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Atendimento Psicossocial à Mulher que Comete Ofensa Sexual

Psychosocial Attention for Women that Commit Sexual Offenses

Atención Psicosocial para Mujeres que Cometen Delitos Sexuales

Resumo

Objetivamos apresentar uma proposta de atendimento psicossocial grupal oferecida para mulheres adultas que cometeram ofensa sexual, cuidadoras e mães. A experiência está sendo desenvolvida no Distrito Federal, Brasil, com pessoas do gênero feminino provenientes de encaminhamento judicial. Carece que os profissionais das áreas da justiça, saúde, serviço social e psicologia avancem no estudo e na compreensão desta temática, de modo a pensarem a atuação e o apoio terapêutico a essas mulheres. O modo de atendimento é focal e breve, com ênfase na criação de um ambiente lúdico como facilitador das interações grupais e da discussão sobre os temas: identidade; confiança nas relações afetivas e sociais; vivência pessoal com violência física e sexual; configuração de gênero; e expressão da sexualidade e futuro. A abordagem individual também se baseia no enfoque dos temas mencionados. O oferecimento de ajuda à mulher cuidadora ou à mãe tem participação ativa na interrupção do circuito abusivo sexual, pois essa violência é extremamente ocultada, ocasionando uma prolongada vulnerabilidade para as vítimas. Ressalta-se o valor do texto indicando a descrição de ação voltada para uma população permanentemente não estudada e evitada em seu reconhecimento. Os limites desta proposta encontram-se na falta de outras iniciativas que possibilitem uma discussão sobre essa experiência.

Palavras-chave:
Mulher ofensora sexual; Abuso sexual; Intervenção psicossocial; Gênero

Abstract

We aim to present a proposal of a group psychosocial intervention offered for adult female sexual offenders, caregivers, and mothers. The intervention is being developed at Federal District, Brazil, with female people coming from judicial referrals. Professionals in the areas of justice, health, social work, and psychology need to advance in the study and understanding this theme to think about action and therapeutic support for these women. The intervention is a focal and brief approach, with emphasis on the creation of a ludic environment as a facilitator of group interactions and discussion about the themes: identity; trust in affective and social relationships; personal experience with physical and sexual violence; gender configuration; and sexuality expression and future. The individual approach is also based on focusing on these themes. The offering of help to the female caregiver or the mother has an active participation in the interruption of the sexual offense circuit, since this violence is extremely hidden, bringing a prolonged condition of vulnerability to the victims. The value of this text is highlighted indicating the description of an action directed to a population that is permanently not studied and whose recognition is avoided. The limits of this proposal are found in the absence of other initiatives that would allow a discussion about this experience.

Keywords:
Female sexual offender; Sexual abuse; Psychosocial intervention; Gender

Resumen

Este texto presenta una propuesta de atención psicosocial grupal destinada a mujeres adultas que han cometido delito sexual, a cuidadoras y madres. La intervención se está desarrollando en el Distrito Federal (Brasil), con personas del género femenino provenientes de remisiones judiciales. Es necesario que los profesionales de las áreas de justicia, salud, trabajo social y psicología avancen en el estudio y comprensión de esta temática para pensar en el desempeño y apoyo terapéutico de estas mujeres. El servicio es enfocado y breve, con énfasis en la creación de un ambiente lúdico como facilitador de interacciones grupales y discusión sobre los temas: identidad; confianza en las relaciones afectivas y sociales; experiencia personal con violencia física y sexual; configuración de género; y expresión de la sexualidad y el futuro. El enfoque individual también se centra en estos temas. La oferta de ayuda a la mujer cuidadora o a la madre es importante para la interrupción del circuito de abuso sexual, ya que esta violencia es extremadamente oculta y provoca una vulnerabilidad prolongada a las víctimas. Se destaca el valor del texto con la descripción de la acción dirigida a una población que no es objeto de estudios ni reconocida. Los límites de esta propuesta se encuentran en la ausencia de otras iniciativas que permitan un debate sobre esta experiencia.

Palabras clave:
Mujer delincuente sexual; Abuso sexual; Intervención psicossocial; Género

Introdução

Este texto objetiva explicitar uma proposta de atendimento psicossocial grupal construída para execução com mulheres adultas que cometeram ofensa sexual. Trata-se de um assunto muito pouco conhecido, mesmo em países de primeiro mundo, e, no Brasil, bastante ausente da discussão acadêmica.Devem-se reconhecer algumas iniciativas nesse sentido: Nicoletti, Giacomozzi e Cabral (2017Nicoletti, M., Giacomozzi, A. I., & Cabral, M. F. (2017). Análise de dois estudos de casos sobre abuso sexual cometido por mães. Revista de Psicologia, 35(2), 423-452. https://doi.org/10.18800/psico.201702.002
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); Passarela, Ströher e Costa (2019Passarela, C. F. T., Ströher, L. M. C., & Costa, L. F. (2019). As violências sofridas por mulheres que ofenderam sexualmente. Nova Perspectiva Sistêmica, XVIII(64), 47-59. https://doi.org/10.38034/nps.v28i64.498
https://doi.org/10.38034/nps.v28i64.498...
); Setubal, Wolff, Ströher, Blanco-Vieira e Costa (2019Setubal, C. B., Wolff, L. S., Ströher, L. M. C., Blanco-Vieira, T., & Costa, L. F. (2019). “Não pode ser abuso… eu sou a mãe”: Ofensa sexual maternal. Revista de Psicologia UChile, 28(1), 1-12. https://doi.org/10.5354/0719-0581.2019.53956
https://doi.org/10.5354/0719-0581.2019.5...
); e Xavier e Zanello (2018Xavier, A., & Zanello, V. (2018). Ouvindo o inaudito: mal estar da maternidade em mães ofensoras atendidas em um Creas. Revista de Ciências Humanas, 52, 1-23. https://repositorio.unb.br/handle/10482/35357
https://repositorio.unb.br/handle/10482/...
). Faz-se necessário que a comunidade de profissionais das áreas da justiça, saúde, serviço social e psicologia avancem no estudo, na descrição e compreensão dessa temática, para que sejam pensadas formas de atuação e apoio terapêutico a essas mulheres. Assinala-se que a ofensa sexual contra crianças/adolescentes é a prática de qualquer ato libidinoso com o fim de satisfação pessoal, ou de terceiros, envolvendo a desigualdade de posições de submissão e coerção da vítima e do agressor, ou em relação à idade e/ou ao estágio de desenvolvimento (World Health Organization [WHO], 2017World Health Organization (WHO) (2017). Responding to children and adolescents who have been sexually abused. https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/259270/9789241550147-eng.pdf?sequence=1
https://apps.who.int/iris/bitstream/hand...
).

As mulheres que cometem ofensa sexual sofreram maior vitimização em seu desenvolvimento, tendo sido, por sua vez, jovens abusadas por múltiplas pessoas, ou sofreram intenso processo de erotização (Strickland, 2008Strickland, S. M. (2008). Female sex offenders: Exploring issues of personality, trauma, and cognitive distortions. Journal of Interpersonal Violence, 23(4), 474-489. https://doi.org/10.1177/0886260507312944
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). Estudos de prevalência apontam que 4% dos casos de abusos sexuais são cometidos por mulheres, em comparação com um conhecimento geral do crime. Porém, quando se compara o número de 4% com a identificação dos casos de ofensa sexual cometidos por mulheres e narrados em contextos clínicos, este pode chegar até 20% (Cortoni, Babchishin, & Rat, 2017Cortoni, F., Babchishin, K., & Rat, C. (2017). The proportion of sexual offenders who are female is higher than thought: A meta-analysis. Criminal Justice and Behavior, 44(2), 145-162. https://doi.org/10.1177/0093854816658923; Strickland, 2008Strickland, S. M. (2008). Female sex offenders: Exploring issues of personality, trauma, and cognitive distortions. Journal of Interpersonal Violence, 23(4), 474-489. https://doi.org/10.1177/0886260507312944
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).

Existe desconhecimento dos casos de ofensa sexual cometidos por mulheres, sejam elas adultas ou adolescentes, e o pouco que se sabe provém de população clínica e/ou jurídica. Os casos foram mais divulgados a partir das décadas de 1980 e 1990 (Cauffman, 2008Cauffman, E. (2008). Understanding the female offender. The Future of Children, 18(2), 119-142. https://www.jstor.org/stable/20179981?seq=1
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; Strickland, 2008Strickland, S. M. (2008). Female sex offenders: Exploring issues of personality, trauma, and cognitive distortions. Journal of Interpersonal Violence, 23(4), 474-489. https://doi.org/10.1177/0886260507312944
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). As mulheres adultas que cometeram ofensas sexuais foram bastante violentadas, sexualmente ou por outras violências, durante sua infância e juventude, especialmente nos ambientes familiares. O histórico de violências e maus-tratos sofridos por elas é maior do que o número de homens adultos violentados na infância que cometeram ofensa sexual (Cauffman, 2008Cauffman, E. (2008). Understanding the female offender. The Future of Children, 18(2), 119-142. https://www.jstor.org/stable/20179981?seq=1
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; Strickland, 2008Strickland, S. M. (2008). Female sex offenders: Exploring issues of personality, trauma, and cognitive distortions. Journal of Interpersonal Violence, 23(4), 474-489. https://doi.org/10.1177/0886260507312944
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; Willis & Levenson, 2016Willis, G. M., & Levenson, J. S. (2016). The relationship between childhood adversity and adult psychosocial outcomes in females who have sexually offended: Implications for treatment. Journal of Sexual Aggression , 22(3), 355-367. https://doi.org/10.1080/13552600.2015.1131341
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).

Várias são as consequências destas violências. Estas mulheres apresentam severidade de trauma na infância, privação afetiva, pobres e frágeis condições de sobrevivência, disfunção familiar, padrão de interação afetiva familiar inadequado, levando a dificuldades de estabelecerem, posteriormente, relações amorosas. Assim, a ofensa sexual pode ser uma estratégia de se conectar com outras pessoas, sugerindo que as desordens de cunho sexual ou, ainda, o maltrato físico podem estar na base do interesse sexual da mulher por criança. Este desarranjo afetivo reverte seu papel social esperado de cuidadora, desse modo, fica dependente da criança para receber satisfação afetiva e amorosa (Comartin, Burgess-Proctor, Kubiak, & Kernsmith, 2018Comartin, E. B., Burgess-Proctor, A., Kubiak, S., & Kernsmith, P. (2018). Factors related to co-offending and coerced offending among female sex offenders: The role of childhood and adult trauma histories. Violence and victims, 33(1), 53-74. https://doi.org/10.1891/0886-6708.VV-D-16-00073
https://doi.org/10.1891/0886-6708.VV-D-1...
; Cortoni et al., 2017Cortoni, F., Babchishin, K., & Rat, C. (2017). The proportion of sexual offenders who are female is higher than thought: A meta-analysis. Criminal Justice and Behavior, 44(2), 145-162. https://doi.org/10.1177/0093854816658923; Passarela et al., 2019Passarela, C. F. T., Ströher, L. M. C., & Costa, L. F. (2019). As violências sofridas por mulheres que ofenderam sexualmente. Nova Perspectiva Sistêmica, XVIII(64), 47-59. https://doi.org/10.38034/nps.v28i64.498
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; Strickland, 2008Strickland, S. M. (2008). Female sex offenders: Exploring issues of personality, trauma, and cognitive distortions. Journal of Interpersonal Violence, 23(4), 474-489. https://doi.org/10.1177/0886260507312944
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).

Autores chamam atenção para a necessidade de se conhecer este universo que permanece ainda oculto. Tem sido por meio de estudos de casos (contexto mais favorável) que surgem as oportunidades para preenchimento dessa lacuna de informações. Assim, já se sabe algo sobre a ofensa sexual do pai contra a filha, mas pouco se conhece da ofensa sexual da mãe contra o filho (Grattagliano et al., 2012Grattagliano, I., Owens, J. N., Morton, R. J., Campobasso, C. P., Carabellese, F., & Catanesi, R. (2012). Female sexual offenders: Five Italian case studies. Aggression and Violent Behavior, 17(3), 180-187. http://dx.doi.org/10.1016/j.avb.2012.01.001
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; Haliburn, 2017Haliburn, J. (2017). Mother-child incest, psychosis, and the dynamics of relatedness. Journal of Trauma & Dissociation, 18(3), 409-426. https://doi.org/10.1080/15299732.2017.1295424
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). Nesta situação, os meninos são mais violentados do que as meninas. Outro ponto que caracteriza a ofensa sexual cometida por mulheres é que elas são tratadas nos tribunais (quando são) de forma muito leniente, recebendo penas leves (Cauffman, 2008Cauffman, E. (2008). Understanding the female offender. The Future of Children, 18(2), 119-142. https://www.jstor.org/stable/20179981?seq=1
https://www.jstor.org/stable/20179981?se...
; Kington, 2014Kington, A. (2014). The sex offender no one suspects: The treatment of female teachers who sexually exploit male student reflects legal and cultural double standards. MacLean’s, 12, 43-44. https://www.macleans.ca/news/canada/female-teachers-the-sex-offenders-no-one-suspects/
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; Strickland, 2008Strickland, S. M. (2008). Female sex offenders: Exploring issues of personality, trauma, and cognitive distortions. Journal of Interpersonal Violence, 23(4), 474-489. https://doi.org/10.1177/0886260507312944
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).

O preconceito em aceitar que a mulher não esteja cumprindo com seu papel de cuidadora explica, em parte, a dificuldade que a sociedade e os profissionais têm em identificar a ofensa sexual cometida por mães (Budd & Bierie, 2018Budd, K. M., & Bierie, D. M. (2018). Victims of sexual assault perpetrated by female youth: An exploratory study of gender differences. Journal of Sexual Aggression , 24(3), 274-293. https://doi.org/10.1080/13552600.2018.1528793
https://doi.org/10.1080/13552600.2018.15...
; Gannon & Alleyne, 2013Gannon, T. A., & Alleyne, K. A. (2013). Female sexual abuser’s cognition: A systematic review. Trauma, Violence & Abuse, 14(1), 67-79. https://doi.org/10.1177/1524838012462245
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; Grattagliano et al., 2012Grattagliano, I., Owens, J. N., Morton, R. J., Campobasso, C. P., Carabellese, F., & Catanesi, R. (2012). Female sexual offenders: Five Italian case studies. Aggression and Violent Behavior, 17(3), 180-187. http://dx.doi.org/10.1016/j.avb.2012.01.001
http://dx.doi.org/10.1016/j.avb.2012.01....
; Setubal et al., 2019Setubal, C. B., Wolff, L. S., Ströher, L. M. C., Blanco-Vieira, T., & Costa, L. F. (2019). “Não pode ser abuso… eu sou a mãe”: Ofensa sexual maternal. Revista de Psicologia UChile, 28(1), 1-12. https://doi.org/10.5354/0719-0581.2019.53956
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). Não se acredita que a mãe seja capaz de cometer tal violência por ser mulher e mãe, logo o ciclo de perpetração da violência, nos casos de ofensa sexual cometida pela mãe, é mais longo. Em função deste silenciamento, a maioria dos casos não são identificados. A ofensa sexual materna cria muita confusão na vítima, porque é vista como traição de quem se confia, e as consequências são vergonha e medo de não ser acreditado, de não se sentir querido. Estes aspectos são pouco descritos na literatura (Haliburn, 2017Haliburn, J. (2017). Mother-child incest, psychosis, and the dynamics of relatedness. Journal of Trauma & Dissociation, 18(3), 409-426. https://doi.org/10.1080/15299732.2017.1295424
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).

Sobre aspectos epidemiológicos, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) divulgou, em maio de 2020, um informe sobre a ocorrência de 17 mil casos de violência sexual contra crianças e adolescentes em 2019 (Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos [MMFDH], 2020Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) (2020). Ministério divulga dados de violência sexual contra crianças e adolescentes. https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2020-2/maio/ministerio-divulga-dados-de-violencia-sexual-contra-criancas-e-adolescentes
https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/no...
), sem apontar o gênero da autoria da violência sexual. Por outro lado, o Conselho Nacional do Ministério Público, em comemoração aos 30 anos do ECA, apontou somente a mãe como responsável por negligência, além de detalhar as violências sexuais cometidas unicamente por pessoas do gênero masculino. O que chama atenção neste informe, em particular, é que há uma categoria “outros” (outros autores) e não apresenta a categoria “gênero feminino” (Vilela, 2020Vilela, D. C. (2020). O Ministério Público e a proteção das crianças e adolescentes vítimas de violência sexual. WEBINAR 30 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente. https://www.cnmp.mp.br/portal/images/noticias/2020/agosto/Apresenta%C3%A7%C3%A3o_-_CNMP_-_30_Anos_ECA.pdf
https://www.cnmp.mp.br/portal/images/not...
).

Cabe ressaltar que a Ficha de Notificação de Violências Interpessoais ou Autoprovocadas (Brasil, 2016Brasil. (2016). Instrutivo: Ficha de notificação de violência interpessoal e autoprovocada (2a ed.). Ministério da Saúde. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/viva_instrutivo_violencia_interpessoal_autoprovocada_2ed.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
), no campo 13, traz a nomenclatura do sexo da pessoa que sofreu violência, e no campo 62 apresenta a nomenclatura de sexo do(a) provável autor(a) da agressão. Ressalta-se que sexo é um conceito biológico em que a pessoa é determinada ou pelas suas características fenotípicas (como a genitália ou caracteres sexuais secundários) ou genéticas. A categoria gênero, enquanto perspectiva teórica, que se refere a uma construção sócio-histórica relacional, vai além das determinações biologicistas, em que os indivíduos podem se identificar com um gênero diferente daquele que seria determinado pela biologia (Butler, 2012Butler, J. (2012). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (4a ed.). Civilização Brasileira.; Reis, 2018Reis, T. (Org.). (2018). Manual de Comunicação LGBTI+ (2a ed.). Aliança Nacional LGBTI / Gay Latino. http://www.grupodignidade.org.br/wp-content/uploads/2018/05/manual-comunicacao-LGBTI.pdf
http://www.grupodignidade.org.br/wp-cont...
).

Em um total de 58.037 vítimas crianças foram registradas notificações de 1.728 denúncias contra meninas (2,78%) e 570 denúncias contra meninos (2,98%) provocadas por mulheres. Em relação à violência perpetrada pela provável autora, em um total de 83.068 vítimas adolescentes, foram registradas 1.227 denúncias de violência sexual cometida contra adolescentes do gênero feminino (1,5%), e 206 denúncias contra adolescentes do gênero masculino (0,25%). Esse conjunto de dados revela o registro das violências entre os anos de 2011 e 2017, no Brasil. Um aspecto chama atenção para a não indicação do grau de parentesco quando as violências são perpetradas por familiares (Brasil, 2018Brasil. (2018). Boletim Epidemiológico 27. Ministério da Saúde. https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/wp-content/uploads/2019/07/2018-024.pdf
https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz...
). Outra questão importante, e de relevância, é que estudos acadêmicos realizados mais recentemente se baseiam nos dados consolidados até 2017, como em Onça e Silva (2020Onça, J. S., & Silva, D. A. (2020). Violência sexual no Brasil: Perfil epidemiológico (2009-2017). Revista Intelecto, 3, 1-10. https://fema.edu.br/images/Intelecto2020/VIOL%C3%8ANCIA_SEXUAL_NO_BRASIL.pdf
https://fema.edu.br/images/Intelecto2020...
).

Por outro lado, o InfoPen Mulheres (Santos, 2018Santos, T. (Org.). (2018). Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (2a ed.). Ministério da Justiça e Segurança Pública. https://conectas.org/wp-content/uploads/2018/05/infopenmulheres_arte_07-03-18-1.pdf
https://conectas.org/wp-content/uploads/...
) informa que o tipo penal mais próximo da condição de adulta ofensora sexual é Violência Doméstica. E sobre a informação relativa à população do Distrito Federal recolhida ao sistema prisional por este tipo penal, a porcentagem é 0%. No entanto, existem informações mais precisas fornecidas pela Secretaria de Estado de Segurança Pública do Distrito Federal. Sobre o ano de 2018 foram registradas 397 ocorrências de estupro de vulnerável, e identificados 336 autores, 12 do gênero feminino (2,5%) e 324 do gênero masculino (97,5%) (Secretaria de Estado de Segurança Pública, 2018Secretaria de Estado de Segurança Pública (2018). Crimes contra a dignidade sexual no DF (estupro, estupro de vulnerável e importunação sexual): Comparativo dos anos de 2017 e 2018 por Região Administrativa e acompanhamento dos últimos anos do Distrito Federal. http://www.ssp.df.gov.br/wp-conteudo/uploads/2017/11/An%C3%A1lise-FSP-003_2019-Crimes-contra-a-dignidade-sexual_-DF-2017_18-e-%C3%BAltimos-anos.pdf
http://www.ssp.df.gov.br/wp-conteudo/upl...
). Já em relação ao ano de 2019 (somente no primeiro semestre), foram registradas para o mesmo crime 150 ocorrências, e identificados 138 autores, 9 do gênero feminino e 129 do gênero masculino. Há que se notar um aumento visível de identificação das autoras do gênero feminino para este crime, considerando-se que o registro do ano de 2018 foi de todo o período, e o ano de 2019 somente para o primeiro semestre (Secretaria de Estado de Segurança Pública, 2019Secretaria de Estado de Segurança Pública (2019). Crimes contra a dignidade sexual no DF (estupro, estupro de vulnerável e importunação sexual): Comparativo do primeiro semestre de 2019 com o mesmo período do ano anterior, por Região Administrativa e acompanhamento dos últimos anos do Distrito Federal. http://www.ssp.df.gov.br/wp-conteudo/uploads/2017/11/An%C3%A1lise-FSP-023_2019-Crimes-contra-a-dignidade-sexual_-DF-1%C2%BA-sem-2019-e-%C3%BAltimos-anos.pdf
http://www.ssp.df.gov.br/wp-conteudo/upl...
).

Estes dados apontados referem-se à identificação de mulheres adultas. Sobre a ocorrência de adolescentes do gênero feminino que cometem ofensa sexual, há muitas dificuldades de acesso aos registros numéricos. Oliver e Holmes (2015Oliver, B. E., & Holmes, L. (2015). Female juvenile sexual offenders: Understanding who they are and possible steps that may prevent some girls from offending. Journal of Child Sexual Abuse , 24(6), 698-715. https://doi.org/10.1080/ 10538712.2015.1058875
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) as identificam e apontam que o número deve ser bem maior do que o minimamente conhecido, em função da grande reserva que existe em conhecer o fenômeno e do segredo tácito entre todos os envolvidos. A justificativa para essas dificuldades provém de várias razões: ausência de pesquisas, de instrumentos para acesso, de literatura, de estudos específicos distinguindo ofensa sexual cometida por autores do gênero masculino e feminino e propostas de tratamento (Vick, McRoy, & Matthews, 2002Vick, J., McRoy, R., & Matthews, B. M. (2002). Young female sexual offenders: Assessment and treatment issues. Journal of Child Sexual Abuse , 11(2), 1-23. http://dx.doi.org/10.1300/J070v11n02_01
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). Um dado recém-publicado (Costa, Junqueira, Bastos, & Tavares, 2020Costa, L. F., Junqueira, E. L., Bastos, K. R. P., & Tavares, A. S. (2020). O que fazer? Ofensa sexual cometida por pré-adolescentes e adolescentes dos gêneros masculino e feminino. In D. M. Amparo, R. A. Morais, K. T. Brasil, & E. R. Lazzarini (Eds), Adolescência: Psicoterapias e mediações terapêuticas na clínica dos extremos (pp. 339-355). Technopolitik.) informa que de 2010 a 2018 foram acolhidas 15 adolescentes entre 11 e 19 anos em um serviço de atendimento a adolescentes que ofenderam sexualmente, no Distrito Federal. Estas chegaram à instituição via encaminhamento do Conselho Tutelar, Vara da Infância e do Ministério Público. Pode-se observar que tem início um movimento de identificação e iniciativas do oferecimento de ações, mesmo diante da negação de profissionais em perceber o abuso sexual, que é interpretado como ação não agressiva.

Referente à execução de política pública de assistência à saúde da mulher, o Ministério da Saúde (Brasil, 2004Brasil. (2004). Política Nacional na Atenção Integral à Saúde da Mulher: Princípios e diretrizes. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nac_atencao_mulher.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
), em seu documento Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher: Princípios e diretrizes, orienta e define os parâmetros de prioridade à saúde da mulher a respeito de: maternidade, saúde sexual, atenção obstétrica, anticoncepção, risco para doenças sexualmente transmissíveis, violência doméstica e sexual, saúde mental, ciclo de vida reprodutor e outros, inclusive voltada também para as adolescentes do gênero feminino. O documento enfatiza a dimensão de gênero norteando a execução desta política, o que está de acordo com as preocupações dos executores de políticas de atendimento terapêutico às mulheres que cometem ofensa sexual, internacionalmente (Marshall, 2018Marshall, W. L. (2018). A brief history of psychological theory, research, and treatment with male sexual offenders. Current Psychiatry Reports, 20(57), 1-8. https://doi.org/10.1007/s11920-018-0920-0
https://doi.org/10.1007/s11920-018-0920-...
; Pflugradt, Allen, & Marshall, 2018Pflugradt, D. M., Allen, B. P., & Marshall, W. L. (2018). A gendered strength-based treatment model for female sexual offenders. Aggression and Violent Behavior , 40, 12-18. https://doi.org/10.1016/j.avb.2018.02.012
https://doi.org/10.1016/j.avb.2018.02.01...
).

Atendimento psicossocial às mulheres que cometeram ofensa sexual

Segundo Marshall (2018Marshall, W. L. (2018). A brief history of psychological theory, research, and treatment with male sexual offenders. Current Psychiatry Reports, 20(57), 1-8. https://doi.org/10.1007/s11920-018-0920-0
https://doi.org/10.1007/s11920-018-0920-...
), desde o século XIX existe uma tentativa de se compreender o fenômeno da violência sexual cometida por adultos contra crianças e adolescentes. Porém, somente a partir da década de 1960 houve uma construção teórica que permitiu uma abordagem prática na proposição de atendimentos terapêuticos a esta população de ofensores sexuais adultos, dos gêneros masculino e feminino. Vários autores (Bowden, Glorney, & Daniels, 2017Bowden, L., Glorney, E., & Daniels, M. (2017). Individual’s experiences of sexual offending therapy in a forensic psychiatric setting. Journal of Sexual Aggression, 23(3), 278-290. http://dx.doi.org/10.1080/13552600.2017.1343398
http://dx.doi.org/10.1080/13552600.2017....
; Levenson, Willis, & Prescott, 2015Levenson, J. S., Willis, G. M., & Prescott, D. S. (2015). Adverse childhood experiences in the lives of female sex offenders. Sexual Abuse: A Journal of Research and Treatment, 27(3), 258-283. https://doi.org/10.1177/1079063214544332
https://doi.org/10.1177/1079063214544332...
; Marshall, 2018Marshall, W. L. (2018). A brief history of psychological theory, research, and treatment with male sexual offenders. Current Psychiatry Reports, 20(57), 1-8. https://doi.org/10.1007/s11920-018-0920-0
https://doi.org/10.1007/s11920-018-0920-...
; Pflugradt et al., 2018Pflugradt, D. M., Allen, B. P., & Marshall, W. L. (2018). A gendered strength-based treatment model for female sexual offenders. Aggression and Violent Behavior , 40, 12-18. https://doi.org/10.1016/j.avb.2018.02.012
https://doi.org/10.1016/j.avb.2018.02.01...
; Willis & Levenson, 2016Willis, G. M., & Levenson, J. S. (2016). The relationship between childhood adversity and adult psychosocial outcomes in females who have sexually offended: Implications for treatment. Journal of Sexual Aggression , 22(3), 355-367. https://doi.org/10.1080/13552600.2015.1131341
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) concordam que existem aspectos comuns entre ofensas sexuais cometidas por homens e mulheres adultas. Porém, em relação à abordagem terapêutica voltada para o gênero feminino, esta deve ser bastante diferenciada daquela oferecida aos homens ofensores sexuais.

A principal diferença e enfoque observado deve ser a dimensão de gênero que necessita estar incluída e priorizada nos atendimentos às mulheres que cometem ofensa sexual. As problemáticas vividas por estas mulheres (maior violência, submissão e dominação, integrantes de sociedades bastante machistas), ao longo de sua vida, são consideradas sob a influência de gênero que aumenta as possibilidades de experiência e sofrimento de novas e diversas violências (Kington, 2014Kington, A. (2014). The sex offender no one suspects: The treatment of female teachers who sexually exploit male student reflects legal and cultural double standards. MacLean’s, 12, 43-44. https://www.macleans.ca/news/canada/female-teachers-the-sex-offenders-no-one-suspects/
https://www.macleans.ca/news/canada/fema...
; Pflugradt et al., 2018Pflugradt, D. M., Allen, B. P., & Marshall, W. L. (2018). A gendered strength-based treatment model for female sexual offenders. Aggression and Violent Behavior , 40, 12-18. https://doi.org/10.1016/j.avb.2018.02.012
https://doi.org/10.1016/j.avb.2018.02.01...
; Setubal et al., 2019Setubal, C. B., Wolff, L. S., Ströher, L. M. C., Blanco-Vieira, T., & Costa, L. F. (2019). “Não pode ser abuso… eu sou a mãe”: Ofensa sexual maternal. Revista de Psicologia UChile, 28(1), 1-12. https://doi.org/10.5354/0719-0581.2019.53956
https://doi.org/10.5354/0719-0581.2019.5...
; Xavier & Zanello, 2018Xavier, A., & Zanello, V. (2018). Ouvindo o inaudito: mal estar da maternidade em mães ofensoras atendidas em um Creas. Revista de Ciências Humanas, 52, 1-23. https://repositorio.unb.br/handle/10482/35357
https://repositorio.unb.br/handle/10482/...
). As sociedades da América Latina (países de língua espanhola e portuguesa) reproduzem esse modelo (Loinaz, 2016Loinaz, I. (2016). Cuando “el” delinquente es “ella”: Intervención con mujeres violentas. Anuario de Psicología Jurídica, 26(1), 41-50. https://doi.org/10.1016/j.apj.2016.04.006
https://doi.org/10.1016/j.apj.2016.04.00...
). A perspectiva de gênero também dá valor especial ao sofrimento vivido pela mulher ofensora sexual, em função de grande vitimização sexual (ou outros tipos de violência) em tenra idade. De modo geral, os adultos que cometeram ofensa sexual, independentemente do gênero, viveram experiências de vitimização física e de teor traumático muito intensas (Bowden et al., 2017Bowden, L., Glorney, E., & Daniels, M. (2017). Individual’s experiences of sexual offending therapy in a forensic psychiatric setting. Journal of Sexual Aggression, 23(3), 278-290. http://dx.doi.org/10.1080/13552600.2017.1343398
http://dx.doi.org/10.1080/13552600.2017....
; Comartin et al., 2018Comartin, E. B., Burgess-Proctor, A., Kubiak, S., & Kernsmith, P. (2018). Factors related to co-offending and coerced offending among female sex offenders: The role of childhood and adult trauma histories. Violence and victims, 33(1), 53-74. https://doi.org/10.1891/0886-6708.VV-D-16-00073
https://doi.org/10.1891/0886-6708.VV-D-1...
; Willis & Levenson, 2016Willis, G. M., & Levenson, J. S. (2016). The relationship between childhood adversity and adult psychosocial outcomes in females who have sexually offended: Implications for treatment. Journal of Sexual Aggression , 22(3), 355-367. https://doi.org/10.1080/13552600.2015.1131341
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). No entanto, há concordância de que as mulheres sofrem maior violência do que os homens (Loinaz, 2016Loinaz, I. (2016). Cuando “el” delinquente es “ella”: Intervención con mujeres violentas. Anuario de Psicología Jurídica, 26(1), 41-50. https://doi.org/10.1016/j.apj.2016.04.006
https://doi.org/10.1016/j.apj.2016.04.00...
; Setubal et al., 2019Setubal, C. B., Wolff, L. S., Ströher, L. M. C., Blanco-Vieira, T., & Costa, L. F. (2019). “Não pode ser abuso… eu sou a mãe”: Ofensa sexual maternal. Revista de Psicologia UChile, 28(1), 1-12. https://doi.org/10.5354/0719-0581.2019.53956
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).

A dimensão de gênero adotada nos atendimentos a essas mulheres não se direciona apenas à influência do contato permanente com machismo e uma posição de submissão nas relações. Os atendimentos devem seguir uma orientação de sensibilidade e afetividade, de especificidade na comunicação e nos interesses referentes às relações familiares e o exercício do papel materno (Ashfield, Brotherston, Eldridge, & Elliot, 2010Ashfield, S., Brotherston, S., Eldridge, H., & Elliot, I. (2010). Working with Female Sexual Offenders: Therapeutic process issues. In T. A. Gannon & F. Cortoni (Eds.), Female sexual offenders: Theory, assessment, and treatment (pp. 161-180). Wiley.; Haliburn, 2017Haliburn, J. (2017). Mother-child incest, psychosis, and the dynamics of relatedness. Journal of Trauma & Dissociation, 18(3), 409-426. https://doi.org/10.1080/15299732.2017.1295424
https://doi.org/10.1080/15299732.2017.12...
). Assim, Willis e Levenson (2016Willis, G. M., & Levenson, J. S. (2016). The relationship between childhood adversity and adult psychosocial outcomes in females who have sexually offended: Implications for treatment. Journal of Sexual Aggression , 22(3), 355-367. https://doi.org/10.1080/13552600.2015.1131341
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) indicam a necessidade da criação de um clima de ajuda mútua, considerando as necessidades próprias da mulher, o desenvolvimento da empatia, o empoderamento para lidar com a falta de afeto característico de sua educação e desenvolvimento. Os objetivos dos atendimentos não devem se centrar nas vivências do passado, no entanto não podem desprezar a realidade de falta de segurança e afetividade vivida nas relações parentais. Além disso, é importante que dimensões de crítica e julgamento estejam fora do campo da intervenção (Willis & Levenson, 2016Willis, G. M., & Levenson, J. S. (2016). The relationship between childhood adversity and adult psychosocial outcomes in females who have sexually offended: Implications for treatment. Journal of Sexual Aggression , 22(3), 355-367. https://doi.org/10.1080/13552600.2015.1131341
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).

Uma abordagem terapêutica para adolescentes do gênero feminino que ofenderam sexualmente ainda se encontra em um estado pouco desenvolvido, mesmo em países de primeiro mundo. Tem-se como certo que não se pode replicar uma abordagem adotada para adolescentes do gênero masculino, considerando-se que existem particularidades para a ofensa cometida pelo gênero feminino (Weinshmeier, Woiwood, Coburn, Chong, & Connolly, 2017Weinshmeier, C. C., Woiwood, D. M., Coburn, P. I., Chong, K., & Connolly, D. A. (2017). The unusual suspects: Female versus male accused in child sexual abuse cases. Child Abuse & Neglect, 72, 446-455. http://dx.doi.org/10.1016/j.chiabu.2017.09.003
http://dx.doi.org/10.1016/j.chiabu.2017....
). Outro aspecto importante é que muitas adolescentes ofensoras ainda estão em situação de intenso maltrato, sendo esta a principal questão que está vinculada à confusão entre buscar afeto e expressar comportamentos de ordem sexual. Abuso físico, violência sexual, negligência e violência intrafamiliar são alguns dos sofrimentos impingidos a estas jovens. A ofensa cometida por adolescentes meninas pode ter início em idade muito precoce, por exemplo, antes dos 12 anos (Frey, 2010Frey, L. (2010). The juvenile female sexual offenders: Characteristics, treatment, and research. In T. A. Gannon, & F. Cortoni (Eds.), Female sexual offenders: Theory, assessment, and treatment (pp. 53-71). Wiley.).

Faz-se necessário um processo de avaliação das condições psicossociais destas adolescentes para um melhor conhecimento sobre a presença de sintomas psiquiátricos, já que o maltrato tem início muito cedo em sua breve vida. Algumas diferenças em relação à violência sexual cometida por adolescentes do gênero masculino devem ser consideradas quando se fizer a programação de ação terapêutica: as vítimas das adolescentes podem ser do gênero feminino, masculino, ou de ambos; dar especial atenção à própria vitimização da adolescente; e buscar conhecer os protocolos do atendimento de mulheres adultas (Frey, 2010Frey, L. (2010). The juvenile female sexual offenders: Characteristics, treatment, and research. In T. A. Gannon, & F. Cortoni (Eds.), Female sexual offenders: Theory, assessment, and treatment (pp. 53-71). Wiley.). No entanto, há reconhecimento de que as propostas de avaliação ainda são pouco usuais e adotadas, mesmo em grandes centros que já têm um domínio maior do tema (Willis & Levenson, 2016Willis, G. M., & Levenson, J. S. (2016). The relationship between childhood adversity and adult psychosocial outcomes in females who have sexually offended: Implications for treatment. Journal of Sexual Aggression , 22(3), 355-367. https://doi.org/10.1080/13552600.2015.1131341
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). Marshall (2018Marshall, W. L. (2018). A brief history of psychological theory, research, and treatment with male sexual offenders. Current Psychiatry Reports, 20(57), 1-8. https://doi.org/10.1007/s11920-018-0920-0
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) insiste em que a questão do gênero deve ser o fio condutor na abordagem às mulheres e adolescentes do gênero feminino.

A proposta de atendimento psicossocial

O contexto de atendimento é um programa de atenção à violência voltado para o adulto que ofende sexualmente crianças e adolescentes. Este programa ocupa espaço em um hospital geral de uma grande capital, contando com uma equipe de duas assistentes sociais, um psicólogo, uma psicóloga e um psiquiatra. O programa apresenta, ainda, uma parceria com um programa de pós-graduação em psicologia de uma universidade federal, que conta com duas psicólogas professoras, alunos de pós-graduação e de graduação que participam das pesquisas e da observação das atividades de rotina dos atendimentos.

O atendimento ao adulto do gênero masculino teve início em 2013 e já está descrito em Meneses, Ströher, Setubal, Wolff e Costa (2016Meneses, F. F. F., Ströher, L. M. C., Setubal, C. B., Wolff, L. S., & Costa, L. F. (2016). Intervenção psicossocial com o adulto autor de violência sexual intrafamiliar contra crianças e adolescentes. Contextos Clínicos, 9(1), 98-108. https://doi.org/10.4013/ctc.2016.91.08
https://doi.org/10.4013/ctc.2016.91.08...
). As atividades que fazem parte da fase inicial de avaliação das condições biopsicossociais são: entrevistas realizadas com o autor da ofensa sexual, de forma individual e em família, e entrevista com o psiquiatra. Após essa etapa, o autor da ofensa sexual é encaminhado para atendimento grupal. Os grupos ocorrem um a cada semestre e somam oito atendimentos grupais de aproximadamente 3 horas cada. Até o momento, foram atendidos cerca de 230 autores de ofensa sexual, encaminhados pelas Varas de Execuções Penais ou pelas Promotorias.

A partir de 2016, além de continuar recebendo encaminhamentos de homens adultos, o programa passou a receber mulheres que cometeram ofensa sexual encaminhadas pelo Ministério Público ou pela Vara da Infância. No primeiro semestre de 2019 foram inscritas no programa cinco mulheres. Essa procura coincide com os dados do aumento da incidência de autores de estupro de vulnerável identificados do gênero feminino (nove ocorrências identificadas), que estão expostos no relatório da Secretaria de Estado de Segurança Pública de 2019 (Secretaria de Estado de Segurança Pública, 2019Secretaria de Estado de Segurança Pública (2019). Crimes contra a dignidade sexual no DF (estupro, estupro de vulnerável e importunação sexual): Comparativo do primeiro semestre de 2019 com o mesmo período do ano anterior, por Região Administrativa e acompanhamento dos últimos anos do Distrito Federal. http://www.ssp.df.gov.br/wp-conteudo/uploads/2017/11/An%C3%A1lise-FSP-023_2019-Crimes-contra-a-dignidade-sexual_-DF-1%C2%BA-sem-2019-e-%C3%BAltimos-anos.pdf
http://www.ssp.df.gov.br/wp-conteudo/upl...
), apresentado anteriormente no texto. Tal trajetória trouxe uma necessidade de se pensar uma forma de atendimento grupal para as mulheres encaminhadas, já que o serviço não comportaria o oferecimento de atendimentos individuais para as mulheres, além do atendimento aos homens.

De modo geral, a sistemática da criação do grupo de mulheres seguiu a modelagem do grupo de homens, em função da expertise adquirida pela equipe, considerando várias indicações de autores sobre a formação grupal para o atendimento ao(à) autor(a) de ofensa sexual (Bowden et al., 2017Bowden, L., Glorney, E., & Daniels, M. (2017). Individual’s experiences of sexual offending therapy in a forensic psychiatric setting. Journal of Sexual Aggression, 23(3), 278-290. http://dx.doi.org/10.1080/13552600.2017.1343398
http://dx.doi.org/10.1080/13552600.2017....
; Marshall, 2006Marshall, W. L. (2006). Treatment of sexual offenders and its effects. Resource Material Series, 72, 1-11. https://www.unafei.or.jp/publications/pdf/RS_No72/No72_12VE_Marshall.pdf
https://www.unafei.or.jp/publications/pd...
, 2018Marshall, W. L. (2018). A brief history of psychological theory, research, and treatment with male sexual offenders. Current Psychiatry Reports, 20(57), 1-8. https://doi.org/10.1007/s11920-018-0920-0
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). Assim, o atendimento tem início com uma etapa de avaliação. Na entrevista inicial de acolhimento constam os seguintes itens: identificação; dados da família; condições de moradia e de saúde; histórico da violência sexual cometida; entrada no sistema judiciário; expectativas para a intervenção; e encaminhamentos para a rede de saúde e/ou assistência social, realizados ao final do atendimento. Nesse momento também é confeccionada uma linha da vida buscando conhecer as experiências da pessoa atendida (Sei, 2017Sei, M. B. (2017). O atendimento a casal e família em serviço-escola de Psicologia. In M. B. Sei, & I. C. Gomes (Eds.), Formação, pesquisa e a clínica psicanalítica de casais e famílias (pp. 35-53). Universidade Estadual de Londrina.), em especial sobre seu histórico de vitimização por violência, sexual ou não (Willis & Levenson, 2016Willis, G. M., & Levenson, J. S. (2016). The relationship between childhood adversity and adult psychosocial outcomes in females who have sexually offended: Implications for treatment. Journal of Sexual Aggression , 22(3), 355-367. https://doi.org/10.1080/13552600.2015.1131341
https://doi.org/10.1080/13552600.2015.11...
). Na entrevista familiar, toda a família é convidada a comparecer, e o objetivo é conhecer a interação familiar, as possíveis consequências da adoção de medidas de afastamento da ofensora (decretadas pela justiça) em relação às crianças sob seus cuidados, bem como a reorganização familiar decorrente destas medidas (Kington, 2014Kington, A. (2014). The sex offender no one suspects: The treatment of female teachers who sexually exploit male student reflects legal and cultural double standards. MacLean’s, 12, 43-44. https://www.macleans.ca/news/canada/female-teachers-the-sex-offenders-no-one-suspects/
https://www.macleans.ca/news/canada/fema...
; Setubal et al., 2019Setubal, C. B., Wolff, L. S., Ströher, L. M. C., Blanco-Vieira, T., & Costa, L. F. (2019). “Não pode ser abuso… eu sou a mãe”: Ofensa sexual maternal. Revista de Psicologia UChile, 28(1), 1-12. https://doi.org/10.5354/0719-0581.2019.53956
https://doi.org/10.5354/0719-0581.2019.5...
). Essa também é a oportunidade para a confecção do Genograma (McGoldrick, Gerson, & Petry, 2012McGoldrick, M., Gerson, R., & Petry, S. (2012). Genograma: Avaliação e intervenção familiar (3a. ed.). Artmed.), que consiste em uma representação gráfica dos membros da família, de suas várias gerações e da qualidade dessas relações entre os diferentes membros. Em relação a essas mulheres, em particular, interessa sobremaneira as violências cometidas contra elas (Levenson et al., 2015Levenson, J. S., Willis, G. M., & Prescott, D. S. (2015). Adverse childhood experiences in the lives of female sex offenders. Sexual Abuse: A Journal of Research and Treatment, 27(3), 258-283. https://doi.org/10.1177/1079063214544332
https://doi.org/10.1177/1079063214544332...
; Passarela et al., 2019Passarela, C. F. T., Ströher, L. M. C., & Costa, L. F. (2019). As violências sofridas por mulheres que ofenderam sexualmente. Nova Perspectiva Sistêmica, XVIII(64), 47-59. https://doi.org/10.38034/nps.v28i64.498
https://doi.org/10.38034/nps.v28i64.498...
). Na entrevista de avaliação psiquiátrica é fundamental a compreensão de possíveis comprometimentos com aspectos psicopatológicos, principalmente depressão, além da presença ou não de uma díade conjugal de dependência emocional afetiva e financeira (Burgess-Proctor, Comartin, & Kubiak, 2017Burgess-Proctor, A., Comartin, E. B., & Kubiak, S. P. (2017). Comparing female and male perpetrated child sexual abuse: A mixed-methods analysis. Journal of Child Sexual Abuse, 26(6), 657-676. https://doi.org/10.1080/10538712.2017.1336504
https://doi.org/10.1080/10538712.2017.13...
; Comartin et al., 2018Comartin, E. B., Burgess-Proctor, A., Kubiak, S., & Kernsmith, P. (2018). Factors related to co-offending and coerced offending among female sex offenders: The role of childhood and adult trauma histories. Violence and victims, 33(1), 53-74. https://doi.org/10.1891/0886-6708.VV-D-16-00073
https://doi.org/10.1891/0886-6708.VV-D-1...
; Grattagliano et al., 2012Grattagliano, I., Owens, J. N., Morton, R. J., Campobasso, C. P., Carabellese, F., & Catanesi, R. (2012). Female sexual offenders: Five Italian case studies. Aggression and Violent Behavior, 17(3), 180-187. http://dx.doi.org/10.1016/j.avb.2012.01.001
http://dx.doi.org/10.1016/j.avb.2012.01....
).

Sobre o modo de atendimento, optou-se por escolher uma abordagem lúdica, focal e breve, a exemplo do que já tinha sido feito com a escolha deste modelo para o atendimento aos homens (Wolff, Oliveira, Marra, & Costa, 2016Wolff, L., Oliveira, E. S., Marra, M. M., & Costa, L. F. (2016). O recurso psicodramático na intervenção com o adulto autor de ofensa sexual. Revista Brasileira de Psicodrama, 24(2), 58-68. http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicodrama/v24n2/v24n2a07.pdf
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicodrama...
). Vários autores (Bowden et al., 2017Bowden, L., Glorney, E., & Daniels, M. (2017). Individual’s experiences of sexual offending therapy in a forensic psychiatric setting. Journal of Sexual Aggression, 23(3), 278-290. http://dx.doi.org/10.1080/13552600.2017.1343398
http://dx.doi.org/10.1080/13552600.2017....
; Marshall, 2018Marshall, W. L. (2018). A brief history of psychological theory, research, and treatment with male sexual offenders. Current Psychiatry Reports, 20(57), 1-8. https://doi.org/10.1007/s11920-018-0920-0
https://doi.org/10.1007/s11920-018-0920-...
; O’Doherty et al., 2014O’Doherty, L. J., MacMillan, H., Feder, G., Taft, A., Taket, A., & Hegarty, K. (2014). Selecting outcomes for intimate partner violence intervention trials: Overview and recommendations. Aggression and Violent Behavior , 19(3), 663-672. https://doi.org/10.1016/j.avb.2014.09.010
https://doi.org/10.1016/j.avb.2014.09.01...
; Willis & Levenson, 2016Willis, G. M., & Levenson, J. S. (2016). The relationship between childhood adversity and adult psychosocial outcomes in females who have sexually offended: Implications for treatment. Journal of Sexual Aggression , 22(3), 355-367. https://doi.org/10.1080/13552600.2015.1131341
https://doi.org/10.1080/13552600.2015.11...
) concordam que essa população de adultos que cometem ofensa sexual não apresenta demanda para atendimento terapêutico, procurando os serviços apenas porque são encaminhados pela justiça. Portanto, trata-se de uma intervenção psicossocial norteada pela escolha de temas pré-definidos, por meio da criação de um ambiente lúdico e do uso de recursos do Psicodrama e da Arteterapia, com fito de fortalecer os fatores protetivos, diminuindo os fatores de risco na perspectiva de redução de reincidência. Por outro lado, também se compreende ser uma oportunidade para a veiculação de informações atualizadas sobre legislação e uma revisão crítica dos preconceitos associados ao tema (Roine, 2010Roine, E. (2010). A utilização do psicodrama com vítimas de trauma. In P. F. Kellerman, & M. K. Hudgins (Eds.), Psicodrama do trauma: O sofrimento em cena (pp. 81-93).Ágora.; Wolff et al., 2016Wolff, L., Oliveira, E. S., Marra, M. M., & Costa, L. F. (2016). O recurso psicodramático na intervenção com o adulto autor de ofensa sexual. Revista Brasileira de Psicodrama, 24(2), 58-68. http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicodrama/v24n2/v24n2a07.pdf
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicodrama...
).

Compreende-se por atendimento psicossocial uma intervenção adotada preferencialmente em contextos públicos de Atenção à Saúde, nos quais se privilegia a formação grupal, além de se considerar que a clientela pertence à instituição e não a um determinado profissional (Costa & Penso, 2010Costa, L. F., & Penso, M. A. (2010). A dimensão clínica das intervenções psicossociais com adolescentes e família. In M. M. Marra, & L. F. Costa (Eds.), Temas da clínica do adolescente e da família (pp. 201-214). Ágora.). Por outro lado, também é importante que sejam consideradas as avaliações de programas referentes ao atendimento à população LGBTQ+, visto que as vitimizações de mulheres e de integrantes desses grupos são muito mais danosas do que aquelas infringidas a componentes de grupos de homens do gênero masculino não LGBTQ+. A proposição de modelos de ajuda aos LGBTQ+ pode oferecer indicativos extremamente úteis (Decker, Littleton, & Edwards, 2018Decker, M., Littleton, H. L., & Edwards, K. M. (2018). An update of the literature on LGBTQ+ intimate partner violence. Current Sexual Health Reports, 10(4), 265-272. https://doi.org/10.1007/s11930-018-0173-2
https://doi.org/10.1007/s11930-018-0173-...
; O’Doherty et al., 2014O’Doherty, L. J., MacMillan, H., Feder, G., Taft, A., Taket, A., & Hegarty, K. (2014). Selecting outcomes for intimate partner violence intervention trials: Overview and recommendations. Aggression and Violent Behavior , 19(3), 663-672. https://doi.org/10.1016/j.avb.2014.09.010
https://doi.org/10.1016/j.avb.2014.09.01...
).

As participantes

Em 2019, estavam em atendimento seis mulheres entre 20 e 53 anos, encaminhadas pelo sistema de justiça e da saúde, todas com abordagem individual. Duas são solteiras e sem filhos; uma é separada, não tendo constituído novo relacionamento, e dedica-se à filha adulta e aos netos; duas são casadas e convivem com os filhos adultos; e uma é casada e tem filhos pequenos; todas pertencentes às classes econômicas C e D. A escolaridade varia de ensino fundamental completo a ensino médio e ensino superior, ambos incompletos. No ano de 2020, houve uma interrupção temporária dos atendimentos presenciais em função da pandemia do covid-19, o que foi aproveitado como um período para a estruturação da proposta grupal agora apresentada.

Cuidados teóricos, metodológicos e éticos no atendimento grupal

O modelo grupal se baseia em uma perspectiva de criação de ambiente lúdico (Moreno, 1972Moreno, J. L. (1972). Fundamentos do Psicodrama. Summus.), no qual se propõem jogos dramáticos que são mais fáceis de serem aceitos nas interações entre as participantes, em função do conteúdo fortemente evocativo de sofrimento e vergonha enfocado em todas as sessões (Bowden et al., 2017Bowden, L., Glorney, E., & Daniels, M. (2017). Individual’s experiences of sexual offending therapy in a forensic psychiatric setting. Journal of Sexual Aggression, 23(3), 278-290. http://dx.doi.org/10.1080/13552600.2017.1343398
http://dx.doi.org/10.1080/13552600.2017....
; Conceição, Penso, Costa, Setubal, & Wolff, 2018Penso, M. A., Conceição, M. I. G., & Costa, L. F. (2018). Revisão histórica da psicologia jurídica na atenção à família e ao sujeito. In L. F. Habigzang, P. I. C. Gomide, & G. M. da Rocha (Eds.), Psicologia forense: Temas e práticas (pp. 19-37). Juruá.; Marshall, 2018Marshall, W. L. (2018). A brief history of psychological theory, research, and treatment with male sexual offenders. Current Psychiatry Reports, 20(57), 1-8. https://doi.org/10.1007/s11920-018-0920-0
https://doi.org/10.1007/s11920-018-0920-...
; Pflugradt et al., 2018Pflugradt, D. M., Allen, B. P., & Marshall, W. L. (2018). A gendered strength-based treatment model for female sexual offenders. Aggression and Violent Behavior , 40, 12-18. https://doi.org/10.1016/j.avb.2018.02.012
https://doi.org/10.1016/j.avb.2018.02.01...
). Outro aspecto teórico metodológico adotado é o valor dado ao objeto intermediário, que é um recurso do psicodrama para tratar de assuntos difíceis e que envolvem percepção que necessita de enfrentamento psíquico emocional (Marra, 2016Marra, M. M. (2016). Conversas criativas e abuso sexual: Uma proposta para o atendimento psicossocial. Ágora.). O objeto intermediário é um recurso técnico aplicável a todas as situações na intervenção que contenham impasses expressos pelas participantes, e sobre os quais se deseja atuar terapeuticamente (Bermúdez, 1968Bermúdez, J. R. (1968). Introdução ao psicodrama. Mestre Jou.).

Talvez o mais significativo ponto particular na proposta é o reconhecimento de que a violência sexual, ou outro tipo de violência, cometida por mulheres está intrinsicamente ligada aos preconceitos e aos pensamentos de gênero desenvolvidos na sociedade, na submissão da mulher aos sistemas de poder, em especial ao machismo e à força masculina presente nos relacionamentos íntimos entre pessoas dos gêneros masculino e feminino (Budd & Bierie, 2018Budd, K. M., & Bierie, D. M. (2018). Victims of sexual assault perpetrated by female youth: An exploratory study of gender differences. Journal of Sexual Aggression , 24(3), 274-293. https://doi.org/10.1080/13552600.2018.1528793
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; Comartin et al., 2018Comartin, E. B., Burgess-Proctor, A., Kubiak, S., & Kernsmith, P. (2018). Factors related to co-offending and coerced offending among female sex offenders: The role of childhood and adult trauma histories. Violence and victims, 33(1), 53-74. https://doi.org/10.1891/0886-6708.VV-D-16-00073
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; Decker et al., 2018Decker, M., Littleton, H. L., & Edwards, K. M. (2018). An update of the literature on LGBTQ+ intimate partner violence. Current Sexual Health Reports, 10(4), 265-272. https://doi.org/10.1007/s11930-018-0173-2
https://doi.org/10.1007/s11930-018-0173-...
; Marshall, 2018Marshall, W. L. (2018). A brief history of psychological theory, research, and treatment with male sexual offenders. Current Psychiatry Reports, 20(57), 1-8. https://doi.org/10.1007/s11920-018-0920-0
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). A concepção do gênero se encontra na preocupação com o pertencimento das participantes ao gênero feminino, no manejo da integração grupal, na valorização da experiência e concepção mútua sobre o feminino, oferecendo a presença de profissionais mulheres na condução da intervenção (Ashfield et al., 2010Ashfield, S., Brotherston, S., Eldridge, H., & Elliot, I. (2010). Working with Female Sexual Offenders: Therapeutic process issues. In T. A. Gannon & F. Cortoni (Eds.), Female sexual offenders: Theory, assessment, and treatment (pp. 161-180). Wiley.).

Na escolha de técnicas, fez-se uma opção por introduzir confecção/interpretação/expressão de imagens relativas ao mundo feminino, no sentido de evocar sensibilidades afetivas, na utilização de atividades mais gráficas, no uso premeditado de variadas cores por meio de desenhos, recorte e colagem (Wolff et al., 2016Wolff, L., Oliveira, E. S., Marra, M. M., & Costa, L. F. (2016). O recurso psicodramático na intervenção com o adulto autor de ofensa sexual. Revista Brasileira de Psicodrama, 24(2), 58-68. http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicodrama/v24n2/v24n2a07.pdf
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicodrama...
). Buscou-se manter as discussões com possibilidade de conexão e contato com mandalas e narrativas de histórias que possam ser vistas como metáforas de aprendizagens (Jung, 1969Jung, C. G. (1969). El Hombre y sus símbolos. Aguilar.). Ainda há investimento sobre a aquisição de habilidades, principalmente de comunicação, sobre o incremento da identidade pessoal e autoestima, sobre a experiência dolorosa de grandes e variadas violências vividas anteriormente (Ashfield et al., 2010Ashfield, S., Brotherston, S., Eldridge, H., & Elliot, I. (2010). Working with Female Sexual Offenders: Therapeutic process issues. In T. A. Gannon & F. Cortoni (Eds.), Female sexual offenders: Theory, assessment, and treatment (pp. 161-180). Wiley.; Passarela et al., 2019Passarela, C. F. T., Ströher, L. M. C., & Costa, L. F. (2019). As violências sofridas por mulheres que ofenderam sexualmente. Nova Perspectiva Sistêmica, XVIII(64), 47-59. https://doi.org/10.38034/nps.v28i64.498
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; Setubal et al., 2019Setubal, C. B., Wolff, L. S., Ströher, L. M. C., Blanco-Vieira, T., & Costa, L. F. (2019). “Não pode ser abuso… eu sou a mãe”: Ofensa sexual maternal. Revista de Psicologia UChile, 28(1), 1-12. https://doi.org/10.5354/0719-0581.2019.53956
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).

Para a consecução da parte vivencial e expressiva da proposta, optou-se pelo referencial da Arteterapia, que tem como base o resgate do potencial criativo, facilitando uma dimensão terapêutica, ampliando a percepção de si e dos outros (Bernardo, 2013Bernardo, P. P. (2013). A prática da Arteterapia - Correlações entre temas e recursos. Vol. V: A alquimia nos contos e mitos e a arteterapia: criatividade, transformação e individuação. Arterapinna Editorial.). A Arteterapia é um método de intervenção baseado na utilização de diferentes formas de expressão artística visando promoção da saúde e da qualidade de vida (Simonetti, Maiolino, & Severino, 2015Simonetti, G. S., Maiolino, W. S. S., & Severino, M. F. S. (2015). Psicodrama: cuerpo, espacio y tempo hacia la libertad creadora. Arteterapia: Papeles de arteterapia y educación artística para la inclusión social, 10, 139-151. https://doi.org/10.5209/rev_ARTE.2015.v10.51688
https://doi.org/10.5209/rev_ARTE.2015.v1...
). Segundo Philippini (2009Philippini, A. (2009). Linguagens e materiais expressivos em Arteterapia: Uso, indicações e propriedades. Wak.), as formas expressivas promovem a materialização dos símbolos nos quais a pessoa busca significação e reestruturação para obter saúde integral. Os materiais utilizados podem ser: desenho, pintura, modelagem, mosaico, música, poesia, dança dentre outros (Walters, 2017Walters, R. (2017). Fairytales, psychodrama and action methods: Ways of helping traumatizes children to heal. Zeitschfrit für Psychodrama und Soziometrie, 16, 53-60. http://dx.doi.org/10.1007/s11620-017-0381-1
http://dx.doi.org/10.1007/s11620-017-038...
). Finalmente, o grupo compreende nove sessões de 3 horas de duração para cada sessão.

Em relação à parte ética, o primeiro ponto observado é o reconhecimento do direito de receber atenção psicossocial, bem como de saúde, que a mulher que ofende sexualmente crianças e adolescentes possui (Ward, Gannon, & Vess, 2009Ward, T., Gannon, T., & Vess, J. (2009). Humans rights, ethical principles and standards in forensic psychology. International Journal of Offender Therapy and Comparative Criminology, 53(2), 126-144. http://dx.doi.org/10.1177/0306624X07313986
http://dx.doi.org/10.1177/0306624X073139...
). Trata-se de uma ação que pode participar da interrupção do circuito abusivo sexual, pois esta é extremamente ocultada, trazendo uma situação prolongada de vulnerabilidades para as vítimas. A vitimização é extensa em função do caráter obscuro e da evitação social e familiar sobre o reconhecimento da violência sexual perpetrada pela mulher/mãe. Além desse ponto, há uma preocupação em se estabelecer um clima de aceitação da ocorrência da violência, um sentido de não julgamento e a presença de conduta e sentimentos empáticos, por parte da equipe de atendimento (Ashfield et al., 2010Ashfield, S., Brotherston, S., Eldridge, H., & Elliot, I. (2010). Working with Female Sexual Offenders: Therapeutic process issues. In T. A. Gannon & F. Cortoni (Eds.), Female sexual offenders: Theory, assessment, and treatment (pp. 161-180). Wiley.; Passarela et al., 2019Passarela, C. F. T., Ströher, L. M. C., & Costa, L. F. (2019). As violências sofridas por mulheres que ofenderam sexualmente. Nova Perspectiva Sistêmica, XVIII(64), 47-59. https://doi.org/10.38034/nps.v28i64.498
https://doi.org/10.38034/nps.v28i64.498...
; Willis & Levenson, 2016Willis, G. M., & Levenson, J. S. (2016). The relationship between childhood adversity and adult psychosocial outcomes in females who have sexually offended: Implications for treatment. Journal of Sexual Aggression , 22(3), 355-367. https://doi.org/10.1080/13552600.2015.1131341
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).

As sessões

Tabela 1
Informações detalhadas sobre tema e manejo de cada sessão

Impasses metodológicos e pessoais

Faz-se necessário assinalar os impasses que surgem, e já estão presentes, na adoção desta proposta. O atendimento à ofensora do gênero feminino, seja adulta ou adolescente, é uma questão bastante recente, embora o fenômeno há muito esteja presente em nossa sociedade. A falta de experiência dos profissionais no trato com o modo de atuar e o contexto de interação com a clientela são aspectos que terão mudanças à medida que a prática se desenvolva, mas no momento ainda são fatores dificultadores. Um efeito imediato é a solidão profissional na execução da proposta e uma fuga emocional de outros possíveis parceiros profissionais e/ou institucionais, mesmo os pertencentes à rede de proteção. Oferecer atendimento à mulher ou à mãe que ofende sexualmente crianças desencadeia reações de negação, rejeição e crítica. É justo indicar que isto não se observa unicamente com profissionais mas, de maneira geral, com a sociedade, em especial os atores que labutam na justiça, e que se revela por julgamentos lenientes com relação à proteção das vítimas.

São muitos os preconceitos e dúvidas sobre o poder violento do abuso sexual cometido por mães e/ou pessoas que cuidam, incluindo-se, aí, o reconhecimento do abuso sexual perpetrado por avós(ôs). Uma dificuldade adicional é a falta de conhecimento específico sobre o tema, o que representa equívocos, por exemplo, o profissional não pesquisar a ofensa sexual cometida pela mulher com a participação de um parceiro. Este aspecto tem especial importância, pois, neste caso, pode se revestir de maior violência e maior período do cometimento da violência. Ainda há que se apontar sobre o sofrimento da profissional em função de, ao atender a esta mulher/adolescente e entrar em contato com histórias de muito sofrimento, reverberar sobre sua própria experiência em pertencer a uma sociedade machista e dominadora, trazendo as questões de gênero para o centro das interações com a clientela (Kington, 2014Kington, A. (2014). The sex offender no one suspects: The treatment of female teachers who sexually exploit male student reflects legal and cultural double standards. MacLean’s, 12, 43-44. https://www.macleans.ca/news/canada/female-teachers-the-sex-offenders-no-one-suspects/
https://www.macleans.ca/news/canada/fema...
; Weinshmeier et al., 2017Weinshmeier, C. C., Woiwood, D. M., Coburn, P. I., Chong, K., & Connolly, D. A. (2017). The unusual suspects: Female versus male accused in child sexual abuse cases. Child Abuse & Neglect, 72, 446-455. http://dx.doi.org/10.1016/j.chiabu.2017.09.003
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; Wijkman, Bijleveld, & Hendriks, 2010Wijkman, M., Bijleveld, C., & Hendriks, J. (2010). Women don’t do such things! Characteristics of female sex offenders and offender types. Sexual Abuse: A Journal of Research and Treatment , 22(2), 135-156. http://dx.doi.org/10.1177/1079063210363826
http://dx.doi.org/10.1177/10790632103638...
; Willis & Levenson, 2016Willis, G. M., & Levenson, J. S. (2016). The relationship between childhood adversity and adult psychosocial outcomes in females who have sexually offended: Implications for treatment. Journal of Sexual Aggression , 22(3), 355-367. https://doi.org/10.1080/13552600.2015.1131341
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). Há ainda um aspecto que é político e que se reveste de grande importância na atualidade, quando a atenção às integrantes do gênero feminino encontram-se bastante discriminadas e colocadas em condições de exclusão e não importância social.

Alcance da proposta

Trata-se de uma experiência inovadora que se alinha à iniciativa já em curso de oferecimento de ação terapêutica aos homens adultos que ofenderam sexualmente crianças/adolescentes. Desse modo, há um avanço na exposição de um problema que permanece desconhecido reiteradamente. Ainda hoje há uma carência de material disponível para discussão sobre a autoria de violência sexual, isto com reconhecimento internacional (Loinaz, 2016Loinaz, I. (2016). Cuando “el” delinquente es “ella”: Intervención con mujeres violentas. Anuario de Psicología Jurídica, 26(1), 41-50. https://doi.org/10.1016/j.apj.2016.04.006
https://doi.org/10.1016/j.apj.2016.04.00...
; Turchik & Edwards, 2012Turchik, J. A., & Edwards, K. M. (2012). Myths about male rape: A literature review. Psychology of Men & Masculinity, 13(2), 211-236. https://doi.org/10.1037/a0023207
https://doi.org/10.1037/a0023207...
) e nacional (Setubal et al., 2019Setubal, C. B., Wolff, L. S., Ströher, L. M. C., Blanco-Vieira, T., & Costa, L. F. (2019). “Não pode ser abuso… eu sou a mãe”: Ofensa sexual maternal. Revista de Psicologia UChile, 28(1), 1-12. https://doi.org/10.5354/0719-0581.2019.53956
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; Xavier & Zanello, 2018Xavier, A., & Zanello, V. (2018). Ouvindo o inaudito: mal estar da maternidade em mães ofensoras atendidas em um Creas. Revista de Ciências Humanas, 52, 1-23. https://repositorio.unb.br/handle/10482/35357
https://repositorio.unb.br/handle/10482/...
). A iniciativa contou com a pressão de instâncias judiciais que se encontram em situação difícil para encaminharem atendimentos terapêuticos nos casos de possível identificação da autora da violência sexual. Um aspecto a ser ressaltado é que com a possibilidade de autores de violência sexual serem atendidos pode-se interferir no circuito da violência sexual, mormente nos casos de abuso sexual intrafamiliar (Conceição et al., 2018Conceição, M. I. G., Penso, M. A., Costa, L. F., Setubal, C. B., & Wolff, L. S. (2018). O psicodrama na intervenção psicossocial com adulto autor de violência sexual. In L. F. Habigzang, P. I. C. Gomide, & G. M. Rocha (Eds.), Psicologia forense: Temas e práticas (pp. 89-110). Juruá.). Também, por meio desta ação, pode-se construir um contexto mais próximo e favorável à discussão em comum com os representantes do poder judiciário: juízes e profissionais do setor psicossocial do tribunal local e, principalmente, os promotores públicos. Estes se constituem na figura jurídica que mais participa da construção da ação terapêutica porque assim podem, de fato, promover proteção de crianças e adolescentes (Penso, Conceição, & Costa, 2018Penso, M. A., Conceição, M. I. G., & Costa, L. F. (2018). Revisão histórica da psicologia jurídica na atenção à família e ao sujeito. In L. F. Habigzang, P. I. C. Gomide, & G. M. da Rocha (Eds.), Psicologia forense: Temas e práticas (pp. 19-37). Juruá.).

Outro ponto a ser destacado é que a iniciativa operacionaliza uma resposta à criação de uma política de atendimento à mulher ofensora sexual, a exemplo do que já está descrito para o homem ofensor sexual (Passarela et al., 2017Passarela, C. F. T., Setubal, C. B., Meneses, F. F. F., Wolff, L. S., Costa, L. F., Ströher, L. M. C., & Vieira, T. B. (2017). Intervenção psicossocial com adulto ofensor sexual: a experiência do Alecrim (PAV/SES/GDF). In K. A. Figueiredo (Ed.), Direitos Sexuais são Direitos Humanos. Coletânea de Textos. Caderno Temático 3 (pp. 73-76). CMDCA.). Assim, amplia a possibilidade da mulher conseguir espaço de valor e oportunidade no atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS) do governo federal.

Limites da proposta

Reconhece-se os limites desta proposta pois não se têm outras iniciativas neste sentido para uma discussão em comum com o desenvolvimento da experiência (Setubal et al., 2019Setubal, C. B., Wolff, L. S., Ströher, L. M. C., Blanco-Vieira, T., & Costa, L. F. (2019). “Não pode ser abuso… eu sou a mãe”: Ofensa sexual maternal. Revista de Psicologia UChile, 28(1), 1-12. https://doi.org/10.5354/0719-0581.2019.53956
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). Os preconceitos e indisposições, a respeito da aproximação com este público, permanecem e guiam a falta de interesse e ousadia para o empreendimento dessas ações. Do mesmo modo, existem limites nas disponibilidades de comparação com outras ações internacionalmente, são reconhecidas as dificuldades de estruturação de ofertas de atendimento a esse público (Grattagliano et al., 2012Grattagliano, I., Owens, J. N., Morton, R. J., Campobasso, C. P., Carabellese, F., & Catanesi, R. (2012). Female sexual offenders: Five Italian case studies. Aggression and Violent Behavior, 17(3), 180-187. http://dx.doi.org/10.1016/j.avb.2012.01.001
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). Preconceitos de instâncias da área de saúde e justiça, aliados ao reconhecimento de um problema que é extremamente desconhecido na sociedade, fazem com que qualquer ação voltada para essas mulheres se revista de muitos cuidados e ousadia.

Além disso, a opção de escolha teórica metodológica, em relação a intervenções descritas na literatura internacional, tem sido a abordagem cognitivo comportamental (Marshall, 2018Marshall, W. L. (2018). A brief history of psychological theory, research, and treatment with male sexual offenders. Current Psychiatry Reports, 20(57), 1-8. https://doi.org/10.1007/s11920-018-0920-0
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). A proposta, em questão neste texto, destacou a cultura e o modo de relação característicos do país, afetividade e aproximação corporal interpessoal. Por outro lado, essa proposição ainda está em implantação, e não apresenta um correspondente de avaliação. No entanto, a perspectiva desta apresentação é que possa suscitar reações e reflexões necessárias para ajustes em seu processo de experimentação e aperfeiçoamento.

Considerações finais

Ao final, seria oportuno retomar a trajetória de implantação dos atendimentos e da proposição deste texto. O passo decisivo foi a pressão da justiça (Vara de Execuções Penais, especificamente), juntamente com a ousadia e coragem dos profissionais que, àquela altura dos acontecimentos, já tinham adquirido expertise nos atendimentos ao adulto do gênero masculino que comete ofensa sexual. Esta retomada se constitui em um ponto crítico, pois contém uma história que necessita ser resgatada, oferecendo um sentido ao ressurgimento de tantos impasses que se apresentam diante de um contexto político adverso para a atenção à mulher.

Em seguida, houve o convite a pesquisadores de universidade pública e privada, que acompanharam a ousadia com objetivos bem estabelecidos de sistematização rigorosa de dados, da observação e registro das ações terapêuticas, e da discussão clínica de casos. Agrega-se, ainda, a abertura e convite para a participação de outros saberes, a submissão de projetos de pesquisa a Comitês de Ética, e a publicação de 15 textos em periódicos nacionais e internacionais, porém, todos com acesso direto via internet. O escopo das publicações faz parte de uma ação de natureza política que tem como objetivo divulgar e tornar mais acessível o conhecimento sobre a temática em questão. Além disso, buscou-se, e ainda se busca, uma aproximação com instâncias superiores da saúde e da justiça (Ministério da Saúde, Ministério Público, diferentes Varas de Execuções Penais) para a construção de uma ação interdisciplinar. Um exemplo é a publicação de Passarela et al. (2017Passarela, C. F. T., Setubal, C. B., Meneses, F. F. F., Wolff, L. S., Costa, L. F., Ströher, L. M. C., & Vieira, T. B. (2017). Intervenção psicossocial com adulto ofensor sexual: a experiência do Alecrim (PAV/SES/GDF). In K. A. Figueiredo (Ed.), Direitos Sexuais são Direitos Humanos. Coletânea de Textos. Caderno Temático 3 (pp. 73-76). CMDCA.).

Considera-se que este texto apresenta um valor que é a descrição de ação voltada para uma população permanentemente não estudada, e mais, evitada. No entanto, o problema abordado é extremamente contemporâneo, pois aponta para a questão da configuração de gênero que molda de forma pungente a violência sexual. Cada vez mais estão surgindo casos de violência sexual praticados por mulheres cuidadoras, babás e mães (Cortoni et al., 2017Cortoni, F., Babchishin, K., & Rat, C. (2017). The proportion of sexual offenders who are female is higher than thought: A meta-analysis. Criminal Justice and Behavior, 44(2), 145-162. https://doi.org/10.1177/0093854816658923; Haliburn, 2017Haliburn, J. (2017). Mother-child incest, psychosis, and the dynamics of relatedness. Journal of Trauma & Dissociation, 18(3), 409-426. https://doi.org/10.1080/15299732.2017.1295424
https://doi.org/10.1080/15299732.2017.12...
). O estudo e interferência no circuito abusivo cometido por mulheres/mães pode estabelecer um bem-estar individual e coletivo, pois esses casos tendem a permanecer sob estrito sigilo, por questões de vergonha, medo e preconceito (Haliburn, 2017Haliburn, J. (2017). Mother-child incest, psychosis, and the dynamics of relatedness. Journal of Trauma & Dissociation, 18(3), 409-426. https://doi.org/10.1080/15299732.2017.1295424
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Abr 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    29 Jan 2021
  • Revisado
    14 Out 2021
  • Aceito
    16 Nov 2021
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