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Percursos da pesquisa qualitativa em psicologia

RESENHA

Percursos da pesquisa qualitativa em psicologia1 1 Constantino, E. P. (Org.). (2007). Percursos da pesquisa qualitativa em Psicologia. São Paulo: Art & Ciência.

Alcides José Sanches VergaraI; José Artur MolinaII

IMestre em Sociologia. Professor Assistente da Universidade Estadual de Londrina

IIMestre em Teoria Psicanalítica. Professor Assistente da Universidade Estadual de Maringá

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: José Artur Molina Rodovia PR317, Km 2, Caixa Postal 7001 CEP 87035-510, Maringá-PR E-mail: josearturmolina@bol.com.br

Nos tempos atuais, a ciência, cada vez mais, percebe-se como diversa. E quem revelou a ela esta verdade foi exatamente a diversidade dos métodos construídos para se produzir um saber coerente com o local. O cientista, ao dialogar com o mundo, percebe que deve utilizar um dialeto que seja passível de diálogo entre ele e o lugar onde realiza seu trabalho.

O genitor da ciência atual (nômade e heterogênea) tinha como desafio organizar as coisas do mundo: classificando, agrupando e contando. Exorcizar demônios com paradigmas da razão e da lógica formal foi sua função primordial.

Dadas às dimensões e quantidades de informações e variáveis a serem trabalhadas, foram necessárias tecnologias matemáticas com tratamentos estatísticos que pudessem trazer possibilidades de análise qualitativa para esse volume de dados empíricos. Em algum momento, o cientista deve comunicar os resultados de suas investigações e pesquisas, bem como, revelar ou traduzir as finalidades éticas, e objetivos humanos e sociais de seu trabalho. Dessa forma, entramos no campo da qualidade científica. Diríamos, portanto, que a ciência contemporânea tem a quantidade na sua história e a qualidade na sua vocação. E isto é ainda mais verdadeiro quando falamos nas ciências dos homens e mulheres, nas quais nos deparamos com impossibilidades quantitativas em função de suas manifestações subjetivas. O método que se encontra em intimidade com esta realidade é aquele que pode melhor perceber sentidos sutis, refinados e coerentes com a sofisticação, complexidade e dinamismo que encarna e constitui nossa humanidade.

Neste sentido, o livro "Percursos da Pesquisa Qualitativa em Psicologia", recente publicação do programa de Pós-Graduação de Psicologia da UNESP-Assis, é bem-vindo e oportuno. O livro traz à luz, problemáticas humanas escritas em uma língua que conta enredos e não números.

Em seus diversos e heterogêneos artigos, é possível estabelecer um fio condutor a partir da afirmação de que não se pode produzir conhecimento nessa esfera com a separação clássica entre observador e objeto. Ambos nascem imbricados um no outro e só é possível uma relação entre eles, através de uma compreensão que dê conta deste panorama.

O artigo que abre a coletânea versa sobre a democratização da ciência, critica os limites do paradigma científico da ciência moderna, e também analisa a emergência de parâmetros para uma nova ciência; acrescenta ainda ao final uma discussão sobre

o conceito de uma ciência menor (autônoma), ou ciência nômade conforme sugerido por Deleuze e Guattari, em contraposição ao conceito de ciência régia (oficial) de Estado.

Os artigos que se seguem focalizam o contexto social, histórico e cultural da produção científica. Abordam as dimensões históricas da produção teórica na Psicologia, do caráter datado e posicionado dos conhecimentos e dos métodos psicológicos. Os autores(as) analisam, ainda, as possibilidades interpretativas e de intervenção que os novos recursos teóricos no campo da psicologia possibilitam: a construção de novos sentidos e saberes sobre a complexidade do humano.

Os artigos que tratam da psicanálise estão em sintonia com essa nova lógica, trazendo a luz diversos aspectos de seu conhecimento em diálogo com determinados campos que demandam significação como: a literatura, a família e as equipes de trabalho de saúde mental.

A transferência e a contratransferência são os conceitos chefe da clínica psicanalítica porque afirmam a interferência recíproca que se está produzindo no ato analítico, isto é, que a relação entre analista e analisando está fadada, a emoção eliciada nesse encontro. Cai por terra o bunker seguro que protegia o cientista: a neutralidade. A coragem freudiana se expressa na coragem de dizer àquilo que se gostaria de encobrir.

Outro artigo interessante é o que analisa as práticas coletivas de saúde dentro da perspectiva genealógica de Michel Foucault. Estas práticas estariam a serviço de um Estado Maior que pretende domesticar o corpo para que em sua docilidade resultante não perturbe a voracidade dele. Trata-se de uma reflexão crítica a respeito das gestões do corpo mental/biológico realizadas pela medicina e a psicologia através de um saber que visa o poder.

Uma última observação quanto à publicação é que se trata de uma produção coletiva e representa um esforço coerente com a proposta metodológica de transpor fronteiras epistemológicas e culturais, no sentido de uma ciência emancipada. Boa Leitura.

Recebido em 05/11/2008

Aceito em 14/11/2008

  • Endereço para correspondência:
    José Artur Molina
    Rodovia PR317, Km 2, Caixa Postal 7001
    CEP 87035-510, Maringá-PR
    E-mail:
  • 1
    Constantino, E. P. (Org.). (2007).
    Percursos da pesquisa qualitativa em Psicologia. São Paulo: Art & Ciência.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Mar 2009
    • Data do Fascículo
      Dez 2008
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