziram mais fortuna do que o ouro e a prata, objeto da conquista” (:113). Fibras têxteis e plantas tintórias também são parte dessa “civilização vegetal”, como as “três espécies de algodão cultivadas pelos indígenas americanos antes da chegada de Colombo (Gossysium barbadense, G. peruvianu e G. hirsutum)”, que figuram “entre as melhores do mundo”. Com a árvore de pau-brasil não foi diferente (:120).
O pau-brasil (Caesalpinia spp) foi o “principal produto de exploração colonial no primeiro século” (B. Ribeiro 1993:120), e tematizou também o manifesto do poeta modernista Oswald de Andrade (1972[1924 ]), que propunha a devoração antropofágica da cultura estrangeira, curiosamente lançado no mesmo ano de nascimento da antropóloga. Extraída de forma indiscriminada no Brasil pela Coroa portuguesa desde o século XVI, sob termos de exclusividade do Real Contrato de Sua Majestade, a árvore era oriunda das matas do nordeste brasileiro e alimentava o vibrante mercado de corantes português e europeu, como mostra o historiador Thiago Alves Dias (2018). Enquanto a produção de tecidos se adensava nos teares industriais da Grã-Bretanha, a tinturaria europeia imitava os seculares processos tradicionais indianos e chineses (Dias 2018:2-3), usando plantas tintórias como o pau do Brasil, como fora chamado à época, que largava “de si uma tinta vermelha”, sendo excelente “para tingir panos de lã e seda, e se fazer dela outras pinturas e curiosidades” (:5). No final do século XVIII, o governador de Pernambuco avisou às autoridades de Lisboa que não consentiria mais em tal exploração. Porém, o efeito já havia sido sentido, visto que as cartas registravam também que “destruíram-se as melhores matas, e algumas nem vestígio conservam da sua antiga riqueza e preciosidade” (:6). A exploração do pau-brasil o leva à situação de extinção e ao uso restrito. O tingimento feito por Flavia Aranha com essa madeira utiliza os resíduos da produção de arcos de violino, fazendo da serragem, que era sobra, cores para as roupas que produz.
O algodão tem também lugar nas publicações de Berta (B. Ribeiro 1979, 1982a, 1982b, 1985, 1993, 1995). Em seu Diário do Xingu ela descreve que encontrou algodão nas aldeias indígenas do Parque Indígena do Xingu (B. Ribeiro 1979:120-121). Entre os Yawalapíti, Berta mostra que alguns cestos são adornados com borlas de algodão e tingidos com urucum (:58). Junto aos Kaiabi ela colhe algodão e descreve não só a colheita, como também mais duas variedades da planta: Manidju, algodão branco, e Manidju-pirang, algodão cor de caramelo que já nasce tingido, ambos arbóreos, plantados e colhidos por mulheres (:118). O algodão cor de caramelo é usado para fazer rede, corda de arco, para amarrar tacape, fazer peneira e para tecer tupoi (tipoia), que as mulheres usam para carregar seus filhos de colo. O algodão também aparece na amarração das pulseiras de tucum que ornamentam seus braços, chegando quase até os cotovelos e que, com os fios amarrados, também adornam as panturrilhas das meninas, visando engrossar suas pernas (:144). Berta mostra que às vezes ambos os algodões são usados para realçar os desenhos. A antropóloga afirma que “algodão é arbóreo e dá flocos muito grandes, alguns com quatro caroços” e inclui um “trabalho mais exaustivo, que é cortar os galhos e as trepadeiras de feijão com um machete”, para depois colhê-los, o que deve ser feito na estação seca, antes da chegada da chuva (:150 sic).
Em três artigos Berta registra o interesse pela planta e por seus usos, tanto no que trata sobre a “civilização vegetal” (B. Ribeiro 1993) quanto nos dois trabalhos homônimos (B. Ribeiro 1982b, 1985), nos quais detalha a fiação e a tecelagem de algodão no PNX entre os Juruna, os Kaiabi, os Assuriní e os Araweté, mostrando semelhanças e diferenças quanto a técnicas, teares, tessituras, motivos, desenhos e usos das redes e das roupas produzidas com esta planta pelas mãos indígenas. Consideradas como tarefas femininas feitas com excelência (:369), essas são descritas de forma minuciosa por Berta (1982b, 1985). Berta mostra que se utiliza também uma espécie de cúrcuma - considerada pela bióloga Margareth Emmerich como exógena e provavelmente trazida pelos europeus - à qual se adiciona o sumo da casca de um arbusto para tingir os fios de algodão, conferindo a eles um amarelo brilhante (B. Ribeiro 1982b:17). Usam-se, ainda, folhas maceradas de um arbusto e água para mergulhar os fios por algum tempo, que depois são untados de barro para secar ao sol, obtendo assim a cor preta. As mulheres araweté, cujo traje vermelho de algodão formado por quatro peças difere dos trajes dos outros povos (como mostra B. Ribeiro 1982b:34, e Viveiros de Castro 1986:42, ao se referir ao traje araweté), utilizam o urucum misturado à seiva da amêndoa do babaçu para tingir os fios (B. Ribeiro, 1982b:22).
O algodão, o pau-brasil, o jequitibá, o urucum guardam histórias de florestas vivas, de conhecimento ancestral, de indígenas, de artesãos e cultivadores de floresta e de terra fértil. Circular e regenerativa é a trajetória que Berta acompanha ao ver o cesto sendo produzido desde o encontro com a planta na terra até ela ser devolvida à própria terra. A proposta de Flavia Aranha com as roupas guarda algumas semelhanças com esses pontos. Criando vestimentas cujo tecido vem de plantas, de resíduos de madeira pau-brasil de arcos de violino, de urucum e acácia-negra plantados e colhidos no país, as roupas guardam histórias de agricultores, de tecelãs e artesãos e de produtores de instrumentos musicais.
Peter Stallybrass (2008:14) entende a roupa como um “material que é ricamente absorvente de significado simbólico e no qual as memórias e as relações sociais são literalmente corporificadas”. O pesquisador ainda mostra que “ao pensar nas roupas como modas passageiras, nós expressamos apenas uma meia-verdade”, uma vez que “os corpos vêm e vão: as roupas que receberam esses corpos sobrevivem” (:10). Desde o fio, depois sendo transformada em tecido, em seu uso e em sua circulação, as roupas guardam histórias. À medida que as pessoas plantam e colhem algodão e urucum ou quando reaproveitam a serragem do pau-brasil, procura-se envolver a roupa em um movimento circular, que permite sua criação e posterior degradação de forma a colaborar com a fecundidade da terra.
Algodão, urucum, pau-brasil são plantas que compõem o vestido em homenagem à Berta em pleno século XXI. As plantas tintórias urucum e pau-brasil formam o laranja da espécie de coleção selvagem que homenageia a antropóloga. Elas permeiam as brancas fibras do tecido de algodão e com seus extratos vegetais vestem os corpos, a pele de cada mulher, carregando muitas histórias em sua composição. De origem brasileira, o urucum, ao qual Berta fazia referência como aquele “amplamente usado como corante alimentício, em cosméticos e protetores contra a exposição solar” (B. Ribeiro 1993:120), se torna cor. As listras mais finas são feitas de cascas de acácia-negra, árvore nativa da Austrália adaptada ao Brasil e cultivada no Rio Grande do Sul seguindo métodos que procuram ser sustentáveis. Seus taninos são mordentes, fixadores de cor, que formam a cor preta das listras do vestido. Observadas de perto, as tramas do vestido nos remetem ao que os bastidores do livro Antes o mundo não existia revelam: no vestido só se veem as plantas quando se conhecem as histórias que ele carrega, no livro só se vê a decisiva participação de Berta conhecendo a história da produção dessa publicação.
Se imagem, vestido e livro ressoam entre si, tal relação não se dá por acaso. Imergindo na malha viva, as histórias são abundantes e se relacionam. De longe a homenagem se compõe de fotografia, vestido e livro. De perto são pessoas, plantas, mitos vestindo nossos olhos com cores, texturas e narrativas e nos levando às histórias e às memórias, bem como a elementos contemporâneos imbricados nessa trama.
Entre plantas e multiespécies
Berta Ribeiro esteve atenta às relações que os povos indígenas estabelecem com o meio ambiente e, em especial, com as plantas, à medida que seus interlocutores tratavam do assunto. A antropóloga (B. Ribeiro 1987:11) afirmava que o conhecimento do ambiente ecológico, o tipo de adaptação e a percepção da vida animal, vegetal e humana intrincavam relações relevantes para estes povos de forma ampla e, em específico, para seus artefatos. Como mostra Berta, em meio a múltiplas formas de vida, os indígenas privilegiavam o vegetal em detrimento do animal em muitas esferas, como a alimentação, os artefatos, a cestaria, as canoas, a constituição das casas, formando o que ela caracteriza como “civilização vegetal” ou “civilização da palha” (B. Ribeiro 1980:5).
Além de observar estas relações e de identificar legados indígenas à cultura brasileira presentes, por exemplo, nas plantas cultivadas, no final da década de 1980, Berta também observava a crescente importância que o meio ambiente vinha tomando entre o chamado “grande público”, tendo registrado estes pontos no livro intitulado O índio na cultura brasileira (B. Ribeiro 1987:92). Em destaque naquele momento, o tema vinha sendo debatido antes. Em 1962 o livro da bióloga americana Rachel Carson, A Primavera Silenciosa, marca o movimento ambientalista internacional, a um só tempo alertando para a necessidade do respeito aos ecossistemas e para os riscos envolvendo o uso de pesticidas e de seus efeitos contaminantes que afetariam a saúde humana e o meio ambiente e poderiam levar a silenciar a primavera, estação de reflorescimento da flora terrestre (Carson 1969).
Os anos seguintes vão ser marcados por iniciativas que colocam o meio ambiente no centro dos debates. Algumas delas são realizadas pela Organização das Nações Unidas (ONU) que, em suma, procura promover cooperações internacionais. Em 1972 é realizada a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, em Estocolmo (Suécia), primeira reunião de chefes de Estado sobre o tema. Em 1987, mesmo ano do referido livro de Berta (B. Ribeiro 1987), é lançado o relatório “Our Common Future”, coordenado pela primeira-ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland, com o compromisso de garantir as bases de recursos (incluindo os chamados recursos naturais) que assegurassem a qualidade de vida média das gerações futuras. No ano de 1988 cria-se o Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), que se tornaria uma referência internacional na análise, na avaliação e em propostas de mitigação para os efeitos causados pelas mudanças climáticas que, por sua vez, são oriundas de impactos das atividades antrópicas sobre os ecossistemas terrestres e oceânicos. Em 2008, o IPCC reconhece os povos indígenas, pela íntima relação que mantêm com o meio ambiente e seus recursos, como vitais no combate a estas mudanças.
No Brasil, em 1988, em um contexto de abertura democrática, é aprovada a Constituição Federal, ampliando os direitos individuais e coletivos, conferindo status constitucional à proteção do meio ambiente e reconhecendo a legitimidade das diferentes organizações sociais e tradições culturais indígenas e o direito à terra que tradicionalmente ocupam. Em 1992, o Rio de Janeiro (Brasil) recebe a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Cnumad), também conhecida como Cúpula da Terra ou Rio 92 e, em 1997, o Protocolo de Kyoto é assinado no Japão. Ambos, em diferentes medidas, permitiram firmar compromissos entre diversos países, na busca pela mitigação das mudanças climáticas.
Ainda que o meio ambiente viesse ganhando atenção ampliada, Berta não deixava de advertir que a discussão sobre ecologia e cultura que ela propunha em 1987 poderia “parecer excessiva a muitos leitores”, ainda que para a antropóloga parecesse ser “a mais pertinente” (B. Ribeiro 1987:92). Enquanto Berta pesquisava, etnografava e publicava seus trabalhos, o debate em torno do tema “vegetal” não era destaque na antropologia. Nela emergia o que viria a ser chamada de “virada animal” (animal turn), por sua vez impulsionada pelo ativismo em torno dos direitos dos animais, ganhando destaque na área pelo menos dos anos 1980 em diante, e dando origem a um domínio de pesquisa especializado em torno do tema, como mostram o antropólogo Jean Segata (2015:415-416) e a historiadora Teresa Castro (2019:04). É somente no início do século XXI que o vegetal vai receber atenção a ponto de engendrar o que vem sendo chamado de “virada vegetal” (plant turn) (Castro 2019:04).
Por sua vez, a “virada vegetal” vem propondo entender, viver, pensar sobre e com vegetais, constituindo-se por meio de etnografias e análises antropológicas oriundas de diferentes autores (Emperaire 2005, 2010; Oliveira 2012, 2018; Oliveira et al. 2020; van Dooren 2012; Cunha 2012; Hustak & Myers 2012; Maizza 2014; Tsing 2012, 2015; Emperaire, Velthem & Oliveira 2014; Emperaire & Eloy 2008; Emperaire & Garcés 2016; Emperaire, Eloy & Seixas 2016; A. Lima 2017; Narby 2005, 2018; Shiratori 2019, para citar algumas), além de reflexões filosóficas (como as de Coccia 2018, 2020; Plumwood 2002; Stengers 2015, para mencionar algumas) e, entre outras, de análises da neurobiologia, que demonstram que as plantas têm memória, cognição e inteligência (como faz Mancuso 2019, por exemplo). Neste bojo, como afirma a historiadora Teresa Castro (2019:04), os botânicos e os geneticistas vêm perdendo no campo da ciência o controle exclusivo sobre a vida vegetal, e os desdobramentos emergentes desse movimento se fazem sentir nas ramificações, que passam a mostrar outras facetas sobre a vida vegetal.
Nesta diversa gama de pesquisas e de novas abordagens, estão estudos que enfatizam os saberes e as relações dos povos indígenas e das populações tradicionais com a biodiversidade e o universo vegetal. Entre estas, uma das referências fundantes são os estudos da pesquisadora Laure Emperaire, que faz o registro do sistema agrícola tradicional do rio Negro como patrimônio imaterial, e aborda os modos de relação, de manejo e de conhecimento de alguns desses povos com os vegetais cultivados. Para Emperaire (2005:01), a biodiversidade agrícola na Amazônia brasileira pode ser vislumbrada ou concebida como um patrimônio que, a um só tempo, possui suporte biológico e existência atrelados ao manejo e aos modos de conhecer e de se relacionar com os vegetais, tal como praticados por povos indígenas e tradicionais. Para a autora, na conservação das espécies e variedades dos vegetais cultivados, bem como da agrobiodiversidade devem ser considerados tanto os recursos fitogenéticos - entendidos como objeto de estudos pluridisciplinares (10) -, quanto o seu patrimônio cultural associado (:12).
A importância do Médio Rio Negro é destacada como centro de diversidade de plantas cultivadas, se constituindo como um importante aspecto da identidade cultural da população e podendo ser integrada na noção de patrimônio cultural imaterial no contexto de uma população ameríndia multiétnica, como mostram Emperaire, Velthem e Oliveira (2014). No Médio e no Alto Rio Negro a alta diversidade de plantas cultivadas também se mantém no contexto urbano, ainda que convivendo com fatores limitantes e obrigações que podem colidir com a dimensão cultural da diversidade agrícola, como demonstram Emperaire e Eloy (2008:209) através de uma abordagem comparativa da diversidade agrícola nos contextos urbano e florestal nessa região.
Outros trabalhos de Emperaire seguem essa mesma linha, abordando os saberes e os modos de manejo envolvidos nos cultivos agrícolas de plantas, como a mandioca da região do Rio Negro, estudo no qual cita Berta Ribeiro como uma de suas referências (Emperaire 2010). Os trabalhos desenvolvidos por Laure Emperaire ao longo da última década influenciaram diversas etnografias de antropólogas brasileiras que realizaram seus trabalhos na região Norte do país e se aprofundaram nos saberes relacionados a este universo vegetal. Dentre estes, encontram-se os estudos de Joana Cabral de Oliveira (2012, 2018) que, de forma profunda, trata de saberes e conhecimentos sobre plantas entre o povo Wajãpi, que vive no Amapá; de Karen Shiratori (2019), que aborda o universo vegetal na sociocosmologia Jamamadi, povo que vive no Amazonas e no Acre; de Fabiana Maizza (2014), que mostra a relação de cultivo e cuidado com as plantas, entendidas como parentes do povo Jarawara, vivente no Amazonas; e de Ana Gabriela Morim de Lima (2017), que vem mostrando a relação de parentesco entre o povo Krahô, que vive no Tocantins, e a batata-doce.
Algumas dessas etnografias (A. Lima 2017; Shiratori 2019, por exemplo) remetem a debates em que as plantas são consideradas “espécies companheiras” (companion species), tal qual a expressão cunhada pela bióloga e pensadora americana Donna Haraway (2003). Esses debates, por seu turno, remetem à proeminente discussão em torno do que vem sendo chamado de “etnografia multiespécie” (multispecies ethnography) que, de forma geral, se propõe a escrever cultura em meio ao Antropoceno15 sem colocar os humanos no centro das análises, mas sim entendendo-os como uma espécie entre outras, como mostram os antropólogos Eben Kirksey e Stefan Helmreich (2010:549). Neste escopo, abre-se espaço para viver e pensar com outras espécies, o que inclui os vegetais. Etnografias multiespécies (como as de Tsing 2015; Hustak & Myers 2012; van Dooren 2012; van Dooren et al. 2016; Barad 2014; Kohn 2013, 2016, por exemplo), neste sentido, impulsionam conectividades com comunidades onde uma multitude de outros, que antes estavam à margem da antropologia, ganham voz, agência, subjetividade e atenção renovadas, sendo potencializadas para repensar categorias de análise em relação a todos os seres (Kirksey & Helmreich 2010:563), mostrando que “histórias apenas-humanas não servirão a ninguém”, como reforçam o filósofo Thom van Dooren e os antropólogos Eben Kirksey e Ursula Münster (van Dooren et al. 2016:41).
Tais discussões, e mais especificamente as que focam nos vegetais, não estão distantes de assuntos analisados por Berta Ribeiro, para quem as plantas não deixavam de estar presentes, se relacionando e convivendo com os povos indígenas. Ainda que ela registrasse que foi na década de 1990 que antropólogos e biólogos tenham sido “estimulados a pesquisar e a relatar o saber indígena do seu meio ambiente e a forma como o manejam e dominam” (B. Ribeiro 1995:11), e que só recentemente a “virada vegetal” se potencializasse, Berta Ribeiro já se interessava etnograficamente por esta dimensão, abordando-a em suas pesquisas, apontando problemáticas e publicando sobre ela (a exemplo, B. Ribeiro 1979, 1987, 1993, 1995), configurando, neste escopo, um pioneirismo, avant la lettre.
Lida no início do século XXI, a obra de Berta encontra terreno fértil na “virada vegetal” e em seus desdobramentos, no próprio “Selvagem” que a homenageou, na relevância da temática ambiental que, nessas últimas décadas, emerge diante das mudanças climáticas, e em reverberações que envolvem o tema e seus efeitos. Tais elementos desvanecem qualquer tom de exagero colocado nos temas abordados por Berta Ribeiro na segunda metade do século XX. A antropóloga não viveu para ver este contexto e esta virada. Berta faleceu em 1997, coincidentemente no mesmo ano em que o Protocolo de Kyoto foi firmado. De outra feita, suas publicações, que não são poucas, nos permitem conhecer mais sobre temáticas que agora, mais que emergentes, são cada vez mais urgentes, e que estão imbricadas nos estudos e na trajetória da antropóloga, bem como no vestido que a homenageia.
Conclusão
Um vestido é uma roupa que permite movimento ao corpo. Como mostra Gilda de Mello e Souza (1987:40), “o traje não existe independentemente do movimento, pois está sujeito ao gesto, e a cada volta do corpo ou ondular dos membros é a figura total que se recompõe, afetando novas formas e tentando novos equilíbrios”. A liberdade das pernas oferecida pela saia, a leveza do tecido, o passo largo ou curto ao sabor do desejo de quem o veste são deleites vindos de seu uso. O vestido que homenageia Berta Ribeiro guarda essas nuances. A antropóloga se movia por aldeias indígenas, conhecendo-as, trazia em seu texto leve as temáticas relevantes aos indígenas, antecipando discussões atuais da área. Ao sabor de seus interesses, ela ia ao encontro de elementos essenciais à arte e à vida indígena. A homenagem, feita no evento “Selvagem” - termo, distante do seu sentido etimológico e mais próximo do significado atribuído pela teoria lévi-straussiana16 (Lévi-Strauss 1989 [1962]) -, apresenta-se como o pensamento humano em livre exercício, o que nos remete à liberdade de expressão desse tributo, concretizado em forma de vestido, imagem e livro. A homenagem nos conduz a olhar Berta de perto, desdobrada em suas obras, em seus feitos e em sua trajetória de antropóloga, que muitas vezes é mantida em silêncio. Ao deslizarmos por entre o feixe que reúne Berta e seu vestido, encontramos seus livros, artigos, sua produção abundante e potente. Vemos uma antropóloga que se emancipa aprendendo nos bastidores o papel que iria ocupar logo depois, com autenticidade e vigor.
O foco em Berta, ampliado pelo vestido que a homenageia, tira do silêncio não só sua trajetória, mas também a arte indígena, as plantas, os conhecimentos tradicionais, a biodiversidade, a floresta viva, mostrando-se como um sopro de vida que nos coloca em contato com saberes oriundos de um mundo vegetal, multiespecífico, metamórfico, amazônico. O vestido conferido pela homenagem traz em suas fibras, se não todas, algumas dessas potências sendo contempladas pelo trabalho de Flavia Aranha, de sua equipe e parceiros, junto a todas as plantas entremeadas nessa malha. Para mais, carrega as histórias, as memórias indígenas e as da antropóloga, junto a técnicas ancestrais e artesanais. Como afirma o sociólogo Georg Simmel (2014[1905 ]:25), a moda é “uma peculiar convergência das mais diversas dimensões da vida” (:55) que reúne “o interesse pela duração, pela unidade e pela igualdade com o interesse pela mudança, pelo particular, pelo único” (:21-23).
Berta Ribeiro e seu legado nos mostram as múltiplas formas pelas quais sua obra contribuiu para a antropologia ao manter vivas a memória e a arte indígenas, registrando a importância dos povos ameríndios, das plantas e das florestas. Quando um vestido feito com plantas homenageia uma antropóloga ao mesmo tempo em que se torna bom para vestir e pensar, ele nos coloca em contato com livros, imagens, com forma e conteúdo que se alinham e, quando olhados de perto, se mostram repletos de uma malha fina, composta de diversidade e, neste caso, de antropologia, de conhecimento indígena, de plantas e de vida.
Agradecimentos
Agradeço aos integrantes do grupo Ateliê de Produção Simbólica e Antropologia - APSA/Unicamp, Ana Carolina Verdicchio Rodegher, Amanda Gonçalves Serafim, Bernardo Fonseca Machado, Brunela Succi, Camila Rosatti, Christiano Tambascia, Gabriela Limão, Gustavo Rossi, Luís Felipe Sobral, Nathanael Araujo da Silva e, em especial, a Bárbara Pires e a Rafael do Nascimento Cesar - também integrantes, pelas valiosas contribuições partilhadas; de forma distinta agradeço à Professora Dra. Heloisa Pontes, também integrante do Apsa, pelo incentivo à escrita deste artigo, bem como pela generosa leitura do texto e por suas preciosas contribuições; agradeço também pelas fecundas leituras de Tatiana Plens, Maria Raquel da Cruz Duran e Igor Alexandre Badolato Scaramuzzi; aos pareceristas da revista Mana pelas sugestões recebidas; às participantes envolvidas na pesquisa; a Karina Hymnô de Souza e também aos revisores da Mana pela atenta revisão de língua portuguesa. Agradeço, ainda, ao Programa de Pós-graduação em Antropologia Social da Unicamp por todo o apoio durante a pós-graduação e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES, pelo financiamento desta pesquisa no Brasil e na Inglaterra.
Referências
- ANDRADE, Oswald de. 1972. “Manifesto da Poesia Pau-Brasil”; “Manifesto Antropófago”. In: O. de Andrade, Do Pau-Brasil à Antropofagia e às Utopias Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, MEC.
- ANDRELLO, Geraldo. 2010. “Falas, Objetos e Corpos Autores Indígenas No Alto Rio Negro”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 25, n. 73.
- ASSIS, Machado de. 1994. Obra Completa Vol. I. Rio de Janeiro: Nova Aguilar.
- BARAD, Karen. 2014. “Invertebrates Visions: Diffractions of the Brittlestar”. In: Eben Kirksey (ed.), The Multispecies Salon London: Duke University Press.
- BICALHO, Charles. 2010. Koxuk, a Imagem do Yãmîy na Poética Maxakali Tese de Doutorado, Universidade Federal de Minas Gerais.
- BOSCOLO, Odara Horta; SENNA-VALLE, Luci & ROCHA, Joyce alves. 2018. “Contribuições de Margarete Emmerich para a Botânica Brasileira”. Ethnoscientia, v. 3, n. 2.
- BRITO, Carolina Arouca Gomes de. 2017. Antropologia de um jovem disciplinado: a trajetória de Darcy Ribeiro no serviço de proteção aos índios (1947-1956). Tese de Doutorado, Fundação Oswaldo Cruz.
-
CARNEIRO, Maria Luiza Tucci. 2008. Guerreiras anônimas: por uma história da mulher judia. Disponível em: http://www.usp.br/proin/download/artigo/artigo_guerreiras_anonimas.pdf Acesso em: 29/09/2021.
» http://www.usp.br/proin/download/artigo/artigo_guerreiras_anonimas.pdf - CARSON, Rachel. 1969 [1962]. A Primavera Silenciosa Rio de Janeiro: Edições Melhoramentos.
- CASTRO, Teresa. 2019. “The Mediated Plant”. E-flux journal, #102.
- CLEMENT Charles. R.; DENEVAN William. M.; HECKENBERGER Michael. J.; JUNQUEIRA André Braga; NEVES Eduardo. G.; TEIXEIRA Wenceslau G.; WOODS William. I. 2015. “The domestication of Amazonia before European conquest”. Proceedings of the Royal Society B, 282.
- COCCIA, Emanuele. 2018. A Vida das Plantas Florianópolis: Cultura e Barbárie.
- COCCIA, Emanuele. 2020. Metamorfoses Rio de Janeiro: Editora Dantes, no prelo.
- CORRÊA, Mariza. 1988. “Traficante do Excêntrico - Os Antropólogos no Brasil dos Anos 30 aos 60”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 3, n. 6:79-98.
- CORRÊA, Mariza. 2003. Antropólogas e Antropologia Belo Horizonte: Editora da UFMG.
- CUNHA, Manuela Carneiro da. 2012. “Questões suscitadas pelo conhecimento tradicional”. Revista de Antropologia, v. 55, n. 1:439-464.
- DEMARCHI, André. 2020. “Homenagem: Berta Ribeiro, antropóloga do futuro”. In: Marcelo de Souza Cleto (org.), Escritas Sociais: democracia, diversidades e gênero Palmas: EDUFT.
- DIAS, Thiago Alves. 2018. “O Negócio Do Pau-brasil, a Sociedade Mercantil Purry, Mellish and Devisme e o Mercado Global de Corantes Escalas Mercantis, Instituições e Agentes Ultramarinos no Século XVIII”. Revista de História, n. 177.
- EMPERAIRE, Laure. 2005. “A biodiversidade agrícola na Amazônia brasileira: recurso e patrimônio”. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, v. 32:31-43.
- EMPERAIRE, Laure (org.). 2010. Dossiê de registro do Sistema Agrícola Tradicional do Rio Negro Brasília: ACIMRN / IPHAN / IRD / Unicamp-CNPq.
- EMPERAIRE, Laure & ELOY, Ludivine. 2008. “A cidade, um foco de diversidade agrícola no Rio Negro (Amazonas, Brasil)?”. Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi. Cienc. Hum., v. 3, n. 2:195-211.
- EMPERAIRE, Laure; ELOY, Ludivine & SEIXAS, Ana Carolina. 2016. “Redes e observatórios da agrobiodiversidade, como e para quem? Uma abordagem exploratória na região de Cruzeiro do Sul, Acre”. Dossiê Dinâmicas das Agriculturas Amazônicas, Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi. Cienc. Hum v. 11, n.1: 159-192.
- EMPERAIRE, Laure & GARCÉS, Claudia Leonor López. 2016. “Dinâmicas das agriculturas amazônicas”. Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi. Cienc. Hum v. 11, n. 1: 13-16.
- EMPERAIRE, Laure; VELTHEM, Lúcia van & OLIVEIRA, Ana Gita de. 2014. “Patrimônio cultural imaterial e sistema agrícola: O manejo da diversidade agrícola no médio rio Negro Amazonas”. Anais do evento 26ª Reunião Brasileira de Antropologia
- FRANCA, Aline & SILVEIRA, Naira Christofoletti. 2014. “A Representação Descritiva e a Produção Literária Indígena Brasileira”. TransInformação, v. 26, n. 1:67-76.
- HARAWAY, Donna. 2003. The Companion Species Manifesto: Dogs, People, and Significant Otherness Chicago: Prickly Paradigm Press.
- HUSTAK, Carla. & MYERS, Natasha. 2012. “Involutionary Momentum: Affective Ecologies and The Sciences of Plant/Insect Encounters”. Differences, v. 23, n. 3.
- KIRKSEY, Eben. & HELMERICH, Stefan. 2010. “The Emergence of Multispecies Ethnography”. Cultural Anthropology , v. 25, n. 4:545-576.
- KOHN, Eduardo. 2013. How Forests Think: Toward an Anthropology Oakland, California: University of California Press.
- KOHN, Eduardo. 2016. “Como os Cães Sonham: Naturezas Amazônicas e as Políticas do Engajamento Transespécies”. Ponto Urbe, v. 19.
- KOPENAWA, Davi & ALBERT, Bruce. 2015. A queda do céu: palavras de um xamã yanomami São Paulo: Companhia das Letras.
- KRENAK, Ailton. 2019. Ideias para Adiar o Fim do Mundo São Paulo: Companhia das Letras .
- KRENAK, Ailton. 2020. O amanhã não está à venda São Paulo: Companhia das Letras .
- LARAIA, Roque de Barros. 2008. Roque de Barros Laraia (depoimento) Rio de Janeiro: CPDOC/Fundação Getulio Vargas (FGV), (1 h 17 min).
- LÉVI-STRAUSS, Claude. 1989 [1962]. O pensamento selvagem Campinas: Editora Papirus.
- LIMA, Ana Gabriela Morim de. 2017. “A Cultura da Batata Doce: Cultivo, Parentesco e Ritual entre os Krahô”. Mana, v. 23, n. 2:455-490.
- LIMA, Carlos Emílio Correa. 2018. Antes o Mundo Não Existia: o Livro da Outra Origem do Mundo Tese de Doutorado, Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
- LLOYD, Kasey. & PENNINGTON, William. 2020. “Towards a Theory of Minimalism and Wellbeing”. Int J Appl Posit Psychol v. 5:121-136.
- LUCIANI, José Antonio Kelly. 2013. “La chute du ciel: paroles d’un chaman yanomami”. Revista de Antropologia da UFSCar, v. 5, n. 1.
- MAIZZA, Fabiana. 2014. “Sobre as Crianças-planta: O Cuidar e o Seduzir no Parentesco Jarawara”. Mana, v. 20, n. 3:491-518.
- MANCUSO, Stefano. 2019. A Revolução das Plantas: Um Novo Modelo para o Futuro São Paulo: Ubu Editora.
- MATTOS, Andre Luis Lopes Borges de. 2007. Darcy Ribeiro: uma trajetória (1944-1982) Tese de Doutorado, Universidade Estadual de Campinas.
- MICELI, S. & MATTOS, F. (org.). 2007. Gilda: A Paixão pela Forma Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul; São Paulo: Fapesp.
- NARBY, Jeremy. 2005. Intelligence in Nature: An Inquiry into Knowledge Londres: Penguin.
- NARBY, Jeremy. 2018. A Serpente Cósmica, o DNA e a Origem do Saber Rio de Janeiro: Editora Dantes.
- OLIVEIRA, Joana Cabral de. 2012. Entre Plantas e Palavras: Modos de Constituição de Saberes entre os Wajãpi (AP) Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo.
- OLIVEIRA, Joana Cabral de. 2018.“Saberes Agrícolas entre os Wajãpi: Desafios de uma Cosmopolítica Contemporânea”. In: Joana Cabral de Oliveira et al. (org.), Práticas e Saberes sobre Agrobiodiversidade: A contribuição dos Povos Tradicionais. São Paulo: IEB Mil Folhas. pp. 135-154.
- OLIVEIRA, Joana Cabral de Oliveira, AMOROSO, Marta, MORIM DE LIMA, Ana Gabriela, SHIRATORI, Karen, MARRAS, Stelio, EMPERAIRE, Laure . 2020. Vozes vegetais: diversidade, resistências e histórias da floresta São Paulo: Ubu Editora/ irD.
- PÂRÕMURU, Umusin & KÊRÍRI, Tõrãmũ. 1980. Antes o Mundo Não Existia: Mitologia dos Antigos Desana-Kêhíripõrã. São João Batista do Rio Tiquié: Unirt; São Gabriel da Cachoeira: Foirn.
- PÂRÕMURU, Umusin & KÊRÍRI, Tõrãmũ. 2019. Antes o mundo não existia Rio de Janeiro: Editora Dantes .
- PLUMWOOD, Val. 2002. Environmental Culture: The Ecological Crisis of Reason Abingdon, Oxfordshire: Routledge.
- PONTES, Heloisa. 1998. Destinos Mistos: Os Críticos do Grupo Clima em São Paulo (1940-1968) São Paulo: Companhia das Letras .
- PONTES, Heloisa. 2004. “Modas e Modos: Uma Leitura Enviesada de O Espírito das Roupas”. Cadernos Pagu [on=line], n. 22:13-46.
- PONTES, Heloisa. 2006. “A Paixão pelas Formas”. Novos Estudos CEBRAP, n. 74:87-105.
- PONTES, Heloisa. 2010. Intérpretes da metrópole: história social e relações de gênero no teatro e no campo intelectual, 1940-1968 São Paulo: Edusp/Fapesp.
- PONTES, Heloisa & PIRES, Bárbara Luisa. 2020. “Gilda de Mello e Souza: une Essayiste Singulière, une Écriture Lumineuse”. Brésil(s) [on-line], n. 17:1-22.
- RAMA, Angél. 1987. “A Importância Inaugural de Antes o Mundo Não Existia”. Jornal Letras e Artes, n. 11.
- RIBEIRO, Berta. 1957. “Bases para uma Classificação dos Adornos Plumários dos Índios do Brasil”. Arquivos do Museu Nacional, v. XLIII:59-119.
- RIBEIRO, Berta. 1979. Diário do Xingu São Paulo: Editora Paz Terra.
- RIBEIRO, Berta. 1980. A Civilização da Palha: a Arte do Trançado dos Índios do Brasil Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo.
- RIBEIRO, Berta. 1982a. “A Oleira e a Tecelã: o Papel Social da Mulher na Sociedade Asurini”. Revista de Antropologia, 25:25-61, dez.
- RIBEIRO, Berta. 1982b. Tecelãs Tupi do Xingu. Relatório de pesquisa, manuscrito datilografado. Acervo ISA.
- RIBEIRO, Berta. 1983. “A Itália e o Brasil Indígena”. Rio de Janeiro: Index.
- RIBEIRO, Berta. 1985. “Tecelãs Tupi do Xingu”. Revista de Antropologia, v. 27-28:355-402.
- RIBEIRO, Berta. 1986a. Suma Etnológica Brasileira: Etnobiologia Petrópolis: Vozes/Finep.
- RIBEIRO, Berta. 1986b. “A Linguagem Simbólica da Cultura Material”. In: Berta Ribeiro & Darcy Ribeiro, Suma Etnológica Brasileira Vol. 3: Arte Índia Rio de Janeiro: Vozes/ Finep. pp. 11-27.
- RIBEIRO, Berta, 1987. O Índio na Cultura Brasileira Rio de Janeiro: Unibrade/Unesco.
- RIBEIRO, Berta. 1988. Dicionário do Artesanato Indígena Belo Horizonte: Editora Itatiaia..
- RIBEIRO, Berta. 1992. “Museu e Memória: Reflexões sobre o Colecionamento”. Revista de Antropologia, v. 30-32:489-510.
- RIBEIRO, Berta. 1993. “Ao Vencedor, as Batatas!”. In: Carta: falas, reflexões, memórias, informe de distribuição restrita do Senador Darcy Ribeiro, n. 1, p. 165-167, Brasília.
- RIBEIRO, Berta. 1994. “Etnomuseologia: da Coleção à Exposição”. Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia, 4:189-201.
- RIBEIRO, Berta. 1995. Os Índios das Águas Pretas: Modo de Produção e Equipamento Produtivo São Paulo: Companhia das Letras/EdUSP.
- RIBEIRO, Berta & RIBEIRO, Darcy. 1957. Arte Plumária dos Índios Kaapor Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira S.A.
- RIBEIRO, Berta & RIBEIRO, Darcy. 1986. Suma Etnológica Brasileira: Etnobiologia Petrópolis: Vozes/Finep .
- RIBEIRO, Berta & VELTHEM, Lucia van. 1992. “Coleções Etnográficas: Documentos Materiais para a História Indígena e a Etnologia”. In: Manuela Carneiro da Cunha (org.), História dos Índios no Brasil São Paulo: Companhia das Letras / Secretaria Municipal de Cultura/ Fapesp. pp. 103-112.
- RIBEIRO, DARCY. 1950. Religião e Mitologia Kadiwéu Rio de Janeiro: SPI.
- RIBEIRO, Darcy. 1962. A Política Indigenista Brasileira Rio de Janeiro: Ministério da Agricultura - Serviço de Informação Agrícola (SIA).
- RIBEIRO, Darcy. 1975. Configurações Histórico-culturais dos Povos Americanos Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.
- RIBEIRO, Darcy. 1995. O Povo Brasileiro: A Formação e o Sentido do Brasil São Paulo: Companhia das Letras .
- RIBEIRO, Darcy. 1996a. Diários Índios: os Urubus-Kaapor São Paulo: Companhia das Letras .
- RIBEIRO, Darcy. 1996b. Os Índios e a Civilização: a Integração das Populações Indígenas no Brasil Moderno São Paulo: Companhia das Letras .
- RIBEIRO, Darcy. 2001. O Processo Civilizatório: Etapas da Evolução Sociocultural São Paulo: Companhia das Letras .
- RIBEIRO, Darcy. 2007. As Américas e a Civilização: Processo de Formação e Causas do Desenvolvimento Desigual dos Povos Americanos São Paulo: Cia das Letras.
- SCHWARZ, Roberto. 2012. Ao Vencedor as Batatas: Forma Literária e Processo Social nos Inícios do Romance Brasileiro São Paulo: Editora 34.
- SEGATA, Jean. 2015. “SÜSSEKIND, Felipe. O rastro da onça: relações entre humanos e animais no Pantanal Rio de Janeiro: 7 Letras.; Horizontes Antropológicos, 44:415-421.
- SHIRATORI, Karen. 2019. “O olhar envenenado: a perspectiva das plantas e o xamanismo vegetal jamamadi (médio Purus, AM)”. Mana, v. 25, n. 1:159-188.
- SIMIONI, Ana Paula Cavalcanti; OLIVEIRA, Claudia de; ROUCHOU Joelle & VELLOSO, Monica Pimenta (orgs.). 2014. Criações compartilhadas: artes, literatura e ciências sociais Rio de Janeiro: Mauad X.
- SIMMEL, Georg. 2014 [1905]. Filosofia da Moda Lisboa: Edições Texto & Grafia Ltda.
- SOBRAL, Luis Felipe. 2018. “Lady Frazer e seu marido. Gênero e anomalia na história da antropologia”. Cad. Pagu, n. 54.
- SOUZA, Gilda de Mello e. 1987. O Espírito das Roupas: A Moda no Século Dezenove São Paulo: Companhia das Letras .
- STALLYBRASS, Peter. 2008. O Casaco de Marx: Roupas, Memória, Dor Belo Horizonte: Autêntica Editora.
- STENGERS, Isabelle. 2015. No tempo das catástrofes São Paulo: CosacNaify.
- TSING, Anna. 2012. “Unruly Edges: Mushrooms as Companion Species”. Environmental Humanities, v. 1:141-154.
- TSING, Anna. 2015. The Mushroom at the End of the World: On the Possibility of Life in Capitalist Ruins Nova Jersey: Princeton University Press.
- VAN DOOREN, Thom. 2012. “Wild Seed, Domesticated Seed Companion species and the emergence of agriculture”. PAN: Philosophy, Activism, Nature, n. 9:22-28.
- VAN DOOREN, Thom; KIRKSEY, Eben & MÜNSTER, Ursula. 2016. “Estudos multiespécies: cultivando artes de atentividade”. Trad. Susana Oliveira Dias. ClimaCom [on-line], Incertezas, n. 7:39-66.
- VELTHEM, Lucia Hussak van. 1997. “Berta Gleiser Ribeiro (1924-1997)”. Anuário Antropológico
- VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. 1986. Araweté Os deuses canibais Rio de Janeiro: Jorge Zahar/Anpocs.
- VOGAS, Ellen Cristine Monteiro (org.). 2011. Inventários dos arquivos pessoais de Darcy e Berta Ribeiro Rio de Janeiro: Fundação Darcy Ribeiro.
Fontes
-
ANNA Dantes. ColaborAmerica Disponível em: https://colaboramerica2017.sched.com Acesso em: 04/05/2020.
» https://colaboramerica2017.sched.com -
ARCOS Brasil. Disponível em: http://www.arcosbrasil.com/ Acesso em: 21/07/2020.
» http://www.arcosbrasil.com/ -
BERTA Ribeiro (1924-1997). Biblioteca Digital Curt Nimuendajú: Línguas e Culturas Indígenas Sul-Americanas Disponível em: http://www.etnolinguistica.org Acesso em: 05/05/2020.
» http://www.etnolinguistica.org - BRUNDTLAND, Gro Harlem. 1991. Nosso futuro comum: comissão mundial sobre meio ambiente e desenvolvimento Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas.
- CARA, Salete de Almeida. 2008. “Uma Intelectual Chamada Gilda: Livro Reúne Acadêmicos para Homenagear Pesquisadora”. Pesquisa FAPESP, ed. 146:110.
-
CENTRO de Pesquisa e Formação do Sesc. Disponível em: https://centrodepesquisaeformacao.sescsp.org.br/atividade/coloquio-gilda-de-mello-e-souza Acesso em: 16/07/2023.
» https://centrodepesquisaeformacao.sescsp.org.br/atividade/coloquio-gilda-de-mello-e-souza -
COPABASE. Disponível em: https://www.copabase.org/ Acesso em: 21/07/2020.
» https://www.copabase.org/ -
CRISTINE Takuá no Selvagem ciclo 2019. [S.l.: s.n.], 2020. 1 vídeo (24 min). Canal SELVAGEM Ciclo de Estudos sobre a Vida. Disponível em: https://www.youtube.com Acesso em: 04/05/2020.
» https://www.youtube.com -
DANTES. Disponível em: https://dantes.com.br/sobre/ Acesso em: 04/08/2020.
» https://dantes.com.br/sobre/ -
EMANUELE Coccia no Selvagem Ciclo 2019. [S.l.: s.n.], 2020. 1 vídeo (25 min). Canal SELVAGEM Ciclo de Estudos sobre a Vida. Disponível em: https://www.youtube.com Acesso em: 04/05/2020.
» https://www.youtube.com -
FLAVIA Aranha. Disponível em: http://flaviaaranha.com/ Acesso em: 04/05/2020.
» http://flaviaaranha.com/ -
FRANÇA, Pedro Henrique. “Gilda, a paixão pela forma”. Estadão, Cultura, 31 ago. 2007. Disponível em: https://cultura.estadao.com.br Acesso em: 04/05/2020.
» https://cultura.estadao.com.br -
FUNDAÇÃO Darcy Ribeiro. Disponível em: https://www.fundar.org.br Acesso em: 04/05/2020.
» https://www.fundar.org.br - GALVÃO, Walnice Nogueira. “A Ciranda das Artes: com Reflexão Pioneira sobre Moda, Cinema e Estética, Gilda de Mello e Souza é Tema de Debates no Interior de SP”. Folha De São Paulo, Mais, São Paulo, 19/08/2007.
-
(THE) INTERGOVERNMENTAL Panel On Climate Change (IPCC). Disponível em: https://www.ipcc.ch/ Acesso em: 16/03/2021.
» https://www.ipcc.ch/ -
ITAÚ Cultural. Gilda de Mello e Souza Disponível em: https://enciclopedia.itaucultural.org.br Acesso em: 04/10/2021.
» https://enciclopedia.itaucultural.org.br -
JEREMY Narby. Ecologistics Disponível em: https://ecologistics.org Acesso em: 16/07/2020.
» https://ecologistics.org -
LUCIA Hussak van Velthem. CNPQ Currículo Lattes. Disponível em: http://buscatextual.cnpq.br Acesso em: 17/07/2020.
» http://buscatextual.cnpq.br -
LUCIANI, José A. K. “A Queda do Céu. Palavras de Um Xamã Yanomami com o Prof. Dr. José Antonio Kelly Luciani - UFSC”. São Leopoldo, 2017. 1 vídeo (1 h 29 min 09 s) Publicado pelo canal Instituto Humanitas Unisinos. Disponível em: https://www.youtube.com Acesso em: 29/09/2021.
» https://www.youtube.com -
MILLEN, Mànya. “A Editora que Constrói Pontes”. Projeto Colabora, 6 fev. 2016. Disponível em: https://projetocolabora.com.br Acesso em: 15/07/2020.
» https://projetocolabora.com.br -
MUSEU Nacional. Disponível em: http://www.museunacional.ufrj.br Acesso em: 17/07/2020.
» http://www.museunacional.ufrj.br -
SEDINI, Sandra. “Anna Dantes”. Instituto de Estudos Avançados/USP 24 set. 2019. Disponível em: http://www.iea.usp.br Acesso em: 04/05/2020.
» http://www.iea.usp.br -
SELVAGEM ciclo de estudos sobre a vida. YouTube Disponível em: https://www.youtube.com Acesso em: 04/05/2020.
» https://www.youtube.com -
SERVIÇO Social do Comércio - SESC. Disponível em: http://www.sesc.com.br Acesso em: 17/07/2020.
» http://www.sesc.com.br -
SUGIMOTO, Luiz. “Um Brasileiro no Exílio. E um Exilado no Brasil”. Jornal da Unicamp, 9-15 abr. 2007. Disponível em: https://www.unicamp.br Acesso em: 04/08/2020.
» https://www.unicamp.br -
TANAC. Disponível em: http://www.tanac.com.br Acesso em: 04/08/2020.
» http://www.tanac.com.br -
TORAMI-KEHIRI (Luiz Lana), Representante do Povo Desana. [S.l.: s.n.], 2019. 1 vídeo (47 min). Canal SELVAGEM Ciclo de Estudos sobre a Vida. Disponível em: https://www.youtube.com Acesso em: 04/05/2020.
» https://www.youtube.com -
(UN) “TOURNANT Animaliste” en Anthropologie? Colloque International Fondation A et P Sommer LAS / APRAS Paris, 22-24 juin 2011 Paris: Collège de France, 2011. Disponível em: http://www.college-de-france.fr/media Acesso em: 08/03/2021.
» http://www.college-de-france.fr/media -
UNITED Nations. Climate Change Disponível em: https://www.un.org/development Acesso em: 12/04/2021.
» https://www.un.org/development -
UNIVERSIDADE Federal de Minas Gerais FE. “Humberto Maturana”. Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares Disponível em: https://www.ufmg.br/ieat/2011/09/humberto-maturana/ Acesso em: 15/07/2020.
» https://www.ufmg.br/ieat/2011/09/humberto-maturana/ -
UNIVERSIDADE de São Paulo. “Gilda Rocha de Mello e Souza: Outorga do Título de Professora Emérita - 20.05.1999”. FFLCH Departamento de Filosofia Disponível em: http://filosofia.fflch.usp.br/docentes/gildarocha Acesso em: 14/07/2020.
» http://filosofia.fflch.usp.br/docentes/gildarocha -
VASONE, Carolina. “Flavia Aranha Cria Moda Atemporal, num Processo de Tingimento com Plantas e Confecção do Próprio Tecido”. FFW Disponível em: https://ffw.uol.com.br Acesso em: 15/07/2020.
» https://ffw.uol.com.br
Notas
-
1
Inicialmente a fotografia seria exibida em um painel amplo, próximo ao anfiteatro do Jardim Botânico. Depois a organização decidiu preparar um pequeno caderno impresso, que levaria a fotografia de Berta junto aos Kadiwéu na capa. O pequeno caderno contava com folhas em branco dentro e na contracapa, levava o nome de apoiadores do “Selvagem”, tendo sido distribuído aos participantes para que pudessem levar consigo este “caderno de campo” quando o evento terminasse.
-
2
Para mais, sobre minimalismo, ver Lloyd e Pennington (2020).
-
3
O Selo B é um certificado emitido pela fundação sem fins lucrativos, denominada Sistema B, que reconhece empresas cujos resultados e operações são de interesse público e trabalham em âmbito global tendo em vista a missão de construir um ecossistema favorável para fortalecer empresas que usam a força do mercado para solucionar problemas sociais e ambientais.
-
4
O livro A queda do céu: palavras de um xamã yanomami (2015), do antropólogo Bruce Albert com o xamã e ativista indígena Davi Kopenawa, é uma relevante e recente obra de destaque publicada neste escopo. Para mais, ver José Antonio Kelly Luciani (2013) sobre este livro e Andrello (2010) sobre autoria compartilhada no Alto Rio Negro.
-
5
Para André Demarchi (2020), além de antecipar a “antropologia compartilhada”, Berta Ribeiro também se consagrou na antropologia da arte, principalmente no que diz respeito ao simbolismo dos grafismos indígenas, e no campo da cultura material, o que colabora para seu destaque como “produtora de uma antropologia do futuro” (:26). A coletânea na qual a publicação do antropólogo está inserida faz referência ao Prêmio Escritas Sociais, organizado pela Universidade Federal do Tocantins, dirigido a professores e estudantes da graduação e do Ensino Médio, que homenageou Berta Ribeiro em 2017.
-
6
Nota suprimida nesta versão em respeito à blind review, revisão cega por pares.
-
7
Para mais sobre a família de Berta Ribeiro e, mais especificamente, sobre sua irmã Genny Gleiser, ver, por exemplo, o trabalho da historiadora Maria Luiza Tucci Carneiro (2008).
-
8
Nas referências consultadas a relação entre este casal intelectual não é problematizada. Mattos (2007:10-11) menciona que Berta teria “materializado o gênio Darcy”, mas não faz uma discussão exaustiva. Importantes pesquisas, no entanto, vêm se dedicando à temática de casais intelectuais, como Pontes (1998, 2004, 2010), Pontes e Pires (2020), Simioni et al. (2014), Sobral (2018), para citar alguns.
-
9
Oriunda do romance Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis (1994), a frase “Ao vencedor, as Batatas!” é resgatada por Berta em tradução metafórica (B. Ribeiro 1993:113). Registramos que o crítico literário Roberto Schwarz (2012) também se baseia no mesmo romance ao escrever “Ao Vencedor as Batatas: Forma Literária e Processo Social nos Inícios do Romance Brasileiro”. O artigo de Berta, no entanto, não compreende o livro de Schwarz.
-
10
A Arcos Brasil desde 1995 produz instrumentos musicais e cordas em Aracruz, no Espírito Santo, buscando, com responsabilidade ambiental e social, realizar parcerias para a preservação ambiental e o combate ao comércio ilícito de madeira. Na confecção de arcos de violino com pau-brasil, busca utilizar madeira legalizada, visto que a espécie está em extinção.
-
11
A Cooperativa de Agricultura Familiar Sustentável com Base em Economia Solidária - Copabase - existe desde 2008, em Arinos, Minas Gerais. Buscando promover a articulação de ações voltadas para o desenvolvimento regional sustentável, atua através de grupos de agricultores familiares e extrativistas procurando fortalecer, beneficiar e comercializar produtos locais e frutos do Cerrado, preservando o bioma.
-
12
A Tanac existe há mais de seis décadas. Localizada na cidade de Montenegro, no Rio Grande do Sul, procura equilibrar recursos naturais e preservação do meio ambiente trabalhando com matérias-primas de fonte renovável.
-
13
Margareth Emmerich (1933-2015) foi bióloga, botânica, taxonomista especialista na família Euphorbiaceae e pioneira em etnobotânica. Foi professora titular do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Colaborou com os estudos de botânica do Parque Indígena do Xingu, em sua porção sul, em trabalho realizado entre os Yawalapiti. Influenciou a área e os botânicos de novas gerações. Para mais, ver Boscolo et al. (2018), por exemplo.
-
14
Esse aspecto é atualmente estudado pela arqueologia, que vem chegando a conclusões semelhantes a estas que Berta expõe. Para mais, ver Clement et al. (2015).
-
15
O chamado Antropoceno, tal como mostram Kirksey e Helmreich (2010), é considerado uma era geológica recentemente reconhecida que se refere aos impactos gerados pelas relações entre humanidade e natureza, cujo marco inicial está em debate.
-
16
Observa-se que o evento em si, ou sua equipe organizadora, não evidencia relações com a obra do antropólogo Claude Lévi-Strauss. Trata-se aqui, portanto, de uma observação da autora em relação ao termo “Selvagem” expresso no título do mesmo evento.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
28 Ago 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
-
Recebido
10 Set 2020 -
Aceito
06 Jun 2023