Open-access O PODER DISCIPLINAR E O COACHING NA GINÁSTICA ARTÍSTICA FEMININA: UMA ANÁLISE FOUCAULTIANA DA RELAÇÃO TREINADOR(A)-GINASTA

DISCIPLINARY POWER AND COACHING IN WOMEN’S ARTISTIC GYMNASTICS: A FOUCAULDIAN ANALYSIS OF THE COACH-GYMNAST RELATIONSHIP

PODER DISCIPLINAR Y COACHING EN LA GIMNASIA ARTÍSTICA FEMENINA: UN ANÁLISIS FOUCAULTIANA DE LA RELACIÓN ENTRENADOR-GIMNASTA

Resumo

Embasado no referencial teórico de Foucault, o objetivo deste estudo foi analisar a relação treinador(a)-ginasta a partir da perspectiva de ambos, em um ginásio de Ginástica Artística Feminina (GAF). Os dados foram produzidos a partir da observação participante e da entrevista semiestruturada com 4 treinadores(as) e 15 ginastas. Por meio da Análise Temática Reflexiva, encontramos três temas: (1) Produtividade e controle, no qual demonstramos como os(as) treinadores(as) utilizam técnicas disciplinares no ginásio; (2) A “contraprodutividade” do poder disciplinar, no qual discutimos como as ações autoritárias dos(as) treinadores(as) poderiam prejudicar o processo de ensino-aprendizagem; (3) Onde há poder, há resistência? A perspectiva das ginastas, nas quais exploramos as reações delas frente às ações dos(as) treinadores(as). Em síntese, os três temas deste artigo indicam que se as técnicas disciplinares se justificam por produzirem resultados esportivos, às vezes elas são pedagogicamente “contraprodutivas” e, por isso, também deveriam ser repensadas pelos(as) treinadores(as).

Palavras-chave
Ginástica Artística Feminina; Foucault; Coaching esportivo; Sociologia do Esporte

Abstract

Based on Foucault's theoretical framework, the aim of this study was to analyze the coach-gymnast relationship from both gymnasts’ and coaches’ perspective, in a Women's Artistic Gymnastics (WAG) training center. The data were produced through participant observation and semi-structured interviews with 4 coaches and 15 gymnasts. Through Reflective Thematic Analysis, we found three themes: (1) Productivity and control, in which we demonstrated how coaches use disciplinary techniques in the gym; (2) The "counter-productivity" of disciplinary power, in which we discussed how the authoritarian actions of coaches could harm the teaching-learning process; (3) Where there is power there is resistance? The gymnasts' perspective, in which we explore the gymnasts' reactions to the coaches' actions. In sum, the three themes indicate that if disciplinary techniques are justified because they produce sporting results, sometimes they are pedagogically "counterproductive". Thus, coaches should rethink their coaching practices based on these disciplinary techniques.

Keywords
Women’s Artistic Gymnastics; Foucault; Sports Coaching; Sociology of Sport

Resumen

Basándose en el marco teórico de Foucault, el objetivo de este estudio fue analizar la relación entrenador-gimnasta desde la perspectiva de ambos, en un gimnasio de Gimnasia Artística Femenina (GAF). Los datos fueron obtenidos mediante observación participante y entrevistas semiestructuradas con 4 entrenadores y 15 gimnastas. A través del Análisis Temático Reflexivo encontramos tres temas: (1) Productividad y control, en el que demostramos cómo los entrenadores utilizan técnicas disciplinarias en el gimnasio; (2) La "contraproductividad" del poder disciplinar, en el que discutimos cómo las acciones autoritarias de los entrenadores pueden perjudicar el proceso de enseñanza-aprendizaje; (3) ¿Donde hay poder, hay resistencia? La perspectiva de las gimnastas, en la que exploramos las reacciones de las gimnastas ante las acciones de los entrenadores. En resumen, los tres temas de este artículo indican que, si bien las técnicas disciplinarias se justifican por producir resultados deportivos, a veces son pedagógicamente "contraproducentes" y, por lo tanto, también deberían ser reconsideradas por los entrenadores.

Palabras clave
Gimnasia Artística Femenina; Foucault; Coaching Deportivo; Sociología del Deporte

1 INTRODUÇÃO

O coaching no esporte pode ser definido como um processo prático, social e dinâmico que integra os(as) atletas, o(a) treinador(a) e os demais agentes envolvidos no determinado contexto esportivo (Cushion, 2007; Cushion; Armour; Jones, 2006; Jones; Armour; Potrac, 2002). Neste processo, o relacionamento treinador(a)-atleta é central na rotina do coaching e a convivência diária e quase integral leva a uma interação social fundamental para a formação do atleta (Cassidy; Jones; Potrac, 2004; Jowett, 2017). No caso da Ginástica Artística Feminina (GAF), destacamos o exemplo da parceria na preparação para os Jogos Olímpicos de 2016 entre Aimee Borman (treinadora) e Simone Biles (multicampeã na GAF) dos Estados Unidos. A ginasta descreve o relacionamento da seguinte forma:

Ela me vê entrar pela porta e já sabe como eu me sinto, já sabe como está meu humor, porque nós nos conhecemos há muito tempo (…) Há momentos em que ela tem que me cobrar, porque eu não estou me esforçando o suficiente, mas todo mundo precisa de alguém na sua vida para fazer isso.

(Barron, 2016, p. 122, tradução nossa).

E a treinadora complementa: “Ela fez a escolha dela. Então ela tem que estudar em casa, treinar muitas horas e fazer trabalho extra de flexibilidade. Ela escolheu isso. Eu sou apenas uma guia para ela.” (Barron, 2016, p. 122, tradução nossa). Esse caso exemplifica que, para alcançar o sucesso no alto rendimento esportivo, a dedicação, a confiança, a disciplina, o comprometimento e a lealdade mútua no relacionamento treinador(a)-ginasta são imprescindíveis no desenvolvimento das atletas.

Por outro lado, pesquisas anteriores, que utilizaram o referencial teórico de Foucault (1987) para analisar como o poder disciplinar opera no contexto da GAF, identificaram desequilíbrios nesse relacionamento (Barker-Ruchti; Tinning, 2010; Costa et al., 2024; Jacobs; Smits; Knoppers, 2017; Tynan; McEvilly, 2017; Smits; Jacobs; Knoppers, 2017). Esses estudos demonstraram como o uso das técnicas disciplinares pelos(as) treinadores(as), desenvolvem ginastas dóceis, com recursos mínimos para resistir às práticas dominantes e aceitas no coaching da GAF. Além disso, essas práticas hierárquicas e inflexíveis têm sido criticadas por normalizar casos de maus-tratos, assédios e abusos (Barker-Ruchti; Varea, 2024; Pinheiro et al., 2014; Stirling; Kerr, 2009; Smits; Jacobs; Knoopers, 2017; Stewart; Barker-Ruchti, 2024). Os(as) autores(as) citados revelam que esse cenário teria potencial para comprometer a saúde e o bem-estar das ginastas que, geralmente, são crianças e jovens submissas e vulneráveis em um contexto dominado por adultos.

Tendo em vista as consequências negativas do uso das técnicas disciplinares no contexto da GAF, questionamos a aplicação regular desses procedimentos na produção de atletas vencedores(as). Por exemplo, Denison (2007) demonstrou que um(a) atleta disciplinado(a) não necessariamente desenvolveria seu desempenho ideal. Desse modo, acreditamos que, apesar de estudos no campo sociocultural da GAF evidenciarem problemas e consequências indesejadas sobre o uso de técnicas disciplinares na modalidade (Barker-Ruchti; Tinning, 2010; Costa et al., 2024; Tynan; McEvilly, 2017), há uma lacuna na literatura em relação à análise acerca da justificativa dos(as) treinadores(as) sobre a importância da disciplina no ginásio e sua relação com a produtividade das ginastas.

Dessa forma, o objetivo desse artigo é explorar a relação de poder treinador(a)-ginasta a partir da perspectiva de ambos, e pela observação em campo de suas ações e reações em um ginásio de treinamento de GAF. Com base nesse objetivo, pretendemos discutir sobre a linha tênue entre o uso das técnicas disciplinares e práticas de coaching autoritárias, com o auxílio do referencial teórico de Foucault, que será apresentado na sequência.

2 TÉCNICAS DISCIPLINARES E TÉCNICAS DE SI: PERSPECTIVAS DE FOUCAULT

A relação entre o conhecimento e o poder é compreendida a partir do discurso, que seria a unidade analisável do conhecimento e construído socialmente pelos efeitos do poder (Foucault, 2005). Nessa perspectiva, o discurso atua na (re)produção e no controle das “verdades” que estabelecem as regras do que pode e do que não pode ser dito e praticado. Segundo o autor essas normas criam um sistema de classificação e de distinção entre as pessoas, com o objetivo de definir, impor e controlar a ordem das coisas (Foucault, 2000, 2009).

Em segundo lugar, Foucault (1987) considerou que o discurso opera por meio de técnicas disciplinares no corpo. Estas técnicas, embora produtivas e úteis em termos de aumentar a habilidade e a aptidão, diminuem simultaneamente as forças e tornam o corpo dócil (Foucault, 1987). Nas palavras de Foucault (1987, p. 118): “é dócil um corpo que pode ser submetido, que pode ser transformado e aperfeiçoado”.

Nessa perspectiva, na sua análise do poder disciplinar, Foucault (1987) identificou quatro técnicas que podem ser entendidas como os mecanismos sutis do funcionamento do poder na sociedade: (a) a arte das distribuições, que se relaciona com a distribuição dos indivíduos no espaço de acordo com princípios de enclausuramento, categorização e hierarquização; (b) o controle da atividade, que remete aos mecanismo de controle temporal que ditam o planejamento, o ritmo e a execução de determinadas atividades; (c) a organização das gêneses, que se refere às etapas lineares que facilitam e norteiam a execução de determinadas atividades; e; (d) a composição das forças, que indica a articulação cuidadosa dos corpos como partes elementares de modo a “obter uma máquina eficiente” (Foucault, 1987, p. 164).

Essas técnicas não funcionam isoladamente, mas em combinação umas com as outras. Ademais, Foucault (1987, p. 195) argumentou que, o sucesso da utilização dessas técnicas disciplinares depende de “instrumentos” compreendidos pelo autor como “recursos para o bom adestramento” – a vigilância hierárquica, a sanção normalizadora e o exame. Estas técnicas e instrumentos permitem o funcionamento do poder disciplinar como uma “vigilância hierarquizada, contínua e funcional” (Foucault, 1995, p. 176). Esta vigilância funcional foi manifestada no projeto arquitetônico do “Panóptico” de Jeremy Bentham (Foucault, 1995). O Panóptico reflete o funcionamento ideal do poder disciplinar que trabalha para “induzir um estado consciente e permanente de visibilidade que assegura o funcionamento automático do poder” (Foucault, 1995, p. 201).

Apesar da congruência das ideias de Foucault (1987, 1983), seus trabalhos iniciais concederam aos indivíduos pouca agência na constituição de sua identidade. Desse modo, Foucault (1999, 2006, 2007) desenvolveu o conceito das técnicas de si. Ao comentar sobre as técnicas de si, Jones e Atchison (2007) argumentam que essas técnicas capacitam os indivíduos a se transformarem conscientemente ao questionarem os discursos dominantes. Entretanto, Foucault (2006) salientou que não há possibilidade de uma sociedade existir sem relações de poder. A partir dessa discussão, o autor reitera que “essas práticas [de si] não são, entretanto, alguma coisa que o próprio indivíduo invente. São esquemas que ele encontra em sua cultura e que lhe são propostos, sugeridos, impostos por sua cultura, sua sociedade e seu grupo social” (Foucault, 2006, p. 276).

3 MÉTODOS

Este artigo faz parte de um estudo de caso qualitativo (Yin, 2012) maior, que teve como objetivo central analisar como as relações de poder entre os principais agentes envolvidos em um ginásio de treinamento de GAF de alto rendimento emergem no coaching.

Optamos por um estudo de caso, pois acreditamos que a exploração de uma micro realidade de coaching é essencial para refletir sobre os problemas, as condições, as influências, as dúvidas e as preocupações específicas que o(a) treinador(a) pode ter, mas ainda não foram consideradas (Denison, 2007; Jones, 2009). Assim, a abordagem qualitativa do estudo de caso facilitou a exploração do objeto de estudo dentro do seu contexto real, que apresenta as tensões únicas que são características da interação humana (Baxter; Jack, 2008; Flyvjerg, 2006; Yin, 2012). Ademais, essa abordagem garantiu que a investigação não fosse explorada por apenas uma lente, pois observamos a dinâmica das relações de poder in loco e entrevistamos os principais agentes envolvidos no contexto (treinadores(as) e ginastas). Dessa forma, facetas múltiplas do objeto de estudo puderam ser reveladas e compreendidas.

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Estadual de Campinas.

3.1 CONTEXTO DO ESTUDO E PARTICIPANTES

Realizamos o estudo de caso em um ginásio de treinamento de alto rendimento proeminente no cenário nacional. O centro de Ginástica conta com: infraestrutura de ponta com aparelhos de Ginástica oficiais; 4 treinadores(as) com ampla experiência nacional e internacional, comprovada por resultados expressivos em Campeonatos Brasileiros no ciclo olímpico 2017-2020, participações em campeonatos internacionais na seleção brasileira de GAF devido à convocação de suas ginastas no mesmo período; 15 ginastas distribuídas nas categorias pré-infantil (n=4), infantil (n=6), juvenil (n=2) e adulta (n=3), destacamos que as ginastas da equipe juvenil são proeminentes no cenário nacional; equipe auxiliar, composta por uma fisioterapeuta e uma coreógrafa. Além disso, participaram do estudo maior também 12 pais. Nesse estudo usamos pseudônimos para garantir o anonimato dos participantes.

3.2 PRODUÇÃO DE DADOS

No projeto de pesquisa maior optamos pelas seguintes técnicas de coleta: a observação participante e a entrevista semiestruturada. Ambos os procedimentos foram realizados pelo primeiro autor. Ressaltamos que o primeiro autor não tem experiência prévia como ginasta. Nos últimos 8 anos ele tem investigado a situação da Ginástica Artística Feminina no Brasil, por meio de seus conhecimentos em métodos qualitativos e estudos pedagógicos e socioculturais do esporte, com o intuito de propor implicações políticas e pedagógicas que garantiriam o equilíbrio entre desempenho e direitos humanos para as ginastas.

Sobre a observação participante, o primeiro autor visitou o ginásio durante um mês. As visitas aconteceram em três períodos, das 8 às 12 horas (treino da equipe infantil), das 14 às 18 horas (treino da equipe juvenil/adulta) e das 17 às 20 horas (treino da equipe pré-infantil) de segunda a sexta feira e aos sábados das 09 às 12 horas (treino da equipe juvenil/adulta). Assim, realizamos o total de 24 visitas para observação participante (aproximadamente 176 horas).

Para descrever o que observou, ouviu, encontrou e vivenciou no ginásio, ao longo desse tempo, o primeiro autor redigiu o Diário de Campo (DC) após cada observação (Schutt, 2012). Os DCs foram compostos por partes descritivas e reflexivas, nas quais o pesquisador utilizou sua perspectiva particular para iniciar o processo analítico e interpretativo dos dados. Além disso, as versões originais dos DCs foram discutidas e revisadas posteriormente junto com a segunda autora para garantir o processo de confiabilidade (trustworthness). A segunda autora tem experiência acadêmica e prática em várias funções no contexto da GAF (ginasta, treinadora, árbitra e pesquisadora).

Além disso, na entrevista semiestruturada o roteiro de entrevista facilitou a interação entre o primeiro autor e os(as) participantes, e o caráter semiestruturado garantiu o fluxo da entrevista como um processo de conversação (Sparkes; Smith, 2014). Ressaltamos que as entrevistas de cada grupo de participantes (i.e. treinadores(as), ginastas e pais) foram norteadas por um roteiro com perguntas específicas. Entretanto, destacamos que com base no objetivo desse artigo e após a análise geral, na qual emergiram os temas gerais do projeto de pesquisa maior, nossos focos de análise foram os DCs, e as entrevistas com os(as) treinadores(as) e com as ginastas.

Desse modo, o roteiro das entrevistas com os(as) quatro treinadores(as) abordava perguntas sobre suas as experiências na Ginástica, o processo de tornar-se treinador(a), a construção de objetivos profissionais, a percepção sobre sua função e sobre as expectativas das ginastas, pais e gestores, a estrutura organizacional da instituição, o relacionamento com as atletas e a filosofia de trabalho. Essas entrevistas duraram de 50 a 100 minutos.

As entrevistas com as ginastas foram realizadas presencialmente durante o período de observações, mas em local reservado. Como estas entrevistas ocorreram enquanto o treino era realizado, pudemos usar exemplos que aconteceram durante o treinamento para estimular as ginastas a falarem e a refletirem sobre a prática de GAF (Sparkes; Smith, 2014). As entrevistas duraram entre 15 e 45 minutos.

3.4 ANÁLISE DE DADOS

Usamos o método da análise temática reflexiva para analisar os dados (Braun; Clarke, 2006, 2019). Segundo as autoras, esse método tem o objetivo de analisar padrões e encontrar temas nos dados. Ao utilizá-los, pudemos “organizar e descrever minimamente o nosso conjunto de dados em (ricos) detalhes” (Braun; Clarke, 2006, p. 79). Ainda, o método está alinhado aos nossos objetivos, pois atribui grande importância às interpretações dos pesquisadores e ao engajamento da reflexividade no processo analítico, influenciado por pressupostos teóricos e pelo próprio conteúdo dos dados (Braun; Clarke; Weate, 2016; Braun; Clarke, 2019). Na elaboração desse artigo, o processo analítico seguiu duas fases. Na primeira fase realizamos as seis etapas da Análise Temática Reflexiva para analisar todo conjunto de dados do projeto de pesquisa maior. Assim, inicialmente, após discutir e revisar os DCs com a segunda autora para garantir o processo de confiabilidade (trustworthness) dos dados, produzimos a versão final dos DCs, escutamos todas as entrevistas, transcrevemos e relemos as transcrições (etapa 1). Posteriormente, codificamos o material com códigos baseados em dados (por exemplo, a relação de poder-treinador ginasta, as reações das ginastas, a socialização dos treinadores) e códigos mais teóricos (por exemplo, a operação das técnicas disciplinares e dos recursos para o bom adestramento no ginásio, a formação discursiva dos treinadores, o papel ativo dos treinadores no ginásio) (fase 2). Nas fases 3-5, classificamos os códigos em temas (iniciais): por exemplo, códigos como “organização e controle no ginásio”, “práticas de coaching coercivas” e “a relação de poder treinador-ginasta” estão integrados no tema “Como o poder disciplinar opera no ginásio: ações, reações e consequências para o coaching”. Por fim, conectamos os temas ao referencial teórico de Foucault em nossa narrativa analítica (fase 6). Assim, ressaltamos que o processo analítico empregado em códigos orientados por dados e códigos orientados pelo referencial teórico foi desenvolvido paralelamente e como resultado um do outro. Além disso, destacamos que os temas emergiram do envolvimento profundo dos pesquisadores com os dados. Em um processo em que suas próprias perspectivas, experiências e valores influenciam a forma como os dados são interpretados e organizados.

Na segunda fase analítica, após encontrar os quatro temas gerais do projeto de pesquisa maior (segunda linha Figura 2), a análise foi mais orientada pelos interesses do analista (Braun; Clarke, 2006, 2019). Dessa forma, a análise se restringiu aos dados relevantes para o objetivo desse artigo. Assim, recodificamos o tema “Como o poder disciplinar opera no ginásio: ações, reações e consequências para o coaching” (terceira linha figura 1) e os temas encontrados serão apresentados na próxima seção.

Figura 1
Mapa temático dos resultados apresentados no Artigo

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Identificamos três temas principais nesse estudo. Primeiramente, descrevemos como os(as) treinadores(as) utilizam as técnicas disciplinares no ginásio e evidenciamos os processos que garantem o funcionamento do poder disciplinar nesse contexto. Segundo, discutimos como as ações autoritárias e o uso das técnicas disciplinares poderiam prejudicar o processo de ensino de elementos para as ginastas durante os treinos. Terceiro, discutimos como as ginastas reagem às ações do treinador. Dessa forma, na sequência apresentamos discursos representativos, trechos de DCs e discussão em diálogo com a literatura para cada tema.

4.1 PRODUTIVIDADE E CONTROLE: O USO DAS TÉCNICAS DISCIPLINARES NO GINÁSIO

O treinador principal Eduardo é claro sobre o coaching do ginásio e que as ginastas foram informadas. E, seu depoimento esclarece sobre a filosofia que impera no ginásio:

Eu deixo claro desde o primeiro momento que aqui as ginastas recebem um tipo de treino específico. Esse treino é duro, esse treino machuca às vezes, as meninas podem chegar em casa chorando, elas vão ficar mais aqui do que em casa às vezes também. Eu explico tudo isso, e eu explico que tem que ser assim, porque aqui o objetivo é desenvolver o máximo de rendimento que a menina pode ter. Para isso, eles têm que confiar nessa filosofia.

Eduardo e seus(suas) colegas de trabalho são congruentes na visão de desenvolvimento de ginastas de alto rendimento. Nas entrevistas, todos(as) os(as) treinadores(as) usaram a palavra disciplina para descrever o que é essencial para manter o funcionamento desse espaço. Nas entrevistas os(as) treinadores(as) argumentaram que para garantir o funcionamento da disciplina no ginásio é essencial que as ginastas obedeçam aos treinadores e aprendam as regras tácitas desse contexto. O depoimento da treinadora Carla exemplifica a percepção desse grupo de treinadores(as):

Desde o primeiro dia de treino a gente começa a mostrar na prática para as meninas e para os pais algumas regras importantes do ginásio. A primeira regra é que elas têm que obedecer às nossas ordens. Aqui quem dita o ritmo das coisas somos nós (treinadores(as). Nós sabemos o que elas precisam para ser boas atletas. Elas vão aprendendo isso aos poucos (...) a gente monitora elas durante todo o tempo. Com o passar do tempo as meninas vêm que se elas não se dedicarem vão ter que fazer mais repetições, vão ter que fazer mais preparo (exercícios de condicionamento físico), vão tomar bronca e se não melhorarem vão ser convidadas a parar de treinar. Então no dia a dia elas aprendem esses combinados e se alinham ao que a gente espera, ao que precisa ser para ter chances de ser uma boa atleta no futuro.

O processo descrito pela treinadora impulsiona as ginastas à adesão e à autorregulação de seus comportamentos. Assim, ao memos tempo em que as ginastas se tornam dóceis (politicamente submissas) elas também se tornam economicamente produtivas no que diz respeito ao desempenho esportivo. Nesse sentido, algumas pesquisas que utilizaram o referencial teórico Foucaultiano identificaram que essas atitudes fazem parte de um relacionamento em que o treinador subordina o atleta (Barker-Ruchti; Tinning, 2010; Costa et al., 2024; Denison; Mills; Konoval, 2017; Johns; Johns, 2000; Tynan; McEvilly, 2017). Os autores complementam que, esse tipo de relação desenvolve atletas dóceis e, consequentemente, a conformidade com as regras aceitas e normalizadas no coaching.

Entretanto, pesquisas anteriores não abordaram qual o sentido da disciplina para as atletas e nem como os procedimentos rotineiros do coaching impactam a subjetividade das atletas, moldando seu comportamento de forma a torná-lo submisso ao treinador. Nesse sentido, exemplificamos a lógica da disciplina para as ginastas na visão de Cecília. Ela tem 16 anos de idade e é umas das atletas mais proeminentes do centro de treinamento, já participou de alguns torneios com a seleção nacional juvenil e atualmente figura nos campings da seleção adulta. A atleta é uma das mais velhas do ginásio e tem uma percepção madura sobre a necessidade de seguir as regras do contexto. Em seu depoimento ela detalha sobre a necessidade da disciplina:

Hoje eu vejo que sem disciplina não tem Ginástica. Disciplina, na minha opinião é basicamente seguir e aceitar as regras, a gente aprende isso no primeiro dia de Ginástica. Sem o controle dos mínimos detalhes pelo treinador a gente não consegue progredir. Sem contar que esse controle que eles fazem de acompanhar a gente de perto impede que alguns acidentes aconteçam. Eu não sei nem te falar o que poderia acontecer comigo se o Eduardo não me desse uma bronca para eu acordar na paralela.

O discurso de Cecília coincide com o depoimento anterior do treinador Eduardo. Desse modo, identificamos que a atleta aprendeu com os discursos que circulam nesse espaço a aceitar as regras impostas pelos treinadores. Além disso, Cecília ressalta a primeira lógica disciplinar do ginásio: a disciplina gera segurança e o poder disciplinar está relacionado à produtividade ou ao desempenho esportivo, no caso da GAF. A segurança é essencial na GAF, que é uma modalidade de risco (Arkaev; Suchlin, 2004; Oliveira, 2014). Entretanto, essa não é a única importância da disciplina nesse cenário.

Conforme os(as) treinadores(as) relataram anteriormente, a filosofia do ginásio está relacionada à produção de resultados. E, o depoimento da atleta Alice mostra que seguir e aceitar as regras impostas por essa disciplina estaria associado ao rendimento esportivo das atletas. Alice é a ginasta mais velha do ginásio, tem 20 anos de idade, e comentou que a seleção não é mais seu objetivo. Com a idade Alice percebeu que tinha outros interesses para sua carreira no futuro e hoje cursa Fisioterapia. A prefeitura, mantenedora do ginásio, paga a mensalidade da sua faculdade e, em contrapartida, ela representa o município em competições de nível regional. Entretanto, a maturidade fez a ginasta perceber que tudo depende dos resultados, conforme o depoimento a seguir:

Tudo aqui depende de resultado. É um ginásio que o objetivo é alto rendimento, então a gente tem que obedecer a eles (treinadores/as) para ter esse alto rendimento. Eles sabem o que fazer para isso. Tem que ter disciplina para isso, por isso mesmo quando os treinadores não estão olhando, eu tenho que me controlar e lembrar sempre do que eles exigem, das regras que tem aqui. Hoje todos aqui sabem, principalmente os treinadores, eu estou aqui para me manter estudando. Eu tenho que mostrar resultado, eu tenho que seguir as regras, eu tenho que ter disciplina para isso. É dar resultado para ter algo em troca.

Alice revela um dos principais aspectos do entendimento de Foucault (1987) sobre o poder disciplinar que diz respeito à implantação de arranjos espaciais, temporais e procedimentais que levou os indivíduos à “autorregularem” seus pensamentos e práticas de acordo com determinadas normas, procedimentos e modos de ser específicos, para garantir a eficiência dos corpos e a produtividade. Estudos no esporte identificaram que a aplicação regular de técnicas disciplinares de Foucault torna os atletas úteis e podem ajudar na produção de atletas vencedores (Barker-Ruchti; Tinning, 2010; Denison; Mills; Konoval, 2017). Nas observações participantes notamos como essas técnicas disciplinares são utilizadas pelos(as) treinadores(as), que argumentam que esses recursos são empregados para se obter o melhor das ginastas em cada treino. Os seguintes trechos extraídos dos DCs, exemplificam o uso dessas técnicas:

O treino seguia sempre a mesma lógica. Aquecimento, preparo físico, treino nos equipamentos. Em todas as etapas os treinadores Eduardo e Yasmim mantinham o discurso: “Nós queremos o melhor de vocês”. Eduardo ficava no meio do tablado e notava os mínimos detalhes de tudo que acontecia no ginásio. O treinador corrigia cada erro do seu grupo e corrigia o grupo que estava com Yasmim. Inclusive, a distribuição das atletas nos aparelhos era feita para garantir que os treinadores pudessem observar e corrigir qualquer erro que pudesse acontecer (Trecho extraído do DC de 28 de janeiro de 2021).

Era mais um dia ruim para Isis (ginasta de 10 anos de idade) no ginásio. Depois de vários erros na rotina comum de aquecimento, Eduardo gritou: “Se já está assim agora, imagina na hora que for para a trave e paralela”. Yasmim era menos sarcástica e tentava trazer a menina para realidade: “Eu quero o seu melhor Liz”. Não adiantou muito. A menina foi para a trave e começou a errar várias vezes sua sequência de Flic-mortal. Dava para ver o medo nos olhos dela. Depois de mais um erro, Yasmim foi até ela e foi clara: “Você sabe que o flic-mortal faz é obrigatório no regulamento da sua categoria (infantil). Se você não fizer você não pode competir. Se você não competir não tem por que você treinar. Eu já falei o que você precisa fazer, agora coloque em prática”. A ginasta abaixou a cabeça e foi tentar novamente. (Trecho extraído do DC de 07 de março de 2021).

O funcionamento do poder depende da utilização de técnicas disciplinares. Primeiro, a organização analítica das ginastas dentro do ginásio, permite aos treinadores protegê-las de distrações e, com o mínimo esforço, observar, corrigir e fornecer direcionamento de forma eficiente (a arte da distribuição). Segundo, o desenvolvimento de habilidades das ginastas é ditado pelas regras da competição, em cada categoria espera-se que as ginastas desempenhem séries específicas (controle da atividade). Terceiro, o desenvolvimento das habilidades e a organização do treinamento costuma ser linear e progressivo, desse modo, os treinamentos seguem um padrão específico diariamente (aquecimento, preparo, treinamento de aparelhos) (organização das gêneses). Por último, a hierarquia e a relação treinador-atleta autocráticas reforçam a aceitação, a conformidade e a necessidade de seguir as práticas de coaching dos treinadores (composição das forças).

Em síntese, os dados apresentados nos permitem interpretar que o uso dessas técnicas disciplinares induz a autorregulação do comportamento das ginastas. Esse cenário, por exemplo, impulsiona as ginastas à adesão ao comportamento disciplinado, dependente e submisso. Esse comportamento seria esperado pelas pessoas que coabitam o coaching para que o treino seja eficiente e, consequentemente, que os resultados competitivos sejam alcançados. Entretanto, no próximo tema questionamos a produtividade dessas técnicas disciplinares com exemplos em que o poder disciplinar poderia ter efeito negativo na aprendizagem.

4.2 A “CONTRA PRODUTIVIDADE” DO PODER DISCIPLINAR

Durante o período de observações, duas frases foram presentes quase que diariamente durante o aquecimento das ginastas pré-infantis e infantis. A primeira frase era: “Nós queremos o melhor de vocês!” As juvenis não eram tão cobradas por isso. Luana, de 15 anos de idade era considerada “uma das mais dedicadas desse grupo”, e esclareceu esse hábito diário no ginásio:

Os treinadores ensinaram isso para nós quando a gente era nova. Tempo aqui é muito precioso, porque no tempo que tem a gente tem que dar o nosso melhor e não podemos enrolar. Então você vê que hoje eles não cobram. Mas fizeram isso quando a gente era menor. Hoje a gente já sabe o que precisa. No dia que o Eduardo tem que resolver alguma coisa extra treino a gente faz o aquecimento e o preparo sozinhas. Ele observa tudo, a gente sabe que ele está vendo. (Luana)

A segunda frase corriqueira era ouvida especificamente pelas ginastas infantis: “Se não vai pelo amor, vai pela dor!” O trecho seguinte exemplifica o contexto da frase:

O treinador Eduardo parece estar bem irritado com as ginastas Isis (10 anos de idade) e Gisele (11 anos de idade) nas paralelas assimétricas. Depois de diversos erros seguidos de Isis o treinador gritou: “Se não vai pelo amor, vai pela dor. A cada erro na sua série você vai pagar 50 cangurus (saltos com joelho flexionado)”. Depois da bronca, Gisele começou a errar sua série e foi punida. Depois de mais de 20 minutos nas paralelas e de erro atrás de erro, as meninas começaram a chorar e pareciam esgotadas. Eduardo permaneceu firme: “Pode chorar, mas chora baixo para eu escutar vocês contando os cangurus”. (Trecho extraído do DC de 03 de março de 2021)

Houve outras situações em que o desempenho insatisfatório foi punido, e cada treinador à sua maneira cobrava as pequenas atletas. Tanto a treinadora Carla como o treinador Eduardo tinham condutas similares. Apesar de não observamos situações em que eles usaram exercícios como punição, havia ameaças: “Prestem atenção, hein. Acho que não tem ninguém que vai querer subir na corda”. O “estilo” da treinadora Yasmim era considerado “morde assopra”, pois logo após as broncas por erros e falta de atenção das ginastas, ela usava feedback positivo para ganhar um sorriso e retomar o foco das atletas de forma que acreditasse ser “mais positiva”. Apesar de Douglas ser bem brincalhão com as meninas do pré-infantil, também as cobrava a todo momento. Os feedbacks eram constantes e quando os erros ocorriam consecutivamente, ele usava da ironia para punir as meninas, que algumas vezes sequer entendiam o que estava acontecendo, conforme observado:

Monique (8 anos de idade) estava dispersa e nitidamente não estava fazendo o que o treinador pediu. Parecia que ela não tinha entendido o que era para ser feito. Douglas observou o comportamento da menina e foi enfático: “Você está de brincadeira, né? Eu já te falei que desse jeito você vai ter que parar de treinar. Poxa, não presta atenção. Desse jeito vai ser melhor você ir tocar piano, porque você leva mais jeito no piano do que na Ginástica.” A menina olhou para o treinador com uma cara bem triste e continuou sua série. Os erros não desapareceram e o treinador olhou bem para ela e resmungou: “Desisto”. (Trecho extraído do DC de 03 de fevereiro de 2021)

As condutas dos treinadores Douglas e Eduardo, mostram que eles identificam nas meninas uma falta de comprometimento com o treino e as punem por isso. Na entrevista com o treinador Eduardo, ele foi claro que essas punições são essenciais para as meninas se manterem focadas e para manter o funcionamento do ginásio. Em seu depoimento o treinador esclarece sobre duas situações que não tolera no ginásio:

São duas situações que eu não tolero. Uma é a falta de disciplina. A outra situação é falta de comprometimento. Com anos de experiência eu sei quando a menina está avoada e precisa de um corretivo. Eu chamo a atenção e se não der certo eu passo um exercício extra.

O ponto central dos dados apresentados nessa sessão é que a punição não trouxe melhora no desempenho nessa situação, conforme os(as) treinadores(as) justificam. No caso da GAF, outros estudos discutiram os motivos do uso da punição. Oliveira (2014) argumenta que as ginastas temem a punição e a rejeição de seus mentores, por isso aprendem alguns aspectos enraizados na modalidade, como competirem lesionadas. Barker-Ruchti (2011) discute que a punição é uma forma de revalidar o poder dos treinadores e garantir que as ginastas sigam as ordens sem questioná-los por medo de serem punidas.

Entretanto, esses estudos não discutem que a punição seja contraprodutiva quando tratamos do desempenho esportivo, como vimos na situação do treinador Eduardo com as ginastas Isis e Gizele. Nesse caso, o problema poderia estar associado a como o treinador utiliza seu poder no coaching e não à falta de comprometimento do atleta. Assim, ao invés de questionar o comprometimento do atleta, o treinador deveria repensar suas práticas de coaching (Denison; Mills; Konoval, 2017). Dessa forma, um dos caminhos para os treinadores seria compreender como o poder opera no coaching para de fato garantir o melhor desempenho de seus atletas e prevenir as consequências negativas do uso das técnicas disciplinares. No caso desse estudo, esse processo estaria relacionado a procurar compreender se as ginastas de fato entenderam a instrução antes de puni-las pelo mau comportamento. Além de estimular e facilitar a comunicação com as ginastas, dar espaço para que elas possam apresentar suas dificuldades e necessidades.

Evidenciamos a necessidade de repensar práticas aceitas sob a justificativa de melhorar o desempenho esportivo, que é uma lógica no esporte de alto rendimento, pois na GAF geralmente as ginastas são crianças e jovens vulneráveis em um contexto dominado por adultos. Nesse caso, no próximo tema discutiremos se essas ginastas teriam capacidade de resistir a práticas negativas de seus treinadores com recursos limitados.

4.3 ONDE HÁ PODER HÁ “RESISTÊNCIA”? A PERSPECTIVA DAS GINASTAS

Conforme discutido, as ginastas das categorias pré-infantil e infantil, vivenciaram alguns momentos em que a punição e o medo desta punição por parte de seus treinadores tiveram efeito negativo na aprendizagem. As expressões faciais das ginastas evidenciaram o medo e a frustração por decepcionarem seus mentores. Assim, buscamos analisar também a perspectiva dessas ginastas nessas situações.

A ginasta Gisele tem 11 anos de idade, e desde muito cedo frequenta o ginásio. A pequena ginasta Gisele é muito alegre no dia a dia do treinamento, por outro lado, as broncas ou punições de seus treinadores fazem o sorriso constante da menina perder o lugar para o choro. Na entrevista com Gisele, não perguntamos sobre situações específicas, mas pedimos que exemplificasse situações em que a conduta do(a) treinador(a) atrapalha seu treino, e ela respondeu:

Eu não gosto de bronca não. Eu sinto um pouquinho de medo quando o Eduardo me dá bronca. Minha mãe me fala que é porque ele quer o meu melhor. Mas, às vezes eu fico com tanto medo que ao invés de eu “acordar” eu “travo” na série. Daí você deve ter visto o que acontece, né? Você viu a minha paralela outro dia? Eu fico com medo, daí é que não sai nada mesmo.

Coincidentemente a ginasta comentou sobre a mesma situação que discutimos anteriormente e reforçou nossa interpretação de que a punição atrapalha seu processo de aprendizagem. Entretanto, na sequência perguntamos se a menina não entendia a explicação do treinador e, se fosse isso, porque não pedia para explicar novamente. Gisele respondeu esse questionamento:

Às vezes a gente não entende e não pede para explicar de novo, porque a gente quer fazer e a gente quer mostrar que somos boas. Tem outra coisa também, os treinadores sabem o que eles estão falando, então a gente não pergunta muito não. Até porque atrapalha o treino a gente ficar perguntando muito.

A partir dessa perspectiva, a ginasta reforça a noção de que as atletas incorporam a submissão e a dependência, tornando-se corpos dóceis (Barker-Ruchti; Tinning, 2010). Além disso, os autores argumentaram que a docilidade e o fato das ginastas serem muito jovens contribuem para que elas tenham recursos limitados para resistir aos discursos hegemônicos no contexto da GAF.

Outro fato que chama atenção no discurso de Gisele e contribui para o cenário discutido por Barker-Ruchti e Tinning (2010), é o fato das ginastas entenderem que os(as) treinadores(as) sabem tudo que elas precisam para serem atletas de alto rendimento. Essa situação também é discutida por outras atletas da categoria pré-infantil e infantil. Para exemplificar, apresentamos o depoimento da ginasta Ana de 8 anos de idade. Apesar da pouca idade, a pequena atleta mora com mais duas colegas de treino em um alojamento disponibilizado pela mantenedora do ginásio. Esse grupo de ginastas é monitorado por uma tutora, que é prima de uma das meninas. A família delas vive a 150 quilômetros do centro de treinamento e as ginastas só os veem nos finais de semana. A ginasta Ana argumenta que como está longe da família, os treinadores representam tudo para ela, conforme o seguinte depoimento:

O meus treinadores representam tudo para mim. Ainda mais que eu moro longe dos meus pais, então eles(treinadores/as) são como se fossem meus pais aqui no dia a dia. Eles são meus guias também. Se eu quero chegar nas olímpiadas eles que vão me ajudar. Eles falam e eu obedeço, porque eu quero ser boa e eles que vão me ajudar a ser boa.

Nesse sentido, os depoimentos apresentados até aqui corroboram dois aspectos importantes evidenciados em pesquisas anteriores, sobre o impacto do relacionamento treinador-atleta na vida dos esportistas, por dois fatores que se interconectam (Cavallerio; Wadey; Wagstaff, 2022; Jones; Glintmeyer; Mckenzie, 2005; Kuhlin; Stewart; Barker-Ruchti, 2020). O primeiro na noção, reforçada por Gisele e Ana, de que o treinador tem as chaves para o sucesso e por isso tem o poder de “narrar suas vidas” (Carless; Douglas, 2013, p. 707). Segundo, tem a natureza pessoal do relacionamento atleta-treinador (Kuhlin; Stewart; Barker-Ruchti, 2020). No caso da GAF, essa última situação é acentuada, pois as ginastas e os treinadores convivem várias horas por dia (Oliveira, 2014; Schiavon, 2009). Ainda, a idade jovem das ginastas acentua os aspectos paternalistas/maternalistas desse relacionamento.

A discussão com a literatura e os dados apresentados reforçam nosso argumento, que as ginastas mais novas teriam poucos recursos para resistir aos discursos e práticas normalizadas no contexto do estudo. Entretanto, a noção de resistência é vital na conceituação de poder de Foucault (1987, 2006, 2007), que enfatizou que onde há poder sempre haverá alguma forma de resistência. Nesse sentido, identificamos que as ginastas desse estudo só encontraram caminhos para resistir e argumentar sobre questões básicas do treinamento com os treinadores à medida em que ficaram mais velhas. O depoimento da ginasta Alice exemplifica essa mudança gradual no relacionamento com o treinador:

Hoje eu sou adulta e minha relação com o Eduardo é muito diferente. Tem um respeito, tem uma cumplicidade diferente, sem contar que aqui ele é um pai para mim, se eu faço faculdade é por causa dele. Mas eu vejo as pequenas morrendo de medo dele e eu falo para elas que não precisa. Quem conhece ele sabe que ele não é um monstro, ele é rígido, porque quer o melhor dela e quando elas não dão o melhor ele fica possesso (risadas). Então, ele tem que pensar nisso também, apesar da gente ter intimidade eu não falo isso para ele, porque não cabe a mim. Mas tem hora que ele não ajuda, porque ele berra com elas e imagina você com 10 anos de idade, não ia ficar com medo?

Apesar de Alice argumentar sobre a mudança no relacionamento com o treinador, ela compreende que não cabe a ela questionar as práticas de coaching dele. Além disso, a atleta reforça para as ginastas mais novas que o coaching autoritário que impera no ginásio é o “material principal da conduta moral” dos treinadores (Foucault, 2000, p. 291), ou seja, que os treinadores são autoritários por quererem “o bem das ginastas”. Assim, semelhante a pesquisas anteriores que analisaram as tensões entre as técnicas disciplinares e as técnicas de si (Bridel; Rail, 2007; Costa et al., 2024; Hanold, 2010), Alice demonstrou simultaneamente problematização em relação às práticas de coaching dos(as) treinadores(as) e docilidade ao reforçar para as atletas a necessidade das regras normalizadas nesse contexto. Desse modo, Foucault (2006, p. 276) reforça que “essas práticas [de si] não são, entretanto, alguma coisa que o próprio indivíduo invente. São esquemas que ele encontra em sua cultura e que lhe são propostos, sugeridos, impostos por sua cultura, sua sociedade e seu grupo social”.

Por outro lado, Mariana (16 anos de idade) argumentou que com o tempo ela aprendeu a falar mais sobre aquilo que seria prejudicial para a saúde dela. Na época das observações, ela se recuperava de uma cirurgia no ombro, e adiou o máximo essa cirurgia, porque estava em período competitivo. A atleta reforçou que aos poucos aprendeu mais sobre seu corpo e aprendeu a conversar com os treinadores sobre essas questões específicas:

Os treinadores têm que ter mais empatia com a gente. Tem que entender que a gente não é robô. Quando eu era pequena eu tinha medo de falar que estava com dor, quando eu falava eu pensava que os técnicos iam achar que eu estava mentindo. Então agora que eu amadureci, eu penso em primeiro no meu corpo, se eu tiver com dor eu vou falar. Então para poder chegar nos meus objetivos é cuidar do meu corpo, de alimentação e de tudo que integra isso. E, para isso eu preciso ter um diálogo maior com os treinadores, que hoje eu tenho. Parece que hoje eles me entendem mais do que antes. Parece que é uma relação de mais confiança e empatia.

Nessa perspectiva, identificamos que hoje Mariana tem papel mais ativo na relação com seus treinadores. Segundo Foucault (2006), a atitude dela poderia estar relacionada a uma técnica de si, descrita pelo autor como os meios pelos quais podemos nos modificar para nos tornarmos sujeitos éticos.

Ainda, salientamos que os(as) treinadores(as) desse estudo reforçam atitudes como essas das ginastas das categorias avançadas. Segundo o treinador Eduardo, as categorias formativas (pré-infantil, infantil), são utilizadas para “forjar” as ginastas. Eduardo comenta, que nessa etapa ele não pode parar o treino por qualquer reclamação, pois nesse caso as ginastas ficariam mal-acostumadas e reclamariam por “qualquer coisa”. Já na categoria juvenil o treinador descreve uma preocupação maior de escutar as ginastas para não ultrapassar limites físicos, que comprometeriam a participação delas em competições importantes.

Em síntese, os dados nos permitem argumentar que a resistência foi exercida dentro de um limite tênue da relação de poder treinador(a)-atleta. Além disso, os espaços para as ginastas argumentarem são evidenciados apenas quando o que está em jogo é o resultado esportivo ou, mais especificamente, a participação em competições esportivas importantes. Desse modo, cabe aos treinadores refletirem sobre os potenciais benefícios de se estabelecer canais de comunicação com as ginastas desde categorias mais iniciais para prevenir aspectos negativos do uso do poder disciplinar.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir do objetivo e da análise realizada nesse estudo, o ponto central é que os resultados indicam que, se as técnicas disciplinares se justificam por produzirem resultados esportivos, às vezes elas são “contraprodutivas” nas práticas de coaching empregadas no cotidiano do contexto desse estudo. Nesse sentido, não questionamos a noção de Foucault (1987) que argumentou que, o poder disciplinar produz “verdades” em um determinado contexto, como no caso desse estudo em que os treinadores têm as chaves para o sucesso das ginastas. Além disso, também demonstramos que o poder disciplinar produziu ginastas dóceis, que aprendem a obedecer a seus(suas) treinadores(as) para obter o máximo desempenho. Ainda, interpretamos que as técnicas disciplinares são utilizadas pelos(as) treinadores(as) não necessariamente para obter o máximo desempenho, mas para preparar as ginastas mais jovens (categorias pré-infantil e infantil) para terem um certo tipo de autonomia nas categorias posteriores (juvenil e adulta). Entretanto, esse tipo de autonomia está relacionado à obediência e autorregulação do comportamento legitimado pelos treinadores.

Dessa forma, acreditamos que os direcionamentos principais que podem emergir da história relatada nesses três temas é que o problema não é o(a) treinador(a) “dominar” o contexto, prever situações inesperadas, se preparar para instabilidades e tomar medidas rígidas, às vezes. Por outro lado, o treinador tem que saber quando essas medidas são necessárias e, principalmente, que não é sempre que elas são necessárias. Com isso, argumentamos que cabe aos(as) treinadores(as) compreenderem os efeitos do poder disciplinar no coaching e limitar os efeitos negativos da docilidade dos atletas (Denison; Mills; Konoval, 2017). Acreditamos que o primeiro passo para isso seria a “desfamiliarização” com os aspectos tidos como “naturais” no coaching, que colocariam em risco à saúde e o bem-estar das ginastas.

Reconhecemos que estimular os(as) treinadores(as) a repensarem suas práticas de coaching pode ser uma tarefa muito desafiadora, pois envolveria a desconstrução de conhecimentos normalizados e aprendidos durante anos, para enxergar um novo caminho e acreditar nessa trajetória. Entretanto, os resultados mostram que ouvir mais as ginastas e compreender que nem todas elas respondem bem á determinada prática seja o caminho inicial.

Nesse sentido, os resultados demonstraram que as ginastas mais velhas têm recursos para serem ouvidas pelos(as) treinadores(as) e estimularem mais empatia e uma relação de mútua confiança. No caso desse estudo, tivemos a oportunidade de ouvir tanto a ginasta, quanto os(as) treinadores(as), identificamos que, desde que haja sinergia nessa relação, ouvir a ginasta e questionar suas próprias práticas de coaching pode ser uma estratégia interessante para os(as) treinadores(as). Além disso, os resultados demonstraram que as ginastas mais jovens, devido à imaturidade e docilidade forjada no ginásio, teriam pouco senso crítico e capacidade de refletir sobre essas situações que acontecem nesse contexto. Isso reforça a necessidade de os pais estarem cientes do cotidiano no ginásio e de seu papel na formação esportiva das ginastas.

  • FINANCIAMENTO
    O presente trabalho foi realizado com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP (processo número: 2019/04687-7).
  • ÉTICA DE PESQUISA
    A pesquisa seguiu os protocolos vigentes nas Resoluções 466/12 e 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde do Brasil e foi aprovado pelo Comitê de Ética de Pesquisa (CEP) da Universidade Estadual de Campinas. Número na Plataforma Brasil CAAE: 23211119.8.0000.5404.
  • COMO REFERENCIAR
    RICCI COSTA, Vítor; NUNOMURA, Myriam. O poder disciplinar e o coaching na Ginástica Artística Feminina: uma análise foucaultiana do relacionamento treinador-ginasta. Movimento, v. 31, p. e31008, jan./dez. 2025. DOI: https://doi.org/10.22456/1982-8918.141118

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Editado por

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Jun 2025
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    04 Jul 2024
  • Aceito
    15 Jan 2025
  • Publicado
    31 Maio 2025
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