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Compreendendo a Prática da Deliberação em uma Controladoria sob a Perspectiva do Julgamento Performativo

Resumo

Bispo (2015)Bispo, M. S. (2015). Methodological reflections on practice-based research in organization studies. BAR, 12(3), 309-323. doi:10.1590/1807-7692bar2015150026

prática; controladoria; deliberação; julgamento performativo; orçamento

Abstract

This research analyzed deliberation practice in a controllership, mainly the decision to replace a given budgetary practice by another, in light of performative judgements, in a big-sized company in São Paulo City, between 2017 and 2020. The research followed the interpretative design, and adopted the research-action strategy. Participatory observation, in-depth interviews (initial research stage) and documental analyses were the techniques applied to find evidences. The field zooming in and zooming out movements were used to describe the elements featuring this practice, by switching the theoretical lens to better understand the whole and the elements composing it. Data analysis followed the framework proposed by Bispo (2015). We have found four fragments of practices encompassing the material arrangements where deliberation takes place: financial management practice, accounting management practice, expense management practice and information technology management practice. Different from the accountability management mainstream, which assumes rationality driven by economic aims, we have observed that deliberation in the assessed controllership is boosted by the “rationality of becoming” as permanent flow. Such a rationality is collectively built due to practical wisdom and to the ability of making practical decisions that form wisdom and practical judgements. It simultaneously shows its fragility in comparison to what is expected from the economic paradigm, as well as its richness, by encompassing the pluralism and dynamics of the context it is inserted in.

practice; controllership; deliberation; performative judgement; budget

Introdução

A tomada de decisão organizacional pode ser compreendida como um processo racional ( Hodgkinson & Starbuck, 2008Hodgkinson, G. P., Starbuck, W. H. (Eds.) (2008). The Oxford handbook of organizational decision making. Oxford: Oxford University Press. ; March, 1978)March, J. G. (1978). Bounded rationality, ambiguity, and the engineering of choice. The Bell Journal of Economics, 9(2), 587-608. doi:10.2307/3003600
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com consequências abrangentes sobre o desempenho organizacional ( Dean & Sharfman, 1996Dean, J. W., Jr., & Sharfman, M. P. (1996). Does decision process matter? A study of strategic decision-making effectiveness. Academy of Management Journal, 39(2), 368-392. doi:10.5465/256784 ; Fredrickson, 1984)Fredrickson, J. W. (1984). The comprehensiveness of strategic decision processes: extension, observations, future directions. Academy of Management Journal, 27(3), 445-466. doi:10.5465/256039
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. Alguns exemplos de decisões nas organizações são: comprar de um determinado fornecedor em vez de outro, vender determinado produto para um cliente específico, investir em um equipamento para aumento de produtividade, adquirir uma empresa concorrente, utilizar determinada técnica de gestão em vez de outra.

Sob a ótica econômica, tais decisões levam em conta a capacidade de calcular, não necessariamente como nas operações matemáticas, mas “estabelecendo distinções entre coisas ou estados do mundo, e imaginando e estimando cursos de ação associados a essas coisas ou a esses estados, bem como suas consequências” ( Callon & Muniesa, 2005Callon, M., Muniesa, F. (2005). Peripheral vision: economic markets as calculative collective devices. Organization Studies, 26(8), 1229-1250. doi:10.1177/0170840605056393 , p. 1231). Essa capacidade, em forma de processo, decorre das seguintes etapas: (a) identificar o número finito de entidades que fazem parte de um dado processo, desanexando-as de seus contextos reais e colocando-as em um amplo e único contexto, em que são comparadas e manipuladas, com base em princípios operacionais comuns; (b) avaliar as possibilidades mais vantajosas decorrentes de suas combinações, associações ou adaptações; e (c) por fim, como resultado do cálculo, obtém-se uma entidade que não é nova, no sentido de surgir do nada, mas que corresponde “precisamente às manipulações efetuadas no espaço calculativo, e, consequentemente, vincula (soma) as entidades levadas em consideração” ( Callon & Muniesa, 2005, pCallon, M., Muniesa, F. (2005). Peripheral vision: economic markets as calculative collective devices. Organization Studies, 26(8), 1229-1250. doi:10.1177/0170840605056393 , p. 1231).

Essa visão positivista advinda do paradigma econômico se tornou o mainstream em diversas áreas do conhecimento. A contabilidade gerencial (CG), entendida como uma extensão da contabilidade financeira, trata das atividades internas das empresas, e é imprescindível ao processo de decisão sobre sua gestão e operação ( Anthony, 1979Anthony, R. N. (1979). Accounting, text and cases. Homewood: Irwin. ; Lima, Espejo, Pereira, & Frezatti, 2011). O paradigma econômico considera as práticas de contabilidade gerencial (PCG), instrumentos utilizados para facilitar o alcance de seus objetivos, como o orçamento empresarial, sistemas de custeio, balanced scorecard , entre outros ( Espejo, 2008Espejo, M. M. S. B. (2008). Perfil dos atributos do sistema orçamentário sob a perspectiva contingencial: uma abordagem multivariada (Tese de Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo, SP. ; Souza, Lisboa, & Rocha, 2003).

Assim, essas práticas são compreendidas como realidades tangíveis (ferramentas) nas organizações, com papéis claros e objetivos previamente estabelecidos. A controladoria é a área funcional responsável por estruturar e difundir o sistema de informações (SI) e as PCG, para apoiar o processo de decisão (Lunkes, Schnorrenberger, Gasparetto, & Vicente, 2009). Sob esse paradigma, a controladoria tem por missão assegurar a otimização do resultado econômico da organização, coordenando e integrando as ações de todos os gestores e gerenciando os SI associados ao desempenho econômico organizacional ( Pereira, 2011)Pereira, A. A. (2011). Gestão Econômica. In C. Parisi, E. Magliorini (Orgs.), Contabilidade Gerencial (pp. 191-238). São Paulo, SP: Atlas. . As PCG são escolhidas criteriosamente, relacionadas a objetivos, estratégias e planos, para auxiliar a gestão do desempenho organizacional, visando melhores resultados ( Otley, 1999)Otley, D. (1999). Performance management: a framework for management control systems research. Management Accounting Research, 10(4), 363-382. doi:10.1006/mare.1999.0115
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.

O foco no paradigma econômico em CG e em controladoria é comum atualmente, como mostram recentes pesquisas que buscaram estabelecer relações causais entre a utilização de PCG e: a posição das organizações em mercados globais ( Gonçalves & Gaio, 2021Gonçalves, T., Gaio, C. (2021). The role of management accounting systems in global value strategies. Journal of Business Research, 124, 603-609. doi:10.1016/j.jbusres.2020.10.059 ); o desenvolvimento de estratégias de diferenciação ( Pasch, 2019)Pasch, T. (2019). Strategy and innovation: the mediating role of management accountants and management accounting systems’ use. Journal of Management Control, 30(2), 213-246. doi:10.1007/s00187-019-00283-y
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; o desenvolvimento de estratégias de inovação; e o desempenho financeiro das empresas (Hariyati, Tjahjadi, & Soewarno, 2019).

Entretanto, esses estudos negligenciam a “análise das condições sociotécnicas que permitem a construção de decisões racionais – conforme definidas na teoria da escolha racional – dentro de contextos organizacionais” (Cabantous, Gond, & Johnson-Cramer, 2010, p. 1532), pois consideram a racionalidade como uma propriedade que as organizações possuem ou não, submetem os aspectos normativos das escolhas à dimensão econômica, e enfatizam o processo de decisão, e “não as práticas concretas dos tomadores de decisão organizacionais”, que utilizam artefatos materiais para incorporar concepções racionais à tomada de decisão ( Cabantous et al., 2010, pCabantous, L., Gond, J. P., Johnson-Cramer, M. (2010). Decision theory as practice: crafting rationality in organizations. Organization Studies, 31(11), 1531-1566. doi:10.1177/0170840610380804 , p. 1532).

Buscando maior reflexividade, escolhemos uma abordagem dos estudos organizacionais, que permite evidenciar como a prática da deliberação acontece nas empresas ( Duarte & Alcadipani, 2016Duarte, M. F., Alcadipani, R. (2016). Contribuições do organizar (organizing) para os estudos organizacionais. Organizações & Sociedade, 23(76), 57-72. doi:10.1590/1984-9230763
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). Para tanto, abandonamos a ideia da organização sólida, com fronteiras delimitadas, racionalidade econômica e clareza de objetivos, para investigar como a decisão organizacional emerge em decorrência das atividades desenvolvidas pelos indivíduos, a partir de seus conhecimentos, e dos artefatos materiais existentes em dado contexto social. Adotamos abordagens baseadas no conceito de prática, pois não se limitam a classificações espaciais e temporais ( Nicolini, 2009)Nicolini, D. (2009). Zooming in and out: studying practices by switching theoretical lenses and trailing connections. Organization Studies, 30(12), 1391-1418. doi:10.1177/0170840609349875
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e possibilitam compreender que para que “uma prática aconteça” ( Schatzki, 2006, pSchatzki, T. R. (2006). On organizations as they happen. Organization Studies, 27(12), 1863-1873. doi:10.1177/0170840606071942
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, p. 1872), são necessárias: a existência de estruturas da prática (entendimentos, regras, estrutura teleoafetiva e entendimentos gerais); e os arranjos materiais (cenários em que as práticas ocorrem, envolvendo coisas e pessoas) em que elas estão situadas, que também precisam acontecer ( Schatzki, 2002, 20Schatzki, T. R. (2002). The site of the social: a philosophical account of the constitution of social life and change. University Park: Penn State Press. , 2006Schatzki, T. R. (2006). On organizations as they happen. Organization Studies, 27(12), 1863-1873. doi:10.1177/0170840606071942
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).

A prática estudada foi a da deliberação na controladoria, especificamente a decisão de substituir uma prática orçamentária por outra . Os eventos que caracterizaram as decisões ocorreram entre 2017 e 2020, com quatro momentos específicos: (a) o início, em 2017, quando a organização adotava a prática do orçamento convencional (OC) há mais de dez anos, mas pensava substituí-la por outra, conhecida como orçamento matricial (OM), e decidiu fazê-lo; (b) em 2018, a contratação e capacitação de novos gestores e a preparação da infraestrutura para a adoção do OM em 2019; (c) em 2019, a adoção do OM e sua prática por um ano, e ao final daquele ano, a decisão de retornar à prática do OC; e (d) em 2020, o retorno à prática original (OC). A ocorrência dessas decisões ao longo do período envolvido chama a atenção, pois envolveu mudanças que costumam causar ansiedade e insegurança, demandam empenho dos envolvidos, e, sobretudo, acarretam investimentos, geralmente expressivos.

A pesquisa foi feita em uma empresa de eletrodomésticos de grande porte, situada no estado de São Paulo, gerenciada pela segunda geração de uma família de empreendedores, aqui denominada ABC, para assegurar sua confidencialidade. O estudo compreendeu o departamento de controladoria da ABC e seu relacionamento com os diversos gestores dos departamentos que utilizam a prática orçamentária.

A modalidade orçamentária mais utilizada no Brasil é o OC ( Lunkes, 2003Lunkes, R. J. (2003). Contribuição à melhoria do processo orçamentário empresarial (Tese de Doutorado). Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC. ). Entretanto, o OM, modalidade desenvolvida no país e ainda objeto de poucas pesquisas acadêmicas ( Bartilotti, 2006Bartilotti, V. F. (2006). O orçamento matricial e o controle de gastos fixos: estudo de caso de uma empresa de telecomunicações (Dissertação de mestrado profissional). Faculdade de Estudos Administrativos de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG. ; Nogueira, Waller, & Ramos, 2012; Padoveze & Taranto, 2009)Padoveze, C. L., Taranto, F. C. (2009). Orçamento empresarial: novos conceitos e técnicas. London: Pearson. , é indicado frequentemente pelas grandes empresas de consultoria e pela mídia voltada aos executivos, como sendo mais efetiva para a gestão de custos e despesas do que o OC, sobretudo quando é necessário maior rigor no controle.

A lente teórica utilizada foi a dos julgamentos performativos. Diferentemente do julgamento com base no pensamento racional, aquele pode ser compreendido como uma prática contínua para apoiar a tomada de decisões e resolver problemas complexos, por meio de um processo que contribui com a compreensão da dinâmica organizacional, em vez de prescrever soluções corretas ( Bispo, 2017Bispo, M. S. (2017). Educating qualitative researchers in management: toward performative judgements. Revista de Administração de Empresas, 57(2), 158-169. doi:10.1590/s0034-759020170205 ).

Com base no exposto, esta pesquisa foi norteada pela seguinte questão: quais são as contribuições dos julgamentos performativos para compreender a prática da deliberação em uma controladoria para além da visão racional e econômica dominante nos estudos de contabilidade gerencial?

Assim, a pesquisa teve por objetivo geral analisar a prática da deliberação em uma controladoria, especificamente quanto à decisão de substituir uma prática orçamentária por outra, à luz dos julgamentos performativos, em uma organização empresarial de grande porte em São Paulo, no período de 2017 a 2020.

Este artigo mostra a prática da deliberação em uma área fortemente associada à racionalidade econômica, a controladoria, como resultante de um intrincado conjunto de práticas de gestão que visam assegurar “um mínimo de coordenação geral e controle de diversas práticas produtivas primárias, que contêm forças centrífugas muito poderosas empurrando na direção de uma complexidade e fragmentação ainda maior” ( Reed, 1984Reed, M. I. (1984). Management as a social practice. Journal of Management Studies, 21(3), 273-285. doi:10.1111/j.1467-6486.1984.tb00411.x , p. 281), e utilizam artefatos (planilhas, sistemas de computador, comunicações por e-mail) ( Schatzki, 2002Schatzki, T. R. (2002). The site of the social: a philosophical account of the constitution of social life and change. University Park: Penn State Press. , 2006Schatzki, T. R. (2006). On organizations as they happen. Organization Studies, 27(12), 1863-1873. doi:10.1177/0170840606071942
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) para tomar distintas pequenas decisões. Essa combinação de elementos, como em um caleidoscópio, revela o devir da racionalidade organizacional, simultaneamente evidenciando sua fragilidade, quando comparada ao esperado no paradigma econômico, e sua riqueza, por contemplar o pluralismo e a dinâmica dos contextos em que se insere.

Compreendendo a controladoria e as práticas de contabilidade gerencial sob a perspectiva do paradigma econômico

A controladoria pode ser compreendida como um ramo do conhecimento responsável pelo estabelecimento da base conceitual necessária para a modelagem, construção e manutenção dos SI voltados à gestão econômico-financeira nas empresas; e um órgão administrativo, que responde pela implementação desses sistemas e por sua difusão na organização (Almeida, Parisi, & Pereira, 2001). Os SI são parte central das controladorias, e demandam infraestrutura tecnológica composta por sistemas, processos e softwares . Existem diversas práticas, denominadas práticas de contabilidade gerencial (PCG), com as quais os gestores obtêm informações e intervêm, por meio de decisões, para atingir seus objetivos ( Espejo, 2008Espejo, M. M. S. B. (2008). Perfil dos atributos do sistema orçamentário sob a perspectiva contingencial: uma abordagem multivariada (Tese de Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo, SP. ; Souza et al., 2003)Souza, M. A., Lisboa, L. P., Rocha, W. (2003). Práticas de contabilidade gerencial adotadas por subsidiárias brasileiras de empresas multinacionais. Contabilidade & Finanças, 14(32), 40-57. doi:10.1590/s1519-70772003000200003
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.

O mainstream da CG considera que a controladoria contém o conhecimento proveniente do conjunto de práticas, como sistemas de custeio, custeio baseado em atividades, orçamento empresarial, e balanced scorecard . Quando essas práticas são usadas de forma sistemática para o alcance de objetivos organizacionais, passam a ser consideradas sistemas de contabilidade gerencial, ou, mais frequentemente, sistemas de controle gerencial – SCG ( Management Control Systems – MCS) ( Chenhall, 2003Chenhall, R. H. (2003). Management control systems design within its organizational context: findings from contingency-based research and directions for the future. Accounting, Organizations and Society, 28(2-3), 127-168. doi:10.1016/s0361-3682(01)00027-7 ).

A compreensão sobre SCG vem mudando ao longo do tempo. Os primeiros relatos, nos Estados Unidos, datam de 1832, e consideravam as pessoas como recursos calculáveis (Ezzamel, Hoskin, & Macve, 1990). Atualmente, as pesquisas têm visado estabelecer relações causais entre a utilização de PCG e SCG, e a obtenção de benefícios econômicos para as organizações. Em síntese, a CG considera PCG como realidades tangíveis (ferramentas), presentes nas organizações com papéis claros e objetivos previamente estabelecidos, apesar das diferenças encontradas em seu uso e desempenho em diferentes organizações e países. Entre as PCG mais utilizadas no Brasil, o orçamento empresarial está em primeiro lugar (Souza, Russo, & Guerreiro, 2020).

O orçamento empresarial é uma PCG usada em associação com diversas outras, como contabilidade por responsabilidade, avaliação de desempenho, alocação de recursos, planejamento e coordenação de atividades, e motivação de funcionários ( Lunkes, 2007Lunkes, R. J. (2007). Manual de Orçamento (2a ed.). São Paulo, SP: Atlas. ). Também pode ser considerada um meio de exprimir a conformidade com as normas sociais (Covaleski, Evans, Luft, & Shields, 2003), uma vez que seu uso estabelece um acordo em relação aos objetivos e metas operacionais e financeiras. Por seu intermédio, pode-se estabelecer o plano financeiro decorrente da implementação da estratégia, associando gastos e receitas à estrutura funcional, e criar uma base de comprometimento dos gestores para o alcance de metas ( Frezatti, 2015)Frezatti, F. (2015). Orçamento empresarial: planejamento e controle gerencial (6a ed.). São Paulo, SP: Atlas. .

O orçamento, aqui chamado de convencional (OC), é utilizado há várias décadas por muitas organizações ( Frezatti, 2015Frezatti, F. (2015). Orçamento empresarial: planejamento e controle gerencial (6a ed.). São Paulo, SP: Atlas. ; Lunkes, 2007Lunkes, R. J. (2007). Manual de Orçamento (2a ed.). São Paulo, SP: Atlas. ; Welsch, 1994Welsch, G. (1994). Orçamento empresarial (5a ed.). São Paulo, SP: Atlas. ). Todavia, também sofre críticas de alguns pesquisadores e usuários, por ser considerado uma metodologia inflexível que impede a alocação adequada de recursos ( Holpe & Fraser, 2003Holpe, J., Fraser, R. (2003). Beyond budgeting: How managers can break free from the annual performance trap. The summary in brief. Busy Executive, 25(9), 21-25. doi:10.5860/choice.41-2908 ; Hansen, Otley, & Van der Stede, 2003), e dificulta a associação das ações estratégicas com os planos financeiros e com os processos de negócio (Nelly, Bourne, & Adams, 2003); alguns recomendam, inclusive, deixar de usá-lo ( Holpe & Fraser, 2003)Holpe, J., Fraser, R. (2003). Beyond budgeting: How managers can break free from the annual performance trap. The summary in brief. Busy Executive, 25(9), 21-25. doi:10.5860/choice.41-2908 . Há evidências de que o orçamento influencia o processo de gestão, principalmente em três macrofunções – planejamento, alocação de recursos, e avaliação de desempenho – atuando como mediador entre as variáveis externas à organização (ameaças e oportunidades) e seu funcionamento interno (Becker, Mahlendorf, Schäffer, & Thaten, 2016).

Quanto ao OM, é uma metodologia desenvolvida no Brasil, com evidências de seu uso inicial na Ambev nos anos 1990, e que tem como elementos centrais: a gestão matricial, o benchmarking , o orçamento base zero (OBZ), e a técnica PDCA ( Plan, do, check, act ). Tem sido apresentado como alternativa ao OC ( Bartilotti, 2006Bartilotti, V. F. (2006). O orçamento matricial e o controle de gastos fixos: estudo de caso de uma empresa de telecomunicações (Dissertação de mestrado profissional). Faculdade de Estudos Administrativos de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG. ; Nogueira et al., 2012Nogueira, R. A., Waller, F. F., Ramos, F. M. (2012). Gestão matricial de despesas. Nova Lima, MG: Cymo Tecnologia em Gestão. ; Padoveze & Taranto, 2009Padoveze, C. L., Taranto, F. C. (2009). Orçamento empresarial: novos conceitos e técnicas. London: Pearson. ), sobretudo por grandes empresas de consultoria empresarial. Ele intensifica o processo de prestação de contas ( accountability 1 1 . Accountability: dever ou obrigação de prestar contas; responsabilidade pela prestação de contas ( Castro, 2013 ). ), pois introduz uma dimensão adicional de controle (gestão por pacotes – grupos de contas contábeis por similaridade), comparativamente ao OC, em que os gastos são acompanhados com base em áreas de responsabilidade (centros de responsabilidade, que no OM são denominados entidades). Tal configuração possibilita que gestores de entidades e de pacotes atuem em sobreposição, contínua e simultaneamente, para atingir as metas estabelecidas ( Bartilotti, 2006Bartilotti, V. F. (2006). O orçamento matricial e o controle de gastos fixos: estudo de caso de uma empresa de telecomunicações (Dissertação de mestrado profissional). Faculdade de Estudos Administrativos de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG. ; Nogueira et al., 2012Nogueira, R. A., Waller, F. F., Ramos, F. M. (2012). Gestão matricial de despesas. Nova Lima, MG: Cymo Tecnologia em Gestão. ; Padoveze & Taranto, 2009)Padoveze, C. L., Taranto, F. C. (2009). Orçamento empresarial: novos conceitos e técnicas. London: Pearson. .

O processo de elaboração do OM ocorre em seis etapas: (a) Preparação da base orçamentária – removendo rateios que possam dificultar o controle dos gastos; (b) Identificação dos pacotes (como ocorre o gasto) e entidades (onde ocorre o gasto) – caracterizando a forma de fazer as análises dos gastos; (c) Preparação das metas – decorrentes inicialmente dos benchmarking 2 2 . Benchmark: referência (termo já incorporado ao jargão econômico e administrativo brasileiro). Benchmarking é o processo de comparar o desempenho de empresas que se destacam em determinada área ou atividade, usando-as como padrão ( Castro, 2013 ). internos, e depois externos; (d) Definição das metas corporativas – processo top-down 3 3 . Top-down , no contexto desta pesquisa, uma ação impositiva por parte dos líderes sobre os liderados. que afeta diretamente gestores de entidades em um primeiro momento, e depois os gestores de pacotes; (e) Negociação e consolidação do orçamento – processo bottom-up 4 4 . Bottom-up , no contexto desta pesquisa, iniciativas dos liderados dirigidas aos seus líderes. , com o propósito de promover ajustes entre a alta e a média gerências; e (f) Controle orçamentário – processo contínuo de acompanhamento (metas versus real) e formulação de planos de ação que levem à correção dos desvios ( Bartilotti, 2006Bartilotti, V. F. (2006). O orçamento matricial e o controle de gastos fixos: estudo de caso de uma empresa de telecomunicações (Dissertação de mestrado profissional). Faculdade de Estudos Administrativos de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG. ; Nogueira et al., 2012Nogueira, R. A., Waller, F. F., Ramos, F. M. (2012). Gestão matricial de despesas. Nova Lima, MG: Cymo Tecnologia em Gestão. ; Padoveze & Taranto, 2009Padoveze, C. L., Taranto, F. C. (2009). Orçamento empresarial: novos conceitos e técnicas. London: Pearson. ).

O processo do OM confere maior capacidade de prestação de contas ao acompanhamento orçamentário ( accountability) . Porém, em função da sobreposição dos controles, adiciona maior potencial de conflito, pois um gestor de entidade precisa, muitas vezes, negociar com diversos gestores de pacotes, e isso aumenta a pressão sobre suas decisões. Portanto, não se recomenda a utilização dessa prática para organizações que tenham dificuldade de gerenciar conflitos ( Bartilotti, 2006Bartilotti, V. F. (2006). O orçamento matricial e o controle de gastos fixos: estudo de caso de uma empresa de telecomunicações (Dissertação de mestrado profissional). Faculdade de Estudos Administrativos de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG. ; Nogueira et al., 2012Nogueira, R. A., Waller, F. F., Ramos, F. M. (2012). Gestão matricial de despesas. Nova Lima, MG: Cymo Tecnologia em Gestão. ; Padoveze & Taranto, 2009Padoveze, C. L., Taranto, F. C. (2009). Orçamento empresarial: novos conceitos e técnicas. London: Pearson. ).

Apesar de conhecido desde os anos 1990, trabalhos científicos sobre OM ainda são escassos, sendo mais frequentes em dissertações de mestrado e artigos apresentados em congressos ( Bartilotti, 2006Bartilotti, V. F. (2006). O orçamento matricial e o controle de gastos fixos: estudo de caso de uma empresa de telecomunicações (Dissertação de mestrado profissional). Faculdade de Estudos Administrativos de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG. ; Magalhães, 2009Magalhães, A. R. (2009). Aplicação do orçamento matricial para redução de custos de terceirização em uma empresa (Dissertação de mestrado profissional). Universidade de Taubaté, Taubaté, SP. ; Sampaio, Peterli, Vallim, & Vallim, 2016; Wanzuit, 2009)Wanzuit, D. R. D. (2009). Proposta de uma sistemática de apoio à implementação do orçamento matricial: o caso de uma indústria de alimentos (Dissertação de mestrado profissional). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS. . Os principais atributos do OM identificados nesses trabalhos são o auxílio ao processo de tomada de decisão e ao estabelecimento de planos de ação; a contribuição para a melhoria dos controles; o suporte à alocação dos recursos; e a influência sobre o comportamento das pessoas que o utilizam, pois trabalha com objetivos e metas a atingir, que aumentam a efetividade do trabalho ( Argyris, 1952Argyris, C. (1952). The impact of budgets on people. Routledge: Controllership Foundation. ; Boedker & Chua, 2013Boedker, C., Chua, W. F. (2013). Accounting as an affective technology: a study of circulation, agency and entrancement. Accounting, Organizations and Society, 38(4), 245-267. doi:10.1016/j.aos.2013.05.001 ; Church, Hannan, & Kuang, 2012).

A prática orçamentária está intrinsecamente associada à existência de procedimentos e normas, que nem sempre são claramente explicados (Preston, Cooper, & Coombs, 1992). Regras contribuem quando são claras, simples e ajustáveis a novos contextos, ou, do contrário, podem ser coercitivas ( Hartmann & Maas, 2011)Hartmann, F. G. H., Maas, V. S. (2011). The effects of uncertainty on the roles of controllers and budgets: an exploratory study. Accounting and Business Research, 41(5), 439-458. doi:10.1080/00014788.2011.597656 . A existência de regras na prática orçamentária decorre da necessidade de gerar informações consistentes à luz da contabilidade, uma vez que esta lida com informações financeiras; também estão associadas à ideia de confiabilidade. Por outro lado, quando as regras afetam, sobretudo, a avaliação de desempenho, isso pode fazer com que o orçamento seja avaliado de forma mais crítica pelos usuários, podendo até desestimular seu uso ( Sponem & Lambert, 2016)Sponem, S., Lambert, C. (2016). Exploring differences in budget characteristics, roles and satisfaction: a configurational approach. Management Accounting Research, 30, 47-61. doi:10.1016/j.mar.2015.11.003 . Entretanto, mesmo sem total concordância e clareza sobre as regras para todos os envolvidos, geralmente elas contribuem para reduzir os efeitos da incerteza na tomada de decisões ( Henttu-Aho, 2016)Henttu-Aho, T. (2016). Enabling characteristics of new budgeting practice and the role of controller. Qualitative Research in Accounting & Management, 13(1), 31-56. doi:10.1108/qram-09-2014-0058
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.

Outro aspecto a considerar é que a utilização da prática orçamentária em ambientes caracterizados por maior competição pode contribuir para desencorajar o espírito de cooperação. Às vezes isso ocorre pela falta de clareza ou de confiança na justiça organizacional, uma vez que o fluxo de informação pode ser interrompido, ou usado de forma inadequada para o benefício de alguns gestores, que assumem posição de competidores (Brüggen &Luft, 2011). Também encontramos em pesquisas expressões relacionadas às sensações afetivas decorrentes da utilização do orçamento, como motivação, nível de engajamento, disposição para negociar, angústia, medo e pressão, mostrando como ele pode ser capaz de sensibilizar e influenciar a ação para atingir os objetivos ( Argyris, 1952Argyris, C. (1952). The impact of budgets on people. Routledge: Controllership Foundation. ; Boedker & Chua, 2013)Boedker, C., Chua, W. F. (2013). Accounting as an affective technology: a study of circulation, agency and entrancement. Accounting, Organizations and Society, 38(4), 245-267. doi:10.1016/j.aos.2013.05.001 .

Para mostrar como se caracteriza uma prática orçamentária, utilizamos uma abordagem conceitual, por meio de um posicionamento ontológico de movimento, que considera as práticas e as organizações em um contínuo processo reflexivo de construção.

Estudos baseados em práticas (EBP)

A abordagem de estudos organizacionais (EO) adotada neste trabalho oferece uma clara noção de espaço-tempo dos atores ( Duarte & Alcadipani, 2016Duarte, M. F., Alcadipani, R. (2016). Contribuições do organizar (organizing) para os estudos organizacionais. Organizações & Sociedade, 23(76), 57-72. doi:10.1590/1984-9230763
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), ao tratar de práticas “situadas”, que implicam a existência de incertezas, conflitos e incoerências como características intrínsecas ( Antonello & Godoy, 2009)Antonello, C. S., Godoy, A. S. (2009). Uma agenda brasileira para os estudos em aprendizagem organizacional. Revista de Administração de Empresas, 49(3), 266-281. doi:10.1590/S0034-75902009000300003 . Entretanto, para acessar os insights decorrentes dos EBP, é necessário utilizar ferramentas e métodos que possibilitem a compreensão dos contextos. Neste estudo, adotamos uma ontologia de movimento, uma abordagem processual e reflexiva, para entender como as práticas são estabelecidas nas organizações (Cooper & Burrel, 1988; Pimentel & Nogueira, 2018)Pimentel, R., Nogueira, E. E. S. (2018). Estudos baseados na prática: possibilidades metodológicas para pesquisas em estudos organizacionais. Organizações & Sociedade, 25(86), 350-370. doi:10.1590/1984-9250861
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.

EBP possibilitam compreender o processo de mudança nas PCG como decorrente das diferentes interpretações possíveis, cada uma servindo a um tipo específico de objetivo, evidenciando elementos relativos a poder, estratégia e conflito que permeiam o lócus da prática. Em meio às várias interpretações, os indivíduos que adotam inovações não são apenas ativos, mas politicamente experientes ( Gherardi & Miele, 2018Gherardi, S., Miele, F. (2018). Knowledge management from a social perspective: the contribution of practice-based studies. In J. Syed, P. A. Murray, D. Hislop, Y. Mouzughi (Eds.), The palgrave handbook of knowledge management (pp. 151-176). London: Palgrave Macmillan. doi:10.1007/978-3-319-71434-9_7
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; Nicolini, Mengis, Meacheam, Waring, & Swan, 2016). A busca por inovações em PCG decorre da necessidade (ou desejo) dos indivíduos de imitarem os outros, enquanto buscam seus próprios interesses ( Czarniawska & Sevón, 2005)Czarniawska, B., Sevón, G. (Eds.). (2005). Global ideas: How ideas, objects and practices travel in a global economy. Frederiksberg: Copenhagen Business School Press. . Nessa abordagem, os principais agentes do processo de inovação podem assumir papéis de intermediários ou mediadores, cuja diferença é sutil, mas importante: os primeiros são meios, portadores neutros da inovação, enquanto mediadores são ativos, consequentes, e criam uma ligação que não existia antes, modificando a inovação ao criar um vínculo entre o que existia e o novo, tornando-o mais aceitável ( Nicolini et al., 2016)Nicolini, D., Mengis, J., Meacheam, D., Waring, J., Swan, J. (2016). Recovering the performative role of innovations in the global travel of healthcare practices. In J. Swan, S. Newell, D. Nicolini (Eds.), Mobilizing knowledge in healthcare: challenges for management & organization (pp. 177-198). Oxford: Oxford University Press. .

Schatzki (2006)Schatzki, T. R. (2006). On organizations as they happen. Organization Studies, 27(12), 1863-1873. doi:10.1177/0170840606071942
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considera que as práticas são realizações do dia a dia. “Elas acontecem” (p. 1864), e, para tanto, as estruturas das práticas (entendimentos, regras, estrutura teleoafetiva e entendimentos gerais) e os arranjos (cenários em que as práticas acontecem, envolvendo coisas e pessoas) também precisam acontecer. O acontecer desses elementos está associado ao que ele chama de governança, responsável pelo desempenho, e ao envolvimento dos arranjos materiais existentes. O autor também considera que alguns eventos não são instantâneos, e ocorrem ao longo do que ele chama de “tempo objetivo”, que se refere a antes e depois. Ao contrário, ele caracteriza o “tempo real” como decorrente das “diversas passagens temporais objetivas que essas ações estabelecem, ou com as quais coincidem” (p. 1865).

Sob essa ótica, PCG são diferentes em cada organização, com diferentes objetivos. Isso porque os gestores utilizam indivíduos distintos e arranjos materiais específicos nos seus contextos tempo-espaço. O conhecimento acumulado nas organizações confere-lhes competências individuais e coletivas que possibilitam construir diferentes conjuntos de arranjos materiais, caracterizados por softwares , processos e atividades, integrados às atividades das pessoas, e práticas, que dão suporte ou são a base de suas rotinas. Os objetivos dessas práticas não são necessariamente claros para todos, mesmo porque, em diferentes níveis hierárquicos, as demandas dos indivíduos são distintas.

O processo de aprendizado nas organizações decorre de experiências práticas, que se somam ao conhecimento formal obtido por meio de treinamento, capacitação, consultoria, e contratação de profissionais que trazem novas competências. O novo conhecimento é agregado à organização a partir de um conjunto de escolhas, nem sempre claras. O processo de refletir sobre escolhas que ocorrem sucessivamente pode ser compreendido como uma prática que serve para apoiar a tomada de decisões, conforme descrito no próximo tópico.

Julgamentos performativos como prática para apoiar a tomada de decisões em controladorias

Bispo (2017)Bispo, M. S. (2017). Educating qualitative researchers in management: toward performative judgements. Revista de Administração de Empresas, 57(2), 158-169. doi:10.1590/s0034-759020170205 desenvolveu um arcabouço teórico que explica o julgamento performativo, empregando o pensamento de Aristóteles para as virtudes intelectuais, e o conhecimento sensível de Strati (2007)Strati, A. (2007). Sensible knowledge and practice-based learning. Management Learning, 38(1), 61-77. doi:10.1177/1350507607073023 . Seu trabalho apresenta quatro dimensões: as duas primeiras se relacionam à decisão prática, que se baseia no conhecimento artesanal (“ craft knowledge ”), que é aprendido no dia a dia, à medida que se faz algo; e no julgamento prático, que vincula o conhecimento sensível , capturado de forma sensorial pelos indivíduos e não necessariamente alinhado a um processo racional de construção do conhecimento, e a sabedoria prática , que possibilita deliberar, de acordo com o senso comum, sobre o que é bom ou ruim. Ou seja, a decisão prática se vale da sabedoria prática. O julgamento performativo possibilita ainda associar a decisão prática à sabedoria teórica, ao acrescentar à primeira a compreensão do contexto, por meio de abordagem filosófica ou científica, e o conhecimento científico, resultado de teorias e métodos de pesquisa testados empiricamente.

Nesta pesquisa, para melhor elucidar os elementos teóricos que permeiam o julgamento performativo em ambientes de controladoria, partindo do modelo proposto por Bispo (2017)Bispo, M. S. (2017). Educating qualitative researchers in management: toward performative judgements. Revista de Administração de Empresas, 57(2), 158-169. doi:10.1590/s0034-759020170205 , contrapusemos alguns elementos das ideias de Aristóteles sobre as virtudes do pensamento ( Pakaluk, 2005Pakaluk, M. (2005). Aristotle’s nicomachean ethics: an introduction. Cambridge: Cambridge University Press. ) e do conhecimento sensível, construído a partir da vida organizacional, destacado por Strati (2007)Strati, A. (2007). Sensible knowledge and practice-based learning. Management Learning, 38(1), 61-77. doi:10.1177/1350507607073023 .

Tanto Strati (2007)Strati, A. (2007). Sensible knowledge and practice-based learning. Management Learning, 38(1), 61-77. doi:10.1177/1350507607073023 quanto Pakaluk (2005)Pakaluk, M. (2005). Aristotle’s nicomachean ethics: an introduction. Cambridge: Cambridge University Press. argumentam que indivíduos estão sujeitos às influências de suas percepções (sensações), e que estas decorrem dos meios naturais pelos quais as pessoas percebem o mundo (sentidos). Por outro lado, há divergências sobre como chegar à ação a partir das percepções. Considerando o contexto deste estudo, podem-se identificar diferenças na compreensão de como as percepções influenciam o surgimento e a mudança das práticas.

No pensamento aristotélico, a percepção não é suficiente para desencadear uma ação que promova o bem comum, com base no fato de que os animais também são dotados de percepções que advêm dos sentidos, mas isso não lhes dá a capacidade de fazer ações para o bem comum. A abordagem aristotélica parte da premissa de que o pensamento funciona como “verdadeiro versus falso”, “afirmação versus negação”, contemplando assim verdades ideais; mas a ação é decorrente de uma virtude de caráter, ou seja, um estado da alma, de sua essência, em que a decisão decorre de um desejo deliberado de busca do bem comum, em que o pensamento se une à verdade. Possibilita aos indivíduos escolher alternativas com melhor desempenho para o bem comum, levando em conta as diferenças de desempenho entre as alternativas possíveis.

Para Strati (2007)Strati, A. (2007). Sensible knowledge and practice-based learning. Management Learning, 38(1), 61-77. doi:10.1177/1350507607073023 , as práticas organizacionais resultam de um processo de aprendizado, que provém não somente de processo racional (mental), mas também da adição da dimensão sensorial e corpórea, que ocorre por meio da interação dos indivíduos com os elementos materiais sensíveis da vida organizacional. O processo de aprendizado ocorre de forma contínua, por meio de diversas situações cotidianas em que o indivíduo julga, a partir de suas percepções e sensações, o certo versus o errado, e vai construindo um senso de desempenho, que é individual, mas também é influenciado e compartilhado com seu coletivo.

Neste artigo, consideramos o julgamento performativo no contexto da controladoria, constituído por dois grandes atributos: o julgamento prático e a sabedoria teórica. O primeiro se compõe do conhecimento artesanal (decorrente do conhecimento sensível) e da sabedoria prática. A sabedoria teórica, por sua vez, é constituída pela abordagem filosófica ou científica, suas respectivas teorias, e pelo método científico. Cada um desses elementos pode ser identificado na Figura 1 , e serão apresentados na sequência.

Figura 1
Julgamento performativo

O conhecimento artesanal ocorre ao nível da prática, valendo-se dos conhecimentos sensíveis existentes no contexto das organizações, ou seja, do saber existente nos arranjos materiais (sistemas, equipamentos, processos etc.) e nos indivíduos praticantes (saber individual). Assim, as práticas da controladoria são influenciadas por eles (seta a) e, simultaneamente, os influencia, dentro dos limites permitidos pelos arranjos materiais e indivíduos (seta b).

A sabedoria prática é influenciada pela prática à medida que ela, em forma de conhecimento artesanal (sensível), vai difundindo novos saberes e influenciando outras práticas (seta c). Tal sabedoria também influencia as práticas na controladoria, trazendo a contribuição de outros indivíduos e de outras práticas, não necessariamente envolvidos com as originais (seta d).

O saber teórico influencia diretamente a sabedoria prática, na medida em que oferece conhecimentos advindos da academia por meio de profissionais formados por universidades, que difundem conhecimentos teóricos aplicados a problemas práticos (seta e). Essa influência pode ocorrer diretamente na prática, quando profissionais com tal conhecimento passam a se envolver com determinadas práticas (seta f). O ciclo virtuoso gerado pelos estudos de práticas na controladoria também gera conhecimento teórico, na medida em que busca compreender como as práticas acontecem no dia a dia, sem ficar limitado a paradigmas que restringem sua compreensão a óticas exclusivamente racionais (seta g) ( Blundel & Smith, 2013Blundel, R. K., Smith, D. J. (2013). Reinventing artisanal knowledge and practice: a critical review of innovation in a craft-based industry. Prometheus: Critical Studies in Innovation, 31(1), 55-73. doi:10.1080/08109028.2013.770276 ).

O julgamento prático é um processo contínuo resultante da somatória de ocorrências observáveis, sejam elas naturalmente percebidas (sensíveis) ou propositalmente introduzidas (racionais), que são materializadas por meio de mudanças no campo da prática (por exemplo, mudança das regras) ou nos arranjos materiais. Esse processo contribui para juntar o conhecimento prático à sabedoria prática ( Pakaluk, 2005Pakaluk, M. (2005). Aristotle’s nicomachean ethics: an introduction. Cambridge: Cambridge University Press. ).

Por fim, o processo de deliberação formal na controladoria ocorre quando uma prática precisa sofrer alterações que ultrapassam seu limite de ajustamento estrutural, tornando necessária a adoção de novas regras e novo conjunto de arranjos materiais (seta h). No pensamento aristotélico, pode-se considerar a deliberação como um ato objetivo em que se busca atingir a verdade prática; assim, a deliberação também pode ser considerada uma virtude que parte da alma, uma condição que leva as coisas a serem feitas de forma confiável ( Pakaluk, 2005Pakaluk, M. (2005). Aristotle’s nicomachean ethics: an introduction. Cambridge: Cambridge University Press. ).

Pode-se considerar que a deliberação nas controladorias é um evento formal, realizado por um ou mais indivíduos com autoridade na organização. Ela decorre da somatória das percepções acumuladas pelos diversos indivíduos, associados direta ou indiretamente às práticas, por meio de trocas de experiências, impressões e conhecimentos. Dependendo do contexto e dos processos de cada organização, a deliberação poderá receber maior ou menor influência da sabedoria teórica, mas certamente estará diretamente subordinada à sabedoria prática ( Pakaluk, 2005Pakaluk, M. (2005). Aristotle’s nicomachean ethics: an introduction. Cambridge: Cambridge University Press. ).

Os elementos conceituais propostos por Schatzki (2002Schatzki, T. R. (2002). The site of the social: a philosophical account of the constitution of social life and change. University Park: Penn State Press. , 2006Schatzki, T. R. (2006). On organizations as they happen. Organization Studies, 27(12), 1863-1873. doi:10.1177/0170840606071942
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), como estruturas da prática e arranjos materiais, sustentam a compreensão das mudanças necessárias, para que tanto as práticas como os arranjos da prática aconteçam no cotidiano das organizações.

Observa-se ainda, na Figura 1 , que a sabedoria teórica influencia a sabedoria prática (seta e) e a própria prática (seta g). Entretanto, a prática influencia a sabedoria prática (seta c), e a sabedoria prática influencia a sabedoria teórica (seta g) mas não diretamente a sabedoria teórica, pois, ao nível da prática, não ocorrem os processos de reflexão necessários à geração de insights para a teoria.

Pode-se considerar que boa parte do julgamento prático, visto de forma processual, ocorre de forma quase subliminar. As práticas vão sendo ajustadas às necessidades apresentadas pelos diferentes indivíduos, com base em suas percepções e, sobretudo, no conhecimento prático que vai sendo construído. O ponto que caracteriza a mudança é justamente o da deliberação (seta h), que ocorre no momento da tomada de decisão “formal”, não necessariamente escrita, mas que envolve algum rito que mostra sua relevância. Em geral, ela é adotada em processos que requerem análises mais complexas e detalhadas. É na deliberação que efetivamente se avalia, com base em critérios de mensuração e desempenho, se os eventuais investimentos para a adequação das práticas (ou suas substituições) se justificam. As deliberações ocorrem no contexto de escolhas maiores ou mais complexas, mesmo que sua materialização ocorra por meio de microdeliberações, que promovem ajustes, principalmente a partir da sabedoria prática. Nesse contexto, o julgamento prático é constituído por diversos elementos: o conhecimento artesanal (sensível), a sabedoria prática, a prática, e a deliberação formal (enquanto prática da controladoria).

A prática da deliberação em Controladorias envolve avaliar a adequação das diversas práticas utilizadas no processo de gestão, considerando que elas atuam de forma integrada; assim, decidir sobre alterações significativas em uma prática poderá trazer impactos em uma ou mais práticas, simultaneamente.

A deliberação neste trabalho se refere à decisão de substituir uma prática orçamentária por outra. Para entender os limites da adequação da prática orçamentária e as implicações em deliberações da controladoria, é necessário compreender quais são os elementos das diversas práticas que possuem interfaces com a prática orçamentária, ou seja, gestão financeira, gestão contábil, gestão dos gastos e gestão da tecnologia da informação (TI). A Figura 2 apresenta essas práticas, e o contexto em que ocorre a deliberação sobre a troca de uma prática orçamentária por outra.

Figura 2
Contexto das práticas de gestão na controladoria e a prática da deliberação

A Figura 2 mostra a sobreposição ou influência entre as práticas, por meio de um diagrama de Venn5 5 . Diagramas de Venn são usados em matemática para simbolizar graficamente propriedades, axiomas e problemas, relativamente aos conjuntos. . Observa-se que a deliberação sobre a substituição de uma prática orçamentária por outra está delimitada pelo conjunto de práticas que se sobrepõem naquele contexto, o que acaba sendo bastante limitado, dados os impactos sobrepostos.

O papel central da controladoria é assegurar a otimização do resultado econômico da organização, por meio do desenvolvimento e disponibilização de informações que auxiliem os gestores em seus processos de decisão ( Pereira, 2011Pereira, A. A. (2011). Gestão Econômica. In C. Parisi, E. Magliorini (Orgs.), Contabilidade Gerencial (pp. 191-238). São Paulo, SP: Atlas. ). Assim, a capacidade dessa área de prover meios para que as informações contábeis sejam disponibilizadas com a qualidade adequada (relevância, materialidade, representação fidedigna e tempestividade [Pronunciamento Técnico CPC-00(R2), 2019]) está diretamente associada à sua capacidade de realizar os ajustes necessários nos SI e nas práticas a eles associadas. As deliberações na controladoria, especificamente para decidir sobre a substituição de uma modalidade orçamentária por outra, são imprescindíveis para realizar sua missão.

Em síntese, a deliberação pode ser vista como um processo racional, decorrente de uma capacidade calculativa ( Callon & Muniesa, 2005Callon, M., Muniesa, F. (2005). Peripheral vision: economic markets as calculative collective devices. Organization Studies, 26(8), 1229-1250. doi:10.1177/0170840605056393 ), sob a ótica do mainstream da CG; e, ao mesmo tempo, sob a ótica do acontecer, revela-se como um entrelaçamento de humanos (gerentes, diretores, líderes e responsáveis por áreas) e não-humanos (planilhas, sistemas de computador, salas de reunião, relatórios de prestação de contas), mostrando-se como uma construção social, conduzida por diversos indivíduos e coisas ( Schatzki, 2002, 20Schatzki, T. R. (2002). The site of the social: a philosophical account of the constitution of social life and change. University Park: Penn State Press. , 2006Schatzki, T. R. (2006). On organizations as they happen. Organization Studies, 27(12), 1863-1873. doi:10.1177/0170840606071942
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).

Procedimentos metodológicos

Para compreender a prática da deliberação na controladoria da ABC, para além da visão racional e econômica dominante nos estudos de CG, utilizamos uma abordagem descritiva e qualitativa, com a finalidade de evidenciar as diferenças entre o OC e o OM. Adotamos uma ontologia de movimento, para mostrar que a prática da deliberação pode ser compreendida como um processo reflexivo, e dessa forma, está sempre em devir, em um fluxo permanente (Cooper & Burrel, 1988; Pimentel & Nogueira, 2018)Pimentel, R., Nogueira, E. E. S. (2018). Estudos baseados na prática: possibilidades metodológicas para pesquisas em estudos organizacionais. Organizações & Sociedade, 25(86), 350-370. doi:10.1590/1984-9250861
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. Enquanto estratégia de pesquisa, realizamos uma pesquisa-ação ( Thiollent, 1988)Thiollent, M. (1988). Metodologia da pesquisa-ação (2a ed.). São Paulo, SP: Cortez. .

As técnicas utilizadas para obter as evidências foram: a observação participante, entrevistas em profundidade, e análise documental. A observação participante foi feita por um dos pesquisadores, que já atuava na controladoria da ABC há cerca de dez anos, quando iniciamos a pesquisa, e lá permaneceu até 2021. Sua familiaridade com o campo possibilitou compreender diversas peculiaridades da organização, como aspectos culturais, as funções de todos os envolvidos, e o histórico das ocorrências que precederam o fenômeno em análise. A fim de atender aos cuidados metodológicos requeridos na observação participante, ele utilizou um caderno de anotações, para registrar as principais ocorrências.

Fizemos entrevistas em profundidade na fase inicial da pesquisa (2017), com o objetivo de assegurar que dimensões eventualmente não visíveis pela observação participante fossem incluídas, e confirmar aquelas que o pesquisador conhecia. Para tanto, criamos um roteiro semiestruturado com 24 questões relacionadas às diferentes funcionalidades do OC e do OM, enfatizando as percepções que levariam à escolha de um ou outro. Realizamos doze entrevistas com gestores da ABC (um controller , oito gerentes, um diretor e dois coordenadores de área), com duração média de sessenta minutos cada, que foram gravadas e transcritas.

O pesquisador teve ainda acesso a diversos documentos da empresa, como planos e orçamentos convencionais de períodos anteriores, registros de e-mails sobre o processo que antecedia a elaboração do orçamento, seu acompanhamento, e o processo posterior, com foco em seu acompanhamento e revisões. Essa documentação foi necessária para compreender a operacionalização da prática orçamentária, e se as motivações que levaram à deliberação se confirmaram, à medida que a nova prática entrou em ação. O pesquisador também teve acesso ao ERP ( Enterprise Resource Planningsoftware de gestão integrada) e planilhas de Microsoft Excel utilizadas para a elaboração do orçamento. Os levantamentos começaram no segundo semestre de 2017, quando o orçamento do ano seguinte estava sendo elaborado, e continuaram até meados de 2020, inserindo a pesquisa no contexto da ação.

Para compreender e descrever os elementos que caracterizam a prática, utilizamos os movimentos de aproximação ( zooming in ) e distanciamento ( zomming out) do campo, alternando lentes teóricas para melhor compreensão do todo e dos elementos que o compõem ( Nicolini, 2009Nicolini, D. (2009). Zooming in and out: studying practices by switching theoretical lenses and trailing connections. Organization Studies, 30(12), 1391-1418. doi:10.1177/0170840609349875
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). Esses procedimentos possibilitaram descrever como os indivíduos usam as práticas e os arranjos materiais, aprofundando o olhar, identificando os elementos, critérios e formas necessários para produzir padrões ordenados e explícitos, mediante as competências aprendidas.

Visando organizar as informações obtidas, levando ao entendimento descrição e explicação da prática, utilizamos o framework proposto por Bispo (2015)Bispo, M. S. (2015). Methodological reflections on practice-based research in organization studies. BAR, 12(3), 309-323. doi:10.1590/1807-7692bar2015150026 , operacionalizado por um conjunto de sete etapas: (a) identificação do fenômeno que se pretende investigar; (b) escolha da abordagem teórica para o estudo da prática; (c) identificação das principais atividades associadas ao fenômeno estudado; (d) definição de critérios-chave de análise alinhados com a abordagem teórica e baseada na prática; (e) descrição da(s) prática(s) associada(s) com as atividades previamente identificadas; (f) análise da(s) prática(s) identificada(s); e (g) caracterização da(s) prática(s). Esse processo, adaptado ao problema de pesquisa, é apresentado na Figura 3 , mostrando o processo de análise dos dados com base nas práticas investigadas.

Figura 3
Framework para o processo de análise de dados para a prática da deliberação em uma controladoria

As principais atividades que fazem parte da deliberação “substituição de uma prática orçamentária por outra” são: (a) orçamentação: processo de uso do orçamento (a prática orçamentária) para a realização do planejamento de gastos e acompanhamento do realizado; (b) manutenção dos SI: atividade recorrente da integração e atualização de diversas bases de dados (contábil, financeira, vendas, compras etc.), e de versões de softwares utilizados; (c) treinamento: capacitação sistemática dos colaboradores envolvidos, seja devido a mudanças em características tributárias, contábeis, ou à rotatividade dos profissionais; (d) projeção de resultados: avaliação dos resultados obtidos, acrescida do que ainda está por acontecer, com base no planejamento; e) benchmarking: atividade recorrente de monitoramento das práticas utilizadas por empresas de referência, sobretudo as que se destacam na mídia; (f) avaliação da percepção de satisfação com o uso da prática: reflete a visão dos gestores usuários da prática, sobre o quanto ela ajuda a atingir as metas, comparativamente a quanto trabalho ela demanda para tal.

Com relação à capacitação, os gestores participaram de um treinamento sobre as potencialidades do OM, evidenciando elementos dessa prática que não eram ainda utilizados na ABC. Foram descritos os elementos operacionais e conceituais envolvidos em sua utilização, vantagens, desvantagens, e o processo necessário para sua implantação na ABC.

O processo de pesquisa permitiu identificar as principais atividades e suas relações, que também fazem parte das dimensões da deliberação na controladoria. Por outro lado, tais atividades também decorrem de outras práticas, e, de forma conjunta, explicam melhor o processo de deliberação na controladoria.

Nesse sentido, utilizamos fragmentos das práticas da gestão financeira (demandas e pressões advindas da gestão da disponibilidade de recursos financeiros); da gestão dos gastos (ações que permitem controlar os gastos e sua prestação de contas) ; da gestão contábil (avaliação do resultado econômico-financeiro), e da gestão da TI (SI e disponibilização de dados), para mostrar o processo de deliberação na controladoria.

Para que esse conjunto de práticas se estabeleça, e com isso a deliberação na controladoria, os arranjos em que elas se situam também precisam existir dinamicamente. Assim, mostra-se o processo de adaptação das coisas, à medida que sistemas e softwares são atualizados, planilhas eletrônicas são adaptadas, e novos colaboradores se somam aos existentes ( Schatzki, 2002Schatzki, T. R. (2002). The site of the social: a philosophical account of the constitution of social life and change. University Park: Penn State Press. , 2006Schatzki, T. R. (2006). On organizations as they happen. Organization Studies, 27(12), 1863-1873. doi:10.1177/0170840606071942
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). Também as estruturas das práticas se alteram, pois novas regras e entendimentos são necessários, modificando seus propósitos iniciais e influenciando os significados e as emoções e sentimentos a elas associados.

Caracterização da ABC e do contexto da pesquisa

A ABC é uma empresa industrial de grande porte, com faturamento anual superior a R$ 600 milhões, abrangência nacional, e situada na Grande São Paulo (SP). Ela também possui uma distribuidora, e é dirigida pela segunda geração de familiares. Membros da família ocupam os principais cargos de direção, sendo responsáveis pela tomada de decisão em questões estratégicas, e também nas operacionais de maior vulto. A percepção, preliminar ao estudo, é que aos demais colaboradores, mesmo os de alto escalão, cabia implementar as decisões tomadas pela família.

A ABC não formaliza planos de longo prazo, cabendo à prática orçamentária atingir objetivos de curto prazo e alocar, principalmente, gastos relacionados à gestão dos custos e despesas operacionais. Na atividade industrial da ABC, os principais grupos de gastos se referem aos materiais utilizados nos produtos fabricados, que, em parte, são commodities (aço, cobre e plástico), cujos preços oscilam no mercado, e gastos relacionados aos processos produtivos e administrativos, que sofrem grande pressão para sua redução.

A pesquisa teve início no segundo semestre de 2017, se originando de uma solicitação da diretoria da ABC a um dos pesquisadores para fazer um estudo que subsidiasse a decisão de substituição da prática do OC, utilizado há mais de dez anos, pelo OM. O processo de decisão ocorreu em 2017, e a substituição de uma prática por outra teve lugar em 2019. Durante o ano de 2018 foram realizadas ações para identificar novos profissionais necessários à utilização do OM, nas funções de gestores de pacotes, que são os responsáveis por avaliar os gastos de forma mais crítica, contribuindo para sua melhor gestão e prestação de contas, que era realizada pelos gestores das áreas de responsabilidade (identificados como gestores de entidades por essa metodologia). Também foram necessárias iniciativas de qualificação dos demais colaboradores, e novas planilhas e processos, para que a nova modalidade orçamentária atingisse os objetivos esperados. O pesquisador chefiou a equipe responsável pela implementação do OM, ao mesmo tempo que também acompanhava e utilizava o OC.

Em 2019 o OM foi implantado, e, no segundo semestre, mais acentuadamente do que esperado pela diretoria da ABC, houve uma redução das vendas e das margens, sobretudo pela ação dos concorrentes, que atuavam como importadores e revendedores de produtos chineses, reduzindo fortemente seus preços. Para restabelecer o equilíbrio financeiro, parte dos colaboradores da empresa foi desligada. Na controladoria, alguns profissionais que haviam sido contratados para exercer as funções de gestores de pacote foram demitidos, e outros buscaram novas oportunidades no mercado. Com isso, parte expressiva dos que estavam à frente do OM deixou a empresa, e o acompanhamento do orçamento, sobretudo o processo de accountability , foi perdido. Em vista dessa situação, tomou-se a decisão de retornar à utilização do OC, o que ocorreu em 2020.

Naquele ano, em meio à pandemia da covid-19 e à dificuldade de obter produtos importados, sobretudo da China, os principais concorrentes da ABC não sobreviveram. Essa situação possibilitou que a demanda, mesmo reduzida em função da pandemia, fosse canalizada para a empresa, que conseguiu maior participação de mercado, comparada à situação anterior à pandemia. Nesse novo contexto, diminuiu a pressão sobre as margens e surgiram novas oportunidades no varejo, que demandaram uma nova estrutura de SI para esse segmento. Para tanto, a empresa adquiriu um novo software de gestão (de uma plataforma mundial), que possui uma versão bastante desenvolvida do OC, o que determinou a continuação de seu uso.

A Figura 4 possibilita visualizar as principais ocorrências ao longo desse período e assim destacar os momentos em que se dão as duas deliberações sobre a prática orçamentária: (a) o momento inicial, em 2017; (b) 2018, com a contratação e capacitação de novos gestores e a preparação da infraestrutura para a adoção do OM em 2019; (c) 2019, com a adoção do OM e sua prática por um ano, e, ao final do ano, a decisão de retornar à prática do OC; e (d) 2020, com a decisão de retorno à prática original (OC).

Figura 4
Ocorrências, na linha do tempo, associadas às deliberações na controladoria

Observa-se que cada deliberação é seguida ou precedida de mudanças nos arranjos materiais e indivíduos. Na sequência, apresentamos fragmentos dessas práticas e suas interfaces com a prática orçamentária, e os efeitos sobre a prática da deliberação.

Fragmentos da prática de gestão financeira e a prática orçamentária

A gestão financeira objetiva assegurar, eficientemente, o processo de captação (financiamento) e alocação (investimento) de recursos de capital, lidando tanto com a escassez como com a disponibilidade de recursos (Assaf Neto & Lima, 2019). Na ABC, as atividades e profissionais que fazem a gestão financeira estão no Departamento Financeiro, e deles é esperado garantir a disponibilidade de recursos para cumprir o pagamento dos gastos (incluindo investimentos). Neste primeiro momento, analisamos a sobreposição da prática da gestão financeira com a atividade de orçamentação, ou seja, a elaboração e manutenção do orçamento empresarial.

Entre as atividades diárias dessa área estão: a verificação das disponibilidades financeiras (recursos financeiros em contas correntes ou para empréstimo), gestão dos recebíveis (sobretudo os que estão vencidos) com base em cenários previamente estabelecidos e em premissas econômicas (crescimento econômico, variação cambial, inflação, endividamento das empresas etc.), e estimativas sobre o comportamento dos clientes. São também realizadas projeções das situações futuras do caixa, para identificar eventuais ações que assegurem a continuidade da organização. A elaboração de um cenário está intrinsecamente ligada aos critérios técnicos utilizados, mas ela é influenciada pelo otimismo ou pessimismo dos tomadores de decisão. Quanto maior a percepção de incerteza, mais frequentemente são revisados os cenários financeiros, e menores são os períodos das projeções. Na ABC, os tomadores dessas decisões são o gestor da área financeira e um dos diretores, cuja percepção era que o orçamento não respondia, na velocidade desejada, à adequação das projeções financeiras, conforme a fala do Diretor 1 (2017): “ a operação requer um recurso, talvez não orçamentado pela dinâmica do mercado, e nós temos que adequar nossa operação de acordo com o que o mercado gera de demanda ”. Tal percepção pode ser explicada pelo nível de sabedoria prática incorporado na prática orçamentária, com base nos resultados. Isso pode ser compreendido pelas setas (a) e (b) e os arranjos materiais descritos na Figura 1 .

Em 2017, após o processo de capacitação, os gestores passaram a ter uma visão mais clara sobre alguns problemas que ocorriam pelo uso do OC, e em função de sua expectativa de melhoria, perceberam que a utilização dessa nova metodologia poderia ajudar a reduzir os problemas. A capacitação pode ser vista nas setas (d), (e) e (f) da Figura 1 , fazendo com que os indivíduos mudassem seu olhar sobre a prática. As declarações de alguns gestores mostram suas expectativas de mudanças na prática orçamentária e a preferência pelo OM: “ Em ambos dá para fazer a alocação correta, no orçamento matricial as regras são melhores ” (Gestor 4, 2017); “ O matricial, porque é mais detalhado ” (Gestor 6, 2017); “ O matricial é melhor porque ele é menos suscetível ao erro e permite uma negociação, um processo de melhoria mais adequado ” (Gestor 7, 2017).

Observa-se o processo de construção do conhecimento compartilhado à medida que outros gestores passam a manifestar visões diferentes sobre a adequação do OM, seja por perceberem que ele impõe restrições à flexibilidade, seja pela ótica da complementaridade ao não o verem como substituto do OC: “ Sim, os dois oferecem, e as regras existem nos dois. O tradicional é mais flexível que o matricial, essa é a diferença ” (Gestor 8, 2017); “ Acho que podem ser complementares. Eu não acho que um orçamento tradicional não tenha nada que você não possa aproveitar ” (Gestor 3, 2017). Essas reflexões mostram como as restrições às regras impostas pela prática são percebidas, ou mesmo os limites de aproveitamento da infraestrutura disponível para a prática. Os indivíduos, em um primeiro momento, de forma artesanal, começam a avaliar a prática, e verificam a possibilidade de realizar pequenos ajustes (setas (a) e (b) da Figura 1 ), o que podemos considerar como microdeliberações individuais ao nível da prática.

O posicionamento da diretoria da ABC, que havia solicitado o desenvolvimento de ações para decidir sobre a substituição da prática, e que também participou do processo de capacitação, foi determinante para a substituição do OC pelo OM: “ Sim, eu defendo a alocação de recursos no OM porque . . . temos que adequar nossa operação de acordo com o que o mercado demanda ” (Diretor 1, 2017). Quando consultado sobre qual modelagem deveria ser utilizada, foi muito claro: “ O matricial é muito melhor ”.

Tendo em conta as limitações que a prática do OC apresentava – dimensões do conhecimento artesanal (setas (a) e (b) da Figura 1 ), dos ajustes que seriam necessários – dimensões da sabedoria prática (setas (c) e (d)) e da sabedoria teórica (seta e), o controller compreendeu que a adoção do OM deveria substituir o OC, o que demandaria ajustes expressivos nas regras e na infraestrutura (mudanças dos arranjos materiais). Ele também reconhecia as pressões advindas do gestor da área financeira e do Diretor 1 (pessoas com reconhecida autoridade e legitimidade na ABC). Assim, ele deliberou (seta h) pela substituição do OC pelo OM, pois, além de atender necessidades técnicas, seria também um meio de legitimar um posicionamento e atender às expectativas das elites sociais do grupo. O OM começou a ser implantado em 2018, por meio da capacitação e contratação de pessoas e ajustes em planilhas, e foi operacionalizado no início de 2019.

Destacamos o papel transformador e político que o controller adotou ao proporcionar os processos de capacitação em 2017 e em 2018, e com isso, atuar para que os indivíduos estivessem alinhados às expectativas advindas das inovações que seriam proporcionadas pelo OM ( Gherardi & Miele, 2018Gherardi, S., Miele, F. (2018). Knowledge management from a social perspective: the contribution of practice-based studies. In J. Syed, P. A. Murray, D. Hislop, Y. Mouzughi (Eds.), The palgrave handbook of knowledge management (pp. 151-176). London: Palgrave Macmillan. doi:10.1007/978-3-319-71434-9_7
https://doi.org/10.1007/978-3-319-71434-...
; Nicolini et al., 2016)Nicolini, D., Mengis, J., Meacheam, D., Waring, J., Swan, J. (2016). Recovering the performative role of innovations in the global travel of healthcare practices. In J. Swan, S. Newell, D. Nicolini (Eds.), Mobilizing knowledge in healthcare: challenges for management & organization (pp. 177-198). Oxford: Oxford University Press. .

Após a decisão de implantação do OM, a prática da gestão financeira não apresentou mudanças, pois suas atividades estavam automatizadas por meio de um software de gestão integrada (ERP), além de planilhas Excel, interface com sistemas bancários, interface com empresas de gestão de risco e crédito, previsões realizadas pelas áreas de vendas, produção e compras, e demandas da área de gestão de tributos e de pessoas, que utilizam outros recursos materiais e outras pessoas.

Para adotar o OM, a diretoria, em 2018, contratou quatro profissionais para a função de “gestor de pacote”, determinante para o bom desempenho do OM. Com o suporte da área de TI, desenvolveu atividades para obter informações da base de dados, gerada pela área financeira, com maior frequência, visando integrá-las à prática da gestão orçamentária. Durante o processo de integração da gestão financeira com o OM, ficou evidente a diferença do tempo de resposta exigido pela área financeira e a resposta da controladoria, e as limitações para adequar os SI, pois o processamento das informações era feito em planilhas. O gestor da área financeira gerava diversas simulações, enquanto o controller , por meio do orçamento, não conseguia processá-las na velocidade requerida e prover informações que permitissem avaliar os cenários mais adequados para a organização como um todo. Isso porque a prática orçamentária envolve ações para geração de consenso, formalização, consistência de dados e implicações nas diversas dimensões da atividade empresarial, e não seria possível integrar a gestão financeira e a orçamentária de forma satisfatória.

Portanto, foi acordado entre os gestores das áreas que, ao final de 2018, seria elaborado o orçamento para 2019, por meio do qual seriam estabelecidas as metas de compromissos dos gestores (entidades e pacotes) com a organização (chamado de linha base); e, durante o ano de 2019, se necessário, para facilitar o acompanhamento e reduzir as diferenças entre previsto e realizado, seriam feitas revisões, com base nos cenários gerados pela área financeira, mas a avaliação final dos gestores continuaria levando em conta a linha base. Todo esse processo pode ser compreendido como uma mudança nos arranjos materiais para sustentar o início de uma nova prática.

Em 2019, a situação financeira da ABC piorou, e, apesar de algumas melhorias no sistema de controle orçamentário, o gestor da área financeira solicitou uma redução de gastos mais acentuada, fazendo com que o Diretor 1, no segundo trimestre, solicitasse a demissão de parte dos gestores de diversas áreas, entre eles os de pacote, contratados havia pouco e envolvidos na gestão orçamentária. Essa decisão antagônica se justificou em face do risco percebido pelo Diretor 1, e pela necessidade de assegurar a continuidade da organização, não só como um negócio, mas como um bem de família. Nesse contexto, ele optou pelo risco de redução do nível de controle orçamentário.

Após as demissões, na percepção do gestor da área financeira, o nível de controle orçamentário se mostrou inferior ao existente durante a utilização do OC. Pior, os descontroles eram cada vez maiores, e por faltarem gestores para as ações corretivas, ele indicou o retorno ao OC em 2020. Outro ponto identificado é que as integrações entre sistemas não geravam as informações necessárias para as decisões sobre o controle dos gastos. Ou seja, os arranjos materiais não conseguiram sustentar a mudança da prática. Esse conjunto de percepções foi determinante para que o controller deliberasse (seta h da Figura 1 ) pelo retorno ao OC. Isso fez com que a controladoria tornasse a adequar as regras e interfaces, com os instrumentos anteriormente utilizados, mas com algumas melhorias, o que foi feito no último trimestre de 2019, quando o orçamento para 2020 estava em elaboração. Pode-se considerar que o orçamento iniciado em 2020, apesar de ser o convencional, não era exatamente o mesmo de 2017. Algumas integrações e nova dinâmica processual (mudança de regras), propostas para o OM, melhoraram o OC, tornando-o mais ágil e preciso, comparado ao de 2017. Portanto, o ano de 2020 começou com a utilização do OC.

Dado o início da pandemia, surgiram novas incertezas, fazendo com que as revisões realizadas pela área financeira fossem mais frequentes e rigorosas. Ficou evidente para o gestor da área financeira que o ERP utilizado estava aquém das demandas necessárias para a simulação e análises necessárias. Porém, o investimento para a substituição por um novo software era muito alto, além de exigir grandes esforços dos colaboradores dessa área e de toda a organização, o que não foi considerado viável.

Outros fatores se somaram à pandemia, ainda em meados de 2020, entre eles os concorrentes nacionais, responsáveis pelo maior nível de pressão financeira. Em função da guerra de preços eles sucumbiram, pela redução dos negócios com a China, pela variação cambial, e pela redução do volume de negócios no mercado local. A ABC, em função de seu porte, e por ser um fabricante nacional, conseguiu manter suas operações e continuar no mercado. Apesar da retração inicial do consumo, suas vendas aumentaram, inclusive com vendas pela internet, inicialmente pouco atendidas. Isso levou à melhora imediata de sua situação financeira, e, sem os concorrentes que mais a preocupavam, houve otimismo em relação aos cenários futuros, com potencial redução na pressão sobre a gestão de gastos. Os novos cenários apontavam uma grande oportunidade para a ABC, mas que requeria investimentos, sobretudo em TI, para consolidar uma vantagem competitiva frente aos concorrentes. Naquele momento, foi decidida a contratação e implantação, em caráter de urgência, do novo software de gestão (já avaliado previamente), incluindo a gestão das novas atividades relacionadas ao comércio eletrônico. Esse software tem, em sua estrutura básica, elementos que possibilitam atender às necessidades da gestão financeira, em termos de cenários e acurácia, além de integrar essas atividades com o OC, o que deverá consolidar a escolha do OC para os próximos períodos.

Aspectos de natureza sensível do conhecimento, e que caracterizam o conhecimento artesanal (setas (a) e (b) da Figura 1 ), foram sistematicamente colocados à prova no contexto da pandemia. Fatores externos à organização foram determinantes para a mudança de perspectivas. A contratação do novo software , ao trazer conhecimento aplicado, evidenciou a influência da sabedoria prática (setas (c) e (d)), e se baseou, sobretudo, na oportunidade de novo negócio e nas necessidades da gestão financeira, sendo a gestão orçamentária beneficiada em consequência, mas não como prioridade.

Ao longo do segundo semestre de 2020, foi iniciada a implantação do novo software . Até o momento de conclusão da pesquisa, as mudanças resultantes não haviam chegado à prática orçamentária; assim, os processos orçamentários eram os mesmos usados no final de 2019, ou seja, ainda não atendiam às expectativas da área financeira.

Fragmentos da prática de gestão de gastos e a prática orçamentária

Neste estudo, consideramos a prática da gestão de gastos como o conjunto das ações que possibilitam assegurar as demandas nos níveis de qualidade estabelecidos, prazos para entrega dos produtos, adequações de processos, ou seja, ações que afetam os produtos vendidos aos clientes, ou os serviços prestados entre áreas internas da organização; para tanto, elas demandam gastos, sejam custos ou despesas, que influenciam os resultados apresentados nos relatórios (Blocher, Stout, & Cokins, 2010). A prática da gestão de gastos utiliza diversas PCG para identificar e controlar os gastos, entre elas, o orçamento.

Em termos de gastos, a ABC contava com duas unidades organizacionais em 2017: (a) a unidade de fabricação, com aproximadamente 30% do total de funcionários operacionais do grupo, e processos automatizados para o controle dos gastos (mão de obra, tempos de produção, perdas, qualidade etc.), o que garantia um nível satisfatório de controle, cuja qualidade oferecia segurança para gerenciar a margem (preço de venda – custos dos produtos vendidos); dessa forma, a empresa era capaz de competir em um mercado norteado por preço; e (b) a distribuidora, com o restante dos colaboradores, cujas atividades sofriam maior pressão da concorrência por preços, pela necessidade de capital de giro e inadimplência, entre outros fatores.

Naquela ocasião, os gestores de gastos também eram pressionados pela gestão financeira, que lhes exigia ações concretas para redução dos gastos e aumento das margens. A partir do treinamento que fizeram, eles passaram a refletir sobre o OC, considerando a necessidade de diversos ajustes, ou mesmo de sua substituição. Declarações de alguns gestores mostram essa percepção: “ No meu ponto de vista, o matricial apresenta maior eficiência para o controle dos gastos, desde que as regras estejam bem estabelecidas ” (Gestor 1, 2017); “ . . . quanto mais envolvidos, melhor, mas desde que estejam efetivamente dispostos a fazer a coisa certa ” (Gestor 8, 2017); “ O tipo matricial apresenta melhores critérios para a elaboração do orçamento, e no meu entendimento é melhor para tomar decisões e aplicar melhorias na gestão dos gastos ” (Gestor 9, 2017); “ . . . o OM é melhor para alocação de recursos. Você consegue, de alguma forma, estratificar os gastos de uma forma mais refinada, e alocar o recurso ” (Gestor 5, 2017). Talvez não estivesse claro, para esses gestores, que a obtenção dos benefícios desejados não aconteceria automaticamente, pela escolha de uma nova modelagem orçamentária, mas seria consequência da mudança de processos e de outras práticas. A fala do Gestor 6 (2017) mostra sua percepção do esforço requerido para a mudança: “ As duas ferramentas são iguais no sentido de poderem fazer o controle dos gastos; na matricial, você precisa ter um controle melhor ”.

Alguns gestores estavam reticentes sobre a efetividade das mudanças advindas da adoção do OM, pois o processo de decisão era centralizado na diretoria da ABC, e, se isso não mudasse, os novos controles não seriam efetivos: “ No geral, eu vejo que não haverá mudanças, porque a tomada de decisão é feita pela diretoria. Os funcionários, em geral, não têm influência sobre isso ” (Coordenador 1, 2017). “ As regras não podem ser alteradas porque elas vêm da diretoria. Então, os gestores e funcionários não têm poder para alterar a regra ” (Coordenador 2, 2017).

O processo descrito anteriormente permite compreender a dinâmica da construção do conhecimento artesanal (setas (a) e (b) da Figura 1 ), quando os gestores refletem sobre as limitações do OC, e somado ao processo de capacitação (seta d), ocorre a construção de uma nova sabedoria prática (setas (c) e (d)) que influencia os limites dos arranjos materiais, por meio do conhecimento artesanal.

A expectativa inicial do controller era que o OM pudesse contribuir para a melhoria da dinâmica do processo de controle, em função do duplo accountability , sobretudo devido à contratação de alguns gestores de pacotes para essa finalidade, especialistas em algumas classes de gastos. Apesar de algumas dúvidas, o controller deliberou (seta h) pela implantação do OM.

Iniciou-se então a mudança dos processos de controle, por meio da adequação de planilhas em Excel e a estruturação de novos relatórios, que permitiam compreender o comportamento dos gastos, tanto na dimensão das entidades como dos pacotes. Para essa finalidade, foram utilizadas ferramentas de BI – Business Intelligence –, que serão mais bem explicadas no tópico de gestão de TI. Ao final de 2018, as mudanças nas planilhas e em alguns processos para geração dos relatórios, além da contratação e treinamento das pessoas, estavam concluídas. Pode-se dizer que houve uma alteração do arranjo material das práticas ( Schatzki, 2002Schatzki, T. R. (2002). The site of the social: a philosophical account of the constitution of social life and change. University Park: Penn State Press. , 2006Schatzki, T. R. (2006). On organizations as they happen. Organization Studies, 27(12), 1863-1873. doi:10.1177/0170840606071942
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), o que permitiu que o OM fosse utilizado a partir de 2019.

No início de 2019, o controller e os gestores de gastos constataram que o nível de controle havia aumentado, mas, devido à piora da situação financeira, ainda não atendia às necessidades da área financeira sobre a gestão de gastos, pois havia, comparativamente a 2017 e 2018, maiores volatilidades, incertezas e riscos, e as ações para a redução dos gastos não estavam sendo feitas da forma como a área financeira julgava necessário. Ao final do primeiro semestre de 2019, o desequilíbrio financeiro chegou a tal ponto que a diretoria solicitou aos gestores que cortassem funcionários. Parte deles eram gestores de gastos, ligados ao OM (que ainda estava em suas funções iniciais). Outros profissionais se desligaram por iniciativa própria. E mesmo representando uma redução inferior a 50% dos envolvidos nos controles do OM, houve acentuada perda de accountability .

A perda de controle por falta de gestores, junto com a impossibilidade de prever quando novas contratações poderiam ser feitas, e a pressão do Diretor 1 e do gestor da área financeira, fez com que o controller decidisse (seta h) pelo retorno ao OC, a partir de 2020; para tanto, no último trimestre de 2019 foram iniciados os ajustes nas planilhas, integração de sistemas e adequação de funções, ou seja, o estabelecimento de um arranjo material ( Schatzki, 2002Schatzki, T. R. (2002). The site of the social: a philosophical account of the constitution of social life and change. University Park: Penn State Press. , 2006Schatzki, T. R. (2006). On organizations as they happen. Organization Studies, 27(12), 1863-1873. doi:10.1177/0170840606071942
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) semelhante ao existente anteriormente, mas com melhorias resultantes do processo desenvolvido a partir da adoção do OM.

Fragmentos da prática da gestão contábil e a prática orçamentária

A contabilidade é uma prática social (Burchell, Clubb, Hopwood, Hughes, & Nahapiet, 1980), e não é neutra ( Miller, 1994)Miller, P. (1994). Accounting as social and institutional practice: an introduction. In A. G. Hopwood, P. Miller (Eds.), Accounting as social and institutional practice (pp. 1-39). Cambridge: Cambridge University Press. , pois é capaz de legitimar decisões que podem ter consequências econômicas, sociais e políticas ( Gallhofer & Haslam, 1991)Gallhofer, S., Haslam, J. (1991). The aura of accounting in the context of a crisis: Germany and the first world war. Accounting, Organizations and Society, 16(5-6), 487-520. doi:10.1016/0361-3682(91)90039-H . Seu processo de elaboração está delimitado por procedimentos técnicos e normas, que registram eventos econômicos realizados pelas organizações (compras, vendas, investimentos etc.); entretanto, os valores registrados estão sujeitos a julgamentos e modelos de cálculos, e podem não representar exatamente a realidade ( Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 2019)Comitê de Pronunciamentos Contábeis (2019). CPC-00(R2) – Estrutura conceitual para relatório financeiro. Brasília, DF: Autor. Recuperado de https://bit.ly/34VLmpa
https://bit.ly/34VLmpa...
.

A dinâmica dos negócios, os impactos econômicos, e o surgimento de novos contextos legais, entre outras demandas, pode requerer ajustes na prática contábil para que ela sempre expresse, adequadamente, os eventos econômicos. Em função do grande volume de transações realizadas pelas organizações, e da utilização de softwares para a gestão integrada (ERP), diversos processos de gestão são integrados automaticamente para gerar os lançamentos contábeis e relatórios. O processo de implantação desses softwares na contabilidade é complexo e trabalhoso, pois deve levar em conta também a dimensão dos relatórios eletrônicos que são entregues digitalmente às autoridades brasileiras, além da apuração dos tributos a serem pagos; dada a complexidade das regras tributárias no Brasil, isso requer conhecimento específico.

Neste artigo, consideramos, na ABC, a prática da gestão contábil como o conjunto das ações escolhidas que levam à adoção de determinadas diretrizes contábeis e de sua operacionalização, e que influencia os resultados apresentados nos relatórios contábeis e financeiros.

Na ABC, todo o processo de elaboração das demonstrações contábeis e financeiras é realizado internamente, e está subordinado à coordenação da controladoria. Para a realização desse processo são necessárias diversas atividades, algumas dentro da própria controladoria (conciliação contábil, ajustes em contas específicas, cadastramento de novos tipos de contabilização de transações e eventos, adequações de parâmetros fiscais etc.), e outras relacionadas ao fluxo de documentos em outros locais da organização (entrada de notas fiscais no estoque, saída de produtos pela expedição, controle de baixas de equipamentos pela manutenção etc.). Também são utilizados diversos sistemas (compras, estoque, controle da produção, vendas, gestão de ativos permanentes, contabilidade etc.), que são integrados em um software de gestão (ERP). O processo de elaboração da contabilidade é cada vez mais automatizado, porque a quantidade de transações e eventos é elevada, sobretudo em empresas do porte e segmento da ABC; se assim não fosse, inviabilizaria a realização da contabilidade atualmente.

Em 2017, a gestão contábil na ABC tinha uma interface estreita com a gestão financeira, a dos gastos e a orçamentária. Os valores considerados no planejamento financeiro eram aqueles previstos pelo orçamento e comparados com os apurados pela contabilidade (valores realizados).

O processo de avaliação do OM como complementar ou substituto do OC também examinou seus impactos na gestão contábil. O OM adiciona uma dimensão na análise, a dos pacotes, ou seja, da agregação de grupos de contas por natureza; entretanto, não foi considerada necessária uma mudança nos parâmetros de contabilização, mas a elaboração de relatórios envolvendo a agregação das informações em pacotes e entidades e, para isso, seria suficiente utilizar softwares de BI. Tal avaliação pode ser compreendida por meio da adequação dos arranjos materiais ao nível do conhecimento artesanal e da sabedoria prática, sem a necessidade de mudanças expressivas (setas (a), (b), (c) e (d) da Figura 1 ). À luz de tais percepções, o controller deliberou pela substituição do OC pelo OM.

A partir de 2019, com a adoção do OM, a contabilidade passou também a disponibilizar informações por meio de uma dimensão adicional, a dos pacotes (ou seja, agrupamentos de contas com certa similaridade, gerenciadas por especialistas nos tipos de gastos), e que visava proporcionar melhor accountability .

A geração dos dados tendo em conta os pacotes foi realizada durante o ano de 2019; entretanto, devido à demissão de alguns profissionais que gerenciavam os pacotes, o accountability foi perdido, uma vez que deixou de ocorrer a responsabilização, e a impossibilidade de outros colaboradores ocuparem essas posições levou ao questionamento sobre a continuidade de tais atividades pela contabilidade. No último trimestre de 2019, o controller deliberou pelo retorno ao OC, e a partir de 2020 a geração de relatórios com base em pacotes deixou de ser realizada.

Fragmentos da prática de gestão da tecnologia de informação e a prática orçamentária

Na ABC, a gestão da TI está subordinada diretamente à diretoria, e é responsável por identificar as tecnologias (inclusive relativas à comunicação) que podem influenciar as demais capacidades estratégicas e operacionais da empresa. Seu papel é importante para a melhoria da cadeia de valor, em função dos ganhos de produtividade e efetividade que ela pode trazer. Paradoxalmente, na prática seu foco tem sido mais voltado às atividades operacionais que visam atender às demandas específicas dos diversos usuários, apoiar a infraestrutura, a integração de programas nativos com sistemas e pacotes de mercado, extrair e gerenciar bases de dados, e gerenciar os links e as comunicações entre as diferentes unidades organizacionais.

Em 2010, a ABC adquiriu um sistema de gestão integrada (ERP) nacional com o qual pode integrar diversos SI: contabilidade, administração financeira e fluxo de caixa, compras, estoques, custos, câmbio, importação/exportação, folha de pagamento. No processo de implementação do ERP não foi possível abandonar o uso de sistemas nativos, que haviam sido desenvolvidos e estavam em pleno uso. Isso levou a uma necessidade de integrar o ERP aos sistemas nativos, o que, de certa forma, limitou a efetividade do ERP, e demandava significativo trabalho em integração e manutenção de bancos de dados. Naquela ocasião, apesar de estarem disponíveis no ERP, não foram implementados os módulos relativos ao CRM ( Customer Relationship Management ) e ao OC, por não terem sido considerados adequados às necessidades da ABC. Posteriormente foi adquirido um software de CRM, responsável pelo gerenciamento das vendas, que também foi integrado ao ERP. Posteriormente, em 2016, foi adquirido outro sistema (BI), que possibilita a geração de relatórios dinâmicos ao acessar as bases de dados extraídas dos diversos sistemas.

Desde 2017, a diretoria vem exigindo que a área de TIC (tecnologia de informação e comunicação) reduza gastos e investimentos, além de seu quadro de colaboradores. Entretanto, em face da necessidade de manutenção de sistemas desenvolvidos internamente, a permanência dos colaboradores foi considerada vital. Naquele ano, durante o processo de avaliação da adoção do OM, a área de TI foi consultada e identificou diversas limitações para o funcionamento adequado do OM, entre as quais restrições que impediam que o ERP gerasse informações, devido às dimensões sobrepostas de entidades e pacotes, pois os cadastros de entrada dos documentos que alimentavam a gestão financeira e a contabilidade eram distintos dos padrões requeridos para o OM. Para o gestor da área de TI, seria possível associar as informações por meio de bancos de dados e de relacionamentos “de para” em tabelas, mas isso não possibilitaria obter automaticamente as informações do ERP nas dimensões esperadas pelas diferentes áreas. Apesar dessas restrições, os gestores das áreas de contabilidade, de gastos e da área financeira aceitaram as alternativas propostas pela área de TI, e o controller deliberou (seta h da Figura 1 ) pela adoção do OM.

Como nos processos de gestão anteriormente avaliados, o ocorrido na área de TI possibilita compreender a dinâmica da construção do conhecimento artesanal quando os gestores refletem sobre as limitações do OC, antes e depois do processo de capacitação (setas (a) (b) (c) e (d) da Figura 1 ) influenciando os limites dos arranjos materiais, por meio do conhecimento artesanal.

A partir de 2018, a área de TI passou a trabalhar intensamente na elaboração dos processos para atender aos diferentes tipos de pacotes e entidades, segundo as visões esperadas. Durante o processo de adoção do OM, em 2019, as atividades associadas à gestão de TI foram ainda mais intensificadas. Os gestores das áreas perceberam as limitações estruturais apontadas pela TI em suas práticas, o que exigia novas adaptações para chegar ao desempenho esperado, e gerava forte insatisfação, sobretudo para o gestor da área financeira e o Diretor 1. Ao final de 2019, a pressão sobre a área de TI aumentou muito, com a saída de parte dos gestores de gastos, sem a expectativa de que essas funções fossem repostas. As possibilidades requeridas de mudanças estruturais nos arranjos materiais eram superiores à capacidade de adaptação e ajuste, por meio da tecnologia disponível na organização.

Isso levou o controller a avaliar a possibilidade de retomar o OC, pois os processos da gestão de TI poderiam se adequar melhor à redução do contingente de pessoas e às limitações tecnológicas; assim, ele deliberou (seta h) pela volta ao OC, a partir do ano seguinte.

A partir daí, ainda em 2019, as atividades em desenvolvimento para o OM foram encerradas, e parte dos recursos foram alocados para reativar os antigos processos do OC, adicionando algumas melhorias resultantes de integrações mais bem estruturadas entre bases de dados e relatórios que foram desenvolvidas para o OM.

Em 2020, dada a expansão dos negócios e a integração de uma nova atividade no portfólio de atividades da ABC, tornou-se imprescindível e urgente a adoção de um SI para atender às novas necessidades de simulações para a área financeira, quanto à acurácia e flexibilidade, mas principalmente para viabilizar as atividades de comércio eletrônico, consideradas vitais para a competitividade da empresa. Assim, optou-se por migrar todos os sistemas para um software de plataforma internacional, com capacidade de integrar as diversas funcionalidades, inclusive as nativas, e aquelas realizadas em outros sistemas. O novo software incorpora o módulo do OC, e é considerado adequado por usuários de outras empresas, o que parece indicar a continuidade de seu uso.

O entrelaçamento das práticas de gestão e a prática da deliberação na controladoria

Na ABC, a controladoria tem as seguintes funções: elaboração da contabilidade societária e fiscal, atendimento à auditoria externa, prestação de contas aos órgãos de controle, e acompanhamento de licenças e alvarás que asseguram a operação do negócio. Também responde pela gestão dos SI: participação no planejamento por meio da consolidação e acompanhamento do orçamento, pela qualidade e consistência das informações, o que depende diretamente da boa integração dos sistemas existentes, sejam nativos ou adquiridos (ERPs, BI, CRM).

Observamos na ABC a prática da deliberação, pelo controller , para a substituição de uma PCG, especificamente uma prática orçamentária. Entretanto, a racionalidade necessária para tal prática é construída pela soma de percepções e conhecimentos. Como uma colcha de retalhos ( patchwork ), a racionalidade não é produto ou propriedade de um indivíduo ou área, nem consiste em uma única prática, mas decorre da soma das diversas formas de compreensão e ação, em face de uma nova realidade emergente. Ela permeia os sistemas que a sustentam, e, por meio dos indivíduos, se constrói em um saber prático, que responde às demandas e, em última instância, contribui para a contínua existência da organização.

O julgamento prático, decorrente da sabedoria prática, é uma resposta às diversas demandas. De fato, o espaço para as decisões na controladoria da ABC é estreito, e as deliberações se encaixam em outras deliberações, da própria área ou das demais. A deliberação acontece como um processo legitimador, que confere conformidade e credibilidade àquilo que precisou ser aceito e consensualmente decidido. Não se nega o efeito performático dos julgamentos realizados, buscando a melhoria do desempenho, mesmo que muitas vezes eles tentem se adequar e dar significado prático ao que foi definido. Por outro lado, com base no que foi observado, não podemos aceitar que a decisão (especificamente a prática da deliberação) seja “um ato antecipatório e projetante, no qual o futuro é de certo modo determinado” ( Abbagnano, 2007Abbagnano, N. (2007). Dicionário de filosofia (5a ed.). São Paulo, SP: Martins Fontes. , p. 232). Essa afirmação não se verifica na prática. Tal pensamento, norteado por uma perspectiva positivista, desconsidera o emaranhado dos arranjos materiais e de indivíduos no contexto social, que decidem simultaneamente. Em relação ao efeito resultante das diversas pequenas deliberações, não se pode pensar em uma soma vetorial, mas na elaboração de um amálgama.

Se, por um lado, esse emaranhado pode limitar a influência direta de cada deliberação, é por meio dele que elas se interconectam e potencializam. O emaranhado é um lago onde ondas causadas pelo impacto de diversas pedras jogadas (deliberações) se sobrepõem (se somam), e tem por resultante o efeito projetante responsável pelo acontecer da organização. A energia que possibilitou lançar as pedras é a decisão prática, resultante do conhecimento prático coletivo, que promove e orienta a capacidade de julgamento prático, ou seja, a sabedoria prática. Esta contribui diretamente para a manutenção do acontecer da organização ( Schatzki, 2006Schatzki, T. R. (2006). On organizations as they happen. Organization Studies, 27(12), 1863-1873. doi:10.1177/0170840606071942
https://doi.org/10.1177/0170840606071942...
).

Na ABC, entre 2017 e 2020, quando a prática da deliberação na controladoria foi avaliada para decidir sobre a substituição de uma prática orçamentária por outra, identificamos o julgamento performativo como a força motriz para a construção do conhecimento A evolução dos fatos narrados também revela a resiliência da ABC, decorrente da robustez de sua estrutura e recursos (ativos), mas também de sua capacidade de ajuste às pressões que fogem ao seu controle, e de resposta rápida a novas oportunidades. Sob esse enfoque, os julgamentos performativos também podem ser considerados como base para tal tipo de atributo organizacional, tão pesquisado atualmente ( Conz & Magnani, 2020Conz, E., Magnani, G. (2020). A dynamic perspective on the resilience of firms: a systematic literature review and a framework for future research. European Management Journal, 38(3), 400-412. doi:10.1016/j.emj.2019.12.004 ; Hillmann & Guenther, 2021)Hillmann, J., Guenther, E. (2021). Organizational resilience: a valuable construct for management research? International Journal of Management Reviews, 23(1), 7-44. doi:10.1111/ijmr.12239 .

Conclusões

O artigo analisou a prática da deliberação em uma controladoria, especificamente a decisão de substituir uma prática orçamentária por outra, à luz dos julgamentos performativos, em uma empresa de grande porte em São Paulo. O trabalho de campo ocorreu no período de 2017a 2020, com o envolvimento direto de um dos pesquisadores.

A deliberação praticada na controladoria é explicada pelos julgamentos performáticos, ou seja, a prática de construir conhecimento prático e utilizá-lo como base para as decisões práticas, gerando a sabedoria prática ( Bispo, 2017Bispo, M. S. (2017). Educating qualitative researchers in management: toward performative judgements. Revista de Administração de Empresas, 57(2), 158-169. doi:10.1590/s0034-759020170205 ). Essa sabedoria permeia a organização por meio dos indivíduos, mas também impregna as coisas (sistemas de computador, processos, modelos etc.), que são “usadas” pelos diversos indivíduos que executam diversas práticas simultaneamente. Em última instância, a deliberação decorre de outras práticas de gestão.

Se, de um lado, o emaranhado gerado por indivíduos, coisas e práticas pode limitar a influência direta de cada deliberação, é nesse contexto que estão os elementos que contribuem para a construção de uma realidade momentânea e única, da qual a deliberação faz parte. Diferente da visão positivista, em que relações de causa e efeito são estabelecidas, a análise da prática da deliberação na controladoria da ABC revela o cuidadoso resultado, que é o devir da racionalidade, decorrente de inúmeros fatores.

Este trabalho contribui para que os executivos, nas empresas, atentem cuidadosamente para a definição de diretrizes, sobretudo as de longo prazo, pois elas podem ser determinantes para o sucesso, mas também limitam as escolhas. É preciso dar atenção ao estabelecimento da infraestrutura tecnológica que sustenta o core business (arranjos materiais). Numa época em que a TIC é a base para qualquer tipo de negócio, essa infraestrutura deve ser robusta em seus aspectos centrais, mas flexível para aceitar adaptações periféricas. Por fim, destacamos o cuidado e atenção com os profissionais da média gerência. Em última análise, são eles que realizam os ajustes dinâmicos, por meio de suas deliberações, ao executarem as diversas práticas de gestão. Nesse sentido, a cultura organizacional deve estar alinhada aos processos de avaliação de desempenho, pois do contrário, as tensões criadas poderão dificultar, ou mesmo impedir, que o conhecimento prático seja criado e flua entre as diversas áreas da organização.

Para a academia, sobretudo o mainstream da CG, em trabalhos que utilizam abordagens estatísticas para avaliar a existência de relações causais, sugerimos mais cuidado com as conclusões, e mais ainda com a generalização dos resultados (seta g da Figura 1 ).

Sugerimos alguns tópicos para novas pesquisas: (a) buscar compreender as práticas que afetam a resiliência organizacional, pois essa abordagem pode trazer contribuições interessantes e auxiliar no entendimento dos atributos que a constituem, o que tem sido mencionado em recentes pesquisas ( Conz & Magnani, 2020Conz, E., Magnani, G. (2020). A dynamic perspective on the resilience of firms: a systematic literature review and a framework for future research. European Management Journal, 38(3), 400-412. doi:10.1016/j.emj.2019.12.004 ; Hillmann & Guenther, 2021)Hillmann, J., Guenther, E. (2021). Organizational resilience: a valuable construct for management research? International Journal of Management Reviews, 23(1), 7-44. doi:10.1111/ijmr.12239 ; (b) identificar, sob a perspectiva das práticas, os atributos que constituem as capacidades dinâmicas relacionadas ao estabelecimento e manutenção de vantagens competitivas sustentáveis (Kump, Engelmann, Kessler, & Schweiger, 2019; Teece & Pisano, 2003)Teece, D., Pisano, G. (2003). The dynamic capabilities of firms. In C. W. Holsapple (Ed.), Handbook on Knowledge Management 2 (pp. 195-213). New York: Springer. ; e (c) sob a ótica das capacidades dinâmicas ambidestras ( Chen, 2017Chen, Y. (2017). Dynamic ambidexterity: how innovators manage exploration and exploitation. Business Horizons, 60(3), 385-394. doi:10.1016/j.bushor.2017.01.001 ; Úbeda-García, Claver-Cortés, Marco-Lajara, & Zaragoza-Sáez, 2020), identificar as práticas que possibilitam o foco no momento atual, naquilo que se tem, e ao mesmo tempo projetar o desconhecido, o disruptivo.

Agradecimentos

Os autores agradecem as contribuições recebidas da equipe editorial e revisores.

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  • Welsch, G. (1994). Orçamento empresarial (5a ed.). São Paulo, SP: Atlas.

Notas

  • 1
    . Accountability: dever ou obrigação de prestar contas; responsabilidade pela prestação de contas ( Castro, 2013Castro, M. M. (2013). Dicionário de direito, economia e contabilidade: português-inglês/inglês-português (4a ed.). São Paulo, SP: Forense. ).
  • 2
    . Benchmark: referência (termo já incorporado ao jargão econômico e administrativo brasileiro). Benchmarking é o processo de comparar o desempenho de empresas que se destacam em determinada área ou atividade, usando-as como padrão ( Castro, 2013Castro, M. M. (2013). Dicionário de direito, economia e contabilidade: português-inglês/inglês-português (4a ed.). São Paulo, SP: Forense. ).
  • 3
    . Top-down , no contexto desta pesquisa, uma ação impositiva por parte dos líderes sobre os liderados.
  • 4
    . Bottom-up , no contexto desta pesquisa, iniciativas dos liderados dirigidas aos seus líderes.
  • 5
    . Diagramas de Venn são usados em matemática para simbolizar graficamente propriedades, axiomas e problemas, relativamente aos conjuntos.
  • Verificação de plágio
    A O&S submete todos os documentos aprovados para a publicação à verificação de plágio, mediante o uso de ferramenta específica.
  • Disponibilidade de dados
    A O&S incentiva o compartilhamento de dados. Entretanto, por respeito a ditames éticos, não requer a divulgação de qualquer meio de identificação dos participantes de pesquisa, preservando plenamente sua privacidade. A prática do open data busca assegurar a transparência dos resultados da pesquisa, sem que seja revelada a identidade dos participantes da pesquisa.
  • Financiamento: Os autores não receberam apoio financeiro para a pesquisa, autoria ou publicação deste artigo.
Editor Associado: Marcelo de Souza Bispo

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    28 Set 2020
  • Aceito
    26 Jan 2022
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