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As Muitas Faces do Exílio de um “Judeu Sem Deus”: A Herança Paterna de Sigmund Freud

The Many Faces of Exile of a "Jew Without God": The Paternal Inheritance of Sigmund Freud

Resumo

Em sua Selbstdarstellung (2011 [1924]), Sigmund Freud (1856-1939), ressalta as origens judaicas e, nessa linhagem, o êxodo que marca sua família: percurso que desemboca em Viena e, posteriormente, em Londres, estação final. As marcas do exílio nos escritos freudianos reforçam o vínculo com o judaísmo, índice da herança paterna. O episódio do “gorro na lama”, descrito na Interpretação dos Sonhos (2019 [1900]FREUD, Sigmund. A interpretação dos sonhos. Obras completas. v. 4. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras , 2019 [1900].), como a humilhação do pai de Freud, Jakob, aos olhos da criança que aspirava a sonhos de grandeza, assim como o presente do Velho Testamento (DERRIDA 2001DERRIDA, Jacques. Mal de arquivo: uma impressão freudiana. Trad. Claudia de Morais Rego. Relume Dumará: Rio de Janeiro, 2001.; YERUSHALMI 1992YERUSHALMI, Yosef Hayim. O moisés de Freud: judaísmo terminável e interminável. Rio de Janeiro: Imago, 1992.), abrem portas para outras questões centrais nas teorias freudianas. O pai, a “judeidade” (FUKS 2000FUKS, Betty B. Freud e a Judeidade: a vocação do exílio. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.), remetem às reflexões de Freud sobre religião, notadamente nas obras Totem & Tabu (2012 [1913]FREUD, Sigmund. Totem e Tabu, Contribuição à história do movimento psicanalítico e outros textos. Obras completas. v. 11. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras , 2012 [1912-1914].), O Futuro de uma ilusão (2014 [1927]FREUD, Sigmund. O futuro de uma ilusão e outros textos. Obras completas. v. 17. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras , 2014 [1926-1929].), Moisés e o Monoteísmo (2018 [1939]FREUD, Sigmund. Moisés e o monoteísmo, Compêndio de psicanálise e outros textos. Obras completas. v. 19. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras , 2018 [1937-1939].). Dessas, o Moisés de Freud é o texto derradeiro, cujas raízes ligam-se ao povo judeu. Outros temas, como o anti-semitismo, as vantagens das “teses universalistas” da intelectualidade judaica, (SAID 2004SAID, Edward W. Freud e os não-europeus. Trad. Arlene Clemesha. São Paulo: Boitempo, 2004.), o isolamento e a resistência (GAY 1990GAY, Peter. Sigmund Freud: um alemão e seus dissabores. In: SOUZA, Paulo César et alii (Orgs.). Sigmund Freud e O Gabinete do Dr Lacan. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1990, 1-71.) são igualmente importantes para os estudos psicanalíticos. Ser judeu é ser o Outro, e por isso, transitar pelo (des)território psicanalítico: da pulsão, da escuta das histéricas, da sexualidade infantil, da insistência da neurose, do valor do sonho.

Palavras-chave:
Herança paterna; Judaísmo; “Judeidade”; Religião

Abstract

In his self-portrayal Selbstdarstellung (2011 [1924]), Sigmund Freud (1856-1939) underlines the Jewish origin and the exodus that characterizes his family: the road that leads to Vienna and later ends in London. The signs of exile in Freud's writings strengthen the connection to Judaism, an indication of the paternal inheritance. The episode “Cap in the Mud”, described in Interpretation of Dreams (2019 [1900]FREUD, Sigmund. A interpretação dos sonhos. Obras completas. v. 4. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras , 2019 [1900].) as the humiliation of Freud's father Jacob seen through the eyes of a child who aspired to dreams of greatness, as well as the gift of the Old Testament received from his father (DERRIDA 2001DERRIDA, Jacques. Mal de arquivo: uma impressão freudiana. Trad. Claudia de Morais Rego. Relume Dumará: Rio de Janeiro, 2001.; YERUSHALMI 1992YERUSHALMI, Yosef Hayim. O moisés de Freud: judaísmo terminável e interminável. Rio de Janeiro: Imago, 1992.), both open doors to other central issues in Freudian theories. The father, as well as his Jewish condition (FUKS 2000FUKS, Betty B. Freud e a Judeidade: a vocação do exílio. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.), refer to Freud's reflections on religion, in particular in the works Totem & Taboo (2012 [1913]FREUD, Sigmund. Totem e Tabu, Contribuição à história do movimento psicanalítico e outros textos. Obras completas. v. 11. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras , 2012 [1912-1914].), The Future of an Illusion (2014 [1927]FREUD, Sigmund. O futuro de uma ilusão e outros textos. Obras completas. v. 17. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras , 2014 [1926-1929].), and Moses and Monotheism (2018 [1939]FREUD, Sigmund. Moisés e o monoteísmo, Compêndio de psicanálise e outros textos. Obras completas. v. 19. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras , 2018 [1937-1939].). Of these, Freud's Moses is the last text whose roots are related to the Jewish people. Other themes, such as anti-Semitism, the advantages of the “universalist theses” of Jewish intellectuality, (SAID 2004SAID, Edward W. Freud e os não-europeus. Trad. Arlene Clemesha. São Paulo: Boitempo, 2004.), and isolation and resistance (GAY 1990GAY, Peter. Sigmund Freud: um alemão e seus dissabores. In: SOUZA, Paulo César et alii (Orgs.). Sigmund Freud e O Gabinete do Dr Lacan. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1990, 1-71.), are equally important for psychoanalytic studies. To be a Jew means to be The Other and consequently to cross the psychoanalytic (unknown / non-) territory: the territory of the drive, of listening to hysterics, of children´s sexuality, of the insistence on neurosis, of the value of dreams.

Keywords:
Paternal inheritance; Judaism; “Jewish condition”; Religion

“Não digas jamais que chegaste; porque tu és passageiro em trânsito.” (Edmond Jabès)

Introdução

Em trecho de sua Autobiografia (2011 [1925]), Sigmund Freud (1856-1939) destaca dois elementos que nortearão a discussão que aqui propomos: o primeiro é o êxodo, o deslocamento que podemos nomear de estações; seguem-se o estabelecimento em Viena e o exílio em Londres, devido ao aumento da perseguição aos judeus e o Anschluss, a anexação da Áustria empreendida por Hitler, em 1938. O segundo é a origem de sua família proveniente da região da Morávia:

Nasci em 6 de maio de 1856, em Freiberg (na Morávia), pequenina cidade da atual Tchecoslováquia. Meus pais eram judeus, e eu também permaneci judeu. Tenho motivos para crer que meus antepassados paternos viveram por longo período na região do Reno (em Colônia), fugiram para o Leste devido a uma perseguição aos judeus, no século XIV ou XV, e no decorrer do século XIX retornaram da Lituânia para a Áustria alemã, através da Galícia (2011 [1925]: 76).

Assim, é o próprio Freud quem demarca essa primeira estação, os 78 anos que permaneceu em Viena, além de frisar sua filiação indelével ao judaísmo. Do grego Diasporá, “Diáspora”, etimologicamente, remete à “dispersão”, “dispersar”, “passar através de todos os lados”, liga-se à “dispersão de povos, por motivos políticos ou religiosos” (HOUAISS 2004HOUAISS, Antonio. Grande Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004.: 1033). Possíveis efeitos do êxodo Freudiano, dessa diáspora, ressoam no próprio estatuto da Psicanálise (FUKS 2000FUKS, Betty B. Freud e a Judeidade: a vocação do exílio. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.), discurso marcado pela errância, pelo nomadismo de um “entre”, na e além da ciência. Assim, a posição que é, ao mesmo tempo, a não-posição, já que marcada pela ambivalência de sentimentos: estar disperso entre os povos, entre determinado estatuto, estar fora deles, não pertencer a.

Quando Jakob (1815-1896) e Amalie Freud (1835-1930) se instalam em Viena, o pequeno Sigmund tem apenas 4 anos de idade. É o filho mais velho do casal e sempre sentirá falta da província, do interior, onde vivia em liberdade (BERTIN 1990BERTIN, Célia. A mulher em Viena nos tempos de Freud. Trad. Marina Appenzeller. Campinas; São Paulo: Papirus, 1990.). Em Viena, o primeiro endereço da família é a Weissgärberstrasse. O comércio de têxteis de Jakob Freud enfrenta sérias dificuldades, levando-os a mudarem-se com frequencia no decorrer dos cinco primeiros anos. A carência material vivida na infância, a despeito do carinho de sua mãe, certamente liga esse período à figura paterna, a qual, aos olhos infantis, seria marcada pelo insucesso nos negócios. Para Bertin (1990BERTIN, Célia. A mulher em Viena nos tempos de Freud. Trad. Marina Appenzeller. Campinas; São Paulo: Papirus, 1990.), é possível que as primeiras marcas do sentimento ambivalente de Freud em relação à capital austríaca se encontrem nos anos de dificuldades financeiras: “Provavelmente seu ódio declarado por Viena, cidade dos contrastes, em que sua hipersensibilidade sabe decifrar depressa, além de uma aparente alegria, a complexidade e a vida difícil dos seres, data desse período.” (1990: 77).

Contudo, os sentimentos ambivalentes nutridos pela capital austríaca costumam ser apontados como algo comum entre os habitantes daquela cidade. O proclamado wiener Selbsthass é um misto de ódio e afeto, compartilhado tanto por nativos quanto por moradores. Além disso, a cidade apresenta outras contradições. Dividida entre realidade e ilusão, tragédia e modernidade, nessa época, Viena é a quarta metrópole da Europa, com mais de dois milhões de habitantes, ao mesmo tempo “Laboratório de Fim de Mundo”2 2 Expressão do escritor austríaco Karl Kraus (1874-1936), conhecido por sua veia crítica e ácida. (ZEYRINGER; GOLLNER 2019: 388). , a despeito de que, como defende Le Rider (1993LE RIDER, Jacques. A Modernidade Vienense e as crises de identidade. Trad. Elena Gaidano. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1993.), sinta-se abaixo de Berlim, em termos de prestígio artístico. Dessa visão, chega, igualmente, “(...) a dificuldade de ser um inovador, um ´moderno´ num meio cultural reputadamente conservador e hostil às menores audácias.” (LE RIDER 1993LE RIDER, Jacques. A Modernidade Vienense e as crises de identidade. Trad. Elena Gaidano. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1993.: 24), “Pois uma grande “questão” judaica atravessa a psicanálise”, como defende Derrida (2001DERRIDA, Jacques. Mal de arquivo: uma impressão freudiana. Trad. Claudia de Morais Rego. Relume Dumará: Rio de Janeiro, 2001.: 9). Na verdade, a ligação mais direta de Freud com o judaísmo se encontra no que denominamos herança paterna. Da complexidade dessa relação, destaca-se, sem dúvida, o episódio do gorro-na-lama, relatado por Freud na Interpretação dos sonhos (Die Traumdeutung, 2019 [1900]FREUD, Sigmund. A interpretação dos sonhos. Obras completas. v. 4. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras , 2019 [1900].). O evento marca o contraste entre o jovem Freud sonhador, cujo ídolo é Aníbal, e o comportamento do pai, considerado passivo e omisso. Por volta dos dez ou onze anos, levando o filho em uma de suas caminhadas e tentando convencê-lo de que a sociedade de então era mais tolerante com os judeus, Jakob relata que, num sábado, bem vestido, trajando um gorro de peles, tem o mesmo arrancado e jogado na lama da calçada por um cristão, aos gritos de “Judeu! saia da calçada!”. Para a criança, a atitude do pai, de simplesmente abaixar-se, limpar o gorro e o colocá-lo de volta à cabeça, é o elemento central na visão dessa figura como um homem pouco fadado ao heroísmo (tão caro a Freud) e aos grandes feitos (com os quais sonhava).

Nessa herança paterna, a cultura judaica, sintetizada no “Livro dos livros”, isto é, a Bíblia, é outro possível elo. Trata-se da bíblia judaica e do volume que pertencera a Jakob. Como defende Fuks (2000FUKS, Betty B. Freud e a Judeidade: a vocação do exílio. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.), sabe-se que Jakob, pelo menos quando jovem, foi um judeu devoto. Quando chegou a Viena, trazia consigo o Tanakh, a bíblia hebraica. Nesse sentido, após a desterritorialização vivida no êxodo familiar e as dificuldades do estabelecimento da família na Viena de meados do século XIX, a herança e consequente posse da bíblia paterna, permitem a Freud “reterritorializar-se” na escrita; sem contar que o próprio processo de escrita é o estabelecimento de uma perenidade inexistente no discurso oral. No ensaio de Edward Said, Freud e os não-europeus (2004SAID, Edward W. Freud e os não-europeus. Trad. Arlene Clemesha. São Paulo: Boitempo, 2004.), em que o teórico revisita pontos-chaves do pensamento freudiano na interseção da cultura e da história, a Bíblia é apontada como um dos arquivos cruciais para a constituição da Psicanálise como discurso. Esse livro, na visão defendida por Said, apresenta a dupla função de marcar o ingresso de Freud na judeidade, assim como fazê-lo herdar dessa cultura todas as implicações de um saber permanentemente desrritorializado. “A Bíblia, recebida como presente de seu pai na infância, inscreveu Freud decididamente na tradição da judeidade, sem que isso implicasse qualquer adesão daquele e da psicanálise ao discurso religioso do judaísmo.” (SAID 2004SAID, Edward W. Freud e os não-europeus. Trad. Arlene Clemesha. São Paulo: Boitempo, 2004.: 21).

Derrida vê, na inscrição em forma de dedicatória, feita pela mão de Jakob, essa mesma linhagem, posto que Jakob é filho de R. Shelomoh Freud, o arquipatriarca, o avô da psicanálise. Dessa forma, o que o pai dá a seu filho é, ao mesmo tempo, uma escritura e seu suporte - a própria Bíblia Philippsohn, com a qual Freud estudara em sua juventude.

Seu pai a entrega a ele, depois de tê-la ofertado como presente com nova encadernação de couro. Encadernar, ligar as folhas novamente é um ato de amor. De amor paternal. Tão importante quanto o texto em Melitzah, estes fragmentos bíblicos, litúrgicos ou rabínicos que compõem a longa dedicatória e transmitem, por sua vez, todo o pensamento do pai. (2001: 34).

Por extensão, da leitura da obra freudiana, Derrida aborda “o belo livro de Yerushalmi” (2001DERRIDA, Jacques. Mal de arquivo: uma impressão freudiana. Trad. Claudia de Morais Rego. Relume Dumará: Rio de Janeiro, 2001.: 34) e dedica sua conferência (Mal de arquivo: uma impressão freudiana) a esse autor, aos seus filhos e à memória de seu pai. Apresentam-se ligados, Freud ao pai, por meio da Bíblia; Derrida, a Yerushalmi, autor do estudo O moisés de Freud: judaísmo terminável e interminável, o qual lê, nesta dedicatória, “um episódio crucial”, considerando-o “único texto canônico de Jakob Freud que chegou até nós.” (2001: 35) Observa-se uma cadeia de diálogo, uma linhagem entre texto e resposta. Ecos e permanência do passado, espectros. Derrida sustenta que Freud soube tirar proveito dos espectros.

Freud tinha seus espectros, ele o confessou nesta ocasião. Participa-nos parte de sua verdade. Tinha os seus e obedecia a eles (Jakob Shelomoh, Moisés e outros), como Yerushalmi (Jakob Shelomoh, Sigmund Shelomoh, seu Moisés e outros) e eu (Jakob, Hayim, meus avós Moisés e Abraão e outros). (2001: 116).

Jakob e Amalie

A herança paterna, na obra freudiana, é regida pelo signo da ambivalência3 3 “Termo utilizado em psicanálise para designar a presença simultânea e conflitante em um mesmo sujeito de sentimentos e tendências opostas em relação a um objeto ou a uma pessoa. Encontramos o par de opostos sim e não, afirmação e negação, de forma concomitante e indissociável. Criado por Bleuler (1910), o termo foi utilizado por Freud em vários textos e passou a fazer parte da teoria psicanalítica, sendo utilizado também por autores.” (BERGEL 2017: 1) . Da ambivalência, misto de ódio e apego profundos, que, como vimos, une Freud à cidade que o acolhe, ao sentimento que o distancia da figura paterna, divergente de seus modelos heróicos masculinos. Muito já se escreveu sobre a visão falocêntrica do feminino, na obra de Freud: mulher, esse ser castrado e invejoso, incapaz de alcançar as grandes tarefas da cultura (privilégio dos homens). O pensamento freudiano deixa pistas da definição estrita do que é esperado por ambos os papéis no exercício de suas tarefas. Como não é o objetivo principal do presente artigo, nos restringiremos aos comentários que marcam o noivado do jovem Freud, iniciado em 1862, com Martha Bernays (1861-1951), nascida em Hamburg, Alemanha, com quem virá a se casar somente em 1886. Nos fragmentos destacados, Freud escreve à noiva, sob a influência da obra que traduzira, ainda estudante, Sobre a submissão das mulheres (1879), de John Stuart Mill (1806-1873).

Lembro-me de que um dos argumentos principais na obra que traduzi era de que não seria absolutamente impossível uma mulher casada ganhar tanto dinheiro quanto o marido. Creio que concordamos no fato de que a manutenção da casa, a educação das crianças e o cuidado com elas monopolizam inteiramente um ser humano e excluem qualquer possibilidade de ganhar dinheiro, mesmo quando os trabalhos domésticos são simplificados e a mulher não tem de espanar, arrumar, cozinhar etc. (apudBERTIN 1990BERTIN, Célia. A mulher em Viena nos tempos de Freud. Trad. Marina Appenzeller. Campinas; São Paulo: Papirus, 1990.: 79).

E prossegue que lhe desagradaria ver sua “doce e delicada querida” (idem) como concorrente, cabendo a ela o reino do lar. Segundo ele, o domínio da mulher da chamada “esfera pública” da política, do trabalho e da carreira a afastaria definitivamente da coisa mais deliciosa do mundo: a “feminilidade”. Chama nossa atenção a visão idílica da mulher como “anjo do lar”, espécie de ser constituído somente de afeto: “(...) Acho que todas as reformas legislativas e educativas fracassarão em consequencia do fato de que, bem antes da idade em que um homem pode garantir para si uma boa situação em nossa sociedade, a natureza decide o destino de uma mulher proporcionando-lhe beleza, encanto e bondade.” (grifos nossos, apudBERTIN 1990BERTIN, Célia. A mulher em Viena nos tempos de Freud. Trad. Marina Appenzeller. Campinas; São Paulo: Papirus, 1990.: 80).

Numa leitura sobre raça, gênero e sexualidade no cenário colonial, Mcclintock analisa diversas categorias essenciais ao pensamento freudiano, como fetiche, falo e libido, chegando à conclusão da existência de uma base ideológica patriarcal. Assim, “No cenário freudiano clássico, as mulheres são reduzidas a uma função menor - na melhor das hipóteses como notas de rodapé, e depois esquecidas.” (2010: 273). Segundo a teórica, um dos conceitos considerados “universais”, na visão freudiana, a libido, vincula-se a uma matriz masculina. Sua aparente unicidade e universalidade significa “masculino”, uma vez que parte de um arcabouço idealizado a partir do padrão masculino. Em outras palavras, [a libido] pode ser justificadamente dita “masculina”, enquanto a justaposição “libido feminina” não tem qualquer justificativa.” (2010: 287). E sobre o falocentrismo, é óbvio, segundo Mcclintock que o pênis em si não se reveste de poder. Tal potência é simbólica, devido justamente ao privilégio social dos homens: “Em suma, o falo é poderoso não por simbolizar o pênis (o que ele faz e não faz), mas porque é o signo do poder masculino.” (2010: 299).

Enquanto parece profetizar o “destino de mulher”4 4 "Ninguém nasce mulher, torna-se mulher. Nenhum destino biológico, psíquico, econômico, define a forma que a fêmea humana assume no seio da sociedade, é o conjunto da civilização que elabora esse produto intermediário entre o macho e o castrado, que qualificam de feminino.” (2019 [1949]: 11). contra o qual se ergue Simone de Beauvoir (1908-1986), décadas depois, o jovem Freud demarca com delicada precisão as atribuições de cada sexo, instituindo à mulher o peso do universo doméstico e da criação dos filhos, enquanto ao homem pertence a dura tarefa de prover os recursos financeiros da família e administrar sua carreira. Dentre os que já se debruçaram sobre as relações de Freud com os sexos e os gêneros, destacamos Peter Gay (1990GAY, Peter. Sigmund Freud: um alemão e seus dissabores. In: SOUZA, Paulo César et alii (Orgs.). Sigmund Freud e O Gabinete do Dr Lacan. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1990, 1-71.). O masculino, regido pela ambivalência de sentimentos; o feminino, pelo fascínio. Dito de outro modo, do pai, a herança de um permanente desconforto; da mãe, um apaixonamento por essa autêntica “mama ídiche”, bela, jovem, aquela que o chamava mein goldener Sigi, “meu Sigi de ouro”, e que lhe garantia o privilégio de um gabinete repleto de livros e do silêncio durante os estudos − para que o brilhante aluno do Gymnasium pudesse estudar, nem a sua irmã era permitido que praticasse as lições de piano.

Se, por um lado, é inegável a importância do pensamento freudiano ao inaugurar um contra-discurso, (re) definindo neuroses, psicoses e perversões, fugindo da vasta gama de quadros psicopatológicos propostos pela Medicina da época, por outro, o percurso edípico funciona como um redutor das possibilidades de expressão de subjetividades. Como defende Molina (2010MOLINA, José Arthur. O que Freud dizia sobre as mulheres. Tese (Doutorado em Letras) - Faculdade de Ciências e Letras de Assis, Universidade Estadual Paulista, São Paulo, 2010.), Freud apresenta, em sua leitura do “feminino”, um “Fundamentalismo fálico”, aliado a um saber, no fundo, conservador. “Solidário com as histéricas, mas enclausurado numa lógica fálica.” (MOLINA 2010MOLINA, José Arthur. O que Freud dizia sobre as mulheres. Tese (Doutorado em Letras) - Faculdade de Ciências e Letras de Assis, Universidade Estadual Paulista, São Paulo, 2010.: 14).

Gay (1990GAY, Peter. Sigmund Freud: um alemão e seus dissabores. In: SOUZA, Paulo César et alii (Orgs.). Sigmund Freud e O Gabinete do Dr Lacan. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1990, 1-71.) destaca, por fim, a morte do pai, em 1896, após uma torturante doença terminal. Cercada pelos costumeiros sentimentos contraditórios, a perda de Jakob impulsiona Freud a escrever, a se analisar, ou seja, sem essa perda, ele não teria se lançado na empreitada de criação dos primeiros escritos psicanalíticos. Treze anos depois, no prefácio à segunda edição d´a Interpretação dos Sonhos, viria a notar que a morte do pai o enredou na exploração de sua história.

O livro sobre os sonhos, escreveu, “foi um pedaço de minha auto-análise, minha reação à morte de meu pai - isto é, ao acontecimento mais significativo, à perda mais decisiva na vida de um homem”. A morte foi o último serviço, por assim dizer, que seu pai lhe prestou; ela o ajudou a compreender a operação da ambivalência. (GAY 1990GAY, Peter. Sigmund Freud: um alemão e seus dissabores. In: SOUZA, Paulo César et alii (Orgs.). Sigmund Freud e O Gabinete do Dr Lacan. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1990, 1-71.: 63).

(Des)Territórios

De acordo com Schorske (1988SCHORSKE, Carl E. Viena fin-de-siècle: política e cultura. Trad. Denise Bottmann. São Paulo: Companhia das Letras , 1988.), Freud rejeitou o realismo fisicista no qual tinha sido criado, soltando as amarras biológicas e anatômicas de seu campo de atuação, mergulhando em si. O resultado mais imediato foi a resistência da ortodoxia acadêmica liberal-racionalista e dos anti-semitas. Isso levou Freud a praticamente retirar-se da cena pública, permanecendo junto a um círculo restrito e fiel, com vistas a preservar o novo terreno que conquistara.

O período no qual surge a Psicanálise é marcado por um “reembaralhamento do eu” (SCHORSKE 1988SCHORSKE, Carl E. Viena fin-de-siècle: política e cultura. Trad. Denise Bottmann. São Paulo: Companhia das Letras , 1988.: 203), pela transição, caracterizado por uma crise da cultura: uma combinação ambígua entre revolta edípica coletiva e busca narcisista de um novo eu. Nas artes plásticas, o movimento da Secessão, liderado por Gustav Klimt (1862-1918) expressa a busca por uma nova direção na vida por meio das formas visuais.

Num recorte temporal mais preciso, entre 1890 e 1910, germina e floresce o período que os historiadores intitulam de “Modernidade Vienense” (Wiener Moderne). Trata-se de um interregno de duas décadas, no resultado das mudanças políticas, sociais e culturais provocadas pelas revoluções burguesas de 1848, cujo produto mais visível é a coincidência de novos movimentos em vários campos: filosofia − positivismo, epistemologia, fenomenologia e filosofia da linguagem, com nomes como Ernst Mach (1838-1916) e Franz Brenntano (1838-1917), − ciências humanas, como na psicanálise de Sigmund Freud, − ciências sociais economia política e direito, como em Carl Menger (1840-1921), literatura − como no movimento da “Jovem Viena”, a Jung Wien, de Hugo von Hoffmannsthal (1874-1929) e Arthur Schnitzler (1862-1931), artes plásticas − além de Klimt, no expressionismo de Egon Schiele (1890-1918) e Oskar Kokoschka (1886-1980), música − como nas composições de Gustav Mahler (1860-1911) e Arnold Schönberg (1874-1951), e até na política − como nas tendências de anti-semitismo e no austro-marxismo (LE RIDER 1993LE RIDER, Jacques. A Modernidade Vienense e as crises de identidade. Trad. Elena Gaidano. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1993.: 23).

Determinados traços característicos dessa Modernidade explicam-se pela situação sociocultural da monarquia austro-húngara, cujo centro nervoso é, justamente, a cidade de Viena. “(...) Caso comparada com outras grandes capitais européias como Londres, Paris ou Berlim, Viena desempenha, no final do século XIX, o papel de retardatária por causa de suas estruturas sociais, econômicas e políticas.” (LE RIDER 1993LE RIDER, Jacques. A Modernidade Vienense e as crises de identidade. Trad. Elena Gaidano. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1993.: 24). O modelo social-aristocrático é marcante, levando a uma modernidade cultural inicialmente pautada em padrões alemães, franceses, escandinavos, italianos e americanos. Entre vários fatores e aspectos do “atraso austríaco” (LE RIDER 1993LE RIDER, Jacques. A Modernidade Vienense e as crises de identidade. Trad. Elena Gaidano. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1993.: 32), podemos citar a preponderância do setor agrário, a mentalidade burocrática, dirigista e protecionista, o capitalismo de Estado, e até a predileção por artigos de luxo e o desenvolvimento do setor das artes decorativas, cujo campo irá florescer melhor do que em qualquer outro lugar, a partir do Jugendstil (Art Noveau). Por outro lado, um amplo movimento de imigração proveniente dos territórios situados ao leste da monarquia provoca a renovação da população vienense e de suas culturas populares, levando essa cidade a concentrar alguns dos melhores talentos de todo o império, como Sigmund Freud.

Falecido em 1939, no exílio londrino (sua “Londres-Egito”, como o intitula Betty Fuks), Freud é um filho do século XIX, espectador privilegiado das mudanças profundas trazidas com o advento da Modernidade e, sobretudo, personagem da Wiener Moderne. Seu pensamento, portanto, pode ser entendido como um amálgama de ecos românticos, iluministas, “vitorianos” (FOUCAULT 2008FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade: a vontade de saber. v. I. São Paulo: Paz e Terra, 2008.), modernos. Pautamo-nos no que Tavares (2007TAVARES, P. H. M. B. Freud e Schnitzler: sonho sujeito ao olhar. São Paulo: Annablume, 2007.) denomina de Ortgeist (2007), isto é, Viena alimenta decisivamente obras, personagens, teorias. Defende-se, assim, a visão de que a obra de Freud, assim como as de Schnitzler, Klimt e Schiele não teriam sido possíveis em outro solo, em outra época. Isto é, a “Viena de Freud”, para empregar a expressão que dá nome ao volume de ensaios de Bruno Bettelheim (1991BETTELHEIM, B. A Viena de Freud e outros ensaios. Rio de Janeiro: Campus, 1991.) aparece imbricada à produção de seus atores, Zeitgeist, Ortgeist, realidade, ficção e história:

Não [grifo do autor] foi por acaso que a Psicanálise nasceu em Viena e ali atingiu a maturidade. No tempo de Freud, a atmosfera cultural estimulava a fascinação por doenças mentais e problemas sexuais de forma singular no mundo ocidental - uma fascinação que se estendia à sociedade, e até à corte imperial que dominava a vida social vienense. (BETTELHEIM 1991BETTELHEIM, B. A Viena de Freud e outros ensaios. Rio de Janeiro: Campus, 1991.: 3).

Para Roudinesco (2000ROUDINESCO, Elisabeth. Por que a Psicanálise? Rio de Janeiro: Zahar, 2000.), o Complexo de Édipo e a decadência do poder paterno estariam imbricados à Viena de Freud. Forjado pelo psicanalista, o modelo edipiano tinha como pano de fundo a sociedade vienense do fim do século, atormentada por sua própria agonia, sensualidade vergonhosa e seu culto à atemporalidade.

Não somente os pais perdiam a sua autoridade à medida que a monarquia dos Habsburgo progressivamente afundava sob o peso de sua arrogância, quanto o corpo das mulheres parecia ameaçado pela irrupção de um possante desejo de gozo. (ROUDINESCO 2000ROUDINESCO, Elisabeth. Por que a Psicanálise? Rio de Janeiro: Zahar, 2000.: 160).

No pólo oposto, a violência do exílio forçado de judeus e intelectuais contrários aos preceitos do Nacionalsocialismo, na Áustria, encontra ecos na autobiografia de outro personagem do período, célebre escritor, amigo e correspondente de Freud: Stefan Zweig (1881-1942). Em O mundo de ontem (Die Welt von gestern, 2014 [1942]), ele rememora a ruptura causada pela fuga, com a estabilidade até então gozada por inúmeras famílias judias na Áustria imperial:

Despreendido de todas as raízes e do solo que as alimenta: é assim que estou de fato, como raras vezes alguém esteve ao logo dos tempos. Nasci em 1881 em um grande e poderoso império, a monarquia dos Habsburgo. (...) Cresci em Viena, a metrópole supranacional de dois mil anos, e tive de deixá-la como criminoso, antes de ser rebaixada a uma cidade provincial alemã. O meu trabalho literário foi incinerado na língua em que o escrevi, no mesmo país onde meus livros ganharam como amigos milhões de leitores. (2014 [1942]: 14).

Figurando entre os 170 mil judeus que viviam em Viena, quando da Anschluss levada a cabo por Hitler, Freud registrou em seu diário, “Finis Austría”, “fim da Áustria”, em 12 de março de 1938. O Führer foi calorosamente recebido em todo o país, ovacionado por multidões hipnotizadas, que lhe jogavam flores. Segundo Edmundson (2009EDMUNDSON, Mark. A morte de Freud: o legado de seus últimos dias. Trad. Luciano Trigo. Rio de Janeiro: Odisseia Editorial, 2009.), “[As palavras de Freud] representavam o fim de uma cultura, centrada em Viena, que era cosmopolita, ao menos na aparência, tolerante, nada carente de sofisticação, devotada à arte e à ciência - e relativamente segura para os judeus.” (2009: 41).

Judeus na Áustria

A comunidade judaica cresceu enormemente durante a segunda metade do século XIX, consequência do êxodo das regiões mais atrasadas do império dos Habsburgos. Em 1860, ano em que a família Freud chega a Viena, a percentagem de judeus na população era de 1,5 por cento. Trinta anos depois, era de dez por cento. A decisão de Jakob Freud, de abandonar a pequena cidade da Morávia, onde fracassou com seu comércio de lã, para tentar a vida na capital, foi típica de milhares de famílias judias.

Uma anedota da época dizia que a primeira geração de emigrantes judeus era de vendedores ambulantes, a segunda de banqueiros e industriais, a terceira de médicos, advogados e artistas. Pois o característico impulso a destacar-se, a ser melhor que os demais, fazia com que em pouco tempo os descendentes dos emigrantes dominassem também nas profissões liberais e nas artes. (SOUZA 1990SOUZA, Paulo César. Uma visita à casa de Freud. In: SOUZA, Paulo César et alii (Orgs.). Sigmund Freud e O Gabinete do Dr Lacan. 2. ed. São Paulo: Brasiliense , 1990, 131-141.: 140).

Fuks (2000FUKS, Betty B. Freud e a Judeidade: a vocação do exílio. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.) sustenta que o movimento de emancipação dos judeus se iniciou com atraso, na Áustria, em relação à maioria dos países europeus - apenas em 1848 foram agraciados com a completa emancipação; a qual foi somente concretizada em 1867. Dessa forma, com o triunfo do liberalismo político, em 1867, os judeus puderam se beneficiar da plena igualdade de direitos civis:

Mas alcançar o registro de cidadão e aderir com entusiasmo às mudanças propostas pelo movimento de emancipação não foi um processo que ocorreu linearmente e sem sacrifícios. Os judeus tiveram que enfrentar uma forte resistência de uma cultura liberal germânica, que continuava a estigmatizá-los a partir de uma série de preconceitos instalados no imaginário do Ocidente desde a Idade Média. (FUKS 2000FUKS, Betty B. Freud e a Judeidade: a vocação do exílio. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.: 22).

Gay (1990GAY, Peter. Sigmund Freud: um alemão e seus dissabores. In: SOUZA, Paulo César et alii (Orgs.). Sigmund Freud e O Gabinete do Dr Lacan. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1990, 1-71.) destaca que Freud persistiu em trabalhar com a psicanálise e em se denominar judeu, havendo, nessa lealdade, uma espécie de desafio. O oposto de um homem religioso, Freud, com seu conceito de religião como uma ilusão semelhante à neurose, terminava por explicar a própria fé de seus antepassados. Em síntese, “o vínculo que sentia com o judaísmo era o reconhecimento de um destino comum dentro de um mundo hostil.” (GAY 1990GAY, Peter. Sigmund Freud: um alemão e seus dissabores. In: SOUZA, Paulo César et alii (Orgs.). Sigmund Freud e O Gabinete do Dr Lacan. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1990, 1-71.: 54).

Pode-se dizer que, na “Áustria de Freud”, o judeu era tudo aquilo que o ariano não era: uma raça de seres intrinsicamente patológicos, sexualmente degenerados, portadores e transmissores de doenças (NAZÁRIO 2002NAZÁRIO, Luiz. O Expressionismo e o Nazismo. In: GUINSBURG, J. (Org.). O Expressionismo. São Paulo: Perspectiva, 2002, 49-720.). Já preconizara Freud, em sua Psicologia das Massas e Análise do Eu (Massenpsychologie und Ich-Analyse, 2011 [1921]) que o sentimento de comunidade das massas exige a hostilidade para com os não-idênticos, legitimando o poder de dominação sobre eles. Nesse ensaio, são explicadas algumas das malhas fascinantes dos jogos identificatórios com o líder, movidos pela crença na hegemonia do eu e no esvaziamento da alteridade. A “Barbárie”, na Antigüidade, era sempre identificada com o elemento estrangeiro; isto é, “bárbaro” seria aquele que existia fora das fronteiras do império. Logo, de certa forma, em nome dos ideais civilizatórios, sublimatórios, a Barbárie é atualizada, simplesmente ao rotular o estranho, o estrangeiro, como aquele Outro, cuja alteridade desafia permanentemente os valores propagados pela maioria.

Ainda que complexo e singular, o sentimento de ser judeu criou, em Freud, um elo íntimo entre ele e Viena.

Pois Viena, que na realidade nunca foi a cidade das operetas e dos flertes, era , já na época de Freud, uma cidade de tristes preliminares: fez com que o judeu Freud sofresse ainda mais por ser judeu do que por ser Freud. Laboratório de todas as espécies conhecidas de anti-semitismo, Viena praticamente obrigou Freud a considerar-se uma entre muitas vítimas potenciais, um entre os judeus de Viena. Foi um papel que assumiu com sua costumeira coragem. (GAY 1990GAY, Peter. Sigmund Freud: um alemão e seus dissabores. In: SOUZA, Paulo César et alii (Orgs.). Sigmund Freud e O Gabinete do Dr Lacan. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1990, 1-71.: 54).

Além do primeiro vínculo de Freud com o judaísmo, centrando-se na herança paterna, o diálogo do “Pai da Psicanálise” com a tradição judaica foi bastante profícuo. Seu proclamado ateísmo sempre caminhou lado a lado das críticas contudentes à religião, lida como fruto do desamparo humano. Tais críticas configuram um percurso, iniciado por Totem & Tabu (Totem und Tabu: Einige Übereinstimmungen im Seelenleben der Wilden und der Neurotiker, 2012 [1913]FREUD, Sigmund. Totem e Tabu, Contribuição à história do movimento psicanalítico e outros textos. Obras completas. v. 11. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras , 2012 [1912-1914].), O Futuro de uma ilusão (Die Zukunft einer Illusion, 2014 [1927]FREUD, Sigmund. O futuro de uma ilusão e outros textos. Obras completas. v. 17. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras , 2014 [1926-1929].), Moisés e o Monoteísmo (Der Mann Moses und die monotheistische Religion: drei Abhandlungen, 2018 [1939]FREUD, Sigmund. Moisés e o monoteísmo, Compêndio de psicanálise e outros textos. Obras completas. v. 19. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras , 2018 [1937-1939].). Dessas obras, as quais articulam um diálogo enriquecido ainda por O mal estar na civilização (Das Unbehagen in der Kultur, 1929), é Móises e o Monoteísmo, pela sua data de publicação e pela temática diretamente ligada ao judaísmo, uma espécie de testamento, epílogo de uma vida dedicada a defender as viscissitudes da errância e do nomadismo do desejo. Assim, o judaísmo apresenta-se como concepção ética, religião, sistema de pensamento. Vale mencionar também que Freud começou a escrever esse livro quando os nazistas queimavam outras obras suas. Ele prosseguiu com o texto, entre os anos de 1934 e 1938, em plena ascensão do Nacionalsocialismo.

Said (2004SAID, Edward W. Freud e os não-europeus. Trad. Arlene Clemesha. São Paulo: Boitempo, 2004.) insiste no pertencimento de Freud à uma proeminente “inteligência judaica” Em língua alemã, são freqüentemente nomes como Heinrich Heine (1797-1856), Karl Marx (1818-1883), Arthur Schnitzler (1862-1931), Franz Kafka (1883-1924), Walter Benjamin (1892-1940), Albert Einstein (1879-1955). Valendo-se da emancipação, esses intelectuais souberam beber nas fontes das duas culturas - a alemã e a judaica. Por outro lado, alguns dados históricos nos levam a questionar a dimensão dessa “assimilação”: 2% dos professores universitários na Áustria eram judeus. Na trajetória acadêmica do próprio Freud, ele precisou esperar 17 anos para tornar-se professor da faculdade de medicina.

Said (2004SAID, Edward W. Freud e os não-europeus. Trad. Arlene Clemesha. São Paulo: Boitempo, 2004.) destaca a universalidade do pensamento construído por intelectuais judeus. Outros fatores significativos, segundo o teórico, são a ancestralidade, o trânsito entre a identidade e a diferença, um movimento marcado pela diáspora e avesso às particularidades e aos nacionalismos.

Poderia então enunciar teses universalistas, justamente porque não ficaria restrita aos particularismos nacionais. O que explica o fato de autores cruciais no Ocidente, como Espinoza, Marx e Freud, todos judeus, terem conseguido constituir leituras universalistas sobre a natureza, o desejo, a história e o inconsciente, que outras tradições culturais não conseguiram, restritas aos seus particularismos. (SAID 2004SAID, Edward W. Freud e os não-europeus. Trad. Arlene Clemesha. São Paulo: Boitempo, 2004.: 28).

Quando de seu surgimento, a psicanálise é recebida como uma ciência judaica. Opõe-se à maioria. Foi inicialmente recebida, pela comunidade médica da época, como um sistema especulativo e de premissas pouco claras e precisas. Porém, enfrentar as coisas como elas são é o que caracteriza a vida de Freud. Ser o destruidor das ilusões humanas, como foi Freud pelas intenções e pelos resultados, significa transformar-se num alvo especial dos anti-semitas. “Esteja certo”, escreveu Freud no verão de 1908 a seu brilhante discípulo Karl Abraham, “se meu nome fosse Oberhuber minhas inovações teriam encontrado muito menos resistência, apesar de tudo” (GAY 1990GAY, Peter. Sigmund Freud: um alemão e seus dissabores. In: SOUZA, Paulo César et alii (Orgs.). Sigmund Freud e O Gabinete do Dr Lacan. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1990, 1-71.: 54).

Todavia, segundo seu criador, a Psicanálise não é judia, nem católica, nem pagã. Com vistas a estabelecer-se enquanto discurso científico, distanciando-se de uma mera Weltanschauung, a psicanálise deve transcender qualquer identidade nacional. Idealizada, portanto, com a marca de outros saberes, podendo estar em qualquer lugar e, ao mesmo tempo, buscar no exílio, na errância, sua cidadania. Trata-se de uma ciência em movimento, capaz de transcender seu campo de saber, a psiquê, o psiquismo humano - algo, por si só, dinâmico. A Psicanálise, portanto, institui-se como um saber sobre o inconsciente.

Um dos pontos destacados por Derrida, apoiando-se no já citado estudo de Yerushalmi é a oposição entre um judaísmo “terminável”, e uma judeidade “interminável”, capaz de sobreviver ao judaísmo. A judeidade configura-se como herança, em relação ao judaísmo.

Para Yerushalmi, há uma essência determinante e irredutível da judeidade: ela já está e não espera o futuro. E esta essência da judeidade não se confunde nem com o judaísmo nem com a religião, nem mesmo com a crença em Deus. Ora, a judeidade que não espera o futuro é justamente a espera do futuro, a abertura da relação com o futuro, a experiência do futuro. Aí estaria a peculiaridade do “judeu”, algo unicamente seu: não somente a esperança, não apenas uma esperança no futuro (hope for the future)”, mas ainda a antecipação de uma esperança específica no futuro (the antecipation of a specific hope for the future). (DERRIDA 2001DERRIDA, Jacques. Mal de arquivo: uma impressão freudiana. Trad. Claudia de Morais Rego. Relume Dumará: Rio de Janeiro, 2001.: 93).

Em certa medida, a judeidade remeteria à escolha, ligando-se à promessa, à esperança no futuro ao passado, tanto quanto evoca a memória.

Sem dúvida, é Jacques Lacan (1901-1981), quem consagra a dimensão do Outro. Freud não designou tão claramente essa instância, em suas teorias, mas atrelou permanentemente ao saber que fundou a presença da “inquietante estranheza”, do “sinistro familiar”, do unheimlich: o descentramento do saber inconsciente, o lugar da alteridade, o estrangeiro que perturba quem está em casa. A concepção do Outro freudiano, além do unheimlich, é, desde sempre, o Outro dos laços atados/desatados ao longo da vida, a alteridade que nos completa como sujeitos sociais. É na introdução do já citado Psicologia das massas e análise do eu que Freud defende que há um vínculo determinante entre o individual e o social:

Na vida psíquica do ser individual, o Outro é via de regra considerado enquanto modelo, objeto, auxiliador e adversário, e portanto a psicologia individual é também, desde o início, psicologia social, num sentido ampliado, mas inteiramente justificado. (2011 [1921]: 14).

Em sua vocação (des)territorial(izante), a Psicanálise defende o domínio de um modelo pulsional para o psiquismo. Conceito basilar, a Pulsão define-se como uma forma de saber extraterritorial, sem identidade possível. Em outras palavras, a pátria da psicanálise não é nem a biologia, nem a psicologia, mas sustenta-se sobre a pulsão, conceito limítrofe entre o psíquico e o somático, entre o que recebeu sentido e o que não se inscreveu. “Ela [a Pulsão] é o mito da diáspora do sujeito freudiano, aquele que está entre-dois - o corpo e a linguagem.” (FUKS 2000FUKS, Betty B. Freud e a Judeidade: a vocação do exílio. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.: 60).

Mulheres, Crianças, Mitos, Sonhos

Nos primeiros escritos de Freud, nos Estudos sobre a Histeria (Studien zur Hysterie, 1895), em parceria com Josef Breuer (1842-1925), as narrativas de Anna O, Katharina, Miss Lucy, Srta. Emmy von N, ganham vida pela escuta clínica. A escuta das histéricas é o pontapé inicial da talking cure, da “cura pela fala”, como a intitula Anna O., codinome de Bertha Pappenheim (1859-1936). A psicose dá lugar ao método catártico que permite a “limpeza da chaminé”, uma outra expressão da célebre paciente, pois declara obter alívio das alucinações que a afligem, a partir da fala. Os Estudos sobre a histeria revelam que adoecer de amor é fazer sintoma. O sintoma é um derivado do recalcado, território estrangeiro do eu. No fundo, a proposta é simples: a recusa de uma visão patologizante, e em seu lugar, o acolhimento das moções efetivas do paciente − amor e ódio, os afetos, as ambivalências. Dessa maneira, a Psicanálise, desde seu início, lida com figuras estigmatizadas, colocadas às margens, isto é, a criança (com a constatação de que o infantil é sexualizado) e a mulher (com a escuta das histéricas), e com matrizes rechaçadas pela lógica científica racional, como os mitos e os sonhos. Consideradas marcas do arcaico no contexto sociopolítico da modernidade, tais traços deveriam ser recalcados. Logo em seguida, com a publicação da Interpretação dos Sonhos, é a vez do tecido onírico, velho companheiro da humanidade, ganhar novas roupagens, novo status. Novamente, o discurso psicanalítico contrapõe-se à racionalidade objetiva e fria da ciência tradicional, aquela que passara a considerar os sonhos matéria-prima dos poetas, dos charlatões e dos místicos.

Como sustenta Neri (2005NERI, Regina. A Psicanálise e o Feminino: um Horizonte da Modernidade. Novas Configurações da Diferença Sexual. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2005.), é a primeira vez, portanto, que um discurso, opondo-se à racionalidade filosófica, se inaugura sob a égide do feminino (questionando, igualmente, a diferença sobre os sexos), numa dupla perspectiva: 1) enunciado a partir do discurso das mulheres; 2) constituído sobre o feminino como interrogação primeira e fundante de seu aparato teórico. A psicanálise não é filha do feminino, mas do império do feminino. Num movimento duplo de enxergar na histérica uma patologia, a visão freudiana questiona o modelo até então vigente, da histérica por simulação. “O sintoma histérico é portador de uma verdade e de um sentido a ser decifrado.” (NERI 2005NERI, Regina. A Psicanálise e o Feminino: um Horizonte da Modernidade. Novas Configurações da Diferença Sexual. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2005.: 115).

A mulher figura no coração da da modernidade vienense, assim como na motivação de vários de seus criadores. Os papéis de gênero são (re) trabalhados, levando ao interesse pela androgenia, por exemplo, ou pelo feminino. O fin-de-siècle traz uma feminilidade que afeta o domínio masculino. Engana-se, contudo, quem vê nesse movimento algum traço militante feminista. O feminino é, tão somente, marca da alteridade, que se configura na luta contra o mundo burguês da ordem, do catolicismo, da razão, calando o erótico, o bizarro, o inconsciente, a magia e o mito. Moralmente falido, o racionalismo do século anterior enfrenta as visões finiseculares e o amanhecer do novo século. A mulher é, nesse sentido, uma grande metáfora para um outro lado, uma nova lógica possível, marca do arcaico que desafia o moderno.

Como exposto anteriormente, além das figuras da mulher (mesmo que se trate de uma visão plena de contradições), da criança (a “descoberta” da sexualidade infantil), os sonhos (“via-régia do inconsciente”) e os mitos compõem matrizes sobre as quais se ergue o edifício teórico freudiano. Os mitos, além de iluminarem conceitos, conferem força de expressão ao pensamento, tecendo fantasias, remetendo aos conteúdos dos sonhos e o do inconsciente. Assim, falando especificamente sobre a descoberta freudiana, Fuks (2000FUKS, Betty B. Freud e a Judeidade: a vocação do exílio. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.) sustenta que:

Édipo e Narciso, dois dos grandes tesouros da mitologia grega, entraram para a psicanálise como modelos, figuras conceituais privilegiadas da fundação do inconsciente e da formação do eu. Reconhecer nos mitos gregos um pensamento autônomo, com sua lógica e seu modo de experiência, levou Freud a aproximá-los do sonho: ambos são vias de acesso ao real. (FUKS 2000FUKS, Betty B. Freud e a Judeidade: a vocação do exílio. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.: 59).

Pode-se dizer que, a despeito das resistências da tradição médica estabelecida e dos anti-semitas, Freud adiantou-se aos modernos, encontrando nos mitos de um passado remoto, formas da cultura como narrativas vinculadas à realidade atual. Associando-se à natureza, possuem grande eficácia simbólica.

Finalmente, o maior ensinamento que o tema das relações entre Freud e o judaísmo pode nos oferecer é um posicionamento do próprio Freud, um indivíduo que enfrentava os obstáculos com sua “costumeira coragem” (1990: 54), como atesta seu maior biógrafo, Peter Gay. Aceitar ser um intelectual judeu, nesse contexto, é encontrar-se numa posição de isolamento. Porém, a hostilidade do meio foi também uma permanente fonte de estímulo e de energia. Quando estudante, a percepção de que era tido como inferior e “estranho” pela maioria dos colegas, devido a sua ascendência, preparou o caminho para a futura solidão intelectual e independência de julgamento.

Logo, Freud, estigmatizado como judeu, tirou vantagem do isolamento, desenvolvendo uma notável resistência. É conhecido o conselho de Freud a Max Graf (1873-1958), pai do “Pequeno Hans”

Se não deixar seu filho crescer como judeu, vai privá-lo dessas fontes de energia que nao podem ser substituídas por nada. Ele terá de combater como um judeu, e o senhor deve desenvolver nele toda a energia de que precisará para esse combate. Não o prive dessa vantagem. (FUKS 2000FUKS, Betty B. Freud e a Judeidade: a vocação do exílio. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.: 30).

Apoiando-se nesse traço de resistência presente na biografia de Freud e nos caminhos da psicanálise, Yerushalmi destaca os seguintes elementos: “Intelectualismo e independência de espírito, os mais elevados padrões éticos e morais, preocupação com justiça social, tenacidade diante da perseguição.” (1992: 33). Desse testamento freudiano, Derrida ressalta “o princípio arcôntico5 5 Relativo a Arconte, isto é, magistrado da Antiga Grécia com poder de legislar e importância vitalícia próxima à realeza. Posteriormente, reduziu-se a um cargo meramente honorífico (HOUAISS 2004: 279). do arquivo”, vinculado à domiciliação, à filiação. Contudo, retomando o princípio da ambivalência, a presença do filho significa a morte do pai, mas que sobrevive nesse filho.

Ninguém analisou melhor que ele, o que é o mesmo que dizer desconstruiu melhor que ele a autoridade do princípio arcôntico. Ninguém melhor que Freud mostrou como este princípio arcôntico, isto é, paternal e patriarcal, não se colocava senão se repetindo e não retornava para se re-colocar senão no parricídio. Retorna no parricídio recalcado ou reprimido do nome do pai como pai morto. (2001: 123).

Para a existência de Um, deve haver o assassinato, a ferida, o traumatismo. Sendo assim, tanto em sua vida quanto em suas teorias, Freud repetiu a lógica patriarcal. Para Derrida, no Homem dos Ratos (Der Rattenmann, 1909), lembrou que o direito patriarcal (Vaterrecht) marcava o progresso civilizador da razão. Com a propagação de sua obra, deu-se uma promessa patriarcal, voltada para união de todos os seus “herdeiros”, psicanalistas de todos os países que podem falar em nome do “Pai” e seguir seus ensinamentos, “A tal ponto que, decênios após sua morte, alguns podem se perguntar se seus filhos, tanto quanto seus irmãos, ainda podem falar sem seu próprio nome.” (DERRIDA 2001DERRIDA, Jacques. Mal de arquivo: uma impressão freudiana. Trad. Claudia de Morais Rego. Relume Dumará: Rio de Janeiro, 2001.: 123).

A consciência do anti-semitismo alia-se ao assombro de pertencimento/não pertencimento, estando, ao mesmo tempo, dentro e fora dessa cultura, como ateu; ao reconhecer-se como judeu, Freud lê criticamente a história judaica, no testamento de Moisés e o Monoteísmo. Ser um judeu sem Deus é equivalente a um grande enigma a ser decifrado (GAY 1990GAY, Peter. Sigmund Freud: um alemão e seus dissabores. In: SOUZA, Paulo César et alii (Orgs.). Sigmund Freud e O Gabinete do Dr Lacan. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1990, 1-71.). A herança paterna, prova indelével de seu judaísmo, desperta os sentimentos ambivalentes de amor-ódio tão compreendidos pelo discurso psicanalítico; a morte de Jakob desencadeia o início da auto-análise, estabelecendo o onírico como um universo inconsciente a ser decifrado. A morte do pai irá, igualmente, trazê-lo para sempre dentro si, internalizá-lo, pois no mito do “banquete totêmico” (Totem & Tabu), Freud afirma como proceder diante da herança paterna, ao assimiliar as palavras do Fausto, de Goethe (1749-1832): “Was du ererbt von deinem Vätern hast, erwirb es, um es zu besitzen.”, (“aquilo que herdaste de teus pais, conquista-o para fazê-lo teu.” (2012 [1912-1913]FREUD, Sigmund. Totem e Tabu, Contribuição à história do movimento psicanalítico e outros textos. Obras completas. v. 11. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras , 2012 [1912-1914].: 240).

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  • TAVARES, P. H. M. B. Freud e Schnitzler: sonho sujeito ao olhar. São Paulo: Annablume, 2007.
  • YERUSHALMI, Yosef Hayim. O moisés de Freud: judaísmo terminável e interminável. Rio de Janeiro: Imago, 1992.
  • ZEYRINGER, Klaus; GOLLNER, Helmut. Áustria: uma história literária. Literatura, cultura e sociedade desde 1650. Trad. e Adaptação Ruth Bohunovsky. Curitiba, Paraná: Editora UFPR, 2019.
  • ZWEIG, Stefan. Autobiografia: o mundo de ontem. Trad. Kristina Michahelles. Prefácio e Posfácio: Alberto Dines. Rio de Janeiro: Zahar , 2014 [1942].
  • 2
    Expressão do escritor austríaco Karl Kraus (1874-1936), conhecido por sua veia crítica e ácida. (ZEYRINGER; GOLLNER 2019ZEYRINGER, Klaus; GOLLNER, Helmut. Áustria: uma história literária. Literatura, cultura e sociedade desde 1650. Trad. e Adaptação Ruth Bohunovsky. Curitiba, Paraná: Editora UFPR, 2019.: 388).
  • 3
    “Termo utilizado em psicanálise para designar a presença simultânea e conflitante em um mesmo sujeito de sentimentos e tendências opostas em relação a um objeto ou a uma pessoa. Encontramos o par de opostos sim e não, afirmação e negação, de forma concomitante e indissociável. Criado por Bleuler (1910), o termo foi utilizado por Freud em vários textos e passou a fazer parte da teoria psicanalítica, sendo utilizado também por autores.” (BERGEL 2017BERGEL, Marli. ‘Alguns dos vocabulários mais usados em psicanálise’. In: FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE PSICANÁLISE. Esboços psicanalíticos. Rio de Janeiro, 2017. Disponível em: Disponível em: https://www.febrapsi.org/wp-content/uploads/2017/02/ambivalencia--marli-bergel.pdf (02/02/2021).
    https://www.febrapsi.org/wp-content/uplo...
    : 1)
  • 4
    "Ninguém nasce mulher, torna-se mulher. Nenhum destino biológico, psíquico, econômico, define a forma que a fêmea humana assume no seio da sociedade, é o conjunto da civilização que elabora esse produto intermediário entre o macho e o castrado, que qualificam de feminino.” (2019 [1949]: 11).
  • 5
    Relativo a Arconte, isto é, magistrado da Antiga Grécia com poder de legislar e importância vitalícia próxima à realeza. Posteriormente, reduziu-se a um cargo meramente honorífico (HOUAISS 2004HOUAISS, Antonio. Grande Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004.: 279).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Ago 2021
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2021

Histórico

  • Recebido
    23 Dez 2020
  • Aceito
    22 Fev 2021
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