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Do Leme a Santa Cruz: a territorialização eleitoral de Jair Bolsonaro no município do Rio de Janeiro

From Leme to Santa Cruz: the electoral territorialization of Jair Bolsonaro in the municipality of Rio de Janeiro

De Leme a Santa Cruz: la territorialización electoral de Jair Bolsonaro en el municipio de Río de Janeiro

De Leme à Santa Cruz : la territorialisation électorale de Jair Bolsonaro dans la municipalité de Rio de Janeiro

O objetivo do artigo é compreender como os indicadores sociais territorializados podem dar pistas sobre a ampliação da base eleitoral de Jair Bolsonaro em sua carreira como parlamentar e, posteriormente, como presidenciável, observando rupturas e continuidades nessa trajetória. O método utilizado será uma correlação entre o Índice de Desenvolvimento Social da cidade do Rio de Janeiro e o desempenho eleitoral espacializado do então candidato nas eleições de 2002, 2006, 2010, 2014 e 2018. Nesse esforço, esperamos oferecer insumos àqueles que se debruçam sobre os seguintes questionamentos: qual o perfil do eleitor de Jair Bolsonaro ao longo de sua trajetória parlamentar? Houve mudanças nesse perfil? Como se deu a ampliação de suas bases eleitorais no processo de construção de sua candidatura à presidência da República?

geografia eleitoral; espacialização do voto; comportamento político; indicadores sociais; Jair Bolsonaro


Abstract

The objective of this article is to demonstrate how social indicators can help to elucidate the process of expansion of the electoral base of Jair Bolsonaro in his parliamentary career and, more recently, as presidential candidate, observing ruptures and continuities in this trajectory. The method used is a correlation between the Social Development Index of the city of Rio de Janeiro and the spatialized electoral performance of the candidate in the elections of 2002, 2006, 2010, 2014, and 2018. With this effort, we hope to offer data to those considering the following questions: what is the profile of those voters who have supported Jair Bolsonaro throughout his parliamentary trajectory? Were there any changes in this profile? How did his electoral base expand in the process of building his candidacy for the presidency of the republic?

electoral geography; vote spatialization; political behavior; social indicators; Jair Bolsonaro

Resumen

El objetivo del artículo es entender cómo los indicadores sociales territorializados pueden ofrecer pistas sobre la expansión de la base electoral de Jair Bolsonaro en su carrera como congresista y, posteriormente, como candidato presidencial, observando rupturas y continuidades en esta trayectoria. El método utilizado será una correlación entre el Índice de Desarrollo Social de la ciudad de Río de Janeiro y el desempeño electoral espacializado del candidato en las elecciones de 2002, 2006, 2010, 2014 y 2018. En este esfuerzo, esperamos ofrecer informaciones a los que se detienen en las siguientes cuestiones: ¿cuál es el perfil del votante de Jair Bolsonaro a lo largo de su trayectoria parlamentaria? ¿Ha habido cambios en este perfil? ¿Cómo se ha producido la ampliación de sus bases electorales en el proceso de construcción de su candidatura a la presidencia de la república?

geografía electoral; espacialización del voto; comportamiento político; indicadores sociales; Jair Bolsonaro

Résumé

L'objectif de l'article est de comprendre comment les indicateurs sociaux territorialisés peuvent fournir des indices sur l'expansion de la base électorale de Jair Bolsonaro dans sa carrière de parlementaire et, ensuite, de candidat à la présidence, en observant les ruptures et les continuités dans cette trajectoire. La méthode utilisée sera une corrélation entre l'indice de développement social de la ville de Rio de Janeiro et la performance électorale spatialisée du candidat de l'époque, lors des élections de 2002, 2006, 2010, 2014 et 2018. Dans cet effort, nous espérons offrir une contribution à ceux qui s'attardent sur les questions suivantes: quel est le profil de l'électeur de Jair Bolsonaro au cours de sa carrière parlementaire, y a-t-il eu des changements dans ce profil, et comment s'est produit l'élargissement de ses bases électorales dans le processus de construction de sa candidature à la Présidence de la République?

géographie électorale; spatialisation des votes; comportement politique; indicateurs sociaux; Jair Bolsonaro

Introdução

O esforço analítico operado neste artigo tem por objetivo compreender, a partir de uma investigação que contemple a espacialização de seus votos, o processo de ampliação da base eleitoral do presidente Jair Bolsonaro nas eleições legislativas de 2002, 2006, 2010, 2014 e, posteriormente, nas eleições presidenciais de 2018. Porém, diferentemente dos esforços realizados por Hunter e Power (2019)Hunter, W.; Power, T. “Bolsonaro and Brazil's illiberal backlash”. Journal of Democracy, vol. 30, nº 1, p. 68-82, 2019. , Power e Rodríguez-Silveira (2018)Power, T. J.; Rodrigues-Silveira, R. The political right and party politics. In: Ames, B. (ed.). Routledge Handbook of Brazilian politics. London: Routledge, p. 251-268, 2018. , Samuels e Zucco (2018)Samuels, D.; Zucco, C. Partisans, anti-partisans, and voter behavior. In: Ames, B. (ed.). Routledge Handbook of Brazilian politics. London: Routledge, p. 269-290, 2018. e Amaral (2020)Amaral, O. E. “The victory of Jair Bolsonaro according to the Brazilian Electoral Study of 2018”. Brazilian Political Science Review, vol. 14, nº 1, 2020. , não nos ativemos ao plano nacional, nem buscamos mensurar variáveis ideológicas ou demográficas como sexo e religião. Mesmo no tocante à geografia eleitoral, no escopo dessa contribuição, não ultrapassamos as fronteiras do município do Rio de Janeiro. A despeito dessas limitações, buscamos dialogar com as profícuas conclusões apresentadas pelas pesquisas acima citadas acerca dos descompassos notados entre os índices de votação observados em segmentos sociais supostamente influenciados pelo legado do lulismo ( Singer, 2009Singer, A. “Raízes sociais e ideológicas do lulismo”. Novos estudos Cebrap, vol. 85, p. 83-102, 2009. , 2012Singer, A. Os sentidos do lulismo: reforma gradual e pacto conservador. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. ). Desse modo, incorporando outras referências ( Rennó e Cabello, 2010Rennó, L. R.; Cabello, A. “As bases do lulismo: a volta do personalismo, realinhamento ideológico ou não alinhamento?”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 25, p. 39-60, 2010. ; Peixoto e Rennó, 2011Peixoto, V.; Rennó, L. “Mobilidade social ascendente e voto: as eleições presidenciais de 2010 no Brasil”. Opinião Pública, vol. 17, nº 2, p. 304-332, 2011. ; Couto, 2014Couto, C. G. “Novas eleições críticas?”. Em Debate, vol. 6, p. 17-24, 2014. ; Melo, 2014Melo, M. A. Lulismo ou “qualunquismo”. Valor Econômico, 15 jan. 2014. ; Borges e Vidigal, 2018Borges, A.; Vidigal, R. “Do lulismo ao antipetismo? Polarização, partidarismo e voto nas eleições presidenciais brasileiras”. Opinião Pública, vol. 24, n° 1, p. 53-89, 2018. ), refletimos sobre como as variáveis socioeconômicas participam dessa equação, por meio da qual é operada a conjunção discursiva entre neoliberalismo, conservadorismo e punitivismo, amalgamada pelo antipetismo, enquanto antagonismo capaz de articular os diferentes segmentos que conformam o sujeito político bolsonarista ( Kalil, 2018Kalil, I. O. Quem são e no que acreditam os eleitores de Jair Bolsonaro. São Paulo: Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, 2018. ; Solano, 2018Solano, E. “Crise da democracia e extremismos de direita”. Análise Friedrich Ebert Stiftung, vol. 42, nº 1, p. 1-27, 2018. ; Alonso, 2019Alonso, A. A comunidade moral bolsonarista. In: Abranches, S., et al. Democracia em risco? 22 ensaios sobre o Brasil hoje. São Paulo: Companhia das Letras, p. 41-56, 2019. ; Fausto, 2019Fausto, R. Depois do temporal. In: Abranches, S., et al. Democracia em risco? 22 ensaios sobre o Brasil hoje. São Paulo: Companhia das Letras, p. 116-129, 2019. ).

Nosso objetivo aqui, no entanto, é menos o de buscar caracterizar esse sujeito do que escavar suas origens, traçando a genealogia de sua conformação em seu berço original, o estado do Rio de Janeiro, pelo qual Bolsonaro foi eleito por sete mandatos consecutivos. Nesse tocante, dialogamos com a pesquisa, por nós realizada, acerca de sua trajetória legislativa, na qual analisamos projetos de lei, discursos e votações em Plenário levadas a cabo em seu período de atuação na Câmara dos Deputados ( Silva, 2022Silva, M. G. Da diferença à equivalência: hipóteses laclaunianas sobre a trajetória legislativa de Jair Bolsonaro, 2022 (no prelo). ). Diante desse propósito, em virtude da dificuldade de encontrar dados sobre os sete pleitos e sobre todos os municípios do estado, ativemo-nos à capital e aos processos eleitorais mais recentes (2002, 2006, 2010, 2014), nos quais analisamos a distribuição dos votos em Jair Bolsonaro pelas regiões administrativas do município do Rio de Janeiro. Ademais, a cidade do Rio de Janeiro foi escolhida para uma análise mais regionalizada por ser um distrito eleitoral expressivo e por conter “mais padrões de territórios eleitorais concentrados, de natureza local, do que de abrangência municipal” ( Terron, 2012Terron, S. “Geografia eleitoral em foco”. Em Debate, vol. 4, nº 2, p. 8-18, 2012. , p. 29).

Em seguida, cruzamos esses dados com o Índice de Desenvolvimento Social (IDS) com o propósito de delinear as características socioeconômicas das áreas com maior adesão ao candidato, observando rupturas e continuidades conforme é operado o processo de expansão de sua base eleitoral. Por fim, comparamos esses resultados com os da eleição presidencial, mantendo, como unidade de análise, a mesma segmentação geográfica.

Para tal, realizamos uma breve incursão à discussão acerca dos fatores que influenciam o comportamento dos eleitores, em termos tanto geográficos quanto sociais. Levando em conta as contribuições de Ethington e McDaniel (2007)Ethington, P. J.; McDaniel, J. A. “Political places and institutional spaces: the intersection of political science and political geography”. Annual Review of Political Science, vol. 10, p. 127-142, 2007. , Clark e Jones (2013)Clark, J.; Jones, A. “The great implications of spatialisation: grounds for closer engagement between political geography and political science?”. Geoforum, vol. 45, p. 305-314, 2013. e Weaver (2014)Weaver, R. “Contextual influences on political behavior in cities: toward urban electoral geography”. Geography Compass, vol. 8, nº 12, p. 874-89, 2014. , nos esforçamos para explicitar a compreensão dos fatores contextuais e composicionais que podem ter contribuído para a curva de desempenho eleitoral verificada ao longo do recorte temporal observado.

O quantitativo eleitoral de Bolsonaro no estado do Rio de Janeiro se manteve relativamente constante ao longo de sua vida parlamentar: em sua primeira eleição para deputado federal (1990), ele obteve 67.041 votos; na segunda (1994), obteve 111.927; na terceira (1998), 102.893; na quarta (2002), 88.945; na quinta (2006), 99.700; e na sexta (2010), 120.000. O ponto fora da curva de seu desempenho eleitoral foi a eleição de 2014, quando se tornou o campeão de votos no estado e passou a figurar entre os cinco deputados federais mais votados do país, com 464.572 votos.

A argumentação desenvolvida neste artigo visa lançar luz sobre esse padrão eleitoral, almejando contribuir com uma gama de trabalhos já produzidos a respeito da espacialização do voto em nível nacional. Nicolau e Peixoto (2007)Nicolau, J.; Peixoto, V. “Uma disputa em três tempos: uma análise das bases municipais das eleições presidenciais de 2006”. In: Anais do Encontro Anual da Anpocs, Caxambu, vol. 31, p. 22-26, 2007. , bem como Carraro et al. (2007)Carraro, A., et al. “'It is the economy, companheiro!': uma análise empírica da reeleição de Lula com base em dados municipais”. In: Anais do Encontro de Economia da Região Sul, 10, Porto Alegre, 2007. , já haviam explicitado a correlação existente entre o grau de desenvolvimento social de populações e a espacialização do voto. Todavia, em virtude dos recortes de tempo e de esfera em que a disputa eleitoral é travada, é preciso alertar que as dimensões analíticas foram contextualizadas tendo em vista a proporção e as peculiaridades de nosso objeto.

No que se segue, tecemos uma análise estatística que busca demonstrar a correlação entre os indicadores sociais das regiões observadas e seu desempenho eleitoral em cada pleito analisado. Não obstante a dimensão geográfica de nossa investigação, o que se pretende neste artigo é verificar a existência de uma correlação entre a proporção de votos em Jair Bolsonaro e os elementos sociais característicos da distribuição territorial do município. Com isso, esperamos oferecer insumos àqueles que se debruçam sobre os seguintes questionamentos: o contexto social e as características do espaço influenciam nas preferências políticas? É possível associar a preferência por determinado candidato a características socioeconômicas compartilhadas por moradores de determinado território? Qual o perfil do eleitor de Jair Bolsonaro ao longo de sua trajetória parlamentar? Houve mudanças nesse perfil? Como se deu a ampliação de suas bases eleitorais?

As duas primeiras seções têm caráter exploratório e servem para apresentar argumentos que configuraram a dimensão qualitativa da pesquisa. Na primeira, discutimos o papel das lideranças locais nas eleições presidenciais, isto é, como as elites políticas enraizadas nos planos municipal e estadual auxiliam na capilarização de uma candidatura nacional. Nessa seção, discutimos como o vácuo de lideranças que emerge na esteira da Operação Lava-Jato no Rio de Janeiro surge como pano de fundo da recepção da candidatura de Jair Bolsonaro no estado. Na segunda seção, discutimos o conceito de classe média com o propósito de fundamentar o que acreditamos ser uma das principais contribuições da pesquisa: oferecer bases empíricas para a associação identitária entre o bolsonarismo e as expectativas e os padrões de consumo dessas camadas, o que implica uma subsequente exclusão de elementos identitários que configuram o universo valorativo das classes populares. Na terceira e quarta seções adentramos na empiria, iniciando com uma apresentação da metodologia utilizada ao longo da investigação, seguida da apresentação de seus resultados, sumariados na Conclusão, na qual reforçamos a conexão com a dimensão qualitativa da pesquisa.

A regionalização do voto na cidade do Rio de Janeiro e o papel das lideranças locais

A formação urbana da cidade do Rio de Janeiro é marcada pela desigualdade socio-espacial, que, para além da renda, é caracterizada pelo acesso a serviços culturais, de saúde e de educação. As reformas urbanas ocorridas ao longo do século XX delimitam essa divisão do espaço urbano a partir de um histórico de desapropriações e de políticas higienistas e pela formação das favelas, que acabam por consolidar uma estratificação espacial da cidade ( Abreu, 1987Abreu, M. Evolução urbana no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 1987. ). A capital fluminense, portanto, é construída, assim como várias outras metrópoles brasileiras, sob essa dicotomia de centro e periferia. Partindo dessa perspectiva sobre o estado do Rio de Janeiro, é possível afirmar que o centro é o grande concentrador de recursos econômicos, financeiros e culturais, escassamente distribuídos pelas regiões periféricas ( Alkmim, 2014Alkmim, A. C. De Brizola a Cabral. De Collor a Dilma: a geografia do voto no Rio de Janeiro de 1982 a 2010. Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2014. ).

Essa taxonomia intramunicipal é, todavia, insuficiente para a ideia de espaço como arena política que queremos desenvolver neste artigo, pois divide a cidade em apenas dois polos: (i) o núcleo, que agrega a região central da cidade, a Zona Sul, a parte litorânea da Zona Oeste e o segmento mais central da Zona Norte; e (ii) a periferia imediata , formada pelos bairros das Zonas Norte e Oeste circunscritos pela linha ferroviária e pela Avenida Brasil. Olhando para trabalhos como os de Fleischer (1976)Fleischer, D. V. “Concentração e dispersão eleitoral: um estudo da distribuição geográfica do voto em Minas Gerais, 1966-1974”. Revista Brasileira de Estudos Políticos, n° 43, 1976. , Dias (1991)Dias, J. L. M. “O jogo e os jogadores: legislação eleitoral e padrões de competição política”. Dissertação de Mestrado em Ciência Política, Iuperj. Rio de Janeiro, 1991. e Terron, Ribeiro e Lucas (2012)Terron, S.; Ribeiro, A.; Lucas, J. F. “Há padrões espaciais de representatividade na Câmara Municipal do Rio de Janeiro? Análise dos territórios eleitorais dos eleitos em 2008”. Teoria & Pesquisa: Revista de Ciência Política, vol. 21, nº 1, p. 28-47, 2012. , que verificam os padrões espaciais do voto nas grandes cidades brasileiras, podemos ver uma geografia eleitoral que ultrapassa essa dimensão de distribuição pela ótica do centro/periferia e que observa essa dinâmica pela dicotomia de concentração/dispersão dos votos ao longo do território, formando alguns distritos simbólicos ( Carvalho, 2009Carvalho, N. R. “Geografia política das eleições congressuais: a dinâmica de representação das áreas urbanas e metropolitanas no Brasil”. Cadernos Metrópole, vol. 11, nº 22, p. 367-384, 2009. ). É nesse sentido que essas duas categorias se impõem como um início para a discussão, mas não esgotam as possibilidades de classificação.

As pesquisas acima referidas, contudo, não consideram as estratégias dos candidatos ( Avelino, Biderman e Silva, 2016Avelino, G.; Biderman, C; Silva, G. P. “A concentração eleitoral no Brasil (1994-2014)”. Dados, vol. 59, nº 4, p. 1.091-1.125, 2016. ), e não é o nosso objetivo aqui debater os conceitos e os efeitos de concentração e dispersão de votos. Essas categorias são apenas instrumentalizadas para compreendermos a expansão territorial de um candidato em específico, considerando-o como agente que mobiliza o seu discurso de forma estratégica para expandir as suas bases eleitorais.

Olhando pela lógica das lideranças locais, atores que podem produzir efeitos para um desempenho eleitoral mais concentrado, Waniez et al. (2012)Waniez, P., et al. A geografia do voto nas eleições para prefeito e presidente nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo: 1996-2010. Rio de Janeiro: Vozes, 2012. evidenciam uma relação entre o papel de mediador exercido por lideranças políticas locais e o desempenho eleitoral de candidatos à presidência da República em dois significativos eventos. Na eleição presidencial de 1989, o candidato do Partido Democrático Trabalhista, Leonel Brizola, lançou sua candidatura ao cargo com apoio de Anthony Garotinho, Marcello Alencar e Cesar Maia, todos do mesmo partido. Garotinho era, à época, um político de destaque no interior do estado do Rio de Janeiro, principalmente na região da cidade de Campos dos Goytacazes, onde atuava desde o começo da década de 1980, chegando a ser eleito prefeito no pleito de 1988. Com uma participação política mais longeva que seus outros dois companheiros de partido, Alencar ocupou a posição de suplente de senador no começo da década de 1960, mas teve sua trajetória interrompida pela cassação de seu mandato pelo Ato Institucional Nº 5 (AI-5). Por fim, Cesar Maia inaugurou sua trajetória partidária no começo da década de 1980, quando se filiou ao PDT, mas já possuía participação na vida política local da capital do estado e no movimento estudantil nas décadas anteriores.

De acordo com Waniez et al. (2012)Waniez, P., et al. A geografia do voto nas eleições para prefeito e presidente nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo: 1996-2010. Rio de Janeiro: Vozes, 2012. , o apoio desses nomes à candidatura de Brizola foi um dos elementos constitutivos de seu bom desempenho, fazendo com que este atingisse a marca de 50% dos votos na capital do estado ainda no primeiro turno das eleições. Rodrigues (2016)Rodrigues, T. C. M. O Rio que queremos: propostas para uma cidade inclusiva, vol. 1. 1ª ed. Rio de Janeiro: Núcleo Piratininga de Comunicação, 2016. demonstra que a cisão entre Marcello Alencar, Cesar Maia e Brizola, entre os anos de 1992 e 1994, inaugurou um processo de desintegração do núcleo brizolista dentro do PDT e uma redistribuição das lideranças locais concentradas pelo partido em direção a outras agremiações partidárias, nomeadamente o PMDB 4 4 Em 15 de maio de 2018, o TSE aprovou a mudança da designação do partido de PMDB para MDB. e o PSDB. Em ambos os casos, a atitude centralizadora de Brizola na decisão acerca da sucessão de Alencar na prefeitura do Rio de Janeiro foi o pivô da ruptura. A ruptura no núcleo de apoio brizolista, que, associada a uma miríade de fatores conjunturais, havia propulsado sua candidatura na eleição de 1989, restringiu seu percentual de votos na capital do estado à marca de 9,8% do total. Na direção oposta, em um segundo evento, o PSDB, que havia recebido 11,6% dos votos à época da eleição de 1989, passa a 47% dos votos na cidade com o apoio dos ex-partidários de Brizola. A hipótese da mediação é reforçada por Alkmim (2014)Alkmim, A. C. De Brizola a Cabral. De Collor a Dilma: a geografia do voto no Rio de Janeiro de 1982 a 2010. Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2014. , que aponta que Brizola e, posteriormente, Garotinho atuaram como mediadores da polarização entre PT e PSDB nas eleições presidenciais da década de 1990. Além disso, Terron, Ribeiro e Lucas (2012) apontam de forma preliminar uma tendência de maior dispersão em partidos de esquerda como PT e PDT e uma maior concentração em partidos como DEM, PMDB, PSDB, PTdoB e PV.

O contexto político que circunscreve a eleição presidencial de 2018 no município do Rio de Janeiro é de relativa ausência de lideranças locais e de crise política entre os partidos tradicionalmente aliados na política local. Os desdobramentos da Operação Lava-Jato no estado do Rio de Janeiro levaram à prisão dos ex-governadores filiados ao atual Movimento Democrático Brasileiro (MDB) Sérgio Cabral, em 2016, e Luiz Fernando Pezão, em 2018, sob acusações de desvio de verba pública. A crise de popularidade no partido se estendeu para a esfera municipal. Em uma conversa telefônica vazada entre Eduardo Paes e o ex-presidente Lula, Paes criticou o fato de Lula ter “alma de pobre” e desferiu ofensas ao município de Macaé, localizado no interior do estado do Rio de Janeiro. Em adição a isso, acusações de violência doméstica recaíram sobre o candidato do partido à sucessão de Paes na prefeitura da capital. O resultado para o PMDB foi a perda da posição tanto na prefeitura da capital quanto no governo do estado. Observando esses acontecimentos, Rodrigues (2020)Rodrigues, T. C. M. “Realinhamentos partidários no estado do Rio de Janeiro (1982-2018)”. Política & Sociedade, vol. 19, n° 46, p. 332–356, 2020. caracteriza o período 2016-2018 como a derrocada da hegemonia do MDB no estado ao assinalar que “o PMDB não possui mais governador, nem vice-governador, nem senador, nem presidente da Alerj, nem prefeito da capital. Ademais, o partido deixou de ter a maior bancada regional na Câmara de Deputados e na Alerj” (p. 353).

A crise que se instaurou na política local encontrava paralelos apenas na esfera nacional. O processo de impeachment contra a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), aceito pelo ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, à época filiado ao MDB, tornou explícita a fragmentação da base de apoio político do Partido dos Trabalhadores e provocou uma crise nas relações entre os dois partidos tanto em nível federal quanto nos níveis estadual e municipal. O MDB, que ocupou dez ministérios ao longo do segundo governo de Dilma Rousseff e a vice-presidência da República, passou a articular em favor da cassação do mandato da presidente. No âmbito da política estadual, MDB e PT constituíram uma aliança fortalecida a partir da primeira eleição de Sérgio Cabral, em 2006, com o Partido dos Trabalhadores apoiando o então PMDB nos pleitos subnacionais e emprestando a imagem de suas lideranças mais fortes para suas campanhas. Desse modo, o argumento aqui ensejado é que as rusgas entre os dois partidos na esfera federal dificultaram a conformação de coligações no estado do Rio de Janeiro, capazes de ampliar a receptividade do eleitor carioca à candidatura de Fernando Haddad (PT) em 2018. Nesse cenário, que, ao nosso ver, facilitou a ascensão de Jair Bolsonaro, ocorreu a conjunção dos três fatores acima mencionados – (I) fragilização das lideranças políticas locais, (II) fragmentação da base política do PT na esfera nacional, e (III) crise da relação entre MDB e PT no âmbito subnacional –, que produziu uma conjuntura em que o Partido dos Trabalhadores não era capaz de articular apoio e associar a imagem de seu candidato, que não possuía atuação relevante no estado, à de lideranças conhecidas da população local. Em outros termos, o que se pretende esclarecer com esse recurso ao debate acerca da relevância das lideranças locais no município do Rio de Janeiro é que, ao menos em parte, o desempenho de Bolsonaro na eleição majoritária pode ser explicado pela soma de dois elementos: a inviabilização de uma coalizão formada por lideranças locais em torno da candidatura do Partido dos Trabalhadores, como se observava nas eleições anteriores, e a relativa autonomia da candidatura de Bolsonaro em relação a essas mesmas lideranças. Assim, observou-se uma tempestade perfeita, que, por um lado, imobilizou a candidatura petista na cidade e, por outro, deu propulsão à candidatura bolsonarista, que se apropriou da crítica às lideranças políticas tradicionais.

Em oposição a esse contexto, a candidatura de Jair Bolsonaro contava com ampla penetração no tecido social, uma vez que o ex-deputado construiu sua carreira política ancorado em suas votações no município. Por esse motivo, quando comparado ao seu rival, Bolsonaro dependia menos de instâncias de mediação entre sua campanha e o eleitorado local. Ademais, sua estratégia de aproximação de lideranças religiosas ampliou a penetração de sua campanha no território da cidade, como explicitamos em outro trabalho ( Gracino, Goulart e Frias, 2021Gracino, P.; Goulart, M.; Frias, P. “'Os humilhados serão exaltados': ressentimento e adesão evangélica ao bolsonarismo”. Cadernos Metrópole, vol. 23, p. 547-580, 2021. ). Neste artigo, nosso objetivo é perceber como a cartografia eleitoral do município, suas características e divisões socioeconômicas contribuem para compreender a ascensão eleitoral de Bolsonaro. Com esse propósito, partimos da classificação de Abreu (1987)Abreu, M. Evolução urbana no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 1987. e Brasileiro (1985)Brasileiro, A. M. Região Metropolitana do Grande Rio: serviço de interesse comum. Brasília: Ipea/IplanRio, 1985. para perceber as nuances entre as Zonas Norte e Oeste, ambas com regiões presentes no núcleo e na periferia imediata. Abreu (1987)Abreu, M. Evolução urbana no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 1987. também introduz uma dicotomia paralela a essa classificação, entre favela e asfalto. A presença das favelas tensiona os conflitos entre as classes a partir do momento em que há uma maior visualização da desigualdade aumentando o potencial de conflito, na medida em que as classes médias e altas constroem “uma imagem negativa daqueles que estão na base da hierarquia social, como classes potencialmente perigosas, que devem ser controladas” ( Alkmim, 2014Alkmim, A. C. De Brizola a Cabral. De Collor a Dilma: a geografia do voto no Rio de Janeiro de 1982 a 2010. Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2014. , p. 59). Por conta de toda essa dinâmica territorial, optamos por analisar a cidade em regiões administrativas, por ser uma forma de regionalização que já agrega os territórios de acordo com seus fluxos econômicos e sociais. Reconhecemos, todavia, as limitações dessa opção, já que essa correlação entre dados eleitorais e dados sociodemográficos sobrepõe duas unidades de análise: as zonas eleitorais, com base nas quais são contabilizados os primeiros, e as regiões administrativas, utilizadas de maneira mais recorrente em pesquisas sobre temas econômicos e sociais.

Bolsonarismo e classe média: uma hipótese identitária

As evidências apresentadas nas próximas seções nos permitem sugerir uma associação entre a identificação com Jair Bolsonaro e a identidade de classe média por parte do eleitor, entendida não como um produto exclusivo da renda, mas do acesso à escolaridade e, sobretudo, às condições estruturais de existência (saúde, moradia, saneamento). Em trabalhos dedicados a discutir o conceito, Scalon e Salata (2012)Scalon, C.; Salata, A. “Uma nova classe média no Brasil da última década? O debate a partir da perspectiva sociológica”. Sociedade e Estado, vol. 27, n° 2, p. 387-407, 2012. indicam que, no Brasil, a classe média seria composta por um padrão de renda de classe AB, cujos rendimentos familiares são superiores a R$ 3.474,00 e envolvem “um padrão de vida estável, ter feito universidade, ter acesso a lazer e diversão etc.” ( Salata, 2015Salata, A. R. “Quem é classe média no Brasil? Um estudo sobre identidades de classe”. Dados, vol. 58, n° 1, p. 111-149, 2015. , p. 131). Desse modo, os autores diferenciam o universo da classe média do perfil do brasileiro mediano, na medida em que o estrato AB abarca apenas os 15% mais ricos da população. Essa conclusão é reforçada por Dougherty (1998)Dougherty, M. “Auto-retratos da classe média: hierarquias de 'cultura' e consumo em São Paulo”. Dados, vol. 41, n° 2, p. 411-444, 1998. em um texto sobre os padrões de consumo da classe média. O texto sugere o sentimento disseminado de que esse padrão se encontraria ameaçado pela deterioração econômica do país. Tal percepção é existencialmente determinante, ameaçando a própria identidade desse grupo social, uma vez que a esse padrão de consumo é atribuída uma superioridade moral, que o distingue dos demais (p. 442). O autor também ressalta o valor atribuído aos investimentos em cultura e educação, bem como ao acesso a bens e serviços qualificados, como símbolos identitários por meio dos quais o grupo se diferencia das camadas populares.

Para refletirmos sobre a questão do perfil identitário de classe média do eleitor de Jair Bolsonaro, é necessário, primeiramente, esclarecer os modos de configuração dos vínculos de identificação entre representantes e representados. Nossa hipótese, respaldada em outras pesquisas, é que o antipetismo teria sido um elemento determinante nessa configuração identitária ( Kalil, 2018Kalil, I. O. Quem são e no que acreditam os eleitores de Jair Bolsonaro. São Paulo: Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, 2018. ; Power e Rodríguez-Silveira, 2018Power, T. J.; Rodrigues-Silveira, R. The political right and party politics. In: Ames, B. (ed.). Routledge Handbook of Brazilian politics. London: Routledge, p. 251-268, 2018. ; Samuels e Zucco, 2018Samuels, D.; Zucco, C. Partisans, anti-partisans, and voter behavior. In: Ames, B. (ed.). Routledge Handbook of Brazilian politics. London: Routledge, p. 269-290, 2018. ; Solano, 2018Solano, E. “Crise da democracia e extremismos de direita”. Análise Friedrich Ebert Stiftung, vol. 42, nº 1, p. 1-27, 2018. ; Alonso, 2019Alonso, A. A comunidade moral bolsonarista. In: Abranches, S., et al. Democracia em risco? 22 ensaios sobre o Brasil hoje. São Paulo: Companhia das Letras, p. 41-56, 2019. ; Fausto, 2019Fausto, R. Depois do temporal. In: Abranches, S., et al. Democracia em risco? 22 ensaios sobre o Brasil hoje. São Paulo: Companhia das Letras, p. 116-129, 2019. ; Hunter e Power, 2019Hunter, W.; Power, T. “Bolsonaro and Brazil's illiberal backlash”. Journal of Democracy, vol. 30, nº 1, p. 68-82, 2019. ; Amaral, 2020Amaral, O. E. “The victory of Jair Bolsonaro according to the Brazilian Electoral Study of 2018”. Brazilian Political Science Review, vol. 14, nº 1, 2020. ). Sendo assim, embora Bolsonaro não tenha uma trajetória política propriamente associada a um partido, é preciso tecer alguns comentários sobre como a identificação partidária atua como preditor do voto e sobre a forma pela qual ela se relaciona com os processos de formação da identidade/autoconcepção individual dos sujeitos.

A natureza e as origens da identificação partidária são temas caros à literatura sobre partidos, eleições e comportamento político, que, de maneira geral, aponta para a importância da conexão psicológica (afetiva) estabelecida através de processos de socialização decorridos ao longo do tempo por meio dos quais os indivíduos configuram e reconfiguram suas identidades ( Campbell et al., 1960Campbell, A., et al. The American voter. New York: John Wiley, 1960. ). Tais dinâmicas, todavia, tendem a ser mais recorrentes em democracias tradicionais, nas quais os sistemas partidários possuem enraizamento social mais longevo. No caso de democracias tardias (ou erráticas) como o Brasil, a identificação partidária acaba sendo determinada por fatores mais conjunturais e midiáticos ( Fiorina, 1981Fiorina, M. P. Retrospective voting in American national elections. Yale: Yale University Press, 1981. ; Borges e Vidigal, 2018Borges, A.; Vidigal, R. “Do lulismo ao antipetismo? Polarização, partidarismo e voto nas eleições presidenciais brasileiras”. Opinião Pública, vol. 24, n° 1, p. 53-89, 2018. ). Entretanto, considerando as mais de três décadas da Nova República e de protagonismo do Partido dos Trabalhadores – a principal agremiação nacional no tocante à capacidade de gerar identificação (e rejeição) –, é possível especular sobre sua presença, enquanto categoria simbólica, nos processos de socialização e configuração identitária ocorridos a partir da década de 1980.

Não obstante, se, a princípio, a presença do PT no repertório de categorias socialmente disseminadas poderia ser considerada como algo restrito às camadas sociais médias e mais escolarizadas ( Singer, 2010Singer, A. “A segunda alma do Partido dos Trabalhadores”. Novos Estudos Cebrap, vol. 88, nov. 2010. , 2012Singer, A. Os sentidos do lulismo: reforma gradual e pacto conservador. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. ; Couto, 2014Couto, C. G. “Novas eleições críticas?”. Em Debate, vol. 6, p. 17-24, 2014. ), sobretudo depois dos mais de 13 anos à frente da presidência da República, é possível considerá-lo como parte do imaginário nacional. Em outros termos e corroborando as evidências encontradas na literatura, é possível adotar, como ponto de partida, a percepção de que a identificação partidária é um preditor do voto no Brasil ( Carreirão e Barbetta, 2004Carreirão, Y. S.; Barbetta, P. A. “A eleição presidencial de 2002: a decisão do voto na região da grande São Paulo”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 19, nº 56, p. 75-93, 2004. ; Rennó, 2007Rennó, L. R. “Escândalos e voto: as eleições presidenciais brasileiras de 2006”. Opinião Pública, vol. 13, nº 2, p. 260-282, 2007. ; Cabello e Rennó, 2010Cabello, A.; Rennó, L. “As bases do lulismo: a volta do personalismo, realinhamento ideológico ou não alinhamento?”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 25, nº 74, p. 39-60, 2010. ; Braga e Pimentel Jr., 2011Braga, M. S. S.; Pimentel, J. “Os partidos políticos brasileiros realmente não importam?”. Opinião Pública, vol. 17, nº 2, p. 271-303, 2011. ; Peixoto e Rennó, 2011Peixoto, V.; Rennó, L. “Mobilidade social ascendente e voto: as eleições presidenciais de 2010 no Brasil”. Opinião Pública, vol. 17, nº 2, p. 304-332, 2011. ), tendo o PT desempenhado a função de “âncora”, organizando as preferências no interior do sistema partidário ( Carreirão e Barbeta, 2004Carreirão, Y. S.; Barbetta, P. A. “A eleição presidencial de 2002: a decisão do voto na região da grande São Paulo”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 19, nº 56, p. 75-93, 2004. ; Kinzo, 2004Kinzo, M. D. G. “Partidos, eleições e democracia no Brasil pós-1985”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 19, p. 23-40, 2004. ; Borges e Vidigal, 2018Borges, A.; Vidigal, R. “Do lulismo ao antipetismo? Polarização, partidarismo e voto nas eleições presidenciais brasileiras”. Opinião Pública, vol. 24, n° 1, p. 53-89, 2018. ).

Ao longo de sua trajetória política, os petistas tiveram como rival preferencial nos processos eleitorais nacionais e subnacionais, mas também nas dinâmicas governativas, o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), configurando uma situação de polarização, também internalizada através de processos de socialização, reforçando o papel da identificação partidária como preditora do voto. A polarização tem um efeito simplificador, tornando as posições dos candidatos mais diferentes e nítidas, facilitando a identificação de suas preferências pelos eleitores ( Hill e Tausanovitch, 2015Hill, S. J.; Tausanovitch, C. “A disconnect in representation? Comparison of trends in congressional and public polarization”. The Journal of Politics, vol. 77, n° 4, p. 1.058-1.075, 2015. ). Nesse processo, o peso da identificação partidária na autoconcepção individual aumenta na medida em que se reforçam os laços entre aqueles que se veem representados pelos discursos polarizados, deflagrando a percepção de inimizade entre grupos, através de uma disputa do tipo “nós” contra “eles” ( Rose e Mishler, 1998Rose, R.; Mishler, W. “Negative and positive party identification in post-communist countries”. Electoral Studies, vol. 17, nº 2, p. 217-234, 1998. ). No caso do Brasil, portanto, é possível afirmar, com o respaldo de diferentes pesquisas sobre o tema ( Limongi e Cortez, 2010Limongi, F.; Cortez, R. “As eleições de 2010 e o quadro partidário”. Novos Estudos Cebrap, nº 88, p. 21-37, 2010. ; Braga e Pimentel Jr., 2011Braga, M. S. S.; Pimentel, J. “Os partidos políticos brasileiros realmente não importam?”. Opinião Pública, vol. 17, nº 2, p. 271-303, 2011. ; Melo e Câmara, 2012Melo, C. R.; Câmara, R. “Estrutura da competição pela presidência e consolidação do sistema partidário no Brasil”. Dados, vol. 55, nº 1, p. 71-117, 2012. ), que, por ter sido polarizada desde 1994 pelos mesmos partidos, a relação entre PT e PSDB teria sido capaz de simplificar o fragmentado sistema partidário brasileiro, condicionando não apenas as eleições para o Executivo nacional, mas também para o Legislativo e para os pleitos realizados nos âmbitos estaduais e municipais. Isso explica sua relevância para a compreensão dos processos eleitorais que constroem a trajetória de Jair Bolsonaro como deputado federal, sobretudo no tocante àqueles realizados após 2004 ( Silva, 2022Silva, M. G. Da diferença à equivalência: hipóteses laclaunianas sobre a trajetória legislativa de Jair Bolsonaro, 2022 (no prelo). ), quando o tema da corrupção começa a alavancar uma série de discursos críticos ao PT, cuja repercussão midiática favoreceu amplamente o aumento da popularidade do ex-capitão ( Hunter e Power, 2019Hunter, W.; Power, T. “Bolsonaro and Brazil's illiberal backlash”. Journal of Democracy, vol. 30, nº 1, p. 68-82, 2019. ).

Por outro lado, considerando as evidências apresentadas por Borges e Vidigal (2018)Borges, A.; Vidigal, R. “Do lulismo ao antipetismo? Polarização, partidarismo e voto nas eleições presidenciais brasileiras”. Opinião Pública, vol. 24, n° 1, p. 53-89, 2018. acerca das eleições de 2002 a 2014, que indicam a crescente importância dos sentimentos partidários na determinação do comportamento dos eleitores no pleito presidencial, é possível indagar sobre o status conferido ao PSDB nessa dinâmica. Quando se analisa a evolução da identificação partidária para as maiores legendas, observa-se que o Partido dos Trabalhadores experimentou um crescimento incomparável em relação ao das demais agremiações, saltando de cerca de 8% das preferências em 1989 para 19% em 2002, chegando a um pico de 25% em 2012. A partir desse ano, o partido observa uma queda considerável. Quando são observados os partidários extremos e moderados, a adesão ao PT cai de 28% em 2002 para 19% em 2014. No entanto, como reforçam os autores, o PSDB, segundo partido mais popular do país, jamais alcançou as mesmas cifras, chegando ao máximo de 16,4%, em 2014. Isso nos permite sugerir que a polarização aqui mencionada como elemento catalisador da identidade partidária (enquanto parcela importante da autoconcepção individual) se deu entre os candidatos petistas e aqueles com maior viabilidade de derrotá-los, que até 2014 tinham em comum o fato de serem do PSDB.

Além de não propiciar vínculos identitários com a mesma abrangência, os tucanos jamais foram capazes de absorver, em sua completa magnitude, os sentimentos refratários ao PT. Como demonstrado no levantamento de Borges e Vidigal sobre as eleições de 2014, metade do eleitorado antipetista revelou não simpatizar com o PSDB. Este é um dado importante para o argumento aqui apresentado, que associa o crescimento eleitoral de Jair Bolsonaro a sua capacidade de simbolizar o antipetismo, entendido como um fenômeno disseminado sobretudo entre as camadas médias e altas da população, mas, também, como desejamos argumentar, entre aqueles que foram contemplados pelos processos de mobilidade social levados a cabo durante a administração petista.

A relação entre classe social e identificação com o Partido dos Trabalhadores é objeto de um profícuo diálogo nas ciências sociais brasileiras, que se estrutura em torno do trabalho de Singer (2010Singer, A. “A segunda alma do Partido dos Trabalhadores”. Novos Estudos Cebrap, vol. 88, nov. 2010. , 2012Singer, A. Os sentidos do lulismo: reforma gradual e pacto conservador. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. ). Simplificando o debate, a tese de Singer é que os governos de Luiz Inácio Lula da Silva teriam sido capazes de ampliar o mercado consumidor, através de políticas macroeconômicas caracterizadas como redistributivismo conservador, que envolveram aumento de renda, acesso ao crédito e programas de assistência social. Esses segmentos populares, por sua vez, seriam caracterizados por um perfil político ideologicamente ambíguo que tende a favorecer o voto nos partidos incumbentes. No entanto, diferentemente daqueles que defendem que o voto seria explicado apenas pelo governismo ( Rennó e Cabello, 2010Rennó, L. R.; Cabello, A. “As bases do lulismo: a volta do personalismo, realinhamento ideológico ou não alinhamento?”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 25, p. 39-60, 2010. ) ou qualunquismo ( Melo, 2014Melo, M. A. Lulismo ou “qualunquismo”. Valor Econômico, 15 jan. 2014. ), enquanto fenômeno particularmente disseminado nas camadas mais pobres, Singer reforça a ideia de que houve a formação de vínculos identitários desses segmentos com a figura de Lula. Todavia, como ressaltado por Couto (2014)Couto, C. G. “Novas eleições críticas?”. Em Debate, vol. 6, p. 17-24, 2014. , conforme suas condições econômicas foram melhorando, as camadas populares foram tendo acesso a novos padrões de consumo, aumentando sua identificação com as classes médias.

Essa relação se dá por um aparente paradoxo entre as melhorias na condição econômica e a satisfação por elas geradas, uma vez que provocam expectativas sociais maiores do que as condições econômicas e estruturais objetivamente disponíveis, o que foi agravado pela interrupção do crescimento econômico a partir de 2014. Com isso, os segmentos emergentes dos setores populares, “a classe C” ( Couto, 2014Couto, C. G. “Novas eleições críticas?”. Em Debate, vol. 6, p. 17-24, 2014. ), tornaram-se menos propensos a apoiar os governos petistas, sobretudo quando comparados às classes D e E, inequivocamente identificadas como pobres , das quais a “nova classe média” deseja se diferenciar.

Ademais, uma vez que convergente com os interesses de parcelas significativas das elites políticas e econômicas, o amálgama formado entre novas e velhas classes médias encontrou um amplo espaço para a reverberação midiática de seu antagonismo para com o projeto político liderado pelo PT, o que pode ser observado na repercussão das manifestações de junho de 2013 e também nos demais movimentos de crítica e descontentamento realizados a partir de então.

Nessa medida, as teses acerca do lulismo nos parecem particularmente importantes para nosso argumento de que, se, em um primeiro momento, a identificação do partido com as classes populares foi determinante para seu sucesso eleitoral, posteriormente ela teria sido uma das causas de seu fracasso. Pois, à luz das evidências encontradas por Couto (2014)Couto, C. G. “Novas eleições críticas?”. Em Debate, vol. 6, p. 17-24, 2014. , Pinheiro-Machado e Scalco (2018)Pinheiro-Machado, R.; Scalco, L. M. “Da esperança ao ódio: juventude, política e pobreza do lulismo ao bolsonarismo”. Cadernos IHU Ideias, vol. 16, nº 278, p. 3-15, 2018. e Solano (2018)Solano, E. “Crise da democracia e extremismos de direita”. Análise Friedrich Ebert Stiftung, vol. 42, nº 1, p. 1-27, 2018. , nos parece que teria sido a partir desses processos de mobilidade que parcelas expressivas dos segmentos populares passaram a absorver símbolos identitários das classes médias, os quais, por sua vez, se estruturam a partir da rejeição dos marcadores populares. Em outros termos, por deixarem de se ver como pobres, esses segmentos quiseram deixar de se comportar como pobres , o que incluiria votar em candidatos que se apresentavam como seus defensores, sendo este um elemento determinante na formação dos vínculos identitários entre Bolsonaro e seus apoiadores. É a partir desse marco que analisamos os resultados encontrados ao longo da pesquisa, que demonstram a expansão geográfica dos votos em Bolsonaro, concentrados em regiões administrativas (RAs) de classe média até as eleições de 2010, para regiões com um perfil socioeconômico mais popular, em 2014 e 2018. Compreendemos, contudo, que as informações recolhidas se referem às regiões como um todo, considerando sua heterogeneidade socioeconômica e as diferentes opções eleitorais de seus moradores. Como não contamos com pesquisas de opinião específicas capazes de indicar o perfil de quem, dentro de cada RA, de fato votou no candidato do PSL, nossas conclusões são o resultado de extrapolações baseadas em dados agregados.

Metodologia

O objetivo do presente artigo é compreender, através da espacialidade do voto, como os indicadores sociais territorializados podem dar pistas sobre a ampliação da base eleitoral de Jair Bolsonaro ao longo de sua trajetória parlamentar e, posteriormente, como presidenciável. O método utilizado é a correlação entre algumas características territoriais da cidade do Rio de Janeiro e o desempenho eleitoral espacializado do atual presidente da República. Para tal, optamos pelo uso do Índice de Desenvolvimento Social (IDS), desenvolvido pelo Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos (IPP) e detalhado em estudo por Cavallieri e Lopes (2008)Cavallieri, F.; Lopes, G. P. “Índice de Desenvolvimento Social – IDS: comparando as realidades microurbanas da cidade do Rio de Janeiro”. Coleção Estudos Cariocas, vol. 8, nº 20080401, 2008. . Ele foi escolhido por se tratar de um índice que, na definição de seus indicadores e das suas fontes de dados, leva em consideração a heterogeneidade do espaço urbano carioca, que não é delineado por regiões administrativas uniformes. A fonte de dados primária do IDS é o Censo Demográfico, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); portanto, sua periodicidade é decenal, tendo sido realizado com os dados de 2000 e 2010. Os dados do Censo Demográfico têm como menor unidade territorial os setores censitários. Estes consistem em um espaço territorial que compreende um agrupamento médio de 250 domicílios, o que permite uma compreensão aprofundada e precisa das características socioeconômicas de cada uma das regiões e a agregação dos dados em outros limites administrativos, como bairros ou regiões administrativas, por exemplo.

Dessa maneira, utilizamos o IDS de 2000 para estabelecer a correlação, o índice e a dispersão eleitoral nas eleições de 2002 e 2006. Para as eleições de 2010, 2014 e 2018, utilizamos os dados levantados pelo IDS de 2010. O IDS é estruturado a partir de quatro dimensões analíticas, das quais derivam dez indicadores, que têm o objetivo de compreender o perfil social da população em cada setor censitário. As dimensões são: (i) Acesso a Saneamento Básico, (ii) Qualidade Habitacional, (iii) Grau de Escolaridade e (iv) Disponibilidade de Renda. O cálculo do IDS é dividido em duas etapas. A primeira consiste na normalização estatística dos valores observados nos indicadores individualmente (para que os valores de todos os indicadores passem a integrar um intervalo compreendido entre 0 e 1, em que o primeiro representa a pior classificação e o último, a melhor). Na segunda etapa, os indicadores de cada uma das regiões administrativas são somados e, de sua média aritmética, resulta o valor do IDS da localidade.

Já os dados eleitorais do TSE são disponibilizados por seção eleitoral e a abrangência territorial de cada uma não é um dado público. Nicolau e Terron (2012)Nicolau, J.; Terron, S. “Uma cidade partida? As eleições para prefeito do Rio de Janeiro em 2008”. In: Anais do 8º Encontro da Associação Brasileira de Ciência Política, Gramado, 2012. consideraram os endereços das seções para agregar os dados por bairro em seu trabalho; contudo, eles pontuam as limitações desse procedimento. Como são considerados apenas os pontos das seções e não os polígonos de sua cobertura, os moradores que votam em bairros contíguos seriam desconsiderados. Pensando nisso, optamos por mitigar esse efeito considerando as regiões administrativas por se tratarem de áreas mais amplas e com um número considerável de regiões, 33 ao todo. Além disso, como estamos trabalhando com eleições proporcionais, o quantitativo de votos do candidato por bairro seria desprezível em alguns casos.

A análise geográfica é de grande relevância para os estudos políticos pois “Ela identifica como o espaço influencia as relações entre os atores políticos e as instituições a partir de dados agregados e não individuais” ( Cervi, 2019Cervi, E. U. Manual de métodos quantitativos para iniciantes em ciência política, vol. 2. Curitiba: CPOP–UFPR, 2019. , p. 222). É nesse sentido que este artigo busca fugir da falácia ecológica, na qual incorrem aqueles que desejam traduzir os resultados de dados agregados para o nível individual. As interpretações dos resultados referem-se ao território delimitado pela unidade espacial escolhida e não aos eleitores individualmente. A proposta de utilizar esses dados para delinear o perfil do eleitorado de Jair Bolsonaro pressupõe uma extrapolação capaz apenas de oferecer uma hipótese e não uma demonstração cabal.

Considerando o crescimento do candidato nas últimas eleições, trabalhamos, na análise espacial, com as eleições de 2002, 2006, 2010, 2014 e 2018. Optou-se por iniciar em 2002, pois utilizamos dados referentes aos censos demográficos de 2000 e 2010. Os dados fornecidos pelo TSE contendo a relação entre zonas e seções eleitorais e suas respectivas regiões administrativas foram adquiridos em 2017 e possuem algumas incongruências na compatibilidade entre todos os anos analisados. Havia seções que não possuíam a exata localização e outras que, dependendo do ano analisado, não existiam. Essas alterações são discriminadas na Tabela 1 . Além disso, é importante ressaltar que essa relação entre região e seção é feita a partir do endereço da seção e não da abrangência eleitoral dos domicílios; portanto, há algumas regiões onde todos os domicílios são alocados em seções fora da sua RA de moradia. Essa limitação técnica faz com que Complexo do Alemão, Jacarezinho e Maré fiquem fora da nossa análise. A região de Vigário Geral também foi retirada pois não há IDS disponível.

Tabela 1
: Relação de seções trabalhadas

A variável eleitoral para a correlação foi construída através de uma proporção simples entre os votos recebidos agrupados por RA sobre os votos válidos daquela região:

i = 1 n v b i i = 1 n v v i

em que n é o número de seções por região, vb é o número de votos recebidos por Bolsonaro e vv são os votos válidos, que são os votos nominais e os de legenda, sendo excluídos, assim, os brancos e nulos.

Foram construídas duas tabelas contendo essa proporção de votos agregados para cada uma das 28 regiões, uma referente às três eleições para deputado federal e outra referente à eleição majoritária de presidente da República. Na eleição de 2002, Bolsonaro não recebeu nenhum voto na Rocinha, portanto, foram consideradas 27 regiões nesse ano.

Esse resultado proporcional de votos por quantidade de votantes foi correlacionado, através da correlação de Pearson, com o IDS. A correlação nos ajuda a verificar se há uma associação linear entre as variáveis. Ela se dá pela seguinte fórmula:

ρ = i = 1 n ( x i x ¯ ) ( y i y ¯ ) [ i = 1 n ( x i x ¯ ) 2 ] [ i = 1 n ( y i y ¯ ) 2 ]

em que a proporção de votos é a variável dependente e o IDS (que varia de 0 a 1) é a variável independente, sendo ambas contínuas.

A análise dos resultados considera os seguintes graus e direções de associação:

  • 0,9 positivo ou negativo indica uma correlação muito forte;

  • 0,7 a 0,9 positivo ou negativo indica uma correlação forte;

  • 0,5 a 0,7 positivo ou negativo indica uma correlação moderada;

  • 0,3 a 0,5 positivo ou negativo indica uma correlação fraca;

  • 0 a 0,3 positivo ou negativo indica uma correlação desprezível.

Análise dos resultados

A eleição de 2002

A primeira eleição contemplada em nossa análise é a de 2002. Ao todo, no estado do Rio de Janeiro, Bolsonaro recebeu 88.945 votos, sendo 59.966 (67,41%) na capital fluminense. À época, o então deputado obteve votação em 27 das 28 regiões administrativas da cidade que estamos analisando, não recebendo votos na RA da Rocinha. Todavia, o candidato não alcançou a marca de 3% das votações totais em nenhum dos casos, sendo 1,61% sua média de votação. Bolsonaro superou seu desempenho médio em 13 regiões administrativas, e seu melhor desempenho eleitoral em termos proporcionais se deu na Zona Norte da cidade, região que contempla as regiões administrativas da Tijuca (2,64%), Vila Isabel (2,61%), Ilha do Governador (2,65%) e Madureira (2,57%). As exceções a essa observação foram as RAs de Copacabana (2,92%) e Realengo (2,57%), localizadas nas Zonas Sul e Oeste da cidade, respectivamente. Na Figura 1 , é possível visualizar essa distribuição dos votos. A classificação nesse mapa e nos próximos está separada em k-means 5 5 Todos os mapas do artigo foram feitos no R e o shapefile das divisões das regiões administrativas foi obtido no data.rio. Os mapas referentes às eleições têm a sua simbologia feita a partir do critério de classificação por k-means , com quatro classes. A escala cromática escolhida foi uma gradação de cor em que o tom mais claro representa uma proporção menor e o mais escuro, uma proporção maior. , tratando-se de uma forma não supervisionada de agrupamento dos dados em clusters , que, nesse caso, são quatro.

Figura 1
: Distribuição do voto em Jair Bolsonaro em 2002 por região administrativa

O levantamento do IDS de cada uma das regiões administrativas elencadas aponta para uma alocação da base eleitoral de Bolsonaro em regiões com boas posições no ranking do índice 6 6 Os mapas do IDS foram classificados com o método pretty breaks , e se trata de uma classificação por arredondamento. A escala cromática é uma gradação do vermelho, que representa os piores desempenhos, até o azul, simbolizando os melhores. . As RAs de Tijuca (0,71), Vila Isabel (0,70) e Copacabana (0,75) estão nas faixas mais altas de pontuação, e sua representação gráfica é a cor azul. A Ilha do Governador (0,62) aparece com uma pontuação menor, em uma faixa mais mediana, mas ainda em um tom claro de azul. Já as regiões de Realengo (0,55) e Madureira (0,57) aparecem em uma posição um pouco abaixo da média da cidade em 2000 (0,59). É importante reforçar, em concordância com o que apontam Santos e Noronha (2001)Santos, S. M.; Noronha, C. P. “Padrões espaciais de mortalidade e diferenciais sócio-econômicos na cidade do Rio de Janeiro”. Cadernos de Saúde Pública, vol. 17, p. 1.099-1.110, 2001. e Nicolau e Terron (2012)Nicolau, J.; Terron, S. “Uma cidade partida? As eleições para prefeito do Rio de Janeiro em 2008”. In: Anais do 8º Encontro da Associação Brasileira de Ciência Política, Gramado, 2012. , que as regiões que apresentam um IDS mais alto, como Tijuca, Vila Isabel e Copacabana, possuem um perfil identitário de classe média. Não obstante, a votação de Bolsonaro em regiões com um IDS menor não representa, necessariamente, um processo de identificação entre o candidato e as classes populares. Isso porque essas regiões se constituem, à exceção de Madureira, como espaços geográficos habitados por segmentos militares e suas famílias, tendo em vista a presença de colégios militares, centros de treinamento e organizações administrativas das Forças Armadas. Essa informação reforça a hipótese levantada de que a base eleitoral originária de Bolsonaro era composta de grupos militares e classe média.

Ao cruzarmos a variável “proporção do voto” em 2002 com o IDS de 2000, temos uma correlação de 0,64, apresentando, assim, uma associação positiva e moderada. Esse resultado demonstra que Bolsonaro obteve melhor desempenho nas regiões com maior grau de desenvolvimento na cidade, o que reforça a hipótese de que suas bases eleitorais consistiam de grupos de classe média. Realengo e outras regiões aparecem como outliers no modelo, o que indica que o IDS não é um fator forte de associação nessas áreas da cidade. Contudo, a região de Realengo merece um destaque através de uma análise mais substantiva. Ela abriga os bairros de Campo dos Afonsos, Vila Militar, Realengo, Jardim Sulacap, Magalhães Bastos e Deodoro. Davies (2020, p. 250) discorre sobre a escolha de Deodoro como grande polo das Olimpíadas de 2016 e sobre como “é importante levar em conta a presença intensa de organizações do Exército Brasileiro nesse bairro e em áreas vizinhas, condensando ali o maior aquartelamento da América Latina”. O autor também aponta Realengo como um lugar com grandes loteamentos pertencentes às Forças Armadas. Quando tiramos a RA do modelo, considerando que os militares compõem a base eleitoral originária de Bolsonaro ( Alonso, 2019Alonso, A. A comunidade moral bolsonarista. In: Abranches, S., et al. Democracia em risco? 22 ensaios sobre o Brasil hoje. São Paulo: Companhia das Letras, p. 41-56, 2019. ; Fausto, 2019Fausto, R. Depois do temporal. In: Abranches, S., et al. Democracia em risco? 22 ensaios sobre o Brasil hoje. São Paulo: Companhia das Letras, p. 116-129, 2019. ; Hunter e Power, 2019Hunter, W.; Power, T. “Bolsonaro and Brazil's illiberal backlash”. Journal of Democracy, vol. 30, nº 1, p. 68-82, 2019. ; Silva, 2022Silva, M. G. Da diferença à equivalência: hipóteses laclaunianas sobre a trajetória legislativa de Jair Bolsonaro, 2022 (no prelo). ;), a correlação passa para 0,70, tornando-se positiva e forte. Além disso, há uma diminuição no p-valor de 0,0003 para 0,0001, que indica uma melhora na significância do modelo. Esse efeito mostra que a alta proporção de votos na região de Realengo não é associada ao IDS do local, mas sim a outros fatores. Nesse sentido, nossa hipótese é a de que, mesmo sendo uma região com IDS menor que a média, caracterizando-se como um local de classe média baixa, a alta presença de militares faz com que esse seja um importante reduto eleitoral de Bolsonaro.

Nessa eleição de 2002, temos Copacabana, Tijuca e Vila Isabel como regiões com alta pontuação no IDS, que se destacaram no desempenho eleitoral de Bolsonaro. Madureira, Ilha do Governador e Realengo são regiões de grande concentração de seu eleitorado, mas que apresentam um IDS baixo; contudo, essa última tem esse resultado explicado pela presença forte de militares, o que faria com que esse fosse um determinante importante para compor a base eleitoral do candidato.

A eleição de 2006

A disputa eleitoral de 2006 apresenta um padrão de dispersão eleitoral com poucas surpresas. O quantitativo total de votos de Bolsonaro chega a 69.936 votos, distribuídos em 28 regiões administrativas, com a maior votação sendo registrada na região de Copacabana (3,65%). A média de votação por região administrativa em termos proporcionais foi de 1,92% do total, ultrapassada em 13 casos. Tijuca (3,30%), Vila Isabel (3,36%), Realengo (3,62%), Ilha do Governador (3,01%) e Madureira (3,44%) foram as regiões onde o ex-deputado obteve maior destaque na proporção de votos. Em razão da constância nas regiões administrativas e do período de análise do IDS, que compreende os anos de 2000 a 2010, o desempenho no IDS de cada uma delas pode ser verificado na subseção correspondente à eleição de 2002.

A correlação entre a eleição de 2006 e o IDS de 2000 é de 0,67, indicando, assim como em 2002, uma correlação moderada e positiva. Ou seja, há uma associação entre o nível de qualidade de vida mensurado pelo IDS – que se utiliza de indicadores sobre saneamento básico, qualidade habitacional, grau de escolaridade e disponibilidade de renda – e a proporção de votos recebidos por Bolsonaro, reforçando a tendência do candidato de conquistar votos em RAs de classe média alta, como Copacabana e Tijuca.

Repetindo o que foi feito no ano anterior e retirando a RA de Realengo do modelo, por se tratar de uma região marcada pela presença de militares, segundo a literatura, temos, para o ano de 2006, uma correlação de 0,74, tornando-se agora forte e positiva.

Nesse ano a RA com maior proporção de votos em Bolsonaro foi Realengo, superando a líder anterior de votos, Copacabana. O fato de essa região estar fora do modelo, assim como no ano anterior, torna a correlação forte e positiva, já que não se trata de uma região com grande associação entre IDS e voto.

Unidos pelo Rio – Eleição de 2010

A eleição de 2010 apresenta o primeiro indício de uma redistribuição espacial da base eleitoral de Bolsonaro. Nesse ano, a quantidade absoluta de votos para sua candidatura foi 82.524, tendo sua média de votos proporcionais por RA se estabelecido em 2,35%. Esse valor foi superado em 16 dos 28 casos em que havia dados das votações. As RAs de Copacabana (4,79%), Tijuca (4,28%), Realengo (4,12%) e Ilha do Governador (3,99%) seguem encabeçando a lista de regiões com destaque em votação proporcional, mas a Barra da Tijuca (4,19%) surge como um polo expressivo de votação. O desempenho do Bolsonaro na região supera o observado em Vila Isabel (3,98%), área que se demonstrava um reduto importante de sua base eleitoral nas eleições anteriores. A região da Barra da Tijuca é uma das áreas mais valorizadas da cidade, concentrando condomínios imobiliários de alto padrão, shoppings centers e uma população de classe média alta. Não obstante, como apontado por Alves (2008)Alves, J. C. S. Milícias: mudança na economia política do crime no Rio de Janeiro. In: Justiça Global (org.). Segurança, tráfico e milícias no Rio de Janeiro. 1ª ed. Rio de Janeiro: Justiça Global e Fundação Heinrich Böll, p. 33-36, 2008. , a região também tem sido um local de crescimento de atividades de grupos paramilitares, as milícias.

Para o ano de 2010 em diante, foi utilizado o IDS de 2010, com isso, houve algumas alterações no desempenho das regiões. O perfil das RAs de destaque da base eleitoral de Bolsonaro é alterado com o ingresso da Barra da Tijuca. Substituindo a região de Madureira, que possuía um IDS de 0,59, Barra da Tijuca figura com um alto desempenho de 0,67. Em razão dessa alteração, entre as seis áreas com maior votação proporcional para sua candidatura, cinco pontuam acima da média da cidade (0,61): Copacabana (0,73), Barra da Tijuca (0,67), Tijuca (0,69), Vila Isabel (0,67) e Ilha do Governador (0,62). A região de Realengo se consolidou como única região com pontuação inferior à média, 0,57, mas já tendo esse comportamento explicado anteriormente pela presença de militares, uma estável base eleitoral de Bolsonaro.

A entrada da Barra da Tijuca entre as regiões com destaque na proporção de votos para o candidato contribui para o aumento dessa associação, já que se trata de uma região com um IDS elevado, formado por uma classe média alta. O coeficiente de correlação para esse ano foi 0,72, a associação mais forte entre todos os anos analisados. Ao retirarmos Realengo do modelo, essa correlação vai para 0,78, indicando como Realengo é uma área que, de forma consistente, não tem o IDS associado ao voto.

A eleição de 2010 marca a entrada da Barra da Tijuca como um território de grande expressão de votos em Bolsonaro. Esse é o ano de associação mais forte entre IDS e proporção dos votos, ou seja, as regiões com uma qualidade de vida mais elevada, caracterizando-se como de classe média alta, compõem de forma mais determinante a base eleitoral de Bolsonaro.

“Somos todos Brasil” – Eleição de 2014

Essa eleição demarca um momento de expansão das bases eleitorais de Jair Bolsonaro, em termos absolutos e proporcionais, além de ser um momento de reformulação dos padrões de dispersão geográfica de seus votos no mapa do município. Sua candidatura para deputado federal recebeu 249.604 votos no município e obteve uma média de participação nas regiões administrativas correspondente a 8,06% dos votos. As alterações mais evidentes dessa eleição são a inserção da região administrativa do Méier (10,51%) nos destaques de voto e a saída de Copacabana (10,28%).

As alterações no padrão de distribuição espacial do voto em Bolsonaro apontam para uma tendência de penetração de seu discurso em regiões menos desenvolvidas do município. Assim como a Ilha do Governador, a região administrativa do Méier apresenta uma pontuação pouco expressiva no IDS (0,62), quase abaixo da média da cidade para o IDS 2010 (0,60), enquanto Copacabana, substituída por aquela, possuía uma pontuação de 0,73. É importante ressaltar, no entanto, que a ascensão da RA do Méier na lista de votação não significa uma queda na adesão da população de Copacabana. Ao contrário, ambas as regiões apresentaram crescimento expressivo, tendo o Méier apenas crescido de maneira mais significativa.

Isso demonstra que a eleição de 2014 é o momento em que a base eleitoral do então deputado federal deixa de se concentrar em RAs de classe média (e militares), demarcando um processo de expansão em direção a segmentos econômica e socialmente menos favorecidos da população.

Nesse ano, o coeficiente de correlação foi 0,57 e a retirada da RA de Realengo do modelo levou a correlação para 0,61, continuando moderada e positiva. Foram os menores coeficientes encontrados nas eleições proporcionais, indicando uma tendência da base eleitoral de ir se diluindo em outras áreas que não apresentam um IDS alto. Esse também é o primeiro ano em que a Barra da Tijuca supera Copacabana, tornando-se um importante território para o crescimento de Bolsonaro.

A eleição de 2014 marca uma grande expansão dos votos em Bolsonaro e também uma queda no grau de associação entre voto e IDS. A Barra da Tijuca aparece como a região com maior proporção de votos, título que conserva também em 2018. É a primeira eleição, entre os quatro pleitos proporcionais, em que a retirada da RA de Realengo não é suficiente para a associação se tornar forte, por conta da ampliação dessa base eleitoral e de ela não estar particularmente centrada em regiões de classe média alta.

“Brasil acima de tudo e Deus acima de todos” – Eleição de 2018

A eleição de 2018 é o primeiro pleito da trajetória política de Bolsonaro direcionado a um cargo do Poder Executivo. Como era esperado, a alteração de uma disputa proporcional para uma disputa majoritária de nível nacional modificou fortemente a dinâmica eleitoral. Em razão das especificidades dessa nova modalidade de disputa, optamos por utilizar os dados referentes ao primeiro turno. Estes são mais associados a uma identificação entre eleitor e candidato do que os dados do segundo turno, que frequentemente se constituem como um voto de negação ou protesto ao outro candidato.

A distribuição dos votos para a chapa bolsonarista nessa eleição apresenta um comportamento bastante uniforme. A média de votos em termos proporcionais foi de 55,60% de aprovação, valor superado em 15 das 28 RAs. A Zona Norte, que compreende as RAs da Tijuca (49,38%), Madureira (62,36%), Ilha do Governador (61,91%) e Vila Isabel (48,73%), um antigo reduto eleitoral de Bolsonaro, obteve menos destaque do que a Zona Oeste, que engloba as RAs da Barra da Tijuca (62,56%), Campo Grande (67,32%), Santa Cruz (64,32%), Guaratiba (63,81%), Jacarepaguá (61,70%) e Realengo (59,57%). Essa região foi responsável pelas três maiores votações para a chapa de Bolsonaro no município em termos proporcionais e absolutos.

Nessa eleição, que apresenta uma correlação de –0,53, a associação é pela primeira vez negativa, ou seja, a proporção do voto aumenta à medida que o IDS decresce. Como são eleições de natureza distinta, a correlação desse pleito foi feita sem o objetivo de comparação com os outros.

Mesmo sem a comparação, vale destacar que Realengo se mostrou um reduto eleitoral consistente em todas as eleições analisadas. As regiões localizadas na Zona Oeste do Rio de Janeiro, como um todo, tiveram um papel de destaque. A Barra da Tijuca continua como o lugar com maior proporção de votos e Campo Grande aparece na sequência, seguido de Realengo.

Debruçar-se sobre a espacialização do voto em Bolsonaro no ano de 2018 revela um dado relevante do contexto eleitoral do município. Como apontado por Alkmin (2014), entre as eleições presidenciais de 1989 e 2010, as regiões periféricas do Rio de Janeiro representaram um território mais receptivo às candidaturas de esquerda do que às de direita. É importante demarcar que, embora as contribuições do autor tenham como base as zonas eleitorais em divergência das RAs adotadas neste artigo, suas descobertas contribuem para delinear a mudança de posicionamento da periferia da cidade. Sobretudo em zonas que englobam as RAs que garantiram altas porcentagens de votos a Jair Bolsonaro em 2018, como Campo Grande, Realengo e Santa Cruz, o padrão que se observou durante o período explorado demarcava uma preferência por candidatos associados ao espectro político da esquerda, mesmo que em graus variáveis.

Considerações finais

A análise dos dados eleitorais dos pleitos observados em cada uma das RAs do município do Rio de Janeiro revela um processo de expansão dos territórios eleitorais de Jair Bolsonaro, que se inaugura já nas eleições de 2010 com a inserção da Barra da Tijuca em seu cenário de destaque eleitoral, mas se intensifica de maneira expressiva em 2014. Tendo mantido seu desempenho relativamente constante entre 1992 e 2010, é no pleito de 2014 que Bolsonaro apresenta o crescimento mais marcante de sua trajetória eleitoral no Legislativo. Dessa maneira, demarca-se que o ínterim entre os pleitos de 2010 e 2014 constituiu um contexto social profícuo para a expansão do bolsonarismo, ao menos na capital fluminense. Esse crescimento, como apresentado nas análises da espacialização do voto nos pleitos de 2002, 2006, 2010 e 2014, foi impulsionado pela incorporação de RAs periféricas e com menor grau de desenvolvimento social.

Como se buscou demonstrar neste artigo, a ampliação geográfica da base eleitoral de Jair Bolsonaro em direção às RAs periféricas é um indicativo de que seu crescimento eleitoral se formulou a partir de um processo de inclusão de novos segmentos sociais ao seu núcleo de apoio e não apenas pela ampliação do apoio dentro dos segmentos originalmente associados à sua base. A mobilização do IDS como ferramenta analítica se mostrou relevante para que pudéssemos auferir uma análise capaz de ultrapassar os possíveis vieses criados por uma observação restrita à dimensão da renda. Especialmente no complexo contexto espacial carioca, que apresenta frequentes enclaves de populações de baixa renda em regiões predominantemente ricas, ampliar o escopo dos indicadores para além da renda se mostrou necessário. Para esse fim, o IDS se provou uma ferramenta valiosa, uma vez que aprofunda a compreensão do contexto social em que a população está inserida, analisando o acesso a diversos aspectos da infraestrutura pública e privada.

Originalmente associada a um perfil eleitoral de classe média, situada principalmente nas regiões próximas ao centro da cidade, a expansão da base eleitoral de Bolsonaro foi capitaneada pela incorporação de RAs menos desenvolvidas e localizadas na periferia. É importante demarcar, no entanto, que, diferente do que foi observado com Lula em 2006, a incorporação de segmentos econômicos menos favorecidos não representou uma ruptura com as classes média e alta que compunham seu eleitorado. Ao contrário, apesar de apresentar crescimento variável ao redor das RAs, Bolsonaro melhorou seu desempenho em todas. Por outro lado, acreditamos que essa expansão se deu dentro de um perfil identitário de classe média, atingindo setores das classes populares afetados positivamente pelo processo de mobilidade social instaurado ao longo das administrações petistas. Embora não tenhamos evidências para sustentar essa afirmação, uma vez que trabalhamos com dados agregados, acreditamos que esse eleitor tardio (pós-2010) de Jair Bolsonaro, embora de origem popular, rejeita esse pertencimento de classe, identificando-se com as camadas médias.

De todo modo, a ascensão de um sujeito político à posição de presidente da República nunca é um fenômeno unidimensional. O esforço empreendido neste artigo buscou contribuir e somar-se às análises que privilegiam os fatores socioeconômicos que caracterizaram o crescimento de sua base eleitoral. Não obstante, como apontado anteriormente, sobretudo no que se refere ao período entre 2010 e 2014, há ainda um amplo campo a ser explorado acerca dos componentes discursivos que propiciaram a caracterização de Bolsonaro como uma figura pop , principalmente nas mídias sociais.

Figura 2
: Índice de Desenvolvimento Social de 2000 por região administrativa na cidade do Rio de Janeiro

Figura 3
: Dispersão entre votos de 2002 e IDS de 2000

Figura 4
: Distribuição do voto em Jair Bolsonaro em 2006 por região administrativa

Figura 5
: Dispersão entre votos de 2006 e IDS de 2000

Figura 6
: Distribuição do voto de Jair Bolsonaro em 2010 por região administrativa

Figura 7
: Índice de Desenvolvimento Social de 2010 por região administrativa na cidade do Rio de Janeiro

Figura 8
: Dispersão entre votos de 2010 e IDS de 2010

Figura 9
: Distribuição do voto em Jair Bolsonaro em 2014 por região administrativa

Figura 10
: Dispersão entre votos de 2014 e IDS de 2010

Figura 11
: Distribuição do voto em Jair Bolsonaro em 2018 por região administrativa

Figura 12
: Dispersão entre votos de 2018 e IDS de 2010

Anexo 1
Anexos

Votação absoluta e relativa de Jair Bolsonaro para os cargos de deputado federal (2002-2014) e presidente (2018) no estado e município do Rio de Janeiro e regiões administrativas da cidade


Anexo 2
: Coeficientes de correlação e p-value da proporção de votos do ano da eleição com o Índice de Desenvolvimento Social

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  • 4
    Em 15 de maio de 2018, o TSE aprovou a mudança da designação do partido de PMDB para MDB.
  • 5
    Todos os mapas do artigo foram feitos no R e o shapefile das divisões das regiões administrativas foi obtido no data.rio. Os mapas referentes às eleições têm a sua simbologia feita a partir do critério de classificação por k-means , com quatro classes. A escala cromática escolhida foi uma gradação de cor em que o tom mais claro representa uma proporção menor e o mais escuro, uma proporção maior.
  • 6
    Os mapas do IDS foram classificados com o método pretty breaks , e se trata de uma classificação por arredondamento. A escala cromática é uma gradação do vermelho, que representa os piores desempenhos, até o azul, simbolizando os melhores.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    16 Fev 2021
  • Aceito
    12 Jan 2022
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