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Dinâmica de populações e preferência alimentar da cochonilha-da-raiz (Pseudococcus comstocki) pela tiririca

Population dynamics and preferential feeding of mealybug (Pseudococcus comstocki) to purple nutsedge (Cyperus rotundus)

Resumos

A flutuação populacional da cochonilha-da-raiz (Pseudococcus comstocki) (Kuwana, 1902) e sua preferência alimentar foram estudadas quando infestando plantas de tiririca (Cyperus rotundus) oriundas dos municípios de Lavras, Lambari e Três Pontas, localizados na região sul do Estado de Minas Gerais, no período de março de 1996 a março de 1997. A cochonilha-da-raiz infestou a tiririca durante todos os meses de avaliação, variando, entretanto, a intensidade de infestação. Entre os locais estudados, Lambari apresentou a mais baixa densidade populacional da praga; em Lavras e Três Pontas as infestações foram semelhantes, sendo as mais elevadas. A temperatura e a umidade relativa do ar foram as variáveis climáticas que mais influenciaram a flutuação populacional da cochonilha-da-raiz em plantas de tiririca, nas três localidades estudadas. Foi observada maior preferência alimentar das cochonilhas por plantas de tiririca oriundas de Lavras e Três Pontas.

planta daninha; Pseudococcus comstocki; resistência de plantas


The mealy bug Pseudococcus comstocki (Kuwana, 1902) population dynamics and preferential feeding on purple nutsedge (Cyperus rotundus) accessions grown in three locations (Lavras, Lambari and Três Pontas) in the southern region of Minas Gerais state, Brazil, were studied from March 1996 to March 1997. Mealy bug infested purple nutsedge all over the year at different intensities. The lowest infestation was observed in Lambari, and in Lavras and Três Pontas was observed similar mealy bug infestation levels. Air temperature and relative humidity were climatic variables that mostly influenced the insect infestation. It was also observed that mealy bug preferred feeding nutsedge grown in Lavras and Três Pontas.

weed; Pseudococcus comstocki; host plant resistance


ARTIGOS

Dinâmica de populações e preferência alimentar da cochonilha-da-raiz (Pseudococcus comstocki) pela tiririca

Population dynamics and preferential feeding of mealybug (Pseudococcus comstocki) to purple nutsedge (Cyperus rotundus)

Santa-Cecília, L.V.C.I; Simões, J.C.II; Souza, I.F.III

IEPAMIG/Centro tecnológico do Sul de Minas, Caixa Postal 176, 37200-000 Lavras-MG

IIBolsista FAPEMIG/EPAMIG, Caixa Postal 176, 37200-000, Lavras-MG

IIIUFLA/Departamento de Agricultura, Caixa Postal 37, 37200-000 Lavras-MG

RESUMO

A flutuação populacional da cochonilha-da-raiz (Pseudococcus comstocki) (Kuwana, 1902) e sua preferência alimentar foram estudadas quando infestando plantas de tiririca (Cyperus rotundus) oriundas dos municípios de Lavras, Lambari e Três Pontas, localizados na região sul do Estado de Minas Gerais, no período de março de 1996 a março de 1997. A cochonilha-da-raiz infestou a tiririca durante todos os meses de avaliação, variando, entretanto, a intensidade de infestação. Entre os locais estudados, Lambari apresentou a mais baixa densidade populacional da praga; em Lavras e Três Pontas as infestações foram semelhantes, sendo as mais elevadas. A temperatura e a umidade relativa do ar foram as variáveis climáticas que mais influenciaram a flutuação populacional da cochonilha-da-raiz em plantas de tiririca, nas três localidades estudadas. Foi observada maior preferência alimentar das cochonilhas por plantas de tiririca oriundas de Lavras e Três Pontas.

Palavras-chave: planta daninha, Pseudococcus comstocki, resistência de plantas.

ABSTRACT

The mealy bug Pseudococcus comstocki (Kuwana, 1902) population dynamics and preferential feeding on purple nutsedge (Cyperus rotundus) accessions grown in three locations (Lavras, Lambari and Três Pontas) in the southern region of Minas Gerais state, Brazil, were studied from March 1996 to March 1997. Mealy bug infested purple nutsedge all over the year at different intensities. The lowest infestation was observed in Lambari, and in Lavras and Três Pontas was observed similar mealy bug infestation levels. Air temperature and relative humidity were climatic variables that mostly influenced the insect infestation. It was also observed that mealy bug preferred feeding nutsedge grown in Lavras and Três Pontas.

Key words: weed, Pseudococcus comstocki, host plant resistance.

INTRODUÇÃO

A cochonilha-da-raiz (Pseudococcus comstocki), é uma das pragas importantes que ocorrem em plantas de citros. Seus danos são manifestados pela sucção de seiva, podendo inocular toxinas, acarretando depauperamento da planta ou até mesmo sua morte. No entanto, esses danos são notados apenas a alguns anos da formação do pomar (Melo & Reis, 1983). Tanto as fêmeas adultas como as ninfas são móveis, apresentando-se recobertas por uma secreção branca pulverulenta, formando apêndices laterais. Elas formam colônias nas raízes das plantas cítricas, vivendo em simbiose com as formigas (Santa-Cecília et al., 1992).

Além do citros, essa espécie é encontrada em outros hospedeiros, como bananeira (Musa sp.), pereira (Pyrus comunis), batata (Solanum sp.), cafeeiro (Coffea arabica), na planta ornamental Clivia miniata e em várias espécies de plantas daninhas, particularmente Cyperus rotundus, conhecida como tiririca (Silva et al., 1968).

Considerando a alta incidência dessa cochonilha em C. rotundus, torna-se necessária a obtenção de informações sobre o comportamento desse inseto em plantas invasoras que se desenvolvem na área cultivada. Dessa forma, desenvolveu-se o presente trabalho para determinar a dinâmica populacional da cochonilha-da-raiz e conhecer seu comportamento alimentar em relação às plantas de tiririca oriundas de três localidades do Estado de Minas Gerais.

MATERIAL E MÉTODOS

Experimento 1 - Levantamento populacional

Foi realizado o levantamento da infestação da cochonilha-da-raiz sobre plantas de tiririca em Lambari, Lavras e Três Pontas/MG, no período de março de 1996 a março de 1997. Nessas localidades, foi selecionado um talhão de 1 ha, sendo o de Lavras localizado no pomar da Universidade Federal de Lavras (UFLA), o de Lambari, na Fazenda Experimental da EPAMIG, e o terceiro, na Fazenda Experimental da EPAMIG de Três Pontas.

A infestação da cochonilha-da-raiz foi estudada seguindo as classes de infestação da cochonilha-do-abacaxi estabelecidas por Vilardebo & Guerout (1966), que atribuíram as notas 0 para nenhuma infestação da cochonilha; 1, para a presença de ninfas de segundo e/ou terceiro instares isoladas ou em grupos de duas ou três; 2, para fêmeas adultas isoladas ou em grupo de duas ou três; 3, para uma ou várias colônias constituídas de uma a dez fêmeas circundadas de ninfas de todos os instares; 4, para uma ou várias colônias compostas de mais de dez fêmeas e de ninfas de todos os instares; e 5, para infestação generalizada em toda a base da planta. As avaliações da infestação foram feitas mensalmente, analisando-se a raiz e região do colo de 60 plantas de tiririca escolhidas ao acaso no talhão, em forma de ziguezague, conforme a escala supracitada.

Foram coletados valores diários de temperatura do ar, umidade relativa do ar e precipitação pluvial das localidades em estudo, os quais foram comparados com as notas de infestação da cochonilha-da-raiz de cada localidade, por meio da análise de correlação de Pearson. Por outro lado, os dados referentes à infestação da cochonilha-da-raiz e aos dos elementos climáticos foram utilizados na confecção das curvas de flutuação populacional dessa praga em cada município objeto desta pesquisa.

Experimento 2 - Preferência alimentar em função dos quimiotipos (locais) de tiririca

Este experimento foi iniciado em julho de 1996, em casa de vegetação da EPAMIG, no Campus da UFLA, onde foi instalada uma criação da cochonilha-da-raiz, utilizando-se adultos e ninfas coletados no pomar de citros da UFLA. Esses insetos foram inoculados em vasos contendo plantas de tiririca da localidade de Lavras, para posterior uso na condução do experimento. Após obtenção de número considerável de fêmeas adultas da cochonilha, procedeu-se à instalação do experimento na área experimental de fruticultura, no pomar da UFLA, em outubro de 1996.

As plantas de tiririca foram plantadas em canteiros, em formato hexagonal, com espaçamento de 10 cm. Em cada canteiro foram plantados dois grupos de 10 mudas de tiririca oriundas dos municípios de Lavras, Lambari e Três Pontas, totalizando 60 plantas, conforme pode ser visto na Figura 1.


Foram liberadas 120 cochonilhas no centro de cada canteiro, a uma distância de 10 cm das plantas de tiririca, permitindo assim a preferência dos insetos por uma ou outra planta, através do método de livre escolha.

As avaliações foram feitas dois meses após a soltura dos insetos, por meio de observações visuais das raízes e do colo das plantas, adotando-se a escala adaptada de Vilardebo & Guerout (1966).

As localidades foram comparadas, quanto à infestação da tiririca pela cochonilha-da-raiz, pela diferença mínima significativa.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Experimento 1

a) Levantamento populacional em Lambari

Não se observou correlação significativa entre a data de amostragem e a infestação da cochonilha-da-raiz. Assim, em todos os meses de amostragem, constatou-se baixa ocorrência da cochonilha-da-raiz, com número ligeiramente maior desse inseto nos meses de maio a setembro e novembro/96 a janeiro/97 (Tabela 1, Figura 2). Verificou-se que a temperatura e a umidade relativa do ar afetaram de modo significativo as populações da cochonilha-da-raiz, observando-se correlação negativa no fator temperatura e positiva na umidade relativa (Tabela 1). Mesmo no período em que a população de cochonilha teve melhores condições de desenvolvimento-inverno seco, conforme Santa-Cecília (1990), não foram observados aumentos na densidade populacional, evidenciando a existência de algum fator, além dos estudados, que tinha limitado o aumento populacional dessa espécie. Vários pesquisadores têm levantado a hipótese de que fatores intrínsecos às plantas, como variação nas concentrações químicas de compostos ainda não identificados, podem ocorrer em função do local em que as plantas de tiririca se desenvolvem (Komai et al., 1977; Komai & Tang, 1989; Komai & Ueki, 1981). Provavelmente seja esse o fator que está contribuindo para a variação do comportamento do inseto nessa localidade.


b) Levantamento populacional em Lavras

Houve alta correlação entre a data de amostragem e a infestação da cochonilha-da-raiz. Este inseto esteve presente em todos os meses de avaliação, variando-se a intensidade de infestação (Tabela 1, Figura 3). A densidade populacional da cochonilha-da-raiz aumentou à medida que houve decréscimo da temperatura, umidade relativa do ar e precipitação (Tabela 1). Observou-se que nos meses de março, abril, junho, julho, agosto e novembro, períodos de menores temperaturas, umidade relativa do ar e precipitação, a cochonilha encontrou melhores condições de desenvolvimento. Nessa época foram observadas as maiores infestações, com notas médias de 0,57 a 1,17, representando presença de ninfas de 2º e/ou 3º instares isoladas ou em grupos de duas ou três. Esses resultados concordam com os obtidos por Gonçalves (1940), que constatou serem os meses secos do ano os mais favoráveis ao desenvolvimento e à multiplicação de P. comstocki em citros.


c) Levantamento populacional em Três Pontas

Não houve correlação significativa entre a data de amostragem e a infestação da cochonilha-da-raiz, embora tenha sido constatada a presença dessa praga em todos os meses avaliados, exceto em março/96, com maior ocorrência de maio a agosto e de outubro a dezembro (Figura 4). Pela análise de correlação (Tabela 1), foi demonstrado que a umidade relativa do ar e a precipitação não influenciaram de forma significativa a ocorrência da cochonilha, porém a temperatura afetou significativamente a população da cochonilha-da-raiz, apresentando efeito negativo sobre a infestação da praga.


Analisando as populações da cochonilha-da-raiz nas três localidades estudadas, esta praga esteve presente durante todos os meses de avaliação, variando a intensidade de infestação, porém em baixos níveis. A temperatura e a umidade relativa do ar foram as variáveis climáticas que mais influenciaram a flutuação populacional da cochonilha-da-raiz em plantas de tiririca nas localidades estudadas.

Experimento 2

Verificou-se maior infestação das cochonilhas nas plantas oriundas de Lavras e Três Pontas (Tabela 2), concordando com os resultados encontrados no primeiro experimento, em que se constatou maior número de indivíduos nas plantas de tiririca provenientes dessas localidades. Essa colonização da cochonilha-da-raiz em plantas provenientes de Lavras e Três Pontas atingiu valores extremos (5), indicando acentuada reprodução desse coccídeo, o que resultou em infestação generalizada em toda a base da planta.

Em plantas de tiririca oriundas de Lambari, verificou-se baixa infestação da praga. Esse fato demonstra a não-preferência da cochonilha de se alimentar e reproduzir nas plantas dessa localidade, apesar de terem sido encontradas em 17% das plantas avaliadas ninfas de 2º e/ou 3º instares isoladas ou em grupos de duas ou três. Supõe-se que essas ninfas tenham se deslocado das outras plantas provenientes de Lavras e Três Pontas, visto que, nesse estádio de desenvolvimento, o inseto possui grande mobilidade.

Essa não-preferência das cochonilhas pelas plantas de tiririca da localidade de Lambari pode estar relacionada aos fatores intrínsecos às plantas, que podem apresentar diferentes composições químicas em função do local de origem, conforme trabalhos de Komai & Tang (1989). Outro fator que também pode estar relacionado é a antibiose, ou seja, as plantas de tiririca desta localidade podem apresentar efeito sobre a biologia da cochonilha, afetando seu desenvolvimento e causando mortalidade.

Dessa forma, torna-se necessário obter informações mais aprofundadas sobre os aspectos químicos e fenológicos ligados às plantas dos locais estudados.

AGRADECIMENTOS

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), pela concessão de recursos financeiros e bolsa de estudo, que possibilitaram a realização desta pesquisa.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em 1º/12/1999 e na forma revisada em 17/12/2001.

Trabalho financiado pela FAPEMIG.

  • GONÇALVES, C. R. Observações sobre Pseudococcus comstocki (Kuw, 1902) atacando citrus na Baixada Fluminense. Rodriguesia, v. 4, n. 13, p. 179-198, 1940.
  • KOMAI, K.; TANG, C. A chemotype of Cyperus rotundus in Havai. Phytochemistry, v. 28, n. 7, p. 1883-1886, 1989.
  • KOMAI, K.; IWAMURA, J.; UEKI, K. Isolation, identification and physiological activies of sesquiterpenes in purple nutsedge. Weed Res, v. 22, p. 14, 1977.
  • KOMAI, K.; UEKI, K. Geographical variation of essential oils in tubers of purple nutsedge. In: ASIAN PACIFIC WEED SCIENCE SOCIETY CONFERENCE, 8, 1981, Bamgaloke, India. Proceedings... Bamgaloke: 1981. p. 387-389.
  • MELO, L. A.; REIS, P. R. Pragas em sementeiras e viveiros de frutíferas. Inf. Agropec., v. 9, n. 102, p. 55-61, 1983.
  • SANTA-CECÍLIA, L. V. C. Efeito de fatores climáticos e da época de plantio do abacaxizeiro sobre a cochonilha pulverulenta Dysmicoccus brevipes (Cockerell, 1893) (Homoptera: Pseudococcidae) nas principais regiões produtoras do Estado de Minas Gerais Lavras: Escola Superior de Agricultura de Lavras, 1990. 114p. Dissertação (Mestrado em Entomologia) Escola Superior de Agricultura de Lavras, 1999.
  • SANTA-CECÍLIA, L. V. C.; SOUTO, R. F.; PEDROSO, E. M. Incidência da cochonilha Pseudococcus comstocki (Kuwana, 1902), (Homoptera: Pseudococcidae) em porta enxertos de citros. Ci. Prat., v. 16, n. 1, p. 88-90, 1992.
  • SILVA, A. G. A. et al. Quarto catálogo dos insetos que vivem nas plantas do Brasil, seus parasitos e predadores Rio de Janeiro: Ministério da Agricultura, 1968. v. 2.
  • VILARDEBO, A.; GUEROUT, R. Tests insecticides avec Dysmicoccus brevipes CKL cochenille farineuse de l'ananas. I. Technique de test de laboratoire et recherche d'une expression du degré d'infestation, base du critére d'efficacité d'essais de plein champ. Fruit, v. 21, n. 1, p. 5-11, 1966.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Set 2009
  • Data do Fascículo
    Abr 2002

Histórico

  • Aceito
    17 Dez 2001
  • Recebido
    01 Dez 1999
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