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SAÚDE MENTAL DE TRABALHADORAS EM ESTUDO: CONTRIBUIÇÕES AO DEBATE DE GÊNERO1 1 Agência de Fomento: Programa de Grupos de Pesquisa da Universidade do Extremo Sul Catarinense - UNESC

SALUD MENTAL DE TRABAJADORAS EN ESTUDIO: CONTRIBUCIONES AL DEBATE DE GÉNERO

RESUMO.

O artigo busca apresentar considerações sobre a saúde mental de trabalhadoras como tema em produções acadêmicas brasileiras (2000-2016), de modo a potencializar contribuições ao debate de gênero no âmbito das relações de trabalho e do adoecimento. Para tanto, fizemos um levantamento da produção acadêmica brasileira, publicada de 2000 a 2016 e disponível na Biblioteca Virtual em Saúde - Brasil (BVS), sobre a temática saúde da trabalhadora. Do universo total de artigos localizados e analisados ao longo da pesquisa, a saúde mental foi foco de um número considerável de estudos, os quais evidenciaram, de modo geral, a relação entre a divisão sexual do trabalho e a prevalência do adoecimento de mulheres em diferentes contextos laborais. Na direção do debate proposto, 14 artigos foram selecionados pelo fato de relacionarem o tema da saúde mental a contextos profissionais produzidos como territórios femininos/masculinos de atuação e, sobretudo, por possibilitarem problematizar a desigualdade de gênero como base da divisão sexual do trabalho e da prevalência do adoecimento mental de trabalhadoras.

Palavras-chave:
Saúde mental; trabalho; gênero

RESUMEN.

El artículo busca presentar consideraciones sobre la salud mental de trabajadoras como tema en producciones académicas brasileñas (2000-2016), de modo a potenciar contribuciones al debate de género en el ámbito de las relaciones de trabajo y de la enfermedad. Para ello, realizamos un mapeo de la producción académica brasileña, publicada del período 2000 a 2016, disponible en la Biblioteca Virtual en Salud - Brasil (BVS), sobre la temática salud de la trabajadora. En el universo total de artículos localizados y analizados a lo largo de la investigación, la salud mental ha sido foco de un número considerable de estudios, que evidenciaron, en general, la relación entre la división sexual del trabajo y la prevalencia de la enfermedad de las mujeres en distintos contextos laborales. En la dirección del debate propuesto, 14 artículos han sido seleccionados por el hecho de relacionar el tema de la salud mental a contextos profesionales producidos como territorios femeninos/masculinos de actuación y, sobre todo, por posibilitaren problematizar la desigualdad de género como base de la división sexual del trabajo y de la prevalencia de la enfermedad mental de las trabajadoras.

Palabras-clave:
Salud mental; trabajo; género

ABSTRACT.

The article sough to analyze considerations on the mental health of women workers as a theme in the Brazilian academic productions (2000-2016), in order to enhance contributions to the gender debate in the context of work relations and illness. Therefore, we performed a mapping of the Brazilian academic literature published from 2000 to 2016, available on the Virtual Health Library - Brazil, on the subject of woman worker health. From the total universe of articles located and analyzed throughout the research, mental health was the focus of a considerable number of studies, which showed, in general, the relationship between the sexual division of labor and the prevalence of illness among women in different contexts. In the direction of the proposed debate, 14 articles were selected because they relate the topic of mental health to professional contexts produced as female/male territories in which they operate and, above all, because they made it possible to problematize gender inequality as the basis of the sexual division of labor and prevalence of mental illness of women workers.

Keywords:
Mental health; labor; gender

Introdução

O artigo busca apresentar considerações sobre a saúde mental de trabalhadoras como tema em produções acadêmicas brasileiras (2000-2016), de modo a potencializar contribuições ao debate de gênero no âmbito das relações de trabalho e do adoecimento. Este recorte analítico emergiu de uma investigação mais ampla que teve como objetivo geral mapear o tema saúde da trabalhadora em produções acadêmicas brasileiras no período de 2000-2016 na Biblioteca Virtual em Saúde - Brasil (BVS). A literatura selecionada oportuniza ampliar reflexões acerca das relações de trabalho e de gênero, em contextos laborais urbanos e rurais, as quais orientam o interesse de pesquisa das autoras nos últimos anos. De uma forma circunscrita, o encaminhamento pressupõe considerar a divisão sexual do trabalho e as desigualdades de gênero a partir de aspectos que desvelam construções de feminilidades/masculinidades no mundo do trabalho, como possibilidade de deslocar o foco de possíveis causas em uma função linear com o adoecimento.

Para a composição do texto, são mobilizadas de concepções de trabalho e de saúde mental que viabilizam a compreensão de dimensões singulares e coletivas do adoecimento. A partir dos estudos de Karl Marx (2013Marx, K. (2013). O Capital. Crítica da economia política. Livro I: o processo de produção do capital. São Paulo, SP: Boitempo . (Trabalho originalmente publicado em 1867).), vislumbra-se no processo de produção capitalista uma determinada concepção de trabalho que permite compreendê-lo como atividade que produz as condições objetivas e subjetivas da existência humana. Logo, as atividades realizadas por trabalhadores/as não se limitam à produção de bens ou serviços como reflexo de atividades meramente econômicas, mas constituem, ao mesmo tempo, condições para as relações sociais e os significados que os sujeitos atribuem ao seu próprio fazer.

Na mesma direção, ressalta-se a necessidade de uma compreensão de saúde mental que possa abarcar formas de existência produzidas na/pela relação com o trabalho, a fim de problematizar como as condições laborais, na interface com as relações de gênero, podem constituir lugares de adoecimento de trabalhadores/as. Neste caso, a respeito da ocorrência de determinadas patologias e suas associações com características do próprio trabalho no campo da saúde mental, as ponderações de Codo (2004Codo, W. (2004). Psicopatologia do trabalho. In W. Codo (Org.), O trabalho enlouquece? Um encontro entre a clínica e o trabalho (p. 11-22). Petrópolis, RJ: Vozes.) orientam na direção de uma leitura possível da relação sujeito-trabalho em processos de adoecimento, na medida em que indicam a necessidade de transpor a compreensão de uma psicopatologia pela relação individual e direta de fatores.

A propósito do debate de gênero no âmbito das relações de trabalho e do adoecimento, as considerações de Codo (2004Codo, W. (2004). Psicopatologia do trabalho. In W. Codo (Org.), O trabalho enlouquece? Um encontro entre a clínica e o trabalho (p. 11-22). Petrópolis, RJ: Vozes.) instigam a interrogar a distribuição de trabalhadores/as por diferentes atribuições, funções e/ou áreas de trabalho, sobretudo, seus efeitos nas condições e nas relações de trabalho enquanto promotoras de desigualdades de gênero. Sem tal interrogação, argumenta-se que se torna infrutífera a investigação dos processos de adoecimento mental no campo das relações de trabalho e gênero. Da mesma forma, é necessário levar em conta que “[...] a doença mental caracteriza-se por uma determinação complexa que envolve dimensões econômica, social, política e cultural, expressando-se diferentemente nas classes sociais e nas relações gênero” (Ludermir, 2008Ludermir, A. B. (2008). Desigualdades de classe e gênero e saúde mental nas cidades. Physis: Revista de Saúde Coletiva, 18(3), 451-467. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/physis/v18n3/v18n3a05.pdf
http://www.scielo.br/pdf/physis/v18n3/v1...
, p. 452).

Quanto às relações de gênero na constituição de sujeitos, é central destacar que, para os estudos feministas e de gênero, provenientes da segunda metade do século XX, a naturalização de posições atribuídas a mulheres e a homens, como destino biológico e como organizador social, foi questionada; uma das ênfases do campo teórico feminista estava em revelar o caráter histórico e sociocultural das posições ocupadas por mulheres e homens, com o intuito de demonstrar a construção de sujeitos femininos e masculinos, bem como as desigualdades sociais produzidas na e pela diferenciação pressuposta (Scott, 1995Scott, J. (1995). Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e realidade. 20(2), 71-99.).

Portanto, alicerçadas em normas temporais e socioculturais, as construções de gênero produzem a diferença sexual e as posições sociais de mulheres e homens, as quais se afirmam pela necessária e recorrente conformação de corpos e de experiências (Butler, 2016Butler, J. (2016). Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade (10a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira.). Tais mecanismos de conformação podem ser subvertidos, na medida em que se pressupõe, conforme Butler (2017Butler, J. (2017). Regulações de gênero. In I. Brandão, I. Cavalcanti, C. de L. Costa, & A. C. A. Lima (Orgs.), Traduções da cultura: perspectivas críticas feministas (p. 692-716). Florianópolis, SC: EDUFAL., p. 695), que o “[...] gênero é o mecanismo pelo qual noções de masculino e feminino são produzidas e naturalizadas, mas também pode muito bem ser o aparato pelo qual tais mecanismos são desconstruídos e desnaturalizados”.

Entretanto, a naturalização de posições ocupadas por homens e mulheres, fundada na biologia como destino, não foi superada, como ressaltado por Saffioti (2016Saffioti, H. I. B. (2016) Conceituando o gênero. In C. Rodrigues, L. Borges, & T. R. O. Ramos (Orgs.), Problemas de gênero(p. 385-394). Rio de Janeiro, RJ: Fundarte., p. 385, grifo do autor): “Embora se pensasse superada, a fase histórica de a biologia é o destino, surgiu na década de 1980 e continua grassando atualmente um retorno assustador a posições essencialistas, vinculando a mulher à natureza e o homem à cultura”.

Sendo assim, observa-se que um dos possíveis efeitos das construções de gênero é a instituição de certa divisão sexual do trabalho que atua na reprodução/condução das vidas laborais de mulheres e de homens. Enquanto uma categoria potente de análise das desigualdades de gênero, a divisão sexual do trabalho representa uma divisão do trabalho social, regida por princípios de separação e de hierarquia, histórica e socialmente construídos, os quais estratificam e atribuem valores diferenciados aos trabalhos realizados por mulheres e por homens (Hirata & Kergoat, 2007Hirata, H., & Kergoat, D. (2007). Novas configurações da divisão sexual do trabalho. Cadernos de Pesquisa, 37(132), 595-609. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/ cp/v37n132/a0537132.pdf
http://www.scielo.br/pdf/ cp/v37n132/a05...
).

O estudo pioneiro de Saffioti (2013Saffioti, H. I. B. (2013). A mulher na sociedade de classes: mito e realidade (3a ed). São Paulo, SP: Expressão Popular. (Trabalho originalmente publicado em 1969).), intitulado A mulher na sociedade de classes, publicado originalmente em 1969, visibiliza determinada divisão sexual do trabalho, na medida em que, ao tratar do tema ‘mulher e capitalismo’, discorre sobre como a força de trabalho feminina “[...] ora se põe no mercado como mercadoria a ser trocada, ora se põe no lar enquanto mero valor de uso que, no entanto, guarda uma conexão com a determinação enquanto mercadoria da força de trabalho do chefe da família” (Saffioti, 2013Saffioti, H. I. B. (2013). A mulher na sociedade de classes: mito e realidade (3a ed). São Paulo, SP: Expressão Popular. (Trabalho originalmente publicado em 1969)., p. 96).

Desde o pioneiro estudo de Saffioti (2013Saffioti, H. I. B. (2013). A mulher na sociedade de classes: mito e realidade (3a ed). São Paulo, SP: Expressão Popular. (Trabalho originalmente publicado em 1969).) aos estudos sobre o tema da divisão sexual do trabalho, produzidos nas últimas cinco décadas, constata-se a exposição de desigualdades de gênero que se expressam e repercutem na crescente, porém difícil, participação de mulheres em diferentes contextos remunerados de trabalho, marcada por empregos precários, condições laborais insalubres e salários inferiores aos dos homens. Representativo desse cenário, o dossiê intitulado ‘Economia, direitos humanos e igualdade de gênero: uma nova agenda?’ foi publicado, no ano de 2016, pela Revista Estudos Feministas, que reúne um conjunto de artigos com o “[...] objetivo de estimular o debate do importante relatório da ONU-Mulheres intitulado Progress of the world’s women 2015-2016” (Sorj, 2016Sorj, B. (2016). Apresentação. Revista Estudos Feministas, 24(2), 587-588. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/ref/v24n2/1805-9584-ref-24-02-00587.pdf
http://www.scielo.br/pdf/ref/v24n2/1805-...
, p. 587).

No dossiê supracitado, Alves (2016Alves, J. E. D. (2016). Desafios da equidade de gênero no século XXI.Revista Estudos Feministas,24(2), 629-638. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/ref/v24n2/1805-9584-ref-24-02-00629.pdf
http://www.scielo.br/pdf/ref/v24n2/1805-...
) ressalta importantes avanços e conquistas das mulheres nas últimas décadas, mas também indica a manutenção de determinada divisão sexual do trabalho na base da distribuição desigual das atividades entre mulheres e homens (atividades de produção e reprodução, por exemplo), a qual, entre outras questões, dificulta a equidade de gênero.

Sobre as atividades reprodutivas de cuidado, em grande medida realizadas por mulheres, a obra intitulada Gênero e trabalho no Brasil e na França - perspectivas interseccionais, organizada por Abreu, Hirata e Lombardi (2016Abreu, A. R. de P., Hirata, H., & Lombardi, M. R. (Orgs.). (2016). Gênero e trabalho no Brasil e na França: perspectivas interseccionais. São Paulo, SP: Boitempo.), traz uma coletânea de artigos que problematizam as relações de gênero e trabalho no campo das atividades de cuidado, entre outras questões. Certamente, a igualdade substantiva no âmbito das relações de trabalho e gênero é uma questão pendente, de forma que, em consonância com os aspectos já pontuados na relação com a saúde mental de trabalhadoras, atualizam e corroboram a relevância do debate de gênero.

Procedimentos

Com o intuito de tratar da emergência da temática saúde mental de trabalhadoras, cabe detalhar os procedimentos metodológicos que orientaram a pesquisa originária sobre o tema saúde da trabalhadora em produções acadêmicas brasileiras no período de 2000-2016. A pesquisa foi realizada na Biblioteca Virtual em Saúde - Brasil (BVS, disponível em http://brasil.bvs.br/), no período de agosto a outubro de 2016. A escolha pela BVS se justifica pelo recorte temático, abrangência e relevância científica da Base de Dados.

No processo de pesquisa, por meio de palavras-chave, foram utilizados os seguintes filtros: artigos (tipos de documento); texto completo; português (idioma); período de 2000-2016 (ano de publicação). A delimitação do período se deu pelo número crescente de periódicos científicos e disponibilidade de artigos completos em formato eletrônico de livre acesso nas duas últimas décadas; e pelo crescente interesse acadêmico pelos estudos de gênero no contexto brasileiro (entre outros aspectos, o crescente interesse pelo debate de gênero pode ser evidenciado em uma breve consulta a dois importantes periódicos acadêmicos intitulados Revista Estudos Feministas e Cadernos Pagu).

Foram utilizadas três combinações de palavras-chave, a saber: ‘saúde da trabalhadora’, ‘saúde, trabalho e mulheres’ e ‘saúde, trabalho e gênero’. Da busca pela primeira combinação de palavras foram selecionados 16 artigos, e 49 de cada uma das duas últimas. A inclusão ou exclusão dos estudos seguiu os critérios da delimitação temática da pesquisa, por meio das palavras-chave e leitura de todos os resumos.

Para cada conjunto de artigos selecionados por meio das palavras-chave, foi elaborado um quadro individual a partir da seguinte organização: título; autores/as; palavras-chave; ano da publicação; nome da revista; endereço eletrônico da publicação; referência completa. Posteriormente, foram excluídos todos os artigos repetidos e os quadros individuais foram integrados em um quadro geral e cronológico com a mesma organização (título; autores/as; palavras-chave; ano da publicação; nome da revista; endereço eletrônico da publicação; referência completa), totalizando 77 artigos relacionados diretamente ao tema saúde da trabalhadora.

Em momento sequente, os artigos completos foram lidos na íntegra, agrupados pela emergência de recortes temáticos e pelo interesse das pesquisadoras de aprofundamento em temas de relevância no contexto social/acadêmico. O tema da saúde mental de trabalhadoras emergiu no processo analítico descrito à medida que se apresentou como foco em um conjunto de 21 artigos. Tendo em vista o interesse acadêmico das autoras em fomentar a discussão no campo dos estudos de gênero e da divisão sexual do trabalho, uma nova leitura dos textos possibilitou a seleção de um conjunto de 14 artigos: Ludermir (2000Ludermir, A. B. (2000). Inserção produtiva, gênero e saúde mental. Cadernos de Saúde Pública, 16(3), 647-659. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csp/v16n3/2950.pdf
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); Ferreira, Albergaria e Conceição (2002); Elias e Navarro (2006Elias, M. A., & Navarro, V. L. (2006). A relação entre o trabalho, a saúde e as condições de vida: negatividade e positividade no trabalho das profissionais de enfermagem de um hospital escola. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 14(4), 517-525. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/rlae/v14n4/v14n4a08.pdf
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); Souza, Franco, Meireles, Ferreira e Santos (2007Souza, E. R. de, Franco, L. G., Meireles, C. de C., Ferreira, V. T., & Santos, N. C. dos. (2007). Sofrimento psíquico entre policiais civis: uma análise sob a ótica de gênero. Cadernos de Saúde Pública, 23(1), 105-114. Recuperado de http://www.scielo.br/ pdf/csp/v23n1/11.pdf
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); Wai e Carvalho (2009Wai, M. F. P., & Carvalho, A. M. P. (2009). O trabalho do agente comunitário de saúde: fatores de sobrecarga e estratégias e enfrentamento. Revista deEnfermagem UERJ, 17(4), 563-8. Recuperado de http://www.facenf.uerj.br/v17n4/v17n4a19.pdf
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); Amato, Pavin, Martins, Ronzani e Batista (2010Amato, T. de C., Pavin, T., Martins, L. F., Ronzani, T. M., & Batista, A. (2010). Trabalho, gênero e saúde mental: uma pesquisa quantitativa e qualitativa entre bombeiros. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, 13(1), 103-118. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-37172010000100009& lng=pt&tlng=pt.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
); Silva, Costa e Nascimento (2010Silva, E. F. da, Costa, D. B., & Nascimento, J. U. do. (2010). O trabalho das profissionais do sexo em diferentes lócus de prostituição da cidade. Psicologia: teoria e prática, 12(1), 109-122. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ptp/v12n1/v12n1a10.pdf
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); Thomé e Meyer (2011Thomé, E. G. da R., & Meyer, D. E. E. (2011). Mulheres cuidadoras de homens com doença renal crônica: uma abordagem cultural. Texto & Contexto - Enfermagem, 20(3), 503-511. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/tce/v20n3/11.pdf
http://www.scielo.br/pdf/tce/v20n3/11.pd...
); Bezerra, Garcia, Gomes, Bittar e Pereira (2012)Bezerra, C. de M., Minayo, M. C. de S., & Constantino, P. (2013). Estresse ocupacional em mulheres policiais.Ciência & Saúde Coletiva,18(3), 657-666. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n3/11.pdf
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; Pinho e Araújo (2012Pinho, P. de S., & Araújo, T. M. de. (2012). Associação entre sobrecarga doméstica e transtornos mentais comuns em mulheres.Revista Brasileira de Epidemiologia,15(3), 560-572. Recuperado dehttp://www.scielo.br/pdf/rbepid/v15n3/10.pdf
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); Minayo e Constantino (2013)Bezerra, C. de M., Minayo, M. C. de S., & Constantino, P. (2013). Estresse ocupacional em mulheres policiais.Ciência & Saúde Coletiva,18(3), 657-666. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n3/11.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n3/11.pd...
; Vidal et al. (2014Vidal, C. E. L., Amara, B., Ferreira, D. P., Dias, I.M. F., Vilela, L. A., & Franco, L. R. (2014). Preditores de prováveis transtornos mentais comuns (TMC) em prostitutas utilizando o self-reporting questionnaire.Jornal Brasileiro de Psiquiatria,63(3), 205-212. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/jbpsiq/v63n3/0047-2085-jbpsiq-63-3-0205.pdf
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); Costa, Dimenstein e Leite (2015)Costa, M. da G., Dimenstein, M., & Leite, J. (2015). Estratégias de cuidado e suporte em saúde mental entre mulheres assentadas. Revista Colombiana de Psicología, 24(1), 13-28. Recuperado de http://www.scielo.org.co/pdf/rcps/v24n1/v24n1a02.pdf
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; Fernandes, Oliveira, Silva et al. (2015)Fernandes, J. D., Ferreira, S. L., Albergaria, A. K., & Conceição, F. M. da. (2002). Saúde mental e trabalho feminino: imagens e representações de enfermeiras. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 10(2), 199-206. Recuperado de http://www. scielo.br/pdf/rlae/v10n2/10515.pdf
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.

Os artigos foram selecionados pelo fato de relacionarem o tema da saúde mental a contextos profissionais produzidos como territórios femininos e masculinos de atuação, além de contribuírem, em grande medida, para atualizar o debate sobre a dupla jornada de trabalho feminina (na/pela conciliação de atividades remuneradas e domésticas) como uma das condições do adoecimento de trabalhadoras. Nos tópicos subsequentes, apresentamos uma possível leitura e contribuições ao debate de gênero.

A saúde mental de trabalhadoras/es como tema de estudo

No conjunto de produções selecionadas, quanto aos procedimentos metodológicos, tem-se um número expressivo de estudos empíricos. Os estudos foram realizados por meio de entrevistas individuais, entrevistas coletivas, grupos focais, observação, estudo de caso, questionários - com destaque para o Self reporting questionnaire (SRQ-20), questionário sobre estresse no trabalho (SWS Survey), Inventário de qualidade de vida, Inventário de sintomas de stress de Lipp, Inventário de Maslach para o Burnout, entre outros instrumentos; tendo em vista o limite máximo de páginas no presente artigo, os instrumentos não serão detalhados e tais informações podem ser encontradas nos artigos originais citados.

Em consonância com os procedimentos de coleta de dados, os estudos articularam abordagens analíticas qualitativas ou quantitativas, qualitativas e quantitativas. Na e pela articulação de conhecimentos das ciências da saúde, humanas e sociais, evidencia-se o interesse em analisar as relações existentes entre o adoecimento mental e os contextos de trabalho, comparando índices de adoecimento entre homens e mulheres em diversas áreas ocupacionais, de emprego formal e informal, em diferentes regiões e cidades brasileiras, a fim de fundamentar a discussão acerca da prevalência do adoecimento das/os trabalhadoras/res.

Os sujeitos das pesquisas foram profissionais da área da saúde (profissionais de enfermagem, agentes comunitários de saúde, profissionais de nível superior vinculados/as à Rede de Atenção Primária à Saúde, entre outros/as), policiais civis e policiais militares, bombeiras/os, bancárias/os, mulheres docentes do ensino superior na área da saúde, trabalhadoras/es de uma universidade pública, mulheres em assentamentos rurais, profissionais do sexo, mulheres cuidadoras de homens com doença renal crônica, entre outras/os trabalhadoras/es.

A partir de pesquisas com trabalhadores/as de diferentes contextos laborais, os estudos de Ludermir (2000Ludermir, A. B. (2000). Inserção produtiva, gênero e saúde mental. Cadernos de Saúde Pública, 16(3), 647-659. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csp/v16n3/2950.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csp/v16n3/2950....
), Pinho e Araújo (2012Pinho, P. de S., & Araújo, T. M. de. (2012). Associação entre sobrecarga doméstica e transtornos mentais comuns em mulheres.Revista Brasileira de Epidemiologia,15(3), 560-572. Recuperado dehttp://www.scielo.br/pdf/rbepid/v15n3/10.pdf
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), Vidal et al. (2014Vidal, C. E. L., Amara, B., Ferreira, D. P., Dias, I.M. F., Vilela, L. A., & Franco, L. R. (2014). Preditores de prováveis transtornos mentais comuns (TMC) em prostitutas utilizando o self-reporting questionnaire.Jornal Brasileiro de Psiquiatria,63(3), 205-212. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/jbpsiq/v63n3/0047-2085-jbpsiq-63-3-0205.pdf
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) e Costa et al. (2015Costa, M. da G., Dimenstein, M., & Leite, J. (2015). Estratégias de cuidado e suporte em saúde mental entre mulheres assentadas. Revista Colombiana de Psicología, 24(1), 13-28. Recuperado de http://www.scielo.org.co/pdf/rcps/v24n1/v24n1a02.pdf
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), trataram da ocorrência de Transtornos Mentais Comuns (TMC). A principal referência para o conceito de TMC é a obra Common mental disorders: a bio-socialmodel, de David P. Goldberg e Peter Huxley, publicada em 1992. Os autores criaram a categoria ‘Transtornos mentais comuns’ para descrever: “[...] casos que apresentam sintomas não psicóticos, como insônia, fadiga, sintomas depressivos, irritabilidade, esquecimento, dificuldade de concentração e queixas somáticas, que produzem incapacidade funcional das pessoas, mas que não preenchem os requisitos para os diagnósticos do DSM-IV” (Moreira, Bandeira, Cardoso, & Scalon, 2011Moreira, J. K. P., Bandeira, M., Cardoso, C. S., & Scalon, J. D. (2011). Prevalência de transtornos mentais comuns e fatores associados em uma população assistida por equipes do Programa Saúde da Família. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 60(3), 221-226. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/jbpsiq/v60n3/12.pdf
http://www.scielo.br/pdf/jbpsiq/v60n3/12...
, p. 222).

O estudo de Costa et al. (2015Costa, M. da G., Dimenstein, M., & Leite, J. (2015). Estratégias de cuidado e suporte em saúde mental entre mulheres assentadas. Revista Colombiana de Psicología, 24(1), 13-28. Recuperado de http://www.scielo.org.co/pdf/rcps/v24n1/v24n1a02.pdf
http://www.scielo.org.co/pdf/rcps/v24n1/...
, p. 16-17) teve “[...] como objetivo investigar as estratégias de cuidado e suporte psicossocial ofertadas às mulheres moradoras de um assentamento rural do Nordeste brasileiro, especialmente para aquelas que apresentam indicativo de TMC”. Por meio de um estudo transversal realizado em Olinda (Pernambuco), o trabalho de Ludermir (2000Ludermir, A. B. (2000). Inserção produtiva, gênero e saúde mental. Cadernos de Saúde Pública, 16(3), 647-659. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csp/v16n3/2950.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csp/v16n3/2950....
, p. 649) buscou investigar “[...] a associação do desemprego e do trabalho informal com os transtornos mentais comuns (TMC)”.

O estudo de Pinho e Araújo (2012Pinho, P. de S., & Araújo, T. M. de. (2012). Associação entre sobrecarga doméstica e transtornos mentais comuns em mulheres.Revista Brasileira de Epidemiologia,15(3), 560-572. Recuperado dehttp://www.scielo.br/pdf/rbepid/v15n3/10.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rbepid/v15n3/10...
, p. 562) “[...] objetivou avaliar a associação entre sobrecarga doméstica e a ocorrência de transtornos mentais comuns em mulheres residentes em áreas urbanas na Bahia, Brasil”. Vidal et al. (2014Vidal, C. E. L., Amara, B., Ferreira, D. P., Dias, I.M. F., Vilela, L. A., & Franco, L. R. (2014). Preditores de prováveis transtornos mentais comuns (TMC) em prostitutas utilizando o self-reporting questionnaire.Jornal Brasileiro de Psiquiatria,63(3), 205-212. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/jbpsiq/v63n3/0047-2085-jbpsiq-63-3-0205.pdf
http://www.scielo.br/pdf/jbpsiq/v63n3/00...
, p. 2006), em estudo transversal, realizado no período de novembro de 2012 a maio de 2013, verificaram “[...] a prevalência de prováveis TMC em mulheres profissionais do sexo cadastradas na Associação de Prostitutas de Minas Gerais (Aprosmig)”.

Os estudos de Wai e Carvalho (2009Wai, M. F. P., & Carvalho, A. M. P. (2009). O trabalho do agente comunitário de saúde: fatores de sobrecarga e estratégias e enfrentamento. Revista deEnfermagem UERJ, 17(4), 563-8. Recuperado de http://www.facenf.uerj.br/v17n4/v17n4a19.pdf
http://www.facenf.uerj.br/v17n4/v17n4a19...
), Bezerra et al. (2013Bezerra, C. de M., Minayo, M. C. de S., & Constantino, P. (2013). Estresse ocupacional em mulheres policiais.Ciência & Saúde Coletiva,18(3), 657-666. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n3/11.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n3/11.pd...
) e Silva et al. (2015Silva, S. C. P.S., Nunes, M. A.P., Santana, V. R., Reis, F. P., Machado Neto, J., & Lima, S.O. (2015). A síndrome de burnout em profissionais da Rede de Atenção Primária à Saúde de Aracaju, Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, 20(10), 3011-3020. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n10/1413-8123-csc-20-10-3011.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n10/1413...
) trataram das temáticas do estresse e da Síndrome de Burnout e seus efeitos em contextos laborais diversos. O artigo de Bezerra et al. (2013, p. 658) “[...] tem como objetivo apresentar e discutir o estresse ocupacional vivenciado por mulheres policiais militares, a partir de um estudo realizado nessa corporação no Estado do Rio de Janeiro”. Os estudos Wai e Carvalho (2009)Wai, M. F. P., & Carvalho, A. M. P. (2009). O trabalho do agente comunitário de saúde: fatores de sobrecarga e estratégias e enfrentamento. Revista deEnfermagem UERJ, 17(4), 563-8. Recuperado de http://www.facenf.uerj.br/v17n4/v17n4a19.pdf
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e Silva et al. (2015)Silva, S. C. P.S., Nunes, M. A.P., Santana, V. R., Reis, F. P., Machado Neto, J., & Lima, S.O. (2015). A síndrome de burnout em profissionais da Rede de Atenção Primária à Saúde de Aracaju, Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, 20(10), 3011-3020. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n10/1413-8123-csc-20-10-3011.pdf
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, em um recorte mais específico, foram realizados com trabalhadores/as da área da saúde e abordam aspectos e implicações de atividades que envolvem o cuidado com o outro. Silva et al. (2015Silva, S. C. P.S., Nunes, M. A.P., Santana, V. R., Reis, F. P., Machado Neto, J., & Lima, S.O. (2015). A síndrome de burnout em profissionais da Rede de Atenção Primária à Saúde de Aracaju, Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, 20(10), 3011-3020. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n10/1413-8123-csc-20-10-3011.pdf
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, p. 3012) avaliaram “[...] a prevalência de Síndrome de Bornout e fatores associados em profissionais de nível superior vinculados à Rede de Atenção Primária à Saúde (REAP) do município de Aracaju/SE”. No estudo de Wai e Carvalho (2009,Wai, M. F. P., & Carvalho, A. M. P. (2009). O trabalho do agente comunitário de saúde: fatores de sobrecarga e estratégias e enfrentamento. Revista deEnfermagem UERJ, 17(4), 563-8. Recuperado de http://www.facenf.uerj.br/v17n4/v17n4a19.pdf
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p. 564), com Agentes Comunitários de Saúde (ACS), “[...] objetivou-se identificar, através das percepções dos ACS, eventos que provocam sobrecarga e as estratégias de enfrentamento por eles usadas”.

Sobre o estresse e a Síndrome de Burnout convém fazer algumas considerações conceituais. Em texto que trata dos conceitos básicos do estresse, Lipp (2001Lipp, M. E. N. (2001). Stress: conceitos básicos. In M. E. N. Lipp (Org.), Pesquisas sobre stress no Brasil: saúde, ocupações e grupos de risco (p. 17-31). Campinas, SP: Papirus., p. 20) observa que é importante considerá-lo como um processo e reação do organismo, envolvendo “[...] componentes físicos e/ou psicológicos, causada pelas alterações psicofisiológicas que ocorrem quando a pessoa se confronta com uma situação que, de um modo ou de outro, a irrite, amedronte, excite ou confunda, ou mesmo que a faça imensamente feliz”. De acordo com os esclarecimentos da autora, o estudo das respostas produzidas pelo processo de estresse deve levar em conta aspectos físicos e psicológicos, como forma de contemplar manifestações físicas e emocionais. Os sintomas do estresse podem ser identificados e contribuir, segundo Lipp (2001)Lipp, M. E. N. (2001). Stress: conceitos básicos. In M. E. N. Lipp (Org.), Pesquisas sobre stress no Brasil: saúde, ocupações e grupos de risco (p. 17-31). Campinas, SP: Papirus., para a etiologia de doenças mais graves, acometendo a qualidade de vida individual e populações específicas. Para a reflexão no âmbito das relações de trabalho e do adoecimento a partir das contribuições dos estudos de gênero, em momento oportuno, será central problematizar sintomas do estresse e doenças relacionadas a coletivos profissionais específicos.

O uso do termo burnout no campo da psicologia, de acordo com Pereira (2015Pereira, A. M. T. B. (2015). Elaboração e validação do ISB: inventário para avaliação da síndrome de burnout.Boletim de Psicologia,65(142), 59-71. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/bolpsi/v65n142/v65n142a06.pdf
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, p. 60), começou a ser usado

[...] para expressar a carência de energia e desânimo em relação ao trabalho por parte de alguns profissionais, em especial os da área da Saúde e Educação, concomitantemente a atitudes frias, desumanas, impessoais com que estes passavam a tratar as pessoas.

No que se refere ao reconhecimento do transtorno mental, no âmbito da legislação brasileira, o Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999 (aprova o regulamento da Previdência Social e dá outras providências), no detalhamento intitulado Transtornos Mentais e do Comportamento - ‘Relacionados com o trabalho (Grupo V da CID -10)’, conforme anexo II, apresenta a seguinte definição: “XII - Sensação de Estar Acabado (‘Síndrome de Burn-Out’, ‘Síndrome do Esgotamento Profissional’) (Z73.0)” (Brasil, 1999Brasil. (1999). Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999. Aprova o regulamento da Previdência Social e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República: Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Recuperado de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3048.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/dec...
).

Ainda no âmbito da saúde e do adoecimento mental de trabalhadoras/es de áreas da saúde e do cuidado com a saúde, foram localizadas e identificadas as produções de Fernandes et al. (2002Fernandes, J. D., Ferreira, S. L., Albergaria, A. K., & Conceição, F. M. da. (2002). Saúde mental e trabalho feminino: imagens e representações de enfermeiras. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 10(2), 199-206. Recuperado de http://www. scielo.br/pdf/rlae/v10n2/10515.pdf
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), Elias e Navarro (2006Elias, M. A., & Navarro, V. L. (2006). A relação entre o trabalho, a saúde e as condições de vida: negatividade e positividade no trabalho das profissionais de enfermagem de um hospital escola. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 14(4), 517-525. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/rlae/v14n4/v14n4a08.pdf
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) e Thomé e Meyer (2011Thomé, E. G. da R., & Meyer, D. E. E. (2011). Mulheres cuidadoras de homens com doença renal crônica: uma abordagem cultural. Texto & Contexto - Enfermagem, 20(3), 503-511. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/tce/v20n3/11.pdf
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). O estudo de Elias e Navarro (2006Elias, M. A., & Navarro, V. L. (2006). A relação entre o trabalho, a saúde e as condições de vida: negatividade e positividade no trabalho das profissionais de enfermagem de um hospital escola. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 14(4), 517-525. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/rlae/v14n4/v14n4a08.pdf
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, p. 518) abordou o “[...] trabalho das profissionais de enfermagem do Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia, MG [...]” e objetivou

[...] investigar as relações entre essa atividade e a saúde das profissionais que a realizam, quais são as negatividades e positividades presentes em seu cotidiano laboral, bem como saber em que medida isso repercute nas condições de vida dessas mulheres.

Fernandes et al. (2002Fernandes, J. D., Ferreira, S. L., Albergaria, A. K., & Conceição, F. M. da. (2002). Saúde mental e trabalho feminino: imagens e representações de enfermeiras. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 10(2), 199-206. Recuperado de http://www. scielo.br/pdf/rlae/v10n2/10515.pdf
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, p. 200) apresentam uma pesquisa que “[...] surge na perspectiva da construção de um conhecimento sobre a relação entre saúde mental e trabalho feminino, através das imagens e representações de enfermeiras, categoria majoritariamente constituída por mulheres, cujo objeto, o cuidado, caracteriza-se como feminino”.

Com destaque à saúde física e mental de mulheres cuidadoras, o artigo de Thomé e Meyer (2011Thomé, E. G. da R., & Meyer, D. E. E. (2011). Mulheres cuidadoras de homens com doença renal crônica: uma abordagem cultural. Texto & Contexto - Enfermagem, 20(3), 503-511. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/tce/v20n3/11.pdf
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, p. 504), produzido a partir de uma pesquisa realizada na Clínica de Hemodiálise do Hospital de Clínicas de Porto Alegre-RS, objetivou “[...] descrever e problematizar, do ponto de vista dos estudos culturais e dos estudos de gênero pós-críticos, algumas das aprendizagens culturais efetivadas por essas mulheres no processo de ‘tornar-se cuidadora’ de homens doentes renais crônicos”.

Igualmente, a saúde mental se configurou como temática de investigação nas produções de Souza et al. (2007Souza, E. R. de, Franco, L. G., Meireles, C. de C., Ferreira, V. T., & Santos, N. C. dos. (2007). Sofrimento psíquico entre policiais civis: uma análise sob a ótica de gênero. Cadernos de Saúde Pública, 23(1), 105-114. Recuperado de http://www.scielo.br/ pdf/csp/v23n1/11.pdf
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) e Amato et al. (2010Amato, T. de C., Pavin, T., Martins, L. F., Ronzani, T. M., & Batista, A. (2010). Trabalho, gênero e saúde mental: uma pesquisa quantitativa e qualitativa entre bombeiros. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, 13(1), 103-118. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-37172010000100009& lng=pt&tlng=pt.
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), que tiveram como objeto de pesquisa bombeiros militares e policiais civis, respectivamente. A pesquisa de Amato et al. (2010, p. 105) “[...] teve por objetivo avaliar indicadores de saúde mental dos bombeiros e os fatores que a influenciam, destacando as diferenças entre as mulheres e os homens”. Souza et al. (2007Souza, E. R. de, Franco, L. G., Meireles, C. de C., Ferreira, V. T., & Santos, N. C. dos. (2007). Sofrimento psíquico entre policiais civis: uma análise sob a ótica de gênero. Cadernos de Saúde Pública, 23(1), 105-114. Recuperado de http://www.scielo.br/ pdf/csp/v23n1/11.pdf
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, p. 106) investigaram “[...] como se expressa o sofrimento psíquico entre policiais civis do Rio de Janeiro, sob a ótica do gênero”.

O sofrimento e o adoecimento mental de profissionais do sexo foram objeto de estudo de Silva et al. (2010Silva, E. F. da, Costa, D. B., & Nascimento, J. U. do. (2010). O trabalho das profissionais do sexo em diferentes lócus de prostituição da cidade. Psicologia: teoria e prática, 12(1), 109-122. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ptp/v12n1/v12n1a10.pdf
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ptp/v12n1/...
, p. 111), em artigo que “[...] apresenta as diferenças e as singularidades das situações de trabalho das profissionais do sexo na feira central e nos bares da cidade de Campina Grande-PB”. O estudo de Oliveira et al. (2012Oliveira, E. R.A. de, Garcia, Á. L., Gomes, M. J., Bittar, T. O., & Pereira, A. C. (2012). Gênero e qualidade de vida percebida: estudo com professores da área de saúde. Ciência & Saúde Coletiva, 17(3), 741-747. Recuperado de http://www.scielo.br/ pdf/csc/v17n3/v17n3a21.pdf
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, p. 742) objetivou “[...] avaliar as condições de trabalho sobre a saúde e qualidade de vida percebida de mulheres docentes do ensino superior na área da saúde, da cidade de Vitória-ES”.

Guardadas as devidas singularidades dos procedimentos metodológicos e dos interesses de cada estudo, o conjunto das produções reunidas demonstra que a saúde mental e os processos de adoecimento de trabalhadores/as, além de se relacionarem com cada atividade e com condições específicas de trabalho, possibilitam problematizar desigualdades de gênero em diferentes contextos laborais, especialmente na e pela materialização de determinada divisão sexual do trabalho, bem como seus efeitos e normas na produção/regulação de sujeitos e de subjetividades. No tópico a seguir, são apresentadas algumas considerações sobre tal possibilidade pelo entrelaçamento das categorias divisão sexual do trabalho, desigualdades de gênero e adoecimento mental de trabalhadoras.

Divisão sexual do trabalho e desigualdades de gênero na gênese do adoecimento mental de trabalhadoras: possíveis fios e entrelaçamentos

Os interesses dos estudos, sumarizados em tópico precedente, demonstraram que investigações sobre a saúde mental de trabalhadoras/es requerem a análise das relações de trabalho e dos fatores técnicos de cada atividade, bem como dos significados sociais e subjetivos atribuídos ao processo laboral. Com efeito, os estudos analisados indicam a necessidade de compreender tal processo em uma perspectiva de classe e de problematizar, entre outros aspectos, a divisão sexual do trabalho e a desigualdade de gênero na gênese do adoecimento mental de trabalhadoras. Embora nem todos os estudos selecionados tratem das categorias divisão sexual do trabalho e gênero, os diferentes encaminhamentos e recortes analíticos produzidos permitem problematizá-las.

Para tanto, conforme explicitado em relação ao processo de seleção dos artigos, optou-se por enfatizar aspectos que permitem problematizar o tema da saúde mental relacionado a territórios considerados femininos e masculinos de atuação, assim como a dupla jornada de trabalho feminina na interface com o adoecimento de trabalhadoras. Essa perspectiva analítica abrangente permite remontar a divisão sexual do trabalho pelo viés das atividades historicamente atribuídas às mulheres e aos homens, o que contribui para demonstrar a correlação entre as atividades consideradas produtivas e reprodutivas na análise do adoecimento de mulheres e homens.

Os estudos de Ludermir (2000Ludermir, A. B. (2000). Inserção produtiva, gênero e saúde mental. Cadernos de Saúde Pública, 16(3), 647-659. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csp/v16n3/2950.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csp/v16n3/2950....
), Pinho e Araújo (2012Pinho, P. de S., & Araújo, T. M. de. (2012). Associação entre sobrecarga doméstica e transtornos mentais comuns em mulheres.Revista Brasileira de Epidemiologia,15(3), 560-572. Recuperado dehttp://www.scielo.br/pdf/rbepid/v15n3/10.pdf
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) e Costa et al. (2015Costa, M. da G., Dimenstein, M., & Leite, J. (2015). Estratégias de cuidado e suporte em saúde mental entre mulheres assentadas. Revista Colombiana de Psicología, 24(1), 13-28. Recuperado de http://www.scielo.org.co/pdf/rcps/v24n1/v24n1a02.pdf
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) a respeito dos Transtornos Mentais Comuns (TMC) são representativos da articulação mencionada, uma vez que evidenciam aspectos do adoecimento relacionados a especificidades e exigências de cada atividade, trazem questões que demonstram os efeitos do trabalho doméstico e a desigualdade de gênero na ocorrência e no diagnóstico dos transtornos citados. No estudo sobre mulheres residentes em assentamentos rurais brasileiros, Costa et al. (2015Costa, M. da G., Dimenstein, M., & Leite, J. (2015). Estratégias de cuidado e suporte em saúde mental entre mulheres assentadas. Revista Colombiana de Psicología, 24(1), 13-28. Recuperado de http://www.scielo.org.co/pdf/rcps/v24n1/v24n1a02.pdf
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, p. 23) explanam que o trabalho como “[...] estratégia de suporte a saúde mental [...]”, além de gerar benefícios, “[...] especialmente na medida em que pode gerar um ganho de autonomia financeira, também aparece como um fator importante a ser levado em consideração ao se referir à saúde dessas mulheres”. No contexto dos assentamentos rurais e da agricultura familiar, de acordo com as autoras e o autor, no processo de adoecimento, há que se considerar a sobrecarga advinda da ‘tripla jornada de trabalho’ das mulheres em função da divisão sexual do trabalho.

Sobre a divisão sexual do trabalho e as desigualdades de gênero relacionadas à ocorrência do TMC, Ludermir (2000Ludermir, A. B. (2000). Inserção produtiva, gênero e saúde mental. Cadernos de Saúde Pública, 16(3), 647-659. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csp/v16n3/2950.pdf
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, p. 656) explicita que, em comparação com a saúde mental dos homens, “[...] as mulheres desempregadas e as trabalhadoras informais apresentaram um risco aumentado para os TMC”. Além disso, o fato de desempenharem atividades econômicas não isenta as mulheres das atividades na esfera doméstica: “[...] ao desempenhar uma atividade econômica, assumia também as responsabilidades de esposa, mãe e trabalhadora e empreendia dois trabalhos: o remunerado e o não remunerado, geralmente não reconhecido dentro de casa” (Ludermir, 2000Ludermir, A. B. (2000). Inserção produtiva, gênero e saúde mental. Cadernos de Saúde Pública, 16(3), 647-659. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csp/v16n3/2950.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csp/v16n3/2950....
, p. 656).

A associação da sobrecarga do trabalho doméstico com Transtornos Mentais Comuns em mulhe res foi observada, igualmente, por Pinho e Araújo (2012Pinho, P. de S., & Araújo, T. M. de. (2012). Associação entre sobrecarga doméstica e transtornos mentais comuns em mulheres.Revista Brasileira de Epidemiologia,15(3), 560-572. Recuperado dehttp://www.scielo.br/pdf/rbepid/v15n3/10.pdf
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). Na pesquisa, realizada com mulhe res residentes em áreas urbanas na Bahia, foi identificada elevada prevalência de TMC, na razão de quatro para cada 10, “[...] o que revela um grave problema de saúde na população estudada, principalmente quando comparada à estimativa da Organização Mundial de Saúde (2000), que refere uma prevalência média de 24% na população” (Pinho & Araújo, 2012Pinho, P. de S., & Araújo, T. M. de. (2012). Associação entre sobrecarga doméstica e transtornos mentais comuns em mulheres.Revista Brasileira de Epidemiologia,15(3), 560-572. Recuperado dehttp://www.scielo.br/pdf/rbepid/v15n3/10.pdf
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, p. 570).

Como visto, a discussão sobre o trabalho doméstico e como este regula a participação das mulheres no mercado de trabalho não é recente no debate feminista, comumente problematizado como efeito da desigualdade de gênero que atua na produção da divisão sexual do trabalho. Os resultados analisados por outro conjunto de artigos reforçam a problemática da sobrecarga do trabalho doméstico de responsabilidade das mulheres, oportunizando o debate sobre a relação entre a divisão sexual do trabalho, a desigualdade de gênero e o adoecimento ao investigarem profissões consideradas femininas e masculinas. Entre as profissões historicamente atribuídas a mulheres, inicia-se com as que reúnem atividades de cuidado no âmbito da enfermagem.

Nesse campo profissional de predomínio feminino, o estudo de Fernandes et al. (2002Fernandes, J. D., Ferreira, S. L., Albergaria, A. K., & Conceição, F. M. da. (2002). Saúde mental e trabalho feminino: imagens e representações de enfermeiras. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 10(2), 199-206. Recuperado de http://www. scielo.br/pdf/rlae/v10n2/10515.pdf
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) expõe o comprometimento da saúde mental das profissionais frente ao cotidiano que requer conciliar atividades profissionais de cuidado com as atividades do espaço doméstico. No estudo de Elias e Navarro (2006Elias, M. A., & Navarro, V. L. (2006). A relação entre o trabalho, a saúde e as condições de vida: negatividade e positividade no trabalho das profissionais de enfermagem de um hospital escola. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 14(4), 517-525. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/rlae/v14n4/v14n4a08.pdf
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) com profissionais de enfermagem destacam-se a presença numerosa de mulheres na realização do trabalho hospitalar e o fato de que a finalização da jornada de trabalho no hospital é seguida pela jornada do trabalho doméstico. Entre as importantes considerações analíticas do estudo, as autoras observam o não reconhecimento do próprio adoecimento pelas profissionais entrevistadas e atentam para uma dimensão dos resultados da pesquisa que “[...] revelaram heterogeneidade na distribuição da sobrecarga, confirmando que não é possível falar de um cotidiano da mulher e sim de vários cotidianos de mulheres, numa pluralidade que contém as diferenças de classe social, ideológicas, culturais e sociais” (Elias & Navarro, 2006Elias, M. A., & Navarro, V. L. (2006). A relação entre o trabalho, a saúde e as condições de vida: negatividade e positividade no trabalho das profissionais de enfermagem de um hospital escola. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 14(4), 517-525. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/rlae/v14n4/v14n4a08.pdf
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, p. 524).

Igualmente, no estudo de Silva et al. (2015Silva, S. C. P.S., Nunes, M. A.P., Santana, V. R., Reis, F. P., Machado Neto, J., & Lima, S.O. (2015). A síndrome de burnout em profissionais da Rede de Atenção Primária à Saúde de Aracaju, Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, 20(10), 3011-3020. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n10/1413-8123-csc-20-10-3011.pdf
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, p. 3012), com “[...] profissionais de nível superior vinculados à Rede de Atenção Primária à Saúde (REAP) do município de Aracaju-SE [...]”, não foram identificadas ‘diferenças de gênero’ na prevalência da síndrome de Burnout. Não obstante, cabe enfatizar que, “[...] no presente estudo, os profissionais da REAP tiveram idade média de 44,9 ± 10,5 anos, sendo a maioria mulheres (83,5%), casadas (65,5%), com filhos (70,6%) e pós-graduação (68%)” (Silva et al., 2015Silva, S. C. P.S., Nunes, M. A.P., Santana, V. R., Reis, F. P., Machado Neto, J., & Lima, S.O. (2015). A síndrome de burnout em profissionais da Rede de Atenção Primária à Saúde de Aracaju, Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, 20(10), 3011-3020. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n10/1413-8123-csc-20-10-3011.pdf
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, p. 3016). Com isso, enfatiza-se que importa considerar que se trata de um universo profissional do cuidado, com a prevalência de mulheres.

Da mesma forma, o adoecimento de profissionais da saúde pela síndrome de burnout foi observado no estudo realizado por Wai e Carvalho (2009Wai, M. F. P., & Carvalho, A. M. P. (2009). O trabalho do agente comunitário de saúde: fatores de sobrecarga e estratégias e enfrentamento. Revista deEnfermagem UERJ, 17(4), 563-8. Recuperado de http://www.facenf.uerj.br/v17n4/v17n4a19.pdf
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), com agentes comunitários de saúde (ACS). O estudo teve como temas centrais de análise fatores de sobrecarga e estratégias de enfrentamento. A categoria gênero foi relacionada à “[...] dificuldade do ACS quando o mesmo é do sexo masculino e enfrenta a dificuldade de criar o vínculo, de entrar nos domicílios nos quais só se encontra presente a dona da casa [...]” e à necessidade de apresentar “[...] orientações quanto a exames ginecológicos e autoexames de mamas” (Wai & Carvalho, 2009Wai, M. F. P., & Carvalho, A. M. P. (2009). O trabalho do agente comunitário de saúde: fatores de sobrecarga e estratégias e enfrentamento. Revista deEnfermagem UERJ, 17(4), 563-8. Recuperado de http://www.facenf.uerj.br/v17n4/v17n4a19.pdf
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, p. 565). Sobre tal aspecto, os autores mencionam e sugerem a perspectiva de gênero como possibilidade de análise da diferença e da desigualdade entre mulheres e homens no campo profissional.

A potência da perspectiva de gênero na análise da posição de ‘cuidadoras’, histórica e culturalmente aprendida e ocupada por mulheres, foi demonstrada no estudo de Thomé e Meyer (2011Thomé, E. G. da R., & Meyer, D. E. E. (2011). Mulheres cuidadoras de homens com doença renal crônica: uma abordagem cultural. Texto & Contexto - Enfermagem, 20(3), 503-511. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/tce/v20n3/11.pdf
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). Para tratar da temática envolvendo “[...] mulheres no processo de ‘tornar-se cuidadora’ de homens doentes renais crônicos [...]”, as autoras se fundamentam em estudos culturais e nos estudos de gênero pós-críticos (Thomé & Meyer, 2011Thomé, E. G. da R., & Meyer, D. E. E. (2011). Mulheres cuidadoras de homens com doença renal crônica: uma abordagem cultural. Texto & Contexto - Enfermagem, 20(3), 503-511. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/tce/v20n3/11.pdf
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, p. 504, grifo das autoras). Para uma doença renal crônica que requer determinada convivência diária de cuidados específicos, o estudo revelou a importância que os homens atribuem às cuidadoras. No entanto, conforme trazem as autoras, “[...] essa convivência, que para algumas pode ajudar na compreensão da situação de seus ‘dependentes’, para outras pode gerar grande ansiedade, justamente pela identificação e pelo julgamento comuns ao quadro desencadeado pela doença” (Thomé & Meyer, 2011Thomé, E. G. da R., & Meyer, D. E. E. (2011). Mulheres cuidadoras de homens com doença renal crônica: uma abordagem cultural. Texto & Contexto - Enfermagem, 20(3), 503-511. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/tce/v20n3/11.pdf
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, p. 506, grifo das autoras).

Dentre outras contribuições ao debate de gênero, o estudo evidencia dois aspectos que merecem ser destacados: por um lado, a cuidadora adoece pela exigência singular do próprio processo de cuidar e da dependência que se instala, gerando, em alguns casos, a necessidade de acompanhamento psiquiátrico; por outro, a “[...] dependência que é vivida como um peso também implica modificações das relações de poder de gênero vigentes em alguns contextos culturais [...]” (Thomé & Meyer, 2011Thomé, E. G. da R., & Meyer, D. E. E. (2011). Mulheres cuidadoras de homens com doença renal crônica: uma abordagem cultural. Texto & Contexto - Enfermagem, 20(3), 503-511. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/tce/v20n3/11.pdf
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, p. 508). Como assevera o estudo, no/pelo cuidar, as entrevistadas evidenciam que o ‘tornar-se’ cuidadora oportuniza a ‘construção de outras identidades’, apesar de reproduzi-lo como tarefa e destino das mulheres.

Outra ocupação que se destaca no repertório de profissões consideradas de mulheres é a docência, foco de investigação do estudo de Oliveira et al. (2012Oliveira, E. R.A. de, Garcia, Á. L., Gomes, M. J., Bittar, T. O., & Pereira, A. C. (2012). Gênero e qualidade de vida percebida: estudo com professores da área de saúde. Ciência & Saúde Coletiva, 17(3), 741-747. Recuperado de http://www.scielo.br/ pdf/csc/v17n3/v17n3a21.pdf
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), realizado com mulheres docentes do ensino superior na área da saúde. Por se tratar de um ambiente de sobrecarga de atividade cognitiva, o estudo salienta que as entrevistadas narram o fato de que as condições de trabalho e a qualidade de vida são afetadas pela falta de lazer e de descanso, gerando estresse, alterações do sono e desordens psíquicas. A ‘jornada de trabalho ilimitada’ pela coexistência de atividades profissionais e atividades domésticas é evidenciada pelas autoras, que apontam que “[...] quando se refere à mulher, o tempo de trabalho parece ser elemento destacável para determinar a percepção da qualidade de vida” (Oliveira et al., 2012Oliveira, E. R.A. de, Garcia, Á. L., Gomes, M. J., Bittar, T. O., & Pereira, A. C. (2012). Gênero e qualidade de vida percebida: estudo com professores da área de saúde. Ciência & Saúde Coletiva, 17(3), 741-747. Recuperado de http://www.scielo.br/ pdf/csc/v17n3/v17n3a21.pdf
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, p. 744). Frente à sobrecarga de demandas e suas implicações para a saúde mental do referido grupo ocupacional, Oliveira et al. (2012Pereira, A. M. T. B. (2015). Elaboração e validação do ISB: inventário para avaliação da síndrome de burnout.Boletim de Psicologia,65(142), 59-71. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/bolpsi/v65n142/v65n142a06.pdf
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, p. 746) sugerem “[...] a necessidade de elaboração de um projeto de intervenção em saúde do trabalhador, para melhorar a condição de trabalho da docente na área da saúde, diminuindo o sofrimento psíquico a que estão expostas”.

As condições e as relações de trabalho vivenciadas por mulheres profissionais do sexo, território onde predomina o trabalho feminino, foram analisadas nos estudos de Silva et al. (2010Silva, E. F. da, Costa, D. B., & Nascimento, J. U. do. (2010). O trabalho das profissionais do sexo em diferentes lócus de prostituição da cidade. Psicologia: teoria e prática, 12(1), 109-122. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ptp/v12n1/v12n1a10.pdf
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) e Vidal et al. (2014Vidal, C. E. L., Amara, B., Ferreira, D. P., Dias, I.M. F., Vilela, L. A., & Franco, L. R. (2014). Preditores de prováveis transtornos mentais comuns (TMC) em prostitutas utilizando o self-reporting questionnaire.Jornal Brasileiro de Psiquiatria,63(3), 205-212. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/jbpsiq/v63n3/0047-2085-jbpsiq-63-3-0205.pdf
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). Os estudos buscam problematizar a centralidade da divisão sexual do trabalho na análise do adoecimento de trabalhadoras e, considerando a complexidade do debate sobre a profissão no campo dos estudos feministas e de gênero, a carga de estereótipos e de preconceitos como efeito das construções de gênero na (des)valorização de mulheres em função das atividades que realizam.

Os agravos à saúde física e mental das mulheres em decorrência do cotidiano do trabalho foram evidenciados pelos dois estudos. Silva et al. (2010Silva, E. F. da, Costa, D. B., & Nascimento, J. U. do. (2010). O trabalho das profissionais do sexo em diferentes lócus de prostituição da cidade. Psicologia: teoria e prática, 12(1), 109-122. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ptp/v12n1/v12n1a10.pdf
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, p. 116), na pesquisa que realizaram com profissionais do sexo na feira central e nos bares da cidade de Campina Grande-PB, relatam que a “[...] violência praticada pelos clientes contra as mulheres [...]” e “[...] a própria iminência de a violência acontecer causa sofrimento psicológico, como angústia”. O estudo de Vida et at. (2014, p. 208), com mulheres profissionais do sexo cadastradas na Associação de Prostitutas de Minas Gerais (Aprosmig), revela que “[...] na amostra estudada, cerca de 60% das mulheres apresentaram sintomas indicativos de prováveis TMC, percentual bem mais elevado que o encontrado na população geral”.

Outro conjunto de artigos reuniu estudos com foco na saúde mental de trabalhadoras que desenvolvem atividades em territórios profissionais historicamente considerados masculinos, tais como as polícias civil e militar. Os estudos de Souza et al.. (2007Souza, E. R. de, Franco, L. G., Meireles, C. de C., Ferreira, V. T., & Santos, N. C. dos. (2007). Sofrimento psíquico entre policiais civis: uma análise sob a ótica de gênero. Cadernos de Saúde Pública, 23(1), 105-114. Recuperado de http://www.scielo.br/ pdf/csp/v23n1/11.pdf
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) e de Bezerra et al. (2013Bezerra, C. de M., Minayo, M. C. de S., & Constantino, P. (2013). Estresse ocupacional em mulheres policiais.Ciência & Saúde Coletiva,18(3), 657-666. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n3/11.pdf
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) são representativos dos processos de adoecimento de mulheres policiais no exercício de suas atividades.

Souza et al. (2007Souza, E. R. de, Franco, L. G., Meireles, C. de C., Ferreira, V. T., & Santos, N. C. dos. (2007). Sofrimento psíquico entre policiais civis: uma análise sob a ótica de gênero. Cadernos de Saúde Pública, 23(1), 105-114. Recuperado de http://www.scielo.br/ pdf/csp/v23n1/11.pdf
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, p. 105) investigaram “[...] o sofrimento psíquico de policiais civis, sob a ótica de gênero [...]” e relatam se tratar de um território laboral considerado masculino (apesar da evolução da participação feminina). No estudo realizado, Souza et al. (2007)Souza, E. R. de, Franco, L. G., Meireles, C. de C., Ferreira, V. T., & Santos, N. C. dos. (2007). Sofrimento psíquico entre policiais civis: uma análise sob a ótica de gênero. Cadernos de Saúde Pública, 23(1), 105-114. Recuperado de http://www.scielo.br/ pdf/csp/v23n1/11.pdf
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destacam a maior representação de policiais mulheres no estrato técnico (TEC) em comparação aos estratos administrativo (ADM) e operacional (OP), o que pode demonstrar a reprodução de uma divisão sexual do trabalho fundada na concepção de trabalho feminino como ajuda. As cargas de atividades na polícia associada à de atividades domésticas (cuidado com a casa e com a família) foram citadas como fatores que podem contribuir para o sofrimento psíquico das policiais mulheres. Os resultados evidenciam dificuldades vivenciadas pelas policiais em função de características do próprio ambiente policial e o desgaste psíquico que podem gerar, demostrando como mulheres e homens atribuem sentidos diferentes à profissão e como tal diferença implica num maior adoecimento de mulheres.

O estudo de Bezerra et al. (2013Bezerra, C. de M., Minayo, M. C. de S., & Constantino, P. (2013). Estresse ocupacional em mulheres policiais.Ciência & Saúde Coletiva,18(3), 657-666. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n3/11.pdf
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), especificamente, tratou do estresse ocupacional vivenciado por mulheres policiais militares, seus desdobramentos nas esferas do trabalho e da vida doméstica. Em uma direção que se aproxima da apontada pelos estudos anteriores no que diz respeito à divisão sexual do trabalho, a maioria das mulheres estudadas desempenha “[...] funções internas, administrativas e de saúde [...]”, posto que “[...] seu estresse tem origem basicamente na questão gerencial e organizacional” (Bezerra et al. 2013Bezerra, C. de M., Minayo, M. C. de S., & Constantino, P. (2013). Estresse ocupacional em mulheres policiais.Ciência & Saúde Coletiva,18(3), 657-666. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n3/11.pdf
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, p. 662). O estudo revelou que mulheres e homens policiais militares não lidam com o cotidiano de trabalho do mesmo jeito, de forma que os fatores geradores de estresse e suas consequências se diferenciam. No caso das policiais, o estresse é associado ao cotidiano de trabalho e seus sintomas afetam o relacionamento familiar; os sintomas psicológicos do estresse suplantam os sintomas físicos; dentre os fatores produtores de estresse negativo, destacam-se o preconceito e a discriminação de gênero (Bezerra et al. 2013Bezerra, C. de M., Minayo, M. C. de S., & Constantino, P. (2013). Estresse ocupacional em mulheres policiais.Ciência & Saúde Coletiva,18(3), 657-666. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n3/11.pdf
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). Outra questão pertinente ao debate de gênero se refere ao fato de que as policiais percebem diferenças na distribuição e avaliação das atividades que realizam em comparação com os homens por conta do seu ‘sexo’; “[...] na lógica das policiais militares sobre os estressores identificados em seu trabalho, o fato de ser mulher é um detonador” (Bezerra et al., 2013Bezerra, C. de M., Minayo, M. C. de S., & Constantino, P. (2013). Estresse ocupacional em mulheres policiais.Ciência & Saúde Coletiva,18(3), 657-666. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n3/11.pdf
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, p. 664). O estudo conclui que não se trata de eliminar as diferenças entre policiais mulheres e homens, mas as desigualdades de gênero.

Ainda em território profissional considerado masculino, Amato et al. (2010Amato, T. de C., Pavin, T., Martins, L. F., Ronzani, T. M., & Batista, A. (2010). Trabalho, gênero e saúde mental: uma pesquisa quantitativa e qualitativa entre bombeiros. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, 13(1), 103-118. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-37172010000100009& lng=pt&tlng=pt.
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) tratam de indicadores de saúde mental e das diferenças entre os processos de adoecimento de mulheres e homens no Corpo de Bombeiros. Na comparação com a saúde dos bombeiros homens, Amato et al. (2010)Amato, T. de C., Pavin, T., Martins, L. F., Ronzani, T. M., & Batista, A. (2010). Trabalho, gênero e saúde mental: uma pesquisa quantitativa e qualitativa entre bombeiros. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, 13(1), 103-118. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-37172010000100009& lng=pt&tlng=pt.
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apontam o comprometimento da saúde mental das bombeiras mulheres. A sobrecarga de trabalho e outros pontos negativos, envolvendo as relações de trabalho e seus efeitos, principalmente, na saúde mental, foram percebidos e relatados pelas mulheres. Alguns preconceitos e julgamentos registrados por mulheres e homens são representativos das desigualdades de gênero, tais como as noções de limitação da força física feminina e funções específicas para as mulheres no Corpo de Bombeiros, o preconceito em relação ao trabalho feminino e a pretensa superioridade dos homens em algumas atividades, entre outras questões. A partir dos resultados obtidos e amplamente detalhados no artigo, os autores observam que se torna “[...] viável sugerir que os indicativos de estresse, depressão e saúde mental geral, mais comuns entre os bombeiros femininos, podem ter ligação com as condições do trabalho feminino na instituição” (Amato et al., 2010Amato, T. de C., Pavin, T., Martins, L. F., Ronzani, T. M., & Batista, A. (2010). Trabalho, gênero e saúde mental: uma pesquisa quantitativa e qualitativa entre bombeiros. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, 13(1), 103-118. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-37172010000100009& lng=pt&tlng=pt.
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, p. 115).

Por fim, o conjunto de artigos selecionados propiciou esboçar considerações a respeito da saúde mental de trabalhadoras no entrelaçamento com as categorias gênero e divisão sexual do trabalho, uma vez que oportunizaram demonstrar a intrínseca relação entre atividades profissionais remuneradas e atividades domésticas na gênese do adoecimento, bem como particularidades de territórios profissionais considerados femininos e masculinos. Diante do exposto, destaca-se a pertinência do debate de gênero para explicar as desigualdades entre mulheres e homens em contextos laborais na base dos agravos a saúde mental das mulheres.

Considerações finais

Os artigos selecionados trouxeram discussões sobre a saúde mental com foco em diferentes contextos profissionais, produzidos como territórios femininos e masculinos de atuação, evidenciando o debate sobre a dupla jornada de trabalho feminina como uma das condições envolvidas no adoecimento de trabalhadoras. As categorias de divisão sexual do trabalho e gênero foram mobilizadas para analisar as relações entre o trabalho e a saúde/adoecimento mental da trabalhadora. Os artigos, em linhas gerais, compararam índices de adoecimento entre homens e mulheres em distintos espaços e condições de trabalho, em diferentes regiões brasileiras, evidenciando a prevalência do adoecimento das trabalhadoras. Um conjunto de estudos teve como tema o adoecimento mental em atividades nas áreas da saúde e do cuidado - em grande medida, precarizadas e feminizadas. Um outro estudo trouxe questões relativas ao adoecimento mental de professoras universitárias, destacando a condição de trabalho full time exigida. No polo oposto, a presença de mulheres em profissões historicamente consideradas masculinas também mostrou faces de adoecimento, as quais apontam o ‘peso’ das normas de gênero e dos desafios de transitar por tais espaços laborais.

Os Transtornos Mentais Comuns foram tema em estudos que evidenciaram as especificidades das ocupações, a relação com o trabalho doméstico e a desigualdade de gênero nos contextos de trabalho como condições para o adoecimento das mulheres. A análise da prevalência do estresse e da Síndrome de Burnout entre as trabalhadoras foi foco de um conjunto de estudos. Em uma análise a partir das contribuições do debate de gênero, os sintomas do estresse são amplamente associados à sobrecarga gerada pelas múltiplas jornadas de trabalho das mulheres, resultantes das desigualdades de gênero que atuam na produção da divisão sexual do trabalho.

Embora nem todos tenham articulado as categorias divisão sexual do trabalho e gênero em suas análises, os estudos analisados permitiram problematizar as diferenças nos processos de adoecimento de trabalhadores e de trabalhadoras, contribuindo para potencializar o debate de gênero no âmbito das relações de trabalho e do adoecimento. Para concluir, destaca-se que a análise realizada contribui para evidenciar a necessidade de estudos empíricos sobre trabalhadoras em diferentes atividades laborais, sobretudo, na interface com temáticas relativas à saúde no campo dos estudos de gênero.

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  • 1
    Agência de Fomento: Programa de Grupos de Pesquisa da Universidade do Extremo Sul Catarinense - UNESC

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Nov 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    09 Ago 2018
  • Aceito
    11 Abr 2019
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