Interfaces entre Psicologia, Educação e Saúde - um relato de prática profissional

Interfaces entre Psicología, Educación y Salud - un relato de práctica profesional

RESUMO

Este é um relato de prática profissional do psicólogo escolar e educacional na área da saúde. Trata-se de um campo de atuação pouco divulgado ou reconhecido e este artigo visa colaborar para dar visibilidade a ele. O trabalho aqui apresentado é desenvolvido na Escola Municipal de Saúde Pública de Goiânia, no estado de Goiás, e se fundamenta na Educação Permanente em Saúde. O psicólogo escolar é o profissional que oferece contribuições dessa ciência para os processos de ensino aprendizagem e da educação como um todo. A Psicologia na saúde pública tem várias frentes de atuação e a educação na saúde é uma delas. O psicólogo escolar e educacional pode atuar nos processos educativos para profissionais de saúde, buscando como fim último aprimorar a qualidade do serviço prestado por eles. Além disso, pode colaborar com as instituições de ensino formais na formação de futuros profissionais. Enfim, o psicólogo escolar na saúde tem muito a contribuir na melhoria do atendimento à população e na busca por uma saúde de qualidade que atenda às necessidades reais do usuário.

Palavras-chave:
Psicologia escolar; serviços de saúde pública; educação permanente

RESUMEN

Este es un relato de práctica profesional del psicólogo escolar y educacional en el área de la salud. Se trata de un campo de actuación poco divulgado o reconocido y este artículo tiene por objetivo colaborar para dar visibilidad a ellos. El estudio aquí presentado fue desarrollado en la Escuela Municipal de Salud Pública de Goiânia, en el estado de Goiás, y se fundamenta en la Educación Permanente en Salud. El psicólogo escolar es el profesional que ofrece contribuciones de esta ciencia para los procesos de enseñanza aprendizaje y de la educación como un todo. La Psicología en la salud pública tiene varias frentes de actuación y la educación en la salud es una de ellas. El psicólogo escolar y educacional puede actuar en los procesos educativos para profesionales de salud, buscando como fin último perfeccionar la calidad del servicio prestado por ellos. Además de eso, puede colaborar con las instituciones de enseñanza formales en la formación de futuros profesionales. En suma, el psicólogo escolar en la salud tiene mucho a contribuir en la mejora de la atención a la populación y en la búsqueda por una salud de calidad que cumpla a las necesidades reales del usuario.

Palabras clave:
Psicología escolar; servicios de salud pública; educación continua

ABSTRACT

This is a report of the professional practice of the school and educational psychologist in the health area. It is a field of activity little known or recognized and this article aims to collaborate to give visibility to it. The work presented here is developed at the Goiânia Municipal School of Public Health, in the state of Goiás, and is based on Permanent Health Education. The school psychologist is the professional who offers contributions of this science to the processes of teaching, learning and education as well as one all. Public health Psychology has several fronts and health education is one of them. The school and educational psychologist can act in the educational processes for health professionals, seeking ultimately to improve the quality of service provided by them. In addition, it can collaborate with formal education institutions in training future professionals. Finally, the school psychologist inside the health system has much to contribute to the improvement of care to the population and the search for quality health that meets the real needs of the user.

Keywords:
School psychology; public health services; continuing education

INTRODUÇÃO

A Psicologia, enquanto profissão, busca a melhoria da qualidade de vida do ser humano e para conseguir isso foca suas forças em diferentes áreas. Seu arcabouço teórico e prático embasa o trabalho deste profissional onde quer que esteja, mesmo em áreas pouco reconhecidas pela sociedade como é o caso da Psicologia Escolar e Educacional.

Esta área vem se transformando no decorrer da história da Psicologia, com estudos e pesquisas buscando mudar os paradigmas já constituídos. Entretanto, a função social desse profissional ainda é confundida por muitos. O psicólogo escolar não é o profissional que atende clinicamente os estudantes na escola ou faz terapia com os professores, mas sim o que oferece contribuições da Psicologia para melhorar os processos de ensino e aprendizagem e da educação como um todo. Historicamente sabemos que ocorreu esta atuação clínica na escola, mas, com todo o arcabouço científico acumulado na área, percebeu-se que esse não era o melhor caminho, pois não contribuía efetivamente com a realidade educacional e com o desenvolvimento de seus atores (Andaló, 1984; Antunes, 2008; Martinez, 2009).

A Psicologia tem contribuído para a educação no sentido de melhorar sua qualidade. Dessa forma, os espaços de trabalho do psicólogo escolar precisam ser ampliados e valorizados, para além das instituições educativas formais. A Associação Brasileira de Psicologia Escolar [ABRAPEE] (s.d.), de forma resumida, diz que o psicólogo nesta área pode estudar, pesquisar ou atuar com as seguintes temáticas: 1) processos de ensino e aprendizagem, 2) desenvolvimento humano, 3) escolarização em todos os seus níveis, 4) inclusão de pessoas com deficiências, 5) políticas públicas em educação, 6) gestão psicoeducacional em instituições, 7) formação continuada de professores, dentre outros.

Existem ainda especificidades da atuação do psicólogo escolar que não são conhecidos até entre os profissionais da área como, por exemplo, o trabalho aqui apresentado, que está inserido no campo da saúde pública, utilizando-se da relação entre psicologia, educação e saúde. Souza (2009), quando trouxe a ideia de novas perspectivas para a Psicologia Escolar, se referia à ampliação das áreas tradicionais de trabalho, falando em áreas emergentes que incluíam também a saúde. Entretanto, não trouxe muitos elementos que demonstram essa atuação e é o que traremos aqui.

A EXPERIÊNCIA

A Psicologia é uma profissão da saúde e tem muito a acrescentar na formação e desenvolvimento de trabalhadores dessa área. Neste sentido, é que o trabalho aqui apresentado é realizado. Apesar de a maioria dos psicólogos que atuam na saúde trabalharem com atendimentos clínicos (Spink, 2006) existem outras ações/atividades necessárias e importantes a serem desenvolvidas. A educação na saúde é uma delas.

A experiência descrita acontece na Secretaria Municipal de Saúde da cidade de Goiânia - Goiás, especificamente na Escola Municipal de Saúde Pública (EMSP). Esta instância é responsável pela formação e desenvolvimento dos servidores que trabalham nessa secretaria e por colaborar com a formação dos futuros profissionais de saúde que estão nas instituições de ensino formais, tanto de nível médio quanto superior.

Neste cenário, o psicólogo educacional se insere como agente de mudanças. Como disse Andaló (1984), se torna “um elemento catalizador de reflexões, um conscientizador dos papéis representados pelos vários grupos que compõem a instituição” (p.4), com o fim último de transformar a realidade institucional e, neste caso específico, o atendimento à saúde da população.

A EMSP se insere no município como agente transformador no processo de educação na saúde e o psicólogo escolar atua principalmente em três frentes de trabalho, explicitadas abaixo:

1- Incentivo, articulação, coordenação e apoio às ações educativas para profissionais de saúde

As ações são desenvolvidas com base na Política Nacional de Educação Permanente em Saúde - PNEPS (Brasil, 2009) que preconiza processos de ensino aprendizagem relacionados ao cotidiano do trabalho para que se torne significativo aos profissionais e os estimule a realizar transformações da realidade em que vivem a partir de reflexões, estudos, diálogos, questionamentos, problematizações e vivências no serviço. De forma ativa e autônoma, essas aprendizagens não necessariamente acontecem em uma sala de aula formal, mas nos ambientes que propiciem a observação participativa da realidade, o pensar sobre os processos de trabalho e a intervenção quando necessária (Brasil, 2009).

A Educação Permanente em Saúde (EPS) tem sido proposta do Ministério da Saúde, para a consolidação da reforma sanitária, que pressupõe várias faces: a ordenação na formação de Recursos Humanos, a formulação e execução de políticas orientadoras na formação de trabalhadores para o setor, vista como um conceito pedagógico que favorece a reflexão crítica sobre o trabalho e a resolutividade da clínica e da promoção da saúde coletiva. (Pires & Braga, 2009, p. 160).

No contexto aqui apresentado, o psicólogo, enquanto agente de transformação, tem um vasto campo de trabalho. Algumas das atividades desenvolvidas por ele, que demonstram resultados práticos são: facilitação de processos de educação permanente em saúde; preparação de outros profissionais para esta facilitação; gestão de projetos e processos educativos que estimulem a reflexão, a autonomia e a transformação da realidade dos serviços; apoio metodológico / pedagógico para as atividades educativas direcionadas tanto para profissionais quanto para gestores; avaliação e acompanhamento dos processos educacionais que acontecem na Secretaria.

O psicólogo escolar na EMSP pode colocar em prática o que Lessa e Facci (2008) discutem sobre a importância de se utilizar os conhecimentos psicológicos de uma maneira crítica e em prol da coletividade. Ao se referir à educação essas autoras concluem: “O objetivo maior é desenvolver estratégias para que as ações sejam concretas e com propostas contextualizadas, comprometendo-se com a construção de um processo educacional que prime pela apropriação do conhecimento científico por todos os indivíduos que passam pela escola”. (Lessa & Facci, 2008, p. 95).

Trabalhando com a Educação Permanente em Saúde o objetivo é o mesmo que as autoras relatam, desenvolver os profissionais trazendo conhecimentos científicos de maneira contextualizada, prática e reflexiva, buscando estimular a autonomia destes.

2- Articulação e execução da Integração ensino-serviço-comunidade

Outra frente de trabalho importante que acontece na EMSP, e que também faz parte da PNEPS, é a parceria com as instituições de ensino formais (cursos técnicos, de graduação e de pós-graduação), numa relação de trocas colaborativas com o fim último de melhoria do ensino para os cursos da área da saúde. As ações giram em torno do incentivo e apoio às mudanças curriculares e pedagógicas para que os profissionais sejam realmente formados para a realidade do serviço da saúde pública, buscando uma educação mais crítica e reflexiva, para que consigam solucionar os problemas cotidianos e transformar a realidade que os cercam.

Além disso, a EMSP gerencia todas as atividades práticas dos alunos das instituições de ensino formais nas unidades da Secretaria de Saúde. É a chamada integração ensino-serviço-comunidade, que é referendada inclusive nas Diretrizes Curriculares Nacionais para cursos de graduação na área da saúde, que enfatiza a importância da prática e do serviço para a formação do profissional (Parecer CNE/CES n. 1133, 2001).

O foco da EPS é catalizar mudanças na saúde pública, buscando melhorias no atendimento à sociedade. Esse objetivo se relaciona com a ideia de Patto (2000) quando ressalta a importância da reflexão crítica do psicólogo escolar para conseguir produzir alguma transformação da realidade.

3 - Produção de conhecimento para o aprimoramento do trabalho desenvolvido

A equipe da EMSP gerencia as pesquisas científicas realizadas na Secretaria Municipal de Saúde. Além disso, desenvolve estudos para subsidiar e melhorar o trabalho executado. Atualmente esta pesquisa é relacionada ao processo de avaliação da EPS, que necessita ser instituído no município. É, ainda, incentivada a publicação e divulgação das ações desenvolvidas, para que possam contribuir com outros profissionais em busca de subsídios para seu trabalho em todo o país.

Vários são os exemplos de ações e projetos realizados pela psicóloga escolar em parceria com toda a equipe, já publicados, como os seguintes: Formação de facilitadores para processos de Educação Permanente em Saúde, desenvolvida para dar base para a implementação da EPS no município (Souza, Albuquerque, & Ramos, 2016; Albuquerque, Souza, Nasser, & Ramos, 2016); o projeto “Saúde Mental na Roda”, que é um processo de EPS para trabalhar a clínica ampliada em saúde (Amorim et al., 2015); projeto de EPS em uma unidade de saúde de Goiânia, que busca melhorar os processos de trabalho da equipe desta unidade (Souza, Varizo, & Rocha, 2018); a integração com as escolas formadoras de profissionais de saúde para a melhoria da qualidade do serviço (Souza, Albuquerque, & Ramos, 2013).

O PSICÓLOGO NA EQUIPE DA EMSP

O trabalho da Psicologia Escolar e Educacional se enriquece com o coletivo e por isso valoriza a equipe. A intersecção da Psicologia com a Educação tem uma delimitação do trabalho do psicólogo que, de forma nenhuma, invade o trabalho de outros profissionais, mas sim valoriza outros olhares e convive bem com outras ciências. A própria PNEPS incentiva a intersetorialidade e interprofissionalidade na educação na saúde (Brasil, 2009).

A experiência aqui relatada valoriza o trabalho multiprofissional e em equipe, pois quando se multiplica as formas de se olhar a realidade, compreende-se melhor as possibilidades para resolver as questões que surgem e diversificam-se as estratégias de intervenção e as possíveis mudanças no serviço em saúde. Na equipe da EMSP, além de psicólogos, temos atualmente sociólogos e enfermeiros.

No entanto, trabalhar interprofissionalmente tem suas complexidades e a integralização dos diferentes saberes acontece no cotidiano mediante discussões e mediações com participação ativa do psicólogo escolar.

O fazer psicológico facilita o processo de trabalho com educação na saúde, pois traz contribuições para a compreensão do desenvolvimento humano, dos processos de ensino - aprendizagem e suas influências, da visão integral da saúde e do ser humano, das relações entre as pessoas, da afetividade, da individualidade do ser humano, dos processos de grupo e da coletividade e processos de comunicação humana.

Nem todos os psicólogos da EMSP têm formação em Psicologia Escolar, entretanto percebe-se que os estudos desta área podem contribuir para a efetividade do trabalho. O psicólogo escolar presente na equipe busca trazer estes elementos à tona para estudos e discussão, possibilitando uma educação permanente da própria equipe desta escola.

CONCLUSÃO

O psicólogo escolar e educacional tem muito a contribuir para a saúde pública, principalmente no trabalho com educação na saúde, que é um campo de atuação que precisa ser divulgado e valorizado. Os conhecimentos dessa área da Psicologia e a atuação crítica reflexiva do psicólogo escolar podem contribuir com a formação dos profissionais da saúde e com a EPS que, como fim último, dará subsídios importantes para a melhoria da qualidade do atendimento à saúde em nosso país. Mesmo que a realidade da saúde pública seja complexa e desafiadora, é possível abrir espaços para discussões sobre esta para que se pense em novas formas de enfrentamento e possíveis transformações.

As Escolas de Saúde Pública espalhadas por todo o país têm um importante papel na construção de um SUS de qualidade para a população, se tornando assim um espaço de atuação do psicólogo escolar e educacional como agente deste processo. Seu trabalho pode se tornar um catalizador de mudanças positivas, quando desenvolvido com eficiência, ética e baseado em evidências científicas que ajudem a compreender criticamente a realidade.

Espera-se que a divulgação desta experiência e de outras práticas profissionais, além do incentivo a pesquisas e estudos na área, possa aprimorar e expandir o trabalho dos psicólogos educacionais e escolares espalhados pelo país.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  02 Mar 2020
• Data do Fascículo
  2020

Histórico

• Recebido
  13 Ago 2018
• Aceito
  06 Maio 2019