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Telas na Infância: Postagens de Especialistas em Grupos de Cuidadores no Facebook

Screens in Childhood: Posts of Specialists in Caretakers’ Groups in the Facebook

Pantallas en la Infancia: las Publicaciones de Expertos en Grupos de Cuidadores en Facebook

Resumo

Apesar das crescentes investigações sobre uso de telas na infância, essa é uma temática complexa e ainda recente, que traz diversos desafios para pesquisadores e cuidadores. Comunidades virtuais em redes sociais são utilizadas por mães e pais para esclarecer dúvidas e receber conselhos acerca da parentalidade e saúde infantil, podendo, simultaneamente, assumir uma função prescritiva e normativa quanto ao seu modo de agir. Sendo assim, este artigo pretende compreender como o uso de telas na infância vem sendo abordado por especialistas em grupos de mães e pais no Facebook. Foi realizado um estudo qualitativo envolvendo 49 postagens de especialistas, sobretudo psicólogos e educadores, extraídas de cinco grupos públicos de mães e pais nessa rede social. Os textos das publicações foram verificados por meio de análise temática e discutidos com base no referencial teórico psicanalítico. Os resultados mostraram que os especialistas destacam os possíveis prejuízos do uso de telas na infância, além de fornecer orientações aos pais sobre como lidar com sua presença no cotidiano das crianças e de suas famílias. Concluiu-se que apesar dos grupos de cuidadores no Facebook serem uma ferramenta de divulgação de informações acerca do uso de telas na infância, cabe não naturalizar a presença de especialistas nesses espaços virtuais criados por pais e mães, interpondo-se nos saberes e nas trocas horizontalizadas entre os cuidadores.

Palavras-chave:
Crianças; Psicanálise; Análise temática; Facebook; Especialismos

Abstract

Although investigations on the use of screens in childhood are increasing, this is a complex and recent topic, which poses several challenges for researchers and caregivers. Virtual communities in social networks are used by mothers and fathers to clarify doubts and receive advice regarding parenting and child health, at times, simultaneously, assuming a prescriptive and normative role on their way of acting. Therefore, this study aimed to understand how the use of screens in childhood has been approached by experts in groups of mothers and fathers on Facebook. A qualitative study was carried out involving 49 posts from specialists, mainly psychologists and educators, extracted from five public groups of mothers and fathers in this social network. The publications’ texts were verified via thematic analysis and discussed based on the psychoanalytical theoretical framework. The results showed that experts highlight the possible damage of the use of screens in childhood, in addition to providing guidance to parents on how to deal with the presence of digital technology in the daily lives of children and families. It was concluded that, although caregivers’ groups on Facebook are a tool for disseminating information about the use of screens in childhood, it is important not to naturalize the presence of specialists in these virtual spaces created by fathers and mothers, interposing in the horizontally interchanges that occur between the caregivers.

Keywords:
Children; Psychoanalysis; Thematic analysis; Facebook; Specialisms

Resumen

A pesar de las crecientes investigaciones sobre el uso de pantallas en la infancia, este es un tema complejo y aún reciente, que plantea varios desafíos para investigadores y cuidadores. Las comunidades virtuales en las redes sociales son utilizadas por madres y padres para aclarar dudas y recibir consejos sobre educación y salud infantil, pudiendo, al mismo tiempo, asumir un rol prescriptivo y normativo sobre su forma de actuar. Por lo tanto, este estudio tuvo como objetivo comprender cómo el uso de las pantallas en la infancia ha sido abordado por especialistas en grupos de madres y padres en Facebook. Se realizó un estudio cualitativo a partir de 49 publicaciones de especialistas, principalmente de psicólogos y educadores, extraídas de cinco grupos públicos de madres y padres en esta red social. Se realizó en los textos de las publicaciones un análisis temático y se utilizó el marco teórico psicoanalítico. Los resultados mostraron que los expertos destacan posibles daños que provoca el uso de pantallas en la infancia, además de orientar a los padres sobre cómo afrontar esta presencia de la tecnología digital en el día a día de los niños y sus familias. Se concluyó que, a pesar de que los grupos de cuidadores en Facebook son una herramienta de difusión de información sobre el uso de pantallas en la infancia, es importante no naturalizar la presencia de especialistas en estos espacios virtuales creados por padres y madres que se interpone entre los saberes e intercambios horizontales de los cuidadores.

Palabras clave:
Niños; Psicoanálisis; Análisis temático; Facebook; Especialidades

Introdução

A atual geração de crianças entra em contato com as telas desde um período muito precoce de suas vidas. Embora a televisão ainda seja o tipo de mídia mais comum na infância (Nobre et al., 2021Nobre, J. N. P., Santos, J. N., Santos, L. R., Guedes, S. C., Pereira, L., Costa, J. M., & Morais, R. L. S. (2021). Fatores determinantes no tempo de tela de crianças na primeira infância. Ciência & Saúde Coletiva, 26(3), 1127-36. http://doi.org/10.1590/1413-81232021263.00602019
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), os dispositivos interativos móveis - tais quais, tablets e smartphones - também têm ampla inserção na rotina de bebês e crianças (Hiniker, Radesky, Livingstone, & Blum-Ross, 2019Hiniker, A., Radesky, J. S., Livingstone, S., & Blum-Ross, A. (2019, May 4-9). Moving beyond “the great screen time debate” in the design of technology for children [Conference Session]. Conference on Human Factors in Computing Systems, Association for Computing Machinery, New York, NY, United States. https://dl.acm.org/citation.cfm?id=3311745
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; Radesky & Christakis, 2016Radesky, J. S., & Christakis, D. A. (2016). Increased screen time: implications for early childhood development and behavior. Pediatric Clinics, 63, 827-39. http://doi.org/10.1016/j.pcl.2016.06.006
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).

Lidar com a presença das telas é um desafio para as famílias na atualidade, em função desses dispositivos fazerem parte do cotidiano tanto dos adultos quanto das crianças, podendo atrair seu interesse desde os primeiros anos da infância. Muitas vezes as telas são utilizadas para acalmar as crianças (Kabali et al., 2015Kabali, H. K., Irigoyen, M. M., Nunez-Davis, R., Budacki, J. G., Mohanty, S. H., Leister, K. P., & Bonner, R. L. (2015). Exposure and use of mobile media devices by young children. Pediatrics , 136(6), 1044-50. http://doi.org/10.1542/peds.2015-2151
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; Radesky, Peacock-Chambers, Zuckerman, & Silverstein, 2016Radesky, J., Peacock-Chambers, E., Zuckerman, B., & Silverstein, M. (2016). Use of mobile technology to calm upset children: associations with social-emotional development. JAMA Pediatrics , 170(4), 397-9. http://jamanetwork.com/pdfaccess.ashx?url=/data/journals/peds/935110/Resolução no 510, de 7 de abril de 2016. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2016/Reso510.pdf
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), como recurso educativo (Guedes et al., 2020Guedes, S. C., Morais, R. L. S., Santos, L. R., Leite, H. R., Nobre, J. N. P., & Santos, J. N. (2020). A utilização de mídias interativas por crianças na primeira infância: um estudo epidemiológico. Revista Paulista de Pediatria, 38, 1-7. http://doi.org/10.1590/1984-0462/2020/38/2018165
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; Zimmermann, Christakis, & Meltzoff, 2007Zimmermann, F. J.; Christakis, D. A., & Meltzoff, A. N (2007). Television and DVD/video viewing in children younger than 2 years. Archives of Pediatrics & Adolescent Medicine, 161(5), 473-9. http://doi.org/10.1001/archpedi.161.5.473
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) ou para entretê-las enquanto os cuidadores realizam tarefas profissionais e domésticas (Zimmermann et al., 2007Zimmermann, F. J.; Christakis, D. A., & Meltzoff, A. N (2007). Television and DVD/video viewing in children younger than 2 years. Archives of Pediatrics & Adolescent Medicine, 161(5), 473-9. http://doi.org/10.1001/archpedi.161.5.473
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). Ao mesmo tempo, artigos apresentaram que mães e pais expressam preocupação quanto aos efeitos dessa exposição precoce, podendo se sentir culpados pelo excesso de tecnologia na vida de seus filhos (Bentley, Turner, & Jago, 2016Bentley, G. F., Turner, K. M., & Jago, R. (2016). Mothers’ views of their preschool child’s screen-viewing behaviour: a qualitative study. BMC Public Health, 16(718), 1-11. http://doi.org/10.1186/s12889-016-3440-z
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; Mallmann & Frizzo, 2019Mallmann, M. Y., & Frizzo, G. B (2019). O uso das novas tecnologias em famílias com bebês: um mal necessário? Revista Cocar, 7, 26-46.).

Nessa linha, diferentes perspectivas teóricas psicanalíticas ressaltam o papel fundamental dos primeiros anos de vida e das relações iniciais no desenvolvimento infantil (Mahler, 1982Mahler, M. (1982). O processo de separação-individuação. Artes Médicas.; Spitz, 1979Spitz, R. (1979). O primeiro ano de vida. Martins Fontes.; Winnicott, 2006Winnicott, D. W. (2006). Os bebês e suas mães . Martins Fontes.). De forma geral, a psicanálise destaca a relevância dos cuidados dispensados ao bebê nos primeiros anos como essenciais para a sua constituição psíquica, ou seja, um período fundante de sua saúde mental. Nesses primeiros tempos espera-se do cuidador uma postura de adaptação ativa às necessidades do bebê, que só pode ocorrer por meio de uma relação viva e pessoal (Winnicott, 2011Winnicott, D. W. (2011). Segurança. In: D. W. Winnicott (Ed.), A família e o desenvolvimento individual. Martins Fontes.), a qual requer que o cuidador principal esteja disponível, física e emocionalmente, para perceber, receber e interpretar os sinais do bebê. O ambiente eletrônico, em contrapartida, não apresenta a capacidade de adaptar-se dessa forma, por essa razão, não fornece a possibilidade de singularização, essencial ao desenvolvimento da criança.

Ademais, o uso indiscriminado de telas nos primeiros anos de vida bombardeia a criança de estimulações que ultrapassam a capacidade de elaboração do seu psiquismo ainda em desenvolvimento (Assemany, 2016Assemany, N. M. (2016). Superestimulação na infância: uma questão contemporânea. Cadernos de Psicanálise, 38(34), 231-43.).O atravessamento das telas nas interações iniciais pode também prejudicar a disponibilidade do cuidador, com estudos mostrando menor sensibilidade parental às necessidades dos filhos (McDaniel & Radesky, 2018McDaniel, B., & Radesky, J. (2018). Technoference: Parent distraction with technology and associations with child behavior problems. Child Development, 89(1), 100-9. https://doi.org/10.1111/cdev.12822
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), além de menor frequência e qualidade das interações entre pais e criança quando esses dispositivos estão sendo utilizados (Anderson & Hanson, 2013Anderson, D. R., & Hanson, K. (2013). What researchers have learned about toddlers and television. Zero to Three, 4-10. http://www.researchgate.net/publication/287195548_What_Researchers_have_learned_about_toddlers_and_television
http://www.researchgate.net/publication/...
; Radesky et al., 2014Radesky, J. S., Kistin, C. J., Zuckerman, B., Nitzberg, K., Gross, J., Kaplan-Sanoff, M., Augustyn, M., & Silverstein, M. (2014). Patterns of mobile device use by caregivers and children during meals in fast food restaurants. Pediatrics , 133(4), 843-9. https://doi.org/10.1542/peds.2013-3703
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).

Por essa razão, autores psicanalíticos contemporâneos destacam a importância das telas não serem utilizadas inadvertidamente, sobretudo, durante os primeiros anos de vida, quando se inicia o processo de constituição psíquica (Bernardino, 2017Bernardino, L. M. F. (2017). Da babá “catódica” aos duplos virtuais: os novos “outros” da infância contemporânea. In A. Baptista & J. Jerusalinsky (Eds.), Intoxicações eletrônicas: o sujeito na era das relações virtuais (pp. 146-65). Ágalma.; Jerusalinsky, 2017Jerusalinsky, J. (2017). As crianças entre os laços familiares e as janelas virtuais. In A. Baptista, & J. Jerusalinsky (Eds.), Intoxicações eletrônicas: o sujeito na era das relações virtuais (pp. 39-55). Ágalma.). Segundo Bernardino (2017)Bernardino, L. M. F. (2017). Da babá “catódica” aos duplos virtuais: os novos “outros” da infância contemporânea. In A. Baptista & J. Jerusalinsky (Eds.), Intoxicações eletrônicas: o sujeito na era das relações virtuais (pp. 146-65). Ágalma., a introdução precoce das telas traz o risco de privar os bebês daquilo que mais precisam: a relação com outro ser humano que lhes seja significativo e que os abasteça da experiência da falta e da diferença.

Nesse ensejo, estudos encontraram associações entre maior exposição às telas na primeira infância e atrasos cognitivos e de linguagem (Anderson & Hanson, 2013Anderson, D. R., & Hanson, K. (2013). What researchers have learned about toddlers and television. Zero to Three, 4-10. http://www.researchgate.net/publication/287195548_What_Researchers_have_learned_about_toddlers_and_television
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; Duch, Fisher, Ensari, & Harrington, 2013Duch, H., Fisher, E. M., Ensari, I., & Harrington, A. (2013). Screen time use in children under 3 years old: a systematic review of correlates. International Journal of Behavioral Nutrition and Physical Activity, 10, 1-10. https://doi.org/10.1186/1479-5868-10-102
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), dificuldades na autorregulação (Cerniglia, Cimino, & Ammaniti, 2020Cerniglia, L., Cimino, S., & Ammaniti, M. (2020). What are the effects of screen time on emotion regulation and academic achievements? A three-wave longitudinal study on children from 4 to 8 years of age. Journal of Early Childhood Research, 19(2), 1-16. https://doi.org/10.1177/1476718X20969846
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; Radesky et al., 2014Radesky, J. S., Kistin, C. J., Zuckerman, B., Nitzberg, K., Gross, J., Kaplan-Sanoff, M., Augustyn, M., & Silverstein, M. (2014). Patterns of mobile device use by caregivers and children during meals in fast food restaurants. Pediatrics , 133(4), 843-9. https://doi.org/10.1542/peds.2013-3703
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) e no desempenho escolar (Cerniglia et al., 2020Cerniglia, L., Cimino, S., & Ammaniti, M. (2020). What are the effects of screen time on emotion regulation and academic achievements? A three-wave longitudinal study on children from 4 to 8 years of age. Journal of Early Childhood Research, 19(2), 1-16. https://doi.org/10.1177/1476718X20969846
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), comportamento sedentário e obesidade (Willis, Roberts, Berry, Bryant, & Rudolf, 2016Willis, T. A., Roberts, K. P. J., Berry, T. M., Bryant, M., & Rudolf, M. C. J. (2016). The impact of HENRY on parenting and family lifestyle: a national service evaluation of a preschool obesity prevention programme. Public Health, 136, 101-8. http://doi.org/10.1016/j.puhe.2016.04.006
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), menor tempo e qualidade de sono (Cheung, Bedford, Urabain, Karmiloff-Smith, & Smith, 2017Cheung, C. H. M., Bedford, R., Urabain, I. R. S.; Karmiloff-Smith, A., & Smith, T. J. (2017). Daily touchscreen use in infants and toddlers is associated with reduced sleep and delayed sleep onset. Scientific Reports, 7, 1-7. http://doi.org/10.1038/srep46104
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; Domingues-Montanari, 2017Domingues-Montanari, S. (2017). Clinical and psychological effects of excessive screen time on children. Journal of Paediatrics and Child Health, 53(4), 333-8. http://doi.org/10.1111/jpc.13462
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) e aumento de problemas socioemocionais (Radesky et al., 2016Radesky, J., Peacock-Chambers, E., Zuckerman, B., & Silverstein, M. (2016). Use of mobile technology to calm upset children: associations with social-emotional development. JAMA Pediatrics , 170(4), 397-9. http://jamanetwork.com/pdfaccess.ashx?url=/data/journals/peds/935110/Resolução no 510, de 7 de abril de 2016. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2016/Reso510.pdf
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) em crianças. Esses desfechos adversos, no entanto, também podem estar relacionados a fatores como nível socioeconômico, sedentarismo e alimentação não saudável (Ashton & Beattie, 2019Ashton, J., & Beattie, R. M. (2019). Screen time in children and adolescents: is there evidence to guide parents and policy? The Lancet Child & Adolescent Health, 3(5), 292-4. https://doi.org/10.1016/S2352-4642(19)30062-8
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), assim como, à diminuição de outras atividades fundamentais ao desenvolvimento infantil, tais quais exercícios físicos, contato social com amigos e boa higiene do sono (Royal College of Paediatrics and Child Health, 2019Royal College of Paediatrics and Child Health (2019). The health impacts of screen time: a guide for clinicians and parents. RCPCH. https://www.rcpch.ac.uk/sites/default/files/2018-12/rcpch_screen_time_guide_-_final.pdf
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).

Outras pesquisas indicam que o uso cauteloso de mídias móveis interativas, que permitem o toque na tela e a interação do usuário com o conteúdo, pode ter efeitos benéficos no desenvolvimento cognitivo, da linguagem e na motricidade fina infantil (Anderson & Subrahmanyam, 2017Anderson, D., & Subrahmanyam, K. (2017). Digital screen media and cognitive development. Pediatrics , 40(2), 57-62. http://doi.org/10.1542/peds.2016-1758C
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; Bedford, Urabain, Cheung, Karmiloff-Smith, & Smith, 2016Bedford, R., Urabain, I. R. S., Cheung, C. H. M., Karmiloff-Smith, A., & Smith, T. J. (2016). Toddlers’ fine motor milestone achievement is associated with early touchscreen scrolling. Frontiers in Psychology, 7, 1-8. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2016.01108
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; Nobre et al., 2020Nobre, J. N. P., Vinolas Prat, B., Santos, J. N., Santos, L. R., Pereira, L., Guedes, S. C., Ribeiro, R. F., & Morais, R. L. S. (2020). Qualidade de uso de mídias interativas na primeira infância e desenvolvimento infantil: uma análise multicritério. Jornal de Pediatria, 96(3), 310-7. https://doi.org/10.1016/j.jped.2018.11.015
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; Radesky, Schumacher, & Zuckerman, 2015Radesky, J. S., Schumacher, J., & Zuckerman, B. (2015). Mobile and interactive media use by young children: the good, the bad, and the unknown. Pediatrics , 135(1), 1-3. http://doi.org/10.1542/peds.2014-2251
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). No entanto, esses eventuais benefícios dependem do tempo de uso, da idade da criança, do conteúdo a que está exposta, da finalidade do uso e da mediação parental (Nobre et al., 2021Nobre, J. N. P., Santos, J. N., Santos, L. R., Guedes, S. C., Pereira, L., Costa, J. M., & Morais, R. L. S. (2021). Fatores determinantes no tempo de tela de crianças na primeira infância. Ciência & Saúde Coletiva, 26(3), 1127-36. http://doi.org/10.1590/1413-81232021263.00602019
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).

Conforme Frizzo (2022Frizzo, G. B. (2022). O uso de telas na primeira infância: O que mudou na pandemia COVID-19 e que lições ainda temos a aprender? Revista Eletrônica Saúde Mental Álcool e Drogas, 18(2), 5-7. https://doi.org/10.11606/issn.1806-6976.smad.2022.000217
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), os estudos sobre o impacto das telas na infância inicialmente destacavam associações entre o tempo de uso e desfechos no desenvolvimento infantil, mas, hoje, a literatura sugere que essa temática é muito mais complexa, pois além do tempo de uso, variáveis como o tipo de conteúdo acessado, uso passivo ou ativo, segurança digital e mediação do adulto também necessitam ser consideradas. Já Reus e Mosley (2018Reus, E. J., & Mosley, I. T. (2018). The health and development correlates of screen media exposure in children 0-5yrs: An integrative literature review. Australian Journal of Child and Family Health Nursing, 15(2), 12-21. https://search.informit.org/doi/10.3316/informit.192484297913792
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) ressaltam a necessidade de mais estudos empregando diversas amostras em delineamentos de alta qualidade, que possam sustentar intervenções e orientações eficazes em uso de telas na infância.

Ainda assim, diante dos resultados de estudos sugerindo prejuízos das telas ao desenvolvimento infantil, algumas orientações vêm sendo consensuadas e divulgadas em diretrizes de entidades da área da saúde (American Academy of Pediatrics (AAP), 2016AAP - American Academy of Pediatrics. (2016). Media and young minds. Pediatrics, 138(5), 1-8. http://doi.org/10.1542/peds.2016-2591
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; Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), 2019SBP - Sociedade Brasileira de Pediatria. (2019). #Menos telas #Mais saúde. Manual de Orientação, Grupo de trabalho Saúde na Era Digital. SBP. https://bit.ly/41i2q0r
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). De modo geral, as associações de pediatria indicam que bebês não sejam expostos às telas nos dois primeiros anos de vida, e que crianças entre 2 e 5 anos não passem mais de uma hora por dia em frente aos eletrônicos. Já para aquelas com idades entre 6 e 10 anos o indicado é que sejam expostas a, no máximo, uma a duas horas ao dia, com supervisão dos pais (SBP, 2019SBP - Sociedade Brasileira de Pediatria. (2019). #Menos telas #Mais saúde. Manual de Orientação, Grupo de trabalho Saúde na Era Digital. SBP. https://bit.ly/41i2q0r
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).

Apesar dessas recomendações, pesquisas têm mostrado que o uso de telas nos primeiros anos de vida é frequente (Hiniker et al., 2019Hiniker, A., Radesky, J. S., Livingstone, S., & Blum-Ross, A. (2019, May 4-9). Moving beyond “the great screen time debate” in the design of technology for children [Conference Session]. Conference on Human Factors in Computing Systems, Association for Computing Machinery, New York, NY, United States. https://dl.acm.org/citation.cfm?id=3311745
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), e sua iniciação é precoce. (Christakis, 2009Christakis, D. A. (2009). The effects of infant media usage: What do we know and what should we learn? Acta Paediatrica, 98(1), 8-16. https://doi.org/10.1111/j.1651-2227.2008.01027.x
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; Radesky & Christakis, 2016Radesky, J. S., & Christakis, D. A. (2016). Increased screen time: implications for early childhood development and behavior. Pediatric Clinics, 63, 827-39. http://doi.org/10.1016/j.pcl.2016.06.006
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). No Canadá, por exemplo, Tombeau Cost et al. (2020Tombeau Cost, K., Korczak, D., Charach, A., Birken, C., Maguire, J.L., Parkin, P.C., & Szatmari, P. (2020). Association of parental and contextual stressors with child screen exposure and child screen exposure combined with feeding. JAMA Network Open , 3(2), 1-12. http://doi.org/10.1001/jamanetworkopen.2019.20557
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) encontraram que 74,6% dos bebês de 7 a 18 meses participantes da sua pesquisa já tinham algum tipo de exposição às telas. No Brasil, 63% das 180 crianças entre 24 e 42 meses, participantes do estudo de Nobre et al. (2021Nobre, J. N. P., Santos, J. N., Santos, L. R., Guedes, S. C., Pereira, L., Costa, J. M., & Morais, R. L. S. (2021). Fatores determinantes no tempo de tela de crianças na primeira infância. Ciência & Saúde Coletiva, 26(3), 1127-36. http://doi.org/10.1590/1413-81232021263.00602019
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), apresentaram tempo de tela superior a duas horas por dia, ultrapassando o limite de tempo recomendado pelas associações de pediatria para essa faixa etária.

Cabe ressaltar que o uso de telas na infância cresceu ainda mais durante a pandemia covid-19 (Aguilar-Farias et al., 2021; Pedrotti et al., 2021Pedrotti, B. G., Mallmann, M. Y., Silva, C., Vescovi, G., Marques, F. M., Riter, H. S., Almeida, M. L., Pieta, M. A. M., & Frizzo, G. B (2021). Infants’ and toddlers’ digital media use and mothers’ mental health: A comparative study before and during the COVID-19 pandemic. Infant Mental Health Journal, 43(1), 24-35. http://doi.org/10.1002/imhj.21952
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; Riter, 2021Riter, H. S. (2021). Mídias digitais e famílias com bebês na pandemia de COVID-19: Mudanças no padrão de uso e variáveis parentais. [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul]. Lume UFRGS.), inclusive com a exposição de crianças pequenas para a realização de atividades escolares, estando este aumento relacionado a possíveis prejuízos, conforme sugerem os resultados de algumas pesquisas. Vadakkemulanjanal, Thomas, Sneha, Vargheese e Jebin (2022Vadakkemulanjanal, J. G., Thomas, A. M., Sneha, E., Vargheese, S., & Jebin, T. (2022). The impact of screen time and mobile dependency on cognition, socialization and behaviour among early childhood students during the Covid pandemic - Perception of the Parents. Digital Education Review, 41, 114-23.), por exemplo, encontraram que o uso prolongado de mídias digitais durante a pandemia influenciou, segundo a percepção dos pais, na dependência de crianças de 3 a 6 anos em relação aos dispositivos móveis, afetando o seu processo de socialização, sua cognição e seus padrões de comportamento. Já o estudo de Tandon, Zhou, Johnson, Gonzalez, & Kroshus (2021Tandon, P. S., Zhou, C., Johnson, A. M., Gonzalez, E. S., & Kroshus, E. (2021). Association of children’s physical activity and screen time with mental health during the COVID-19 pandemic. JAMA Network Open, 4(10), 1-12. http://doi.org/10.1001/jamanetworkopen.2021.27892
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) indicou que crianças que se envolveram mais em atividades físicas e utilizaram menos as telas durante a pandemia apresentaram melhores indicadores de saúde mental.

Outras pesquisas mostram que muitos cuidadores desconhecem as diretrizes das associações de pediatria sobre uso de telas na infância e não são orientados por profissionais de saúde acerca do assunto (Beck, Takayama, Badiner, & Halpern-Felsher, 2015Beck, A. L., Takayama, J., Badiner, N., & Halpern-Felsher, B. (2015). Latino parents’ beliefs about television viewing by infants and toddlers. Journal of Health Care for the Poor and Underserved, 26(2), 463-74. http://doi.org/10.1353/hpu.2015.0037
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; Golden, Blake, Giuliano, 2020Golden, S. L., Blake, J. W. C., & Giuliano, K. K. (2020). Parental decision-making: Infant engagement with smartphones. Infant Behavior and Development, 61, 1-7. https://doi.org/10.1016/j.infbeh.2020.101497
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; Kılıç et al., 2019Kılıç, A. O., Sari, E., Yucel, H., Oguz, M. M., Polat, E., Acoglu, E. A., & Senel, S. (2019). Exposure to and use of mobile devices in children aged 1-60 months. European Journal of Pediatric, 178, 221-7. https://doi.org/10.1007/s00431-018-3284-x
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; Pedrotti, 2019Pedrotti, B. G. (2019). Como prescindir das novas tecnologias no cuidado e na interação com os bebês? [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul]. Lume UFRGS. https://bit.ly/41G2pmy
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). No entanto, mesmo o acesso a essas informações podem ser insuficientes para promoverem mudanças nas práticas parentais. No estudo de Brown e Smolenaers (2018Brown, A., & Smolenaers, E. (2018). Parents’ interpretations of screen time recommendations for children younger than 2 years. Journal of Family Issues, 39(2), 406-29. http://doi.org/10.1177/0192513X16646595
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), por exemplo, muitos pais referiram concordar com a recomendação de não expor os bebês de até dois anos às telas, mas consideraram um grande desafio conseguir cumpri-la.

Muitos pais também utilizam as redes sociais como fonte de informações sobre saúde infantil e parentalidade (Pretorius, Johnson, & Rew, 2019Pretorius, K., Johnson, K. E., & Rew, L. (2019). An integrative review: understanding parental use of social media to influence infant and child health. Matern Child Health Journal, 23(10), 1360-70. http://doi.org/10.1007/s10995-019-02781-w
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). Atualmente, o Facebook permanece sendo a maior rede social do mundo, com mais de dois bilhões de usuários ativos. Entre seus recursos, estão dezenas de milhões de comunidades virtuais ou grupos ativos de usuários da rede, dos quais participam mais de 1,8 bilhão de pessoas (Facebook, 2020Facebook (2020). Novas ferramentas para fortalecer as comunidades online. Meta . https://about.fb.com/br/news/2020/10/novas-ferramentas-para-fortalecer-as-comunidades-online/
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). No Brasil, em setembro de 2020, mais de 120 milhões de pessoas participaram desses grupos (Crescer Online, 2020Crescer Online (2020). 7,5 milhões participam de grupos de pais e mães no Facebook. Crescer https://revistacrescer.globo.com/Educacao-Comportamento/noticia/2020/10/75-milhoes-participam-de-grupos-de-pais-e-maes-no-facebook.html
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), que podem ser privados (nos quais é necessária autorização do administrador para participar, com postagens que só ficam visíveis para os seus membros) ou públicos (em que qualquer pessoa usuária da rede social pode fazer parte).

Os grupos de mães e pais estão entre os mais populares no Facebook, englobando cerca de 7,5 milhões de pessoas em sete mil comunidades virtuais quanto à parentalidade no mundo inteiro (Crescer Online, 2020Crescer Online (2020). 7,5 milhões participam de grupos de pais e mães no Facebook. Crescer https://revistacrescer.globo.com/Educacao-Comportamento/noticia/2020/10/75-milhoes-participam-de-grupos-de-pais-e-maes-no-facebook.html
https://revistacrescer.globo.com/Educaca...
). Estudo encomendado pela rede social (Facebook, 2018Facebook (2018). Por que os novos pais e mães buscam uma comunidade virtual. Meta. https://www.facebook.com/business/news/insights/why-new-parents-turn-to-a-virtual-village
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) identificou os motivos que levam os novos pais e mães a integrarem essas comunidades online: elas são uma maneira rápida e fácil de solucionar dúvidas urgentes e permitem a conexão com outras pessoas para o recebimento de conselhos, além de dicas de produtos. Em uma revisão integrativa da literatura sobre o uso que mães e pais fazem das redes sociais, Pretorius et al. (2019Pretorius, K., Johnson, K. E., & Rew, L. (2019). An integrative review: understanding parental use of social media to influence infant and child health. Matern Child Health Journal, 23(10), 1360-70. http://doi.org/10.1007/s10995-019-02781-w
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) identificaram que o Facebook é um meio importante para o compartilhamento de informações, pois muitos pais buscam a rede social para esclarecer dúvidas relacionadas à parentalidade e à saúde infantil.

Passos e Arteiro (2019Passos, M. C., & Arteiro, I. L. (2019). Escrever e inscrever a maternidade por meio dos blogs. Estudos Interdisciplinares em Psicologia, 10(3), 85-100. https://doi.org/10.5433/2236-6407.2019v10n3suplp85
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), por sua vez, evidenciam a importância dos espaços cibernéticos no que tange à sua função continente e de auxílio na elaboração das experiências suscitadas pela maternidade. A função continente, ou capacidade de rêverie, foi originalmente pensada como a capacidade materna de acolher e conter as necessidades e angústias que a criança, por meio de identificações projetivas, coloca dentro dela (Zimerman, 2004Zimerman, D. E (2004). Manual de técnica psicanalítica: uma revisão. Artmed.).

Nesse sentido, o espaço dos grupos pode ser entendido como um ambiente no qual os pais, mães e demais cuidadores buscam esse acolhimento das sensações de vazio, angústias, desejos e demandas despertados pela experiência do cuidado de uma criança, o que é corroborado pelo estudo desenvolvido por Pesce e Lopes (2020Pesce, L. R., & Lopes, R. C. S. (2020). “O Lado B da maternidade”: um estudo qualitativo a partir de blogs. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 20(1), 205-30. http://dx.doi.org/10.12957/epp.2020.50825
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), em blogs, sobre “o lado B da maternidade” (p. 206). Essa expressão, segundo as autoras, foi criada em um movimento social de mães que começaram a compartilhar, em espaços virtuais como blogs e redes sociais, aspectos da experiência da maternidade que se distanciam da imagem idealizada de mãe construída pela sociedade, e que geralmente permanecem negados. Os resultados deste estudo demonstram de que forma o uso dos grupos virtuais pode ter a função de compartilhamento de experiências, assim como de defesa contra a ansiedade, reduzindo a sensação de desamparo que determinados aspectos da maternidade podem trazer à tona (Pesce & Lopes, 2020Pesce, L. R., & Lopes, R. C. S. (2020). “O Lado B da maternidade”: um estudo qualitativo a partir de blogs. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 20(1), 205-30. http://dx.doi.org/10.12957/epp.2020.50825
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). Esses sentimentos são suscitados pelo estado de extrema identificação que a mãe ou o cuidador principal encontra-se com a criança, por meio do qual assume suas vulnerabilidades (Winnicott, 1988Winnicott, D. W. (1988). Comunicação entre o bebê e a mãe e entre a mãe e o bebê: convergências e divergências. In D. W. Winnicott (Ed.), Os bebês e suas mães. Martins Fontes.). Diante dessa mobilização psíquica, entende-se que esses ambientes virtuais possam atuar como facilitadores da organização subjetiva dos cuidadores, aspecto que interfere em seu processo de subjetivação enquanto pais (Passos & Arteiro, 2019Passos, M. C., & Arteiro, I. L. (2019). Escrever e inscrever a maternidade por meio dos blogs. Estudos Interdisciplinares em Psicologia, 10(3), 85-100. https://doi.org/10.5433/2236-6407.2019v10n3suplp85
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).

Ao mesmo tempo, espaços virtuais como os blogs podem assumir uma função prescritiva acerca do modo de agir das mães, muitas vezes como uma tentativa de normatização que pode se tornar intrusiva ao desconsiderar as singularidades de cada dupla mãe-bebê, perpetuando estereótipos de uma maternidade ideal (Pesce, Pedrotti, Frizzo, & Lopes, 2023Pesce, L. R., Pedrotti, B. G., Frizzo, G. B., & Lopes, R. C. S (2023). Compartilhar experiências ou prescrever orientações? Psico Porto Alegre, 54(1), 1-12. https://doi.org/10.15448/1980-8623.2023.1.38081
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). Em seu estudo sobre os principais assuntos abordados em blogs de mães de crianças pequenas, as referidas autoras encontraram que a maioria das postagens tinha uma função prescritiva. Frequentemente, as próprias mães se utilizavam das postagens de especialistas sobre temas relacionados às práticas parentais, incluindo o uso de telas, aliando-se ao saber prescritivo dos especialistas. Isso evidencia certa identificação materna com essas orientações normativas em detrimento do compartilhamento de um saber mais intuitivo, ou seja, próprio da experiência da maternidade e parentalidade.

Os saberes científicos e especialistas, ao contrário, caracterizam-se por sua naturalização e pretensa objetividade, ocupando uma posição hegemônica de saber-poder na sociedade contemporânea (Coimbra & Leitão, 2003Coimbra, C., & Leitão, M. B. S. (2003). Das essências às multiplicidades: especialismo psi e produções de subjetividades. Psicologia e Sociedade, 15(2), 6-17. https://doi.org/10.1590/S0102-71822003000200002
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). Esses discursos e práticas atuam de forma a produzir subjetividades e moldar as formas socialmente aceitas de viver, estabelecendo normatividades nos âmbitos da família, infância, saúde, dentre outros (Hüning & Guareschi, 2005Hüning, S. M., & Guareschi, N. M. F (2005). O que estamos construindo: especialidades ou especialismos. Psicologia & Sociedade, 17(1), 17-28.). Ainda que esses saberes especializados sobre a infância se pretendam bem-intencionados, fracassam, em sua maioria, na consideração de sua determinação histórica e social, hierarquizando as identidades e possibilidades de infâncias que desviam das normativas científicas estabelecidas (Hillesheim & Guareschi, 2007Hillesheim, B., & Guareschi, N. M. F. (2007). De que infância nos fala a psicologia do desenvolvimento? Algumas reflexões. Psicologia da Educação, (25), 75-92.).

Dessa forma, este artigo pretende compreender como o uso de telas na infância vem sendo abordado por especialistas em grupos de mães e pais no Facebook. Conhecer as informações a que eles têm acesso nesses espaços é importante em função do caráter potencialmente intrusivo de orientações e recomendações de especialistas na vida das crianças e seus cuidadores, comumente naturalizadas nesses espaços virtuais.

Método

Delineamento e procedimentos

Trata-se de um estudo de natureza exploratória e delineamento qualitativo (Robson, 2002Robson, C. (2002). Real world research: a resource for social scientists and practitioner researchers (2nd ed.). Blackwell.) realizado por meio da análise de postagens efetuadas por especialistas - em sua maioria psicólogos e educadores - em grupos abertos de mães e pais no Facebook. O levantamento inicial dos grupos foi realizado com ajuda da ferramenta de busca na aba Grupos do Facebook, inserindo-se, um por vez, os descritores: mães e pais; mães; pais; maternidade; paternidade; e parentalidade. Além disso, foi utilizado filtro para seleção apenas de grupos públicos, em função da maior facilidade de acesso aos conteúdos neles compartilhados. Também foram utilizados os seguintes critérios de exclusão: a) grupos com fins comerciais e/ou de trocas de objetos, móveis, brinquedos e roupas infantis entre os pais; b) grupos de mães e pais não-brasileiros; c) grupos de mães e pais de adolescentes.

Os grupos foram listados em ordem decrescente conforme a quantidade de participantes. Como o número (49) era demasiado grande para a realização de uma análise qualitativa em profundidade, foram adotados critérios adicionais de seleção. Conforme realizado em outros estudos que observaram grupos no Facebook (Minson, Mukerji, & Rankine, 2016Minson, S., Mukerji, M., & Rankine, J. (2016). G26 Social media support for parents and young people with food allergy: an analysis of facebook content. Archives of Disease in Childhood, 101(1), 17-23. http://doi.org/10.1136/archdischild-2016-310863.26
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; Thoren, Metze, Bührer, & Garten, 2013Thoren, E. M., Metze, B., Bührer, C., & Garten, L. (2013). Online support for parents of preterm infants: a qualitative and content analysis of Facebook ‘preemie’ groups. Archives of Disease in Childhood - Fetal and Neonatal Edition, 98(6), 34-8. http://doi.org/10.1136/archdischild-2012-303572
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), foram selecionados aqueles com maior número de membros. A partir daí, a inclusão de um novo grupo na investigação foi realizada conforme o critério de saturação, consoante proposto por Stake (2006Stake, R. E. (2006). Multiple case study analysis. The Guilford Press.). Desse modo, foram incluídos na análise cinco deles: Grupo 1 (187,1 mil membros e seis postagens analisadas), Grupo 2 (64 mil membros e oito postagens analisadas), Grupo 3 (8,3 mil membros e 14 postagens analisadas), Grupo 4 (7,9 mil membros e seis postagens analisadas) e Grupo 5 (5,6 mil membros e 15 postagens analisadas).

Para a seleção das postagens de interesse, foi utilizado o campo de pesquisa em cada um dos grupos, inserindo, um por vez, os descritores: telas; tecnologias; mídias digitais; e eletrônicos. A busca não foi restrita a um intervalo de tempo específico, sendo incluídas todas as postagens que versavam sobre o tema de interesse. Foram excluídas apenas as publicações duplicadas e aquelas que, embora relacionadas aos descritores utilizados, não apresentavam relação com os objetivos do artigo, por exemplo, anúncios de telas de proteção em janelas para crianças e propagandas de telas contra insetos. Após esse processo, restaram 49 postagens com data de publicação entre abril de 2013 e fevereiro de 2021: 23 de psicólogos, 14 de profissionais da educação e 12 de profissionais de outras áreas (como coach, consultor gestacional e jornalista).

Análise dos dados

As postagens selecionadas foram agrupadas, descritas detalhadamente e verificadas pelas duas primeiras autoras por meio de análise temática, conforme proposto por Braun et al. (2019Braun, V., Clarke, V., Hayfield, N., & Terry, G. (2019). Thematic analysis. Handbook of Research Methods in Health Social Sciences, 843-860. https://doi.org/10.1007/978-981-10-5251-4_103
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). Esse tipo de observação é indicado para identificar, analisar e relatar padrões existentes nos dados, organizando-os e descrevendo-os, podendo também passar ao nível interpretativo em diversos aspectos relacionados à questão de pesquisa (Braun et al., 2019Braun, V., Clarke, V., Hayfield, N., & Terry, G. (2019). Thematic analysis. Handbook of Research Methods in Health Social Sciences, 843-860. https://doi.org/10.1007/978-981-10-5251-4_103
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). Os códigos e temas foram construídos a partir dos dados, em um processo indutivo, buscando-se consenso entre as autoras na interpretação dos resultados. Entende-se que o processo de análise e interpretação, conforme referem Braun, Clarke, Hayfield, & Terry (2019)Braun, V., Clarke, V., Hayfield, N., & Terry, G. (2019). Thematic analysis. Handbook of Research Methods in Health Social Sciences, 843-860. https://doi.org/10.1007/978-981-10-5251-4_103
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, foi atravessado pelas preferências teóricas e compromissos epistemológicos das pesquisadoras, baseados, sobretudo, no referencial psicanalítico.

Nesse sentido, a investigação temática buscou compreender de que forma os especialistas abordam a relação entre telas e infância nos grupos de mães e pais no Facebook. Em um primeiro momento, as postagens tiveram seu conteúdo copiado e transferido para um documento separado, sendo agrupadas conforme a especialidade do profissional que a compartilhou. Seguiu-se então o processo de leitura de todas essas postagens, bem como de seleção dos aspectos mais relevantes de seu conteúdo, com especial atenção para o objetivo do estudo. Por fim, as pesquisadoras realizaram a discussão dos achados que culminou, indutivamente, na proposição dos eixos de análise do material.

O conteúdo das postagens foi verificado tanto em sua dimensão textual quanto das imagens anexadas às publicações. Quanto aos textos, buscou-se descrever e transcrever de forma literal os excertos mais significativos para a questão de pesquisa. Já as imagens foram descritas de forma pormenorizada, buscando transmitir, dentro das limitações da transposição da linguagem visual para escrita, seus conteúdos principais.

Considerações éticas

Segundo a Resolução n° 510 (Brasil, 2016), não serão avaliados por Comitês de Ética em Pesquisa (sistema CEP/CONEP) os estudos que utilizam informações de acesso público. Neste artigo, apenas os grupos de cuidadores no Facebook - identificados como de conteúdo aberto e público - foram incluídos na pesquisa, não sendo necessária, desse modo, a autorização por parte do Comitê de Ética para a realização da pesquisa. Além disso, houve o cuidado de não nomear os grupos, profissionais e páginas no relato dos resultados, a fim de preservar suas identidades.

Resultados

Por intermédio da análise temática (Braun et al., 2019Braun, V., Clarke, V., Hayfield, N., & Terry, G. (2019). Thematic analysis. Handbook of Research Methods in Health Social Sciences, 843-860. https://doi.org/10.1007/978-981-10-5251-4_103
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), foram construídos dois temas: (1) Prejuízos das telas para as crianças; (2) Orientações sobre o uso de telas. Na Tabela 1 apresenta-se um panorama geral dos principais resultados obtidos no estudo, em que é possível verificar a quantidade de profissionais e de postagens analisadas por área de especialidade, além do número de publicações que tratavam acerca de cada um dos temas.

Tabela 1
Panorama geral dos principais resultados.

Para uma melhor compreensão, os dois temas identificados (Prejuízos das telas para as crianças e Orientações sobre o uso de telas) serão apresentados e exemplificados por meio de recortes das postagens analisadas. Cada trecho ilustrativo é acompanhado por uma sequência de letras e números, a qual faz referência à especialidade, à identificação do autor e à postagem (por exemplo: P2b - psicóloga 2, postagem b; E1a - educadora 1, postagem a). No total, publicações de oito psicólogos, cinco educadores, três coaches e um jornalista foram encontradas, evidenciando a preponderância do discurso psicológico nesses espaços.

Importante ressaltar que a grande maioria das postagens dos especialistas não geraram debates em seus comentários, diferentemente de outros conteúdos compartilhados pelos próprios cuidadores. Além disso, apenas um único post de uma psicóloga, com orientações sobre uso de telas, fez menção ao contexto da pandemia, apesar das diversas mudanças ocorridas na rotina das crianças e suas famílias durante esse período (Pedrotti et al., 2021Pedrotti, B. G., Mallmann, M. Y., Silva, C., Vescovi, G., Marques, F. M., Riter, H. S., Almeida, M. L., Pieta, M. A. M., & Frizzo, G. B (2021). Infants’ and toddlers’ digital media use and mothers’ mental health: A comparative study before and during the COVID-19 pandemic. Infant Mental Health Journal, 43(1), 24-35. http://doi.org/10.1002/imhj.21952
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). Os especialistas também pouco abordaram as possibilidades, sob determinadas condições, de alguns ganhos a partir da relação das crianças com as tecnologias, seguindo, portanto, a linha analítica que discorda dessa interação (Anderson & Subrahmanyam, 2017Anderson, D., & Subrahmanyam, K. (2017). Digital screen media and cognitive development. Pediatrics , 40(2), 57-62. http://doi.org/10.1542/peds.2016-1758C
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; Bedford et al., 2016Bedford, R., Urabain, I. R. S., Cheung, C. H. M., Karmiloff-Smith, A., & Smith, T. J. (2016). Toddlers’ fine motor milestone achievement is associated with early touchscreen scrolling. Frontiers in Psychology, 7, 1-8. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2016.01108
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; Nobre et al., 2020Nobre, J. N. P., Vinolas Prat, B., Santos, J. N., Santos, L. R., Pereira, L., Guedes, S. C., Ribeiro, R. F., & Morais, R. L. S. (2020). Qualidade de uso de mídias interativas na primeira infância e desenvolvimento infantil: uma análise multicritério. Jornal de Pediatria, 96(3), 310-7. https://doi.org/10.1016/j.jped.2018.11.015
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; Radesky et al., 2015Radesky, J. S., Schumacher, J., & Zuckerman, B. (2015). Mobile and interactive media use by young children: the good, the bad, and the unknown. Pediatrics , 135(1), 1-3. http://doi.org/10.1542/peds.2014-2251
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), destacando os prejuízos do uso de telas na infância. Apenas um post de um jornalista mencionou possíveis vantagens do uso de telas ao orientar os pais acerca da importância de mediarem o uso de tecnologias de modo a promover a aprendizagem das crianças.

Prejuízos das telas para as crianças

Foram incluídas neste objeto de estudo as publicações dos especialistas contemplando possíveis prejuízos do excesso de exposição às telas para o desenvolvimento motor, emocional, cognitivo e social das crianças. Os profissionais destacam, dentre outros aspectos, o risco de dificuldades de atenção, obesidade, atrasos cognitivos, má qualidade do sono e problemas de comportamento.

Em termos de atratividade visual, alguns recursos são empregados para atrair a atenção a essas postagens, como imagens de bebês e crianças pequenas utilizando telas, cores chamativas, além de slogans e frases de efeito. A postagem de uma coach (C1), por exemplo, apresenta a seguinte frase em destaque, com fundo colorido e letras grandes, atribuindo-a ao dono de uma grande empresa de tecnologia: “Meu filho terá computadores, mas antes terá livros” (C1a). A profissional, então, faz a seguinte pergunta: “Por que será que alguém que vive da tecnologia não queira que os computadores entrassem na vida de seus filhos antes dos livros?” (C1a). Em seguida afirma: “Porque ele sabe o quanto a tecnologia inserida precocemente na vida de uma criança atrasa seu desenvolvimento. Qualquer tipo de tela apresentada a uma criança cedo prejudica seu desenvolvimento físico e emocional” (C1a). Ela encerra a postagem convocando os pais para uma reflexão: “Se Bill Gates priorizou os livros nas vidas dos filhos, mesmo respirando tecnologia, o que cabe a nós fazermos para proteger o desenvolvimento de nossas crianças e adolescentes?” (C1a).

A partir dessa perspectiva, ainda encontramos a postagem de uma psicóloga (P1a), intitulada: Família de mentirinha. O texto traz, de forma incisiva, a responsabilidade dos pais pela inversão de valores, terceirização de cuidados, falta de pulso e autoridade, e pouca comunicação nas famílias. A psicóloga cita elementos de sua experiência profissional, nos quais os eletrônicos seriam um dos fatores centrais relacionados às dificuldades enfrentadas pelos pais, por fim considerando que: “Educar dá trabalho, depois [os pais] não podem reclamar!’’ (P1a, acréscimo nosso). Observa-se, além disso, a consideração da psicóloga de que a ausência de limites, em geral, contribui para o surgimento de angústia, depressão e até mesmo suicídio. Mais adiante, afirma que as crianças que não são ensinadas a lidar com as frustrações se tornam: “adulto(s) egoísta(s), narcisista(s) e infeliz(es)” (P1a).

Outras postagens utilizam uma abordagem diferente, fazendo referência a resultados de pesquisas científicas. Um exemplo é a publicação de um jornalista (J1a), alertando sobre a influência da luz azul dos eletrônicos na diminuição da produção de melatonina. O texto cita um estudo desenvolvido pela Universidade do Colorado (Akacem, Wright, & LeBourgeois, 2018Akacem, L. D., Wright, K. P., & LeBourgeois, M. K. (2018). Sensitivity of the circadian system to evening bright light in preschool‐age children. Physiological Reports, 6(5), 1-10. http://doi.org/10.14814/phy2.13617
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), que encontrou uma supressão robusta de melatonina em crianças pré-escolares quando expostas, durante a noite, à luz azul emitida pelas telas. A postagem também traz a explicação de uma neuropediatra quanto ao efeito da luz azul na produção de melatonina e seus prejuízos à qualidade do sono. Ressalta, ainda, a importância do sono para o desenvolvimento cerebral das crianças.

Observaram-se, também, algumas informações contraditórias quanto aos prejuízos das telas para as crianças. Em post publicado pela profissional de coaching (C1) há a seguinte chamada: “Televisão no quarto dos filhos, será?’’. A profissional segue escrevendo, então, que a resposta cabe aos pais, uma vez que “se você acha que não tem problema seu filho ficar até tarde vendo TV ou jogando videogame, está tudo bem. Se não tem problema de passar o dia inteiro dentro do quarto vendo séries, e isso não irá prejudicar seus estudos ou horas de sono também está tudo bem” (C1b).

Em seguida, na mesma postagem, a coach (C1b) apresenta a opinião de um neurologista sobre o assunto, a qual contraria essa afirmação. O profissional em questão refere que ter televisão no quarto é um fator prejudicial à duração e à qualidade do sono das crianças, contraditoriamente ao que havia sido mencionado logo antes.

Nas postagens analisadas, os profissionais também alertam que o uso de eletrônicos pode prejudicar a experiência do brincar livre e criativo, da imaginação e da ação na companhia de outras crianças. Um exemplo foi uma postagem publicada em maio de 2020, dia do brincar, no qual uma psicóloga (P2a) compartilhou um vídeo publicitário de uma empresa de telefonia, com um apelo para as crianças usarem menos os aparelhos tecnológicos. Trata-se de uma animação que mostra crianças brincando de amarelinha, jogando bola e desenhando. Em outros momentos, os personagens aparecem lado a lado, cada qual utilizando seu smartphone, com olhar fixo na tela. Enquanto as imagens se desenrolam, a personagem principal aparece tocando violão e cantando: “. . . Sai da tela, vai correr e pular. Tudo tem hora, razão e lugar. E agora é hora de brincar”. A psicóloga destaca, então, a importância do brincar, da imaginação, da criatividade e do desenvolvimento de novas habilidades, especialmente diante de um contexto (pandemia de covid-19) em que o convívio social foi substituído pela inclusão acelerada da tecnologia na vida das crianças.

Outro aspecto destacado pelos profissionais como um possível prejuízo da utilização excessiva das telas é a necessidade que pais e cuidadores demonstram de evitar momentos de tédio das crianças, os quais seriam importantes para estimular a criatividade, a imaginação e o aprendizado. Nesse sentido, a publicação de um vídeo sobre o tédio, realizada por uma psicóloga (P3a) transmite a ideia de que não há a necessidade de um estímulo permanente sobre a criança por meio de brincadeiras ou brinquedos. Segundo a profissional, momentos de espera no consultório médico, traslado de carro de um local a outro ou mesmo a interação social na mesa do restaurante são situações nas quais é possível desenvolver o aprendizado de outras habilidades, por exemplo a compreensão das regras sociais ou o fomento para consolidação dos vínculos familiares. Desse modo, a sensação de tédio é positiva para a criança exercer a criatividade com os recursos disponíveis no ambiente, estimulando a capacidade de fantasiar e simbolizar outras situações.

Outro possível prejuízo mencionado pelos profissionais diz respeito ao afastamento e isolamento que pode ocorrer dentro das famílias em decorrência do uso de telas. Uma psicóloga (P4a), por exemplo, compartilha um texto de uma psicopedagoga sobre as mudanças nas relações familiares ocorridas a partir da introdução das tecnologias. O texto transmite a ideia de que antigamente os pais tinham mais conhecimento quanto ao que se passava nas vidas, pensamentos e fantasias dos filhos, o que atualmente não ocorreria, sobretudo, pelo fato das crianças estarem dentro de seus quartos envolvidas com as telas. A autora refere que, desse modo, os filhos se afastam do relacionamento com seus pais, da identidade familiar e de seus valores. “Quando entravam em casa não existia uma TV em cada quarto, nem dispositivos eletrônicos em suas mãos. Agora ficam com seus fones de ouvido, trancados em seus mundos, construindo seus saberes sem que saibamos o que é . . .”.

Contudo, o isolamento pelo uso de telas não se daria apenas pela utilização dos aparelhos eletrônicos pelas crianças. Algumas publicações enfatizam e alertam os pais quanto aos possíveis prejuízos do uso que eles próprios fazem das telas na presença de seus filhos. A esse respeito, encontra-se um post, de dezembro de 2020, realizado por um psicólogo (P5a), que replica matéria publicada no site de uma instituição de divulgação de conhecimento sobre o desenvolvimento integral na primeira infância. A postagem é acompanhada de um cartum em que há um adulto sentado no sofá, usando seu celular, enquanto uma menina tenta chamar sua atenção exibindo um desenho colorido em um caderno com os escritos: “Papai, você pode curtir meu desenho?”. O texto desta publicação traz excertos de uma entrevista com uma terapeuta ocupacional, que aborda o sentimento de rejeição, insegurança e abandono cujo uso prolongado dos eletrônicos pelos pais pode ocasionar nas crianças, gerando relações parentais frias e automáticas. Junto a isso, são apresentados dois estudos empíricos com crianças a respeito da temática, cujos resultados corroboram as reclamações por parte dos filhos com relação ao uso indiscriminado que os pais fazem das telas, mas a publicação não traz as referências completas dessas pesquisas, dificultando o acesso aos materiais originais.

Profissionais da educação também realizaram postagens alertando para os possíveis prejuízos das telas para as crianças, conforme exemplo, em que uma educadora destaca a composição do ambiente ideal para a educação da criança, ponderando seus aspectos internos, externos, de iluminação e sonoridade. No tocante aos eletrônicos, em específico, lê-se: “[não é adequado] oferecer um videogame, que oferece imagens que se movimentam muito na tela ou traz muita informação, deixando essa criança agitada em razão de ela não ter ainda desenvolvido recursos para digerir essas informações.” (E1a, acréscimo nosso) Ainda em relação aos prejuízos ocasionados pelo uso de telas, outra educadora (E2a) caracteriza a utilização demasiada dos eletrônicos como um sintoma da atualidade, que desconsidera a criança tal qual um sujeito merecedor de cuidados humanizados e condizentes com suas reais necessidades particulares ao início da vida.

Orientações a cuidadores sobre o uso de telas

Diversas postagens dos especialistas fornecem orientações aos cuidadores em virtude do uso de telas na infância. Muitos deles divulgam as diretrizes da Organização Mundial de Saúde (OMS, 2019OMS - Organização Mundial da Saúde (2019). Guidelines on physical activity, sedentary behaviour and sleep for children under 5 years of age. OMS. https://apps.who.int/iris/handle/10665/311664
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) e das associações de pediatria (AAP, 2016AAP - American Academy of Pediatrics. (2016). Media and young minds. Pediatrics, 138(5), 1-8. http://doi.org/10.1542/peds.2016-2591
http://doi.org/10.1542/peds.2016-2591...
; SBP, 2019SBP - Sociedade Brasileira de Pediatria. (2019). #Menos telas #Mais saúde. Manual de Orientação, Grupo de trabalho Saúde na Era Digital. SBP. https://bit.ly/41i2q0r
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) a respeito do tempo de uso indicado conforme a faixa etária, como nesta publicação de uma coach:

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o uso de telas - celular, tablet e televisão - até os 2 anos de idade não é recomendado. De 2 a 5 anos, o contato das crianças com esses dispositivos não deve passar de uma hora por dia. A partir dos seis anos, o limite recomendado é de até duas horas diárias (C1c).

Os especialistas também indicam que as telas não sejam usadas antes de dormir, a exemplo deste post de um jornalista (J1b), em que ele apresenta orientações de uma neurologista sobre uso de telas: “É preciso repensar os hábitos da família e a rotina da noite. A recomendação é evitar ao máximo deixar a criança ficar vendo TV ou usar os outros eletrônicos depois que o sol se põe”.

Além disso, os profissionais orientam os pais a supervisionarem o uso de telas feito pelas crianças, selecionando aplicativos educativos e adequados à faixa etária, e monitorando o conteúdo a que seus filhos têm acesso, como ilustrado por este recorte do post de uma psicopedagoga (PG1a): “. . . devemos evitar ao máximo o acesso aos conteúdos inadequados e controlar o que está sendo visto”.

Outras publicações orientam os pais a não utilizarem as telas na presença das crianças, objetivando evitar prejuízo às interações familiares e a sensação dos filhos de estarem sendo menosprezados. Essa ideia pode ser observada na postagem, a seguir, de uma psicóloga:

A recomendação de especialistas é que os pais separem um período do seu dia para dar atenção exclusiva aos filhos, sem interrupções desnecessárias - o que inclui, é claro, os aparelhos tecnológicos. Isso contribui com o fortalecimento do vínculo e desenvolvimento da criança (P6a).

Em algumas publicações, os especialistas orientam os pais a realizarem atividades fora das telas com seus filhos, inclusive fornecendo algumas sugestões. O trecho, a seguir, retirado da postagem de uma psicóloga (P7a), é ilustrativo nesse aspecto: “Férias escolares chegando e ainda não sabe se vai viajar? Para evitar que seus filhos fiquem somente nas telas do tablet, videogame ou celular, que tal preparar algumas atividades que podem ser feitas sem sair de casa?” (P7a).

Além dessas orientações expressas diretamente nas postagens, os especialistas também divulgaram cursos, palestras, lives e encontros que abordariam a questão do uso de telas na infância. O seguinte recorte da postagem de uma educadora (E2a), realizando convite para um evento, ilustra essa ideia: “O cuidado da criança em casa: acesso das crianças às tecnologias digitais, possibilidades e desafios de cada etapa”, a ser conduzido por outra profissional da área da educação.

Discussão

A partir dos resultados encontrados, percebe-se que os grupos de mães e pais no Facebook são uma ferramenta de divulgação de informações técnicas quanto ao uso de telas na infância por parte dos especialistas, os quais partem da premissa de que os cuidadores necessitam dessas orientações. Como a temática é recente e ainda são necessárias mais pesquisas com delineamentos de alta qualidade acerca dos prejuízos e benefícios do uso de telas na infância (Ashton & Beattie, 2019Ashton, J., & Beattie, R. M. (2019). Screen time in children and adolescents: is there evidence to guide parents and policy? The Lancet Child & Adolescent Health, 3(5), 292-4. https://doi.org/10.1016/S2352-4642(19)30062-8
https://doi.org/10.1016/S2352-4642(19)30...
; Reus & Mosley, 2018Reus, E. J., & Mosley, I. T. (2018). The health and development correlates of screen media exposure in children 0-5yrs: An integrative literature review. Australian Journal of Child and Family Health Nursing, 15(2), 12-21. https://search.informit.org/doi/10.3316/informit.192484297913792
https://search.informit.org/doi/10.3316/...
; Royal College of Paediatrics and Child Health, 2019Royal College of Paediatrics and Child Health (2019). The health impacts of screen time: a guide for clinicians and parents. RCPCH. https://www.rcpch.ac.uk/sites/default/files/2018-12/rcpch_screen_time_guide_-_final.pdf
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), é importante não naturalizar a presença de especialistas nesses espaços virtuais criados por pais e mães, uma vez que essa frequência pode desautorizar o saber da experiência destes últimos na criação dos filhos.

Resultados de alguns estudos sugerem que as práticas baseadas no aconselhamento por especialistas podem ser insuficientes para promover mudanças na relação das famílias com as telas. Golden et al. (2020Golden, S. L., Blake, J. W. C., & Giuliano, K. K. (2020). Parental decision-making: Infant engagement with smartphones. Infant Behavior and Development, 61, 1-7. https://doi.org/10.1016/j.infbeh.2020.101497
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), por exemplo, encontraram que, para a maioria dos pais participantes de sua pesquisa, as orientações das associações de pediatria não haviam influenciado de forma significativa a sua decisão de oferecer telas aos seus bebês ou de usá-las em sua presença.

Ainda, apesar de concordarem com essas recomendações, muitos pais e mães consideram um grande desafio segui-las (Brown & Smolenaers, 2018Brown, A., & Smolenaers, E. (2018). Parents’ interpretations of screen time recommendations for children younger than 2 years. Journal of Family Issues, 39(2), 406-29. http://doi.org/10.1177/0192513X16646595
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). No estudo de Golden et al. (2020Golden, S. L., Blake, J. W. C., & Giuliano, K. K. (2020). Parental decision-making: Infant engagement with smartphones. Infant Behavior and Development, 61, 1-7. https://doi.org/10.1016/j.infbeh.2020.101497
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), mães e pais de bebês expressaram o desejo de estabelecer um maior equilíbrio entre o uso que eles próprios fazem de smartphones e o envolvimento em atividades tradicionais com seus filhos, algo que eles não conseguem colocar em prática.

Além disso, pesquisas têm mostrado o conflito que os pais enfrentam buscando conciliar as orientações dos especialistas sobre o uso de telas na infância com a realidade de cuidar e educar uma criança em uma sociedade repleta de tecnologias digitais (Golden et al., 2020Golden, S. L., Blake, J. W. C., & Giuliano, K. K. (2020). Parental decision-making: Infant engagement with smartphones. Infant Behavior and Development, 61, 1-7. https://doi.org/10.1016/j.infbeh.2020.101497
https://doi.org/10.1016/j.infbeh.2020.10...
). Mães de crianças pequenas referem culpa em relação aos efeitos da exposição precoce das crianças aos eletrônicos (Bentley et al., 2016Bentley, G. F., Turner, K. M., & Jago, R. (2016). Mothers’ views of their preschool child’s screen-viewing behaviour: a qualitative study. BMC Public Health, 16(718), 1-11. http://doi.org/10.1186/s12889-016-3440-z
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; Mallmann & Frizzo, 2019Mallmann, M. Y., & Frizzo, G. B (2019). O uso das novas tecnologias em famílias com bebês: um mal necessário? Revista Cocar, 7, 26-46.), ao mesmo tempo em que pensam que esse contato é algo inevitável na sociedade contemporânea (Bentley et al., 2016Bentley, G. F., Turner, K. M., & Jago, R. (2016). Mothers’ views of their preschool child’s screen-viewing behaviour: a qualitative study. BMC Public Health, 16(718), 1-11. http://doi.org/10.1186/s12889-016-3440-z
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).

As publicações de especialistas que desconsideram essa dimensão de ambivalência talvez não alcancem os pais, tornando-se inócuas ou até mesmo intrusivas, tendo em vista a mobilização psíquica por parte dos cuidadores em torno dessas questões. Cabe ressaltar, nesse sentido, que a grande maioria das postagens analisadas não gerou debates, nem mesmo comentários por parte dos pais e mães, o que indica que os especialistas não encontraram uma interlocução com os cuidadores nesses espaços virtuais. Esse dado corrobora a compreensão de que a presença dos especialistas, nesses espaços, se dá por meio de uma posição diferenciada do saber dos pais, parecendo deslocada da maior parte dos saberes que circulam nesses grupos. Dessa forma, é importante que os profissionais façam essa reflexão, de modo a não assumir uma posição que desautorize as mães e pais, considerando-os dependentes do saber técnico dos profissionais.

A pouca reverberação das postagens dos especialistas entre os cuidadores suscita outra reflexão, a respeito da demanda por essas orientações: seria ela, de fato, uma necessidade dos pais por sua dificuldade de lidar com as telas na infância? Ou seria essa uma demanda produzida pelo próprio discurso dos especialistas, a partir de seus alertas sobre os prejuízos do excesso de telas para as crianças? Estariam os especialistas antecipando-se a uma demanda que ainda não foi formulada pelos pais?

Ressalta-se, nesse sentido, que os profissionais destacam os prejuízos desses dispositivos para o desenvolvimento infantil, dando orientações aos pais sobre como restringir o uso ou minimizar desfechos negativos, mas pouco abordando a possibilidade de ocorrência de alguns benefícios por meio da relação das crianças com as tecnologias digitais, sob determinadas condições, conforme demonstram alguns artigos (Anderson & Subrahmanyam, 2017Anderson, D., & Subrahmanyam, K. (2017). Digital screen media and cognitive development. Pediatrics , 40(2), 57-62. http://doi.org/10.1542/peds.2016-1758C
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; Bedford et al., 2016Bedford, R., Urabain, I. R. S., Cheung, C. H. M., Karmiloff-Smith, A., & Smith, T. J. (2016). Toddlers’ fine motor milestone achievement is associated with early touchscreen scrolling. Frontiers in Psychology, 7, 1-8. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2016.01108
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; Nobre et al., 2020Nobre, J. N. P., Vinolas Prat, B., Santos, J. N., Santos, L. R., Pereira, L., Guedes, S. C., Ribeiro, R. F., & Morais, R. L. S. (2020). Qualidade de uso de mídias interativas na primeira infância e desenvolvimento infantil: uma análise multicritério. Jornal de Pediatria, 96(3), 310-7. https://doi.org/10.1016/j.jped.2018.11.015
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; Radesky et al., 2015Radesky, J. S., Schumacher, J., & Zuckerman, B. (2015). Mobile and interactive media use by young children: the good, the bad, and the unknown. Pediatrics , 135(1), 1-3. http://doi.org/10.1542/peds.2014-2251
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).

Observou-se, também, que foram raras as referências dos especialistas ao uso de telas durante a pandemia, mesmo nas publicações relativas ao ano de 2020 e 2021. Chama atenção essa lacuna na reflexão por parte dos profissionais, visto que a própria Sociedade Brasileira de Pediatria (2020)Sociedade Brasileira de Pediatria. (2020). Recomendações sobre o uso saudável das telas digitais em tempos de pandemia da COVID-19. #Boas telas #Mais saúde. Nota de Alerta, Grupo de trabalho Saúde na Era Digital. SBP . https://www.sbp.com.br/imprensa/detalhe/nid/recomendacoes-sobre-o-uso-saudavel-das-telas-digitais-em-tempos-de-pandemia-da-covid-19-boas-telas-mais-saude/
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editou recomendações no contexto da pandemia, as quais passaram a discutir as inúmeras mudanças ocorridas na rotina das crianças e suas famílias, em função do uso das tecnologias como meio possível para viabilizar o trabalho, os estudos e a manutenção de vínculos e de atividades profissionais, escolares, culturais e sociais (Pedrotti et al., 2021Pedrotti, B. G., Mallmann, M. Y., Silva, C., Vescovi, G., Marques, F. M., Riter, H. S., Almeida, M. L., Pieta, M. A. M., & Frizzo, G. B (2021). Infants’ and toddlers’ digital media use and mothers’ mental health: A comparative study before and during the COVID-19 pandemic. Infant Mental Health Journal, 43(1), 24-35. http://doi.org/10.1002/imhj.21952
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).

O saber especialista também pode ser considerado destoante do propósito inicial dos grupos analisados, uma vez que se interpõe nas trocas horizontalizadas de experiências singulares entre os pais e cuidadores. Cabe ainda, o questionamento sobre a possibilidade da construção criativa de si mesmo enquanto pai/cuidador, na medida em que esses ambientes passam a ser preenchidos com orientações e instruções externas trazidas pelo saber científico hegemônico e especializado. Nessa linha, Espote e Serralha (2018Espote, R., & Serralha, C. A. (2018). Escutando as mães: O cuidado ao bebê frente às orientações profissionais. Psicologia, Saúde & Doenças, 19(2), 453-67.) propõem que as orientações de especialistas aos pais precisam ser fornecidas de forma empática, acolhendo as percepções e sentimentos dos cuidadores. Segundo as referidas autoras, as orientações em específico devem ser fornecidas apenas nas situações em que há uma necessidade evidente de suporte para fornecimento de cuidados mais adequados, levando em conta os saberes e impressões dos cuidadores. As diretrizes sobre uso de telas da Royal College of Paediatrics and Child Health (2019)Royal College of Paediatrics and Child Health (2019). The health impacts of screen time: a guide for clinicians and parents. RCPCH. https://www.rcpch.ac.uk/sites/default/files/2018-12/rcpch_screen_time_guide_-_final.pdf
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, no Reino Unido, parecem mais alinhadas a essa perspectiva, ao proporem questões norteadoras para que as próprias famílias avaliem o uso que fazem das telas. Dessa forma, também ampliam o foco de atenção para além da criança, considerando o uso de telas na família como um todo.

Nesse sentido, é importante refletir, com ajuda das ideias de Winnicott (2006Winnicott, D. W. (2006). Os bebês e suas mães . Martins Fontes.), acerca da importância da escuta e acolhimento às mães - e aos pais -, na tentativa de valorização do saber materno, sendo que este difere das instruções e orientações dos profissionais oriundos de um nível cognitivo de conhecimento sobre as crianças. Ainda, Assemany (2016Assemany, N. M. (2016). Superestimulação na infância: uma questão contemporânea. Cadernos de Psicanálise, 38(34), 231-43.) refere que as mães aprendem em cursos ou na internet maneiras de trocar, falar, cantar, tocar e interagir com os filhos, como se a maternidade exigisse um preparo profissional. Dessa forma, seria importante que esses espaços pudessem funcionar também como oportunidades de reflexão e acolhimento de angústias, fomentando a capacidade intuitiva e espontânea das mães.

Faz-se necessário, portanto, questionar a naturalização e generalização do saber técnico, ampliando a possibilidade de uma escuta que considere as especificidades de cada família na relação estabelecida com as tecnologias. Conforme destaca Mendes (2015Mendes, R. (2015). Smartphones: objeto transicional e conectividade de um novo espaço potencial. Estudos de Psicanálise, 44, 133-44.), o papel desempenhado pelas telas adquire contornos muito singulares em cada indivíduo, carregando a marca do sintoma de cada um - entendido, aqui, não enquanto algo patológico, mas, conforme expressão de subjetividade. Desse modo, é importante considerar que lugar é assumido e qual o papel desempenhado pelas telas dentro de cada grupo familiar.

Além disso, cabe a reflexão dos profissionais acerca da forma de abordagem e a fundamentação de suas considerações quanto aos prejuízos das telas para as crianças. Algumas postagens analisadas neste estudo, por exemplo, apenas mencionam possíveis prejuízos do uso de telas para as crianças, sem citar a referência, teoria ou estudo em que se baseiam essas informações. Muitas vezes adquirem um tom alarmista ou determinista - o qual pode simplesmente provocar sentimento de culpa nos pais, ao invés de levá-los a refletir sobre o assunto para promover mudanças no cuidado com seus filhos e filhas.

Um dos elementos que compõem o desenvolvimento da parentalidade é o resgate, por parte das mães e pais, da provisão ambiental recebida nos primeiros anos, resultante da introjeção desses cuidados (Zornig, 2010Zornig, S. M. A. (2010). Tornar-se pai, tornar-se mãe: o processo de construção da parentalidade. Tempo Psicanalítico, 42(2), 453-70.). Outro aspecto que é mobilizado nesse momento são as experiências por meio das brincadeiras da infância, que se constituem nas identificações feitas nesse período, que também sustentam e possibilitam o exercício da parentalidade (Winnicott, 2006Winnicott, D. W. (2006). Os bebês e suas mães . Martins Fontes.). Além disso, o modelo internalizado de relação amorosa resultante da conflitiva edípica dos genitores também influenciaria na interação entre os pais e seus filhos (Aragão, 2007Aragão, R. M. O. (2007). A construção do espaço psíquico materno e seus efeitos sobre o psiquismo nascente do bebê. [Dissertação de mestrado, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo]. Repositório PUCSP. https://bit.ly/41Cq07N
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).

Dessa forma, a construção da parentalidade envolve preponderantemente a dimensão subjetiva dos cuidadores, constituindo-se de uma reestruturação a nível psíquico e, de certa forma, inconsciente (Zornig, 2010Zornig, S. M. A. (2010). Tornar-se pai, tornar-se mãe: o processo de construção da parentalidade. Tempo Psicanalítico, 42(2), 453-70.). Assim, não se trata de um saber que possa ser ensinado de forma pedagógica por intermédio de orientações, mas que se constrói ativamente com ajuda das experiências de vida singulares e na vivência da própria parentalidade.

Winnicott (2006Winnicott, D. W. (2006). Os bebês e suas mães . Martins Fontes.) inclusive alerta para os perigos de que questões tão profundas acedam ao nível da consciência, pois, caso os cuidadores tornem-se conscientes das inúmeras responsabilidades do cuidado necessário a uma criança, podem assustar-se, o que tornaria sua incumbência ainda mais onerosa em termos psíquicos. Nesse sentido, a co-construção da parentalidade vai se dando por meio da comunicação não verbal afinada entre os cuidadores implicados nos cuidados e a criança, que vai mostrando do que necessita (Zornig, 2010Zornig, S. M. A. (2010). Tornar-se pai, tornar-se mãe: o processo de construção da parentalidade. Tempo Psicanalítico, 42(2), 453-70.). O saber especialista nos grupos do Facebook seria, nesse contexto, estrangeiro a essa comunicação, podendo ser questionado, pois destoa da língua, da intimidade que é estabelecida apenas na relação entre os cuidadores e as crianças pelas quais são responsáveis.

Nesse sentido, as orientações dos especialistas a respeito da necessidade dos momentos de ócio e a importância da espontaneidade na infância poderiam ser realçadas, paradoxalmente, como necessidades do próprio exercício da parentalidade. Os momentos de dúvida sobre o uso dos eletrônicos podem ser fecundos para a mobilização desse saber, muitas vezes inconsciente, por parte dos cuidadores. Quando o discurso dos especialistas se interpõe nessa busca, a construção criativa de si mesmo enquanto pai, mãe ou cuidador pode tornar-se dificultada. Como esperar que as crianças possam brincar espontaneamente, conforme trazido em algumas publicações, se os próprios pais não estão autorizados a se constituírem como cuidadores de forma natural e criativa?

Não obstante, no que tange às postagens acerca do uso de telas pelos pais, estudos mostram que, quando esse se dá de forma excessiva, os cuidadores permanecem absorvidos em seus dispositivos, demonstrando menor sensibilidade e responsividade verbal e não-verbal às necessidades e demandas de seus filhos por atenção (Kildare & Middlemiss, 2017Kildare, C. A., & Middlemiss, W. (2017). Impact of parents mobile device use on parent-child interaction: a literature review. Computers in Human Behavior, 75, 579-93. http://doi.org/10.1016/j.chb.2017.06.003
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; Radesky et al., 2014Radesky, J. S., Kistin, C. J., Zuckerman, B., Nitzberg, K., Gross, J., Kaplan-Sanoff, M., Augustyn, M., & Silverstein, M. (2014). Patterns of mobile device use by caregivers and children during meals in fast food restaurants. Pediatrics , 133(4), 843-9. https://doi.org/10.1542/peds.2013-3703
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). Esses efeitos são especialmente preocupantes no caso dos bebês, pois quando suas manifestações não são acolhidas ou compreendidas como demandas, encontram o vazio e perdem sua potencialidade de devir, uma vez que não encontram um correspondente humano capaz de promover um processo de singularização, necessário para o amadurecimento da criança (Winnicott, 1983Winnicott, D. W. (1983). Distorção do ego em termos de falso e verdadeiro self. In D. W. Winnicott (Ed.), O ambiente e os processos de maturação. Artes Médicas.).

Importante mencionar que a presença dos profissionais foi constituída preponderantemente por psicólogos que, a princípio, têm uma formação privilegiada no que tange o desenvolvimento infantil e possíveis abordagens com pais e cuidadores. Cabe a reflexão, por parte dos profissionais da área, quanto aos efeitos que a presença do seu saber especializado pode produzir nessas comunidades virtuais criadas por (e para) pais e mães, evitando o que Hillesheim e Guareschi (2007Hillesheim, B., & Guareschi, N. M. F. (2007). De que infância nos fala a psicologia do desenvolvimento? Algumas reflexões. Psicologia da Educação, (25), 75-92.) descrevem como regimes de verdade baseados em experiências homogeneizadas e idealizadas de ser criança.

Considerações Finais

Este artigo pretendeu compreender de que forma o uso de telas na infância vem sendo abordado por especialistas em grupos de mães e pais no Facebook. Concluiu-se que, apesar dessas comunidades virtuais serem uma ferramenta de divulgação de informações sobre uso de telas na infância, cabe não naturalizar a presença de especialistas nesses espaços, sobretudo, por seu caráter potencialmente intrusivo e normativo na vida das crianças e seus cuidadores. Nesse sentido, sugere-se a ampliação das pesquisas acerca dessa temática, visando conhecer de forma mais aprofundada a influência dos profissionais nesses ambientes virtuais, considerando a dimensão sócio-histórica da construção dos discursos e saberes concernentes à infância.

Esta pesquisa traz uma contribuição importante, já que os grupos de mães e pais no Facebook ainda são pouco investigados em pesquisas quanto ao uso de telas na infância. Além disso, este artigo trata de um tema relevante e bastante atual, em especial, diante do contexto da pandemia de covid-19, quando o uso de telas cresceu significativamente ao redor do mundo, inclusive entre as crianças.

Nesse sentido, observou-se que foram raras as referências dos especialistas quanto ao uso de telas durante a pandemia, mesmo nas publicações referentes ao ano de 2020 e 2021. Chama atenção essa lacuna na reflexão por parte dos profissionais, visto que a própria Sociedade Brasileira de Pediatria (2020)Sociedade Brasileira de Pediatria. (2020). Recomendações sobre o uso saudável das telas digitais em tempos de pandemia da COVID-19. #Boas telas #Mais saúde. Nota de Alerta, Grupo de trabalho Saúde na Era Digital. SBP . https://www.sbp.com.br/imprensa/detalhe/nid/recomendacoes-sobre-o-uso-saudavel-das-telas-digitais-em-tempos-de-pandemia-da-covid-19-boas-telas-mais-saude/
https://www.sbp.com.br/imprensa/detalhe/...
editou recomendações no contexto da pandemia, as quais passaram a discutir as inúmeras mudanças ocorridas na rotina das crianças e suas famílias, em função do uso das tecnologias para viabilizar o trabalho, os estudos e o vínculo com a escola, familiares e amigos.

Cabe ainda ressaltar que ao empregar grupos de mães e pais no Facebook como fonte de coleta dos dados, focou-se neste estudo em uma população que tem acesso às tecnologias e é usuária de redes sociais. Entretanto, no Brasil há grande desigualdade no acesso à internet e às novas tecnologias. Sendo assim, uma direção para futuras publicações seria investigar de que modo os profissionais que atuam no atendimento a cuidadores sem acesso amplo à internet vêm abordando o uso de telas na infância com as famílias.

Observou-se que as postagens dos especialistas acabam por responsabilizar individualmente os pais e mães pelo uso de telas na infância, ignorando o contexto mais amplo de uma sociedade caracterizada pela presença maciça das tecnologias. De forma geral, os profissionais parecem condicionar essa questão a uma livre escolha por parte dos cuidadores, sem promover o debate mais abrangente sobre os determinantes sócio-históricos para a excessiva utilização das telas e eletrônicos na atualidade.

Nesse sentido, é possível questionar o modelo de subjetividade e sociabilidade endossado pela lógica capitalista, a qual pressupõe o consumo e individualismo como elementos que conferem significado e possibilidade às existências dos indivíduos. Seria esse o único modelo de subjetividade possível para as infâncias? Cabe refletir, ainda, acerca do papel das empresas de tecnologia e desenvolvedores de aplicativos na produção e oferta de conteúdos voltados a bebês e crianças. Essas questões podem ser discutidas e aprofundadas em futuros estudos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    29 Jun 2021
  • Aceito
    23 Ago 2022
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