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Lições de Justiça Reprodutiva para catalisar estratégias de incidência durante a crise do Zika no Brasil

Resumo

Revisitaremos uma constelação de respostas para garantir justiça reprodutiva para mulheres e meninas durante a crise do Zika no Brasil. As ações relatadas foram conduzidas pela Anis – Instituto de Bioética, uma ONG feminista. Argumentamos que, durante as emergências sanitárias, é necessário o uso de lentes feministas interseccionais para construir respostas efetivas e sensíveis às questões de gênero, em favor de mulheres e meninas. Apresentamos três táticas de incidência utilizadas na luta por justiça reprodutiva durante a crise do Zika: 1) construir narrativas baseadas em histórias de vida que retratem os efeitos desproporcionais da crise em mulheres e meninas; 2) produzir dados baseados em evidências para catalisar estratégias de incidência para revisão legal e de políticas públicas; 3) promover oportunidades para o fortalecimento de alianças e movimentos, bem como o compartilhamento de poder por meio de atividades de mobilização comunitária. Reconhecemos a importância de responder às necessidades das populações em tempo real, e para isso torna-se fundamental que as evidências sobre os impactos das emergências em saúde pública sejam produzidas e compartilhadas de maneira ágil. Os esforços em incidência não são estratégias fragmentadas, pois garantir a justiça reprodutiva exige uma estrutura abrangente e transformadora, incluindo soluções que envolvam o cotidiano das pessoas comuns e suas experiências de vida.

Palavras-Chave:
Zika; Justiça reprodutiva; Ações de incidência; Feminismo interseccional; Mobilização comunitária

Abstract

This article aims to revisit a constellation of responses to guarantee reproductive justice for women and girls during the Zika crisis in Brazil, that were conducted by Anis - Institute of Bioethics, a Brazilian feminist NGO. We argue that intersectional feminist lenses and gender-sensitive responses are necessary to build effective efforts for women and girls during a public health emergency. As such, we present three concomitant and intersectional learned tactics we used to fight for reproductive justice during the Zika crises, but also in its aftermath: 1. To build storytelling narratives that portray the disproportional effects of the crisis on women and girls; 2. To produce evidence-based data to catalyze advocacy strategies for legal and policy review; 3. To promote movement building opportunities and sharing power through community mobilization activities. We assume the importance of providing immediate evidence and gender sensitive framings to inform real-time public health responses. Advocacy efforts should not be seen as fragmented strategies, since ensuring reproductive justice demands a comprehensive and transformative framework that include solutions for multiple aspects of real-life experiences.

Keywords:
Zika virus; Reproductive Justice; Advocacy; Intersectional Feminism; Community Mobilization

Introdução

As consequências devastadoras e duradouras do surto de Zika afetaram desproporcionalmente as populações mais vulneráveis no Brasil (Diniz; Brito, 2018DINIZ, D.; BRITO, L. Uma epidemia sem fim: zika e mulheres. In: RIFIOTIS, THEOFILOS; SEGATA, J. (Ed.). Políticas Etnográficas no Campo da Moral. Porto Alegre: UFGRS Editora, 2018. p. 169-181.; Santos et al., 2018SANTOS, B. M. C. et al. Zika: an ongoing threat to women and infants. Cadernos de Saúde Pública, v. 34, n. 11, 8 nov. 2018.). Esse efeito reflete o que as epidemias costumam fazer: exacerbar as desigualdades. As crianças com deficiência e as mulheres suportam o maior fardo. Pesquisadores e ativistas têm discutido que os impactos de longo prazo contra esta população são exacerbados porque os cuidados de saúde sexual e reprodutiva são frequentemente ignorados durante emergências e crises humanitárias (Ambrogi; Brito; Diniz, 2021). No Brasil, as demandas da crise do Zika continuam relevantes e são agravadas pela pandemia da Covid-19. Só em 2020, segundo o Ministério da Saúde, houve 1.007 novos casos notificados de crianças no Brasil com suspeita de síndrome congênita do Zika (SCZ) – uma média de mais de dois casos por dia. As autoridades brasileiras não reportaram dados epidemiológicos durante 2021.

Em 2015 e 2016, o Zika se tornou um tormento para as gestantes que, ao adoecerem, temiam a transmissão vertical do vírus e o risco de complicações graves. Em fevereiro de 2016, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a microcefalia e outras doenças neurológicas relacionadas com o Zika como uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII). Foi a primeira vez que tal declaração foi feita para uma infecção transmitida por mosquito que teve efeitos específicos no processo reprodutivo. Embora infecções por Zika tenham sido relatadas em outros 87 países e territórios até julho de 2019, o Brasil foi o epicentro da crise e de suas consequências (OMS, 2019).

A emergência do Zika revelou-se um espelho das desigualdades no Brasil, de gênero, raça, status socioeconômico, deficiência e região (HRW, 2017HRW. Negleted and unprotected: The Impact of the Zika Outbreak on Women and Girls in Northeastern Brazil. [s.l: s.n.], 2017.). Os autores já apontaram a centralidade das normas de gênero na saúde, incluindo que o gênero precisa ser incluído como um importante determinante da saúde numa perspectiva global (Davies; Bennett, 2016DAVIES, S. E.; BENNETT, B. A gendered human rights analysis of Ebola and Zika: locating gender in global health emergencies. International Affairs, v. 92, n. 5, p. 1041-1060, 2016.; Hawkes; Buse, 2013HAWKES, S.; BUSE, K. Gender and global health: evidence, policy, and inconvenient truths. The Lancet, v. 381, n. 9879, p. 1783-1787, 18 May 2013.). No entanto, a experiência do surto de ebola, por exemplo, expôs a falta de uma perspectiva de gênero durante as respostas de emergência nos países da África Ocidental (Harman, 2016HARMAN, S. Ebola, gender and conspicuously invisible women in global health governance. Third World Quarterly, v. 37, n. 3, p. 524-541, 3 mar. 2016.). Da mesma forma, no Brasil, as respostas públicas ao surto de Zika não foram acompanhadas por esforços interseccionais e sensíveis ao gênero (Davies; Bennett, 2016DAVIES, S. E.; BENNETT, B. A gendered human rights analysis of Ebola and Zika: locating gender in global health emergencies. International Affairs, v. 92, n. 5, p. 1041-1060, 2016.; Wenham et al., 2020WENHAM, C. et al. Gender mainstreaming as a pathway for sustainable arbovirus control in Latin America. PLOS Neglected Tropical Diseases, v. 14, n. 2, p. e0007954-e0007954, fev. 2020.).

Em resposta à crise do Zika, o Anis – Instituto de Bioética, uma ONG feminista sediada no Brasil, criou uma constelação de respostas para lutar pela justiça reprodutiva para mulheres e meninas durante a epidemia e suas consequências (Brito; Rondon, 2020BRITO, L.; RONDON, G. Zika in Brazil: Reproductive Justice in Response to a Humanitarian Crisis. Brasília: 2020.). Inspiradas pelo movimento das mulheres negras, entendemos a justiça reprodutiva como uma exigência de proteção dos direitos das mulheres inserida em um marco de direitos humanos e de justiça social (Ross, 2006ROSS, L. Understanding Reproductive Justice: Transforming the Pro-Choice Movement. Off Our Backs, v. 36, n. 4, p. 14-19, 2006.). As estratégias de defesa incorporadas num compromisso de justiça reprodutiva combinam a saúde e os direitos sexuais e reprodutivos com esforços mais amplos de justiça social. Defendemos, ao mesmo tempo, por exemplo, o acesso ao aborto, mas também um benefício universal de transferência de renda para todas as mulheres e crianças afetadas pela epidemia, para além do acesso a cuidados de saúde especializados para crianças com deficiência. Combinar todas estas estratégias, o que poderia ser, para alguns, considerado contraditório (Mohapatra, 2019MOHAPATRA, S. Law in the Time of Zika: Disability Rights and Reproductive Justice Collide. Brooklyn Law Review, v. 84, n. 2, p. 325-366, 2019.), é uma representação fundamental da nossa compreensão do que uma ética de justiça reprodutiva exige numa crise como a causada pelo vírus Zika.

Este artigo tem como objetivo revisitar as ações de Anis. Argumentamos que lentes feministas interseccionais e respostas sensíveis ao gênero são necessárias para construir esforços eficazes para mulheres e meninas durante uma emergência de saúde pública. Foram propostas lentes feministas interseccionais na agenda da saúde para promover a igualdade de gênero (Davies et al., 2019DAVIES, S. E. et al. Why it must be a feminist global health agenda. Lancet, v. 393, n. 10171, p. 601-603, 9 fev. 2019.; Kapilashrami; Hankivsky, 2018KAPILASHRAMI, A.; HANKIVSKY, O. Intersectionality and why it matters to global health. The Lancet, v. 391, n. 10140, p. 2589-2591, 2018.). Por interseccionalidade entendemos uma perspectiva ética para analisar regimes de poder que oprimem, excluem e violam grupos específicos de pessoas para perpetuar privilégios de outros grupos (Crenshaw, 1989CRENSHAW, Kimberle. Demarginalizing the Intersection of Race and Sex: A Black Feminist Critique of Antidiscrimination Doctrine, Feminist Theory and Antiracist Politics. University of Chicago Legal Forum, v. 1989, n. 1, article 8, 1989.; Sariola, 2020SARIOLA, S. Intersectionality and Community engagement: can solidarity alone solve power differences in global health research? Am J Bioeth., v. 20, n. 5, p. 57-59, 2020.; Brito; Santos; Rego, 2022). Ao compreendermos o feminismo como uma lente de inclusão e diversidade, o feminismo interseccional reconhece os múltiplos fatores que podem violar direitos – tais como raça, gênero, geografia, idade, deficiência, pobreza e muitos outros aspectos que se cruzam e agravam as desigualdades. Neste sentido, o feminismo interseccional considera a diversidade de vozes e experiências daqueles que sofrem de forma diferente a opressão e a discriminação com base no gênero (ONU Mulheres, 2020).

Apresentamos, assim, três táticas interseccionais para promover uma mudança transformadora e sensível às lentes de gênero durante uma crise de saúde pública. Primeiro, construir narrativas que retratem os efeitos desproporcionais da crise nas mulheres e nas meninas; segundo, produzir dados baseados em evidências para catalisar estratégias de incidência para revisão legal e política; terceiro, promover oportunidades de construção de movimentos e compartilhamento de poder por meio de atividades de mobilização comunitária. Todos esses são baseados na nossa experiência e podem ser entendidos como um estudo de caso de como aplicar a justiça reprodutiva às estratégias de defesa de uma ONG feminista no Sul Global. Assumimos a importância de fornecer evidências imediatas e enquadramentos sensíveis ao gênero para informar as respostas de saúde pública em tempo real. As estratégias de incidência (advocacy) são fundamentais para garantir a proteção dos direitos e necessidades das mulheres e crianças afetadas pelas epidemias. Durante uma emergência de saúde pública, os esforços de incidência não devem ser vistos como estratégias fragmentadas, uma vez que garantir a justiça reprodutiva exige uma abordagem abrangente e transformadora que inclua soluções para múltiplos aspectos das experiências da vida real (Ross, 2006ROSS, L. Understanding Reproductive Justice: Transforming the Pro-Choice Movement. Off Our Backs, v. 36, n. 4, p. 14-19, 2006.).

Durante uma crise como a provocada pelo Zika, esta lição foi ainda mais importante, pois foi necessário demonstrar, nas nossas ações, que os direitos sexuais e reprodutivos não estão em conflito com os direitos das pessoas com deficiência (Mohapatra, 2019MOHAPATRA, S. Law in the Time of Zika: Disability Rights and Reproductive Justice Collide. Brooklyn Law Review, v. 84, n. 2, p. 325-366, 2019.). Pelo contrário: um quadro de justiça reprodutiva e de justiça para as pessoas com deficiência exige, ao mesmo tempo, a proteção das diferentes formas de vivenciar o corpo, o cuidado e a dependência, bem como uma atenção especial às condições em que as pessoas vivem a sua sexualidade, reprodução e acesso a recursos e direitos que protejam a maternidade e a infância. Em todas as seções, este pressuposto pode ser entendido como um fundamento da nossa mobilização.

Construindo narrativas: mulheres e meninas no centro da crise da zika

No início do surto de Zika, apesar da excessiva cobertura midiática sobre os efeitos do vírus no desenvolvimento dos bebês, as mulheres e as meninas, bem como suas necessidades, não foram incluídas no centro das narrativas. Em vez disso, foram personagens secundários do quadro de guerra contra os mosquitos e do diagnóstico de microcefalia (Ophir; Jamieson, 2020OPHIR, Y.; JAMIESON, K. H. The Effects of Zika Virus Risk Coverage on Familiarity, Knowledge and Behavior in the U.S. – A Time Series Analysis Combining Content Analysis and a Nationally Representative Survey. Health Communication, v. 35, n. 1, p. 35-45, 2 jan. 2020.). O “surto de microcefalia” estava nos jornais diários com números atualizados sobre o nascimento de “bebês de cabeça pequena” e a resignação silenciosa das suas mães negras e pobres. O foco foi nas deficiências das crianças, incluindo imagens de malformações, sobre as quais a discussão hegemônica foi sobre “uma geração perdida” (Porto; Costa, 2017PORTO, R. M.; COSTA, P. R. S. M. O Corpo Marcado: a construção do discurso midiático sobre Zika Vírus e Microcefalia. Cadernos de Gênero e Diversidade, v. 3, n. 2, 30 jul. 2017.). Embora retratasse inadequadamente a deficiência como uma tragédia, pouco se falava sobre a violação dos direitos de mulheres e meninas que vivenciavam a angústia de estar grávidas nesse período no Brasil. Por outro lado, houve relatos de famílias da elite que puderam optar por migrar para outros países durante a gravidez (Butti, 2016BUTTI, N. Mulheres estão tomando medidas radicais para fugir do vírus da zika. Rede Globo, Fantástico, Rio de Janeiro, 07 fev. 2016. Disponível em: https://globoplay.globo.com/v/4795068/. Acesso em: 29 jan. 2023.
https://globoplay.globo.com/v/4795068/....
).

A narrativa dominante que excluiu as vozes da população mais afetada – isto é, mulheres e meninas, especialmente as mais vulneráveis – revela a negligência estrutural que cruza a desigualdade de gênero com outras desigualdades. Textos e imagens em um quadro de notícias produzem significados sobre o surto de zika, mas o significado produzido pela grande mídia estava longe do impacto da epidemia para os mais afetados. Pesquisadores e ativistas já demonstraram que a epidemia de zika acabou sendo uma crise humanitária que afetou especialmente mulheres em idade reprodutiva que enfrentam camadas maiores e históricas de vulnerabilidade (Ambrogi; Brito; Diniz, 2021). Claramente, essas mulheres são muito diferentes da maioria daquelas que foram efetivamente ouvidas pelos meios de comunicação no início da emergência: aquelas que puderam viajar para fora do país ou tiveram acesso à informação e à contracepção para evitar engravidar durante uma crise de saúde.

A reformulação do enquadramento hegemônico para incluir as mulheres mais afetadas no centro da discussão deveria ser uma estratégia estruturante na cobertura midiática. Para mudar a narrativa dominante sobre o Zika e suas consequências, a equipe da Anis trabalhou com jornalistas parceiros para divulgar histórias centradas nas mulheres, nas quais as mulheres e meninas eram protagonistas das matérias de jornal. De 2015 a 2020, foram publicados 735 artigos na mídia nacional e internacional com referência ao trabalho da Anis relacionado ao Zika (Brito; Rondon, 2020BRITO, L.; RONDON, G. Zika in Brazil: Reproductive Justice in Response to a Humanitarian Crisis. Brasília: 2020.). Essas peças apresentavam entrevistas com a equipe da Anis, dados de nossos estudos qualitativos ou histórias de mulheres com quem a equipe trabalhou.

Desde o início da epidemia, nossa equipe vem trabalhando com mulheres em diversas comunidades afetadas e, assim, criamos vínculos para documentar seu dia a dia. Em fevereiro e março de 2016, algumas semanas após o anúncio da OMS da Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (PHEIC), a equipe da Anis viajou até ao epicentro da epidemia de Zika no país para recolher e partilhar histórias de mulheres. Nosso primeiro passo foi produzir um documentário sobre a história de cinco dessas mulheres (Diniz, 2016aDINIZ, D. Zika. Itinerante Filmes, 2016a.). As narrativas derivadas do campo são úteis para ampliar nossas ferramentas éticas sobre outras realidades (Diniz, 2019DINIZ, D. Enlarging bioethics imagination in humanitarian settings. Developing World Bioethics, v. 19, n. 3, p. 124-125, 2019.). Ouvir as vozes das mulheres pode permitir que diferentes atores imaginem como os problemas estão a ser efetivamente vividos. Diversas fontes de narrativas deveriam ser usadas para expandir a imaginação das pessoas e de suas preocupações morais para mobilização coletiva.

Os métodos visuais participativos, como, por exemplo, o relato de experiências em primeira pessoa, podem ser uma ferramenta significativa para documentar as vozes e necessidades das pessoas mais afetadas. As histórias em formato de vídeo privilegiam as narrativas dos participantes, pois representam suas experiências numa perspectiva de seus próprios testemunhos (Gubrium; Hill; Flicker, 2014GUBRIUM, A. C.; HILL, A. L.; FLICKER, S. A situated practice of ethics for participatory visual and digital methods in public health research and practice: A focus on digital storytelling. American Journal of Public Health, v. 104, n. 9, p. 1606-1614, 2014.). Neste contexto, os métodos participativos têm sido apontados como uma técnica democrática e consolidada de transferência de poder e geração de informação centrada nas comunidades (Packard, 2008PACKARD, J. ‘I’m gonna show you what it’s really like out here’: The power and limitation of participatory visual methods. Visual Studies, v. 23, n. 1, p. 63-77, 2008.). Durante a epidemia de zika e no período que se seguiu, a equipe da Anis trabalhou para criar a oportunidade de retratar mulheres, meninas e suas famílias como contadoras de histórias que têm o controle sobre quais informações são importantes para compartilhar para expandir a imaginação de outros públicos (Diniz, 2019DINIZ, D. Enlarging bioethics imagination in humanitarian settings. Developing World Bioethics, v. 19, n. 3, p. 124-125, 2019.).

Após a epidemia, o Zika desapareceu da discussão pública, mas persistimos em contar histórias sobre os efeitos contínuos desta emergência sanitária na vida das mulheres e das famílias. Isto se deu principalmente ligando as violações de direitos relacionadas com o Zika a outros temas da agenda política, para garantir que as reivindicações das populações mais afetadas ganhassem visibilidade. Esses objetivos tornaram-se um compromisso permanente com as comunidades com as quais trabalhamos desde o surto de zika em 2015 (Brito; Rondon, 2020BRITO, L.; RONDON, G. Zika in Brazil: Reproductive Justice in Response to a Humanitarian Crisis. Brasília: 2020.). Em 2019, por exemplo, a equipe da Anis contribuiu para a produção de uma matéria em um veículo de notícias e um minidocumentário para um jornal brasileiro sobre mulheres na região central do Brasil que vivem com crianças com a síndrome congênita do zika (Contaifer, 2019CONTAIFER, J. 2019. As mães da zika abandonadas no coração do país. Disponível em: <https://www.metropoles.com/materias-especiais/as-maes-da-zika-abandonadas-no-coracao-do-pais>.
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). Esta era uma região do país onde se pensava que o Zika não tinha chegado. Assim, o objetivo da cobertura era duplo: mostrar que os efeitos da epidemia tinham sido territorialmente mais extensos do que se supunha e apresentar as diversas necessidades das cuidadoras e as crianças enfrentavam à medida que cresciam.

Em 2019, a equipe da Anis também produziu pequenos vídeos com histórias de mulheres que vivenciaram as consequências duradouras da epidemia de Zika. Os vídeos curtos permitiram maior alcance, engajamento e circulação nas redes sociais, e estão disponíveis no YouTube, com legendas em português, inglês e espanhol. Três histórias foram retratadas nos vídeos curtos. Ana Lúcia Mota é avó de Dayara, criança com síndrome congênita do Zika. Ela refletiu sobre a importância da associação comunitária em Alagoas, Brasil, para garantir os direitos sociais e o acesso aos cuidados de saúde (The Legacy of Zika, 2019aTHE LEGACY OF ZIKA in Alagoas: Ana Lucia and Dayara [S. l.: s. n.], 2019a. 1 video (1’28”). Published by the channel Anis - Instituto de Bioética. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Fd6OVPCGSrY&list=PLf-Oz5dUh_niYt8DbLCkCRuCQlTa_ovun&index=34. Acesso em: 29 jan. 2023.
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). Alessandra Hora é avó de Erik e líder comunitária. Ela falou sobre como a criação de uma associação de mulheres afetadas pelo Zika no território tem sido fundamental para reforçar o envolvimento comunitário entre as mulheres (The Legacy of Zika, 2019bTHE LEGACY OF ZIKA in Alagoas: Alessandra and Erik [S. l.: s. n.], 2019b. 1 video (2’17”). Published by the channel Anis - Instituto de Bioética. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Fd6OVPCGSrY&list=PLf-Oz5dUh_niYt8DbLCkCRuCQlTa_ovun&index=34. Acesso em: 29 jan. 2023.
https://www.youtube.com/watch?v=Fd6OVPCG...
). Lenice do Nascimento é mãe de Enzo, uma criança em idade escolar afetada pelo Zika. Ela falou sobre a importância de uma escola acessível às crianças com deficiência e como a escola desempenhou papel importante ao permiti-la planejar o seu regresso ao trabalho remunerado (The Legacy of Zika, 2019cTHE LEGACY OF ZIKA in Alagoas: Lenice and Enzo [S. l.: s. n.], 2019c. 1 video (2’12”). Published by the channel Anis - Instituto de Bioética. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Fd6OVPCGSrY&list=PLf-Oz5dUh_niYt8DbLCkCRuCQlTa_ovun&index=34. Acesso em: 29 jan. 2023.
https://www.youtube.com/watch?v=Fd6OVPCG...
).

Naturalmente, nenhuma dessas estratégias por si só garante a reformulação das políticas. Contudo, além de ter contribuído para um debate público mais qualificado e diversificado em torno das pessoas que sofrem os maiores efeitos do Zika – mulheres e meninas – poderíamos afirmar que também contribuiu para a visibilidade e liderança dessas mulheres nas suas persistentes lutas pelo direito à saúde dos seus filhos durante vários anos após o início da crise sanitária. Em 2022, por exemplo, muitas dessas mulheres foram líderes de uma luta para aprovar uma lei que proibia os planos de saúde de limitar a lista de procedimentos disponíveis para os seus filhos – e tiveram sucesso (Utida, 2022UTIDA, M. Movimentos sociais de todo Brasil lutam pela derrubada do ‘rol taxativo’ e aprovação do PL 2033/22. Mídia Ninja, Brasília, 28 July 2022. Disponível em: https://midianinja.org/news/movimentos-sociais-de-todo-brasil-lutam-pela-derrubada-do-rol-taxativo-e-aprovacao-da-pl203322/. Acesso em: 29 jan. 2023.
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).

Informações baseadas em evidências para construir estratégias de defesa de direitos

A produção de evidências sobre uma emergência de saúde pública ou crise humanitária é fundamental para compreender a vastidão dos seus efeitos nas populações mais vulneráveis. Além disso, mostrar a magnitude das violações de direitos que resultaram do surto, acompanhadas pelos rostos e vozes de mulheres e meninas, pode desempenhar um papel transformador na integração da ética da justiça reprodutiva no desenho de respostas a uma epidemia. Nesta perspectiva, pretendíamos produzir dados baseados em evidências para catalisar estratégias de incidência para a revisão legal e política para proteção de direitos das pessoas mais vulneráveis às consequências duradouras da epidemia de zika. Uma das estratégias iniciais da Anis foi persuadir o Estado brasileiro a fornecer evidências sobre como vinha protegendo mulheres e meninas mais vulneráveis ao Zika. Rapidamente, ficou evidente que não havia no país uma política específica de proteção à esta população. Uma pesquisa qualitativa foi então iniciada para coletar evidências que pudessem embasar estratégias de incidência (Diniz, 2017DINIZ, D. Zika in Brazil: women and children at the center of the epidemic. Brasilia: [s.n.], 2017.).

Para coletar tais evidências, foi realizado um estudo de caso no estado de Alagoas, um dos estados epicentro da epidemia e que possui o menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e que, na época concentrava a maior taxa de gravidez na adolescência do país. Em dezembro de 2016, orientando-nos por uma lista de municípios que notificaram casos ao Ministério da Saúde, ouvimos histórias de 54 mulheres (Diniz, 2017DINIZ, D. Zika in Brazil: women and children at the center of the epidemic. Brasilia: [s.n.], 2017.). Naquela época, havia 86 mulheres no estado de Alagoas cujos filhos tinham diagnóstico confirmado de zika. O estudo permitiu à equipe da Anis narrar a violação dos direitos na vida de mulheres e crianças agravada pela epidemia de zika. O estudo mostrou que a maioria das mulheres afetadas eram jovens e negras, e que três em cada quatro vivenciaram a primeira gravidez na adolescência e tinham pouca escolaridade. Metade das mulheres não utilizava nenhum método contraceptivo, embora não pretendesse engravidar novamente. Apesar da necessidade de proteção social, muitas não estavam cobertas por programas de assistência social e não recebiam cuidados de saúde adequados (Ambrogi; Brito; Diniz, 2021AMBROGI, I. G.; BRITO, L.; DINIZ, D. The vulnerabilities of lives: Zika, women and children in Alagoas State, Brazil. Cadernos de Saúde Pública, v. 36, n. 12, 11 jan. 2021.).

Durante uma emergência de saúde pública, entretanto, não é suficiente mostrar que uma epidemia viola direitos – é necessário também exigir que esses direitos sejam garantidos. Com base nas evidências coletadas durante o estudo de caso, a Anis também apresentou um relatório com recomendações de políticas para diferentes esferas de governo nos níveis municipal, estadual e federal (Diniz, 2017DINIZ, D. Zika in Brazil: women and children at the center of the epidemic. Brasilia: [s.n.], 2017.). O relatório deu origem à primeira força-tarefa do estado de Alagoas para reavaliar os casos identificados pelo sistema de vigilância epidemiológica – crianças do interior e da cidade foram encaminhadas aos hospitais de referência para exames complementares. Mais de 60 casos descartados no início da epidemia foram reavaliados e quase metade deles foram confirmados e depois incorporados aos esforços estaduais (Brito; Rondon, 2020BRITO, L.; RONDON, G. Zika in Brazil: Reproductive Justice in Response to a Humanitarian Crisis. Brasília: 2020.).

A pesquisa da Anis também foi fundamental para a estratégia de litígio estratégico durante a epidemia de Zika. Propor ações de litígio estratégico em tribunais locais ou internacionais pode ser uma ferramenta relevante nas democracias para garantir a responsabilização do Estado pela negligência na proteção das populações mais vulneráveis às emergências de saúde pública (Biehl et al., 2019BIEHL, J. et al. Judicialization 2.0: Understanding right-to-health litigation in real time. Global Public Health, v. 14, n. 2, p. 190-199, 21 fev. 2019.). Em agosto de 2016, a Anis atuou em parceria com a Associação Nacional dos Defensores Públicos (ANADEP) para apresentar uma petição no Supremo Tribunal Federal para proteger os direitos violados pelo Zika (STF; ANADEP, 2016). As demandas apresentadas ao Supremo Tribunal basearam-se numa perspectiva ampliada de justiça reprodutiva e justiça da deficiência. Foram solicitadas soluções individuais e coletivas em diversas demandas, como a implementação de políticas sociais e um programa universal de transferência de renda para proteger mulheres e crianças afetadas pelo Zika e o acesso a cuidados de saúde especializados para bebês e crianças com a síndrome congênita do Zika (SCZ). Para a população em geral, mas especialmente para meninas e mulheres em idade reprodutiva, o caso exigiu acesso a programas de planejamento familiar com distribuição na rede pública de saúde de contraceptivos reversíveis de longa duração. Para mulheres grávidas infectadas pelo vírus Zika e em sofrimento mental devido à epidemia, o caso da Suprema Corte exigiu o direito de optar pela interrupção da gravidez, se assim fosse o desejo de mulher, dado o entendimento de que o vírus Zika submete as mulheres infectadas a intenso sofrimento diante da incerteza sobre os efeitos da infecção na gravidez.

A colaboração com diferentes especialistas permitiu à equipe da Anis dar substância a estas exigências, por meio da utilização de evidências confiáveis e produzidas em tempo real sobre os efeitos da epidemia de Zika. Em um esforço coordenado para organizar evidências para ações de incidência, vários pareceres técnicos escritos especificamente sobre o tema foram anexados à petição inicial do Supremo Tribunal Federal (STF; ANADEP, 2016). As pesquisadoras com deficiência da Anis também se engajaram no debate, produzindo análises sobre a convergência entre os feminismos, o direito ao aborto e a proteção da vida e da autonomia das pessoas com deficiência, sem recurso ao direito penal (Guedes de Mello; Rondon, 2020GUEDES DE MELLO, A.; RONDON, G. Feminism, disability, and reproductive autonomy: abortion in times of Zika in Brazil. Somatosphere, p. 1-17, 2020.).

Entre 2016 e 2020, o Supremo Tribunal Federal agendou a decisão sobre o caso em quatro ocasiões. Mesmo quando nenhuma decisão final fosse alcançada na Suprema Corte, a cada vez que ela foi colocada em pauta, houve nova oportunidade para uma discussão pública sobre as múltiplas demandas das mulheres e famílias afetadas por Zika. Em 2019, por exemplo, impulsionados pelo retorno do processo à pauta do STF pela terceira vez, alguns parlamentares, com apoio da Anis, apresentaram projetos de lei que tinha como objetivo ampliar o acesso a benefícios de transferência de renda para famílias afetadas pelo Zika. Esta foi uma oportunidade única para expandir a justiça reprodutiva para as mulheres e suas famílias, aproveitando a tensão entre os dois ramos do poder. Os setores conservadores foram obrigados a ceder à proposta de instituir uma pensão vitalícia para as vítimas do Zika – particularmente porque queriam evitar o debate sobre o aborto que fazia parte da ação na Suprema Corte. A pensão proporciona mais uma solução para as mulheres e famílias afetadas pelo Zika e é particularmente crucial dada a exacerbação da desigualdade e da pobreza que afeta essas comunidades como resultado da pandemia da Covid-19 (STF; ANADEP, 2016).

A lei da pensão vitalícia entrou em vigor no início de 2020 (Resende, 2020RESENDE, S. Senado aprova MP que dá pensão vitalícia às crianças com microcefalia causada pelo zika, G1, Brasília, 05 fev. 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/02/05/senado-aprova-mp-que-da-pensao-vitalicia-as-criancas-com-microcefalia-causada-pelo-zika.ghtml. Acesso em: 29 Jan. 2023.
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). A Lei 13.985/2020 regulamenta o acesso ao benefício permanente de transferência de renda para crianças com diagnóstico de SCZ. No entanto, não incorporou naquele momento, a redação conforme demandada pelas mulheres, pois exige que para as crianças terem acesso ao benefício, já recebam o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Para que as famílias tenham acesso ao BPC é exigido um nível de renda extremamente baixo – a renda familiar per capita deve ser inferior a ¼ do salário-mínimo mensal (ou seja, US$ 60 por pessoa/mês). Na prática, isso significa que as famílias não poderão receber os dois benefícios, pois ao receberem a pensão vitalícia, automaticamente deixarão de se enquadrar nos critérios para recebimento do BPC. Por outro lado, muitas famílias que lidam diariamente com “despesas catastróficas” para o cuidado das necessidades das crianças não se enquadram nos critérios para recebimento do BPC, e por isso também não poderiam receber o benefício da pensão vitalícia (Santos; Rosário, 2020SANTOS, A. L. N.; ROSÁRIO, L. A. Reflexos da pandemia da Covid-19 para as famílias afetadas pelo vírus Zika no Brasil: a urgência do direito à proteção social. Revista da Defensoria Pública do Distrito Federal, v. 2, n. 2, p. 13-40, nov. 2020.). Anis ainda luta nos tribunais brasileiros para ampliar a interpretação desta lei para cobertura universal de todas as vítimas do Zika. Ainda assim, tal como é hoje, a Lei dá uma garantia mínima de um benefício permanente de transferência de renda às famílias mais pobres, sem a necessidade de revisões periódicas da sua situação socioeconômica.

No final de abril de 2020, o caso constitucional do Zika foi colocado pela quarta e última vez na agenda do Supremo Tribunal Federal, desta vez para uma decisão virtual devido à necessidade de distanciamento social. Com pouca atenção do público, concentrado na pandemia e na crise política, o caso foi rejeitado por questões processuais, ou seja, sem qualquer análise do mérito das demandas (Gomes, 2020GOMES, J. C. A. Opacidade do plenário virtual, Zika e censura nas escolas: obstáculo ou estratégia? Jota, 12 May 2020. Disponível em: https://www.jota.info/stf/supra/opacidade-plenario-virtual-zika-censura-escolas-12052020. Acesso em: 29 jan. 2023.
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). Um dos principais argumentos para rejeitá-lo foi o fato de o Congresso Nacional já ter aprovado a Lei da pensão vitalícia. Mesmo que as demais demandas do caso permanecessem sem solução, isso foi tomado como um sinal de que a Corte entendia não haver negligência política a ser superada – o que significa que não havia interesse político para enfrentar os demais temas na época. O caso foi encerrado, mas deixou sua marca na luta contínua pela justiça reprodutiva no Brasil. Não só ajudou a impulsionar um debate legislativo sobre políticas sociais para as crianças e famílias afetadas pelo Zika, mas também contribuiu para o debate geral brasileiro sobre a injustiça reprodutiva e o aborto (Schossler, 2016SCHOSSLER, A. Zika esquentou debate sobre aborto no Brasil, DW, 03 fev. 2016. Disponível em: https://www.dw.com/pt-br/zika-esquentou-debate-sobre-aborto-no-brasil-afirma-imprensa-alem%C3%A3/a-19025285. Acesso em: 29 Jan. 2023.
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). Somente após a ação na Suprema Corte sobre o Zika é que foi possível apresentar o primeiro processo constitucional de descriminalização do aborto no Brasil, movido pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) com o apoio técnico da Anis em 2017 e ainda pendente em 2023, provocando debates contínuos sobre o assunto (Jota, 2023JOTA. 2023 será o ano em que o STF julgará a descriminalização do aborto? Jota, Brasília, 03 feb. 2023. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/sem-precedentes/2023-sera-o-ano-em-que-o-stf-julgara-a-descriminalizacao-do-aborto-03022023. Access on: 12 jun. 2023.
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).

Evidências que informam mobilizações públicas têm sido apresentadas há décadas como um mecanismo importante para melhorar a saúde e os direitos das populações (Chhetri; Zacarias, 2021CHHETRI, D.; ZACARIAS, F. Advocacy for Evidence-Based Policy-Making in Public Health: Experiences and the Way Forward. Journal of Health Management, v. 23, n. 1, p. 85-94, 31 mar. 2021.). No entanto, os impactos desproporcionais das emergências sanitárias na vida das mulheres e das meninas têm sido negligenciados pelas autoridades públicas. Nesse contexto, as estratégias incidência para disseminar evidências desempenham papel fundamental na ampliação das estratégias para criar condições para garantir a justiça de gênero e os direitos humanos aos grupos mais impactados, mesmo que de forma não linear, incluindo perdas – como a anulação do julgamento de caso constitucional de Zika – e debates imprevistos.

O Estado brasileiro ainda não deu respostas satisfatórias à crise do Zika, e sua negligência foi agravada pelo negacionismo oficialmente assumido pelo governo brasileiro durante a pandemia da Covid-19, que mais uma vez teve um impacto desproporcional sobre mulheres e meninas. Taxas alarmantes de mortalidade materna foram apenas a face mais visível desse efeito (Diniz; Brito; Rondon, 2022DINIZ, D.; BRITO, L.; RONDON, G. Maternal mortality and the lack of women-centered care in Brazil during COVID-19: Preliminary findings of a qualitative study. The Lancet Regional Health Americas, v. 10, 100239, June 2022.; Souza; Amorim, 2021SOUZA A.S.R.; AMORIM R.A.M. Maternal mortality by COVID-19 in Brazil. Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil, v. 21, supl 1, fev. 2021.). Apesar disso, as experiências aprendidas com a emergência do Zika devem servir como marco de memória sobre a possibilidade de unir pesquisa social, litígio estratégico e ações de incidência para continuar a tornar visível e exigir responsabilização do Estado brasileiro na proteção de mulheres e meninas e na igualdade de gênero, aspectos dos quais a Anis segue comprometida (Rondon; Diniz; Benvindo, 2022RONDON, G.; DINIZ, D.; BENVINDO, J. Speaking truth to power: Legal scholars as survivors and witnesses of the Covid-19 maternal mortality in Brazil. International Journal of Constitutional Law, v. 20, n. 3, p. 1360-1369, jul. 2022.; Santana et al., 2022SANTANA, J. et al. Renda básica do zika à covid-19: amparando as trabalhadoras do cuidado em emergências humanitárias. Áltera, n. 14, p. 1-28, 2022.; Santos; Rosário, 2020SANTOS, A. L. N.; ROSÁRIO, L. A. Reflexos da pandemia da Covid-19 para as famílias afetadas pelo vírus Zika no Brasil: a urgência do direito à proteção social. Revista da Defensoria Pública do Distrito Federal, v. 2, n. 2, p. 13-40, nov. 2020.).

Construção de movimento para compartilhar poder

A Organização Mundial da Saúde define o engajamento comunitário para a saúde como “um processo de desenvolvimento de relações que permitem que as pessoas de uma comunidade e organizações trabalhem em conjunto para abordar questões relacionadas com a saúde e promover o bem-estar para alcançar impactos e resultados positivos na saúde” (OMS, 2017). O conceito pode ser novo no campo da saúde pública internacional, mas é importante reconhecer que as mulheres têm sido protagonistas históricas da solidariedade pela justiça social durante emergências de saúde pública e outras crises humanitárias (Nunes, 2021NUNES, N. R. D. A. The power that comes from within: female leaders of Rio de Janeiro’s favelas in times of pandemic. Global Health Promotion, v. 28, n. 2, p. 38, 2021.). Elas vêm desenvolvendo múltiplas relações solidárias em suas comunidades e, como resultado, sendo promotoras de mudanças sociais. Compreendemos que nenhuma resposta eficiente ou justa às consequências duradouras da epidemia de Zika virá sem ouvir e compreender as experiências e necessidades das mulheres, tanto individual como coletivamente. Tendo isso em mente, as categorias de mobilização comunitária e coletividade são as que melhor definem o trabalho com o qual nos comprometemos. Muitas vezes a noção de engajamento comunitário proposta pela OMS pode ser compreendida numa perspectiva de criação de laços comunitários que antes seriam inexistentes ou frágeis. Argumentamos que as noções de mobilização, movimentos e coletividade refletem de forma mais abrangente os arranjos comunitários e as lideranças construídas no território para superar barreiras em contextos restritivos.

O fortalecimento das estratégias das lideranças locais – seja por meio de ações de formação, do desenvolvimento de capacidades ou da facilitação para o fortalecimento de laços com outros autores relevantes – é peça-chave para construir movimentos mais fortes para garantir a justiça reprodutiva. Nesta perspectiva, a equipe da Anis também trabalhou ao lado de mulheres e meninas das comunidades afetadas no fortalecimento de ações de mobilização comunitária e formação de lideranças no território para apoiar os direitos das mulheres. Durante as atividades de mobilização comunitária, entendemos que não era possível dissociar as necessidades de saúde ou as demandas de proteção social. Por exemplo, não havia como exigir o acesso aos cuidados de saúde sem exigir também a mobilidade urbana e transporte, tampouco apelar à proteção das decisões reprodutivas das mulheres e meninas sem garantir o acesso à renda e aos programas de proteção social para crianças com deficiência. A complexidade dessas demandas refletiu-se no nosso caso constitucional, mencionado anteriormente.

Anis também trabalhou como facilitadora para amplificar a mobilização e o protagonismo dos movimentos de mulheres na luta pelos seus direitos e necessidades. A epidemia de Zika no Brasil evidenciou um aspecto bem conhecido e compartilhado pelas comunidades nos territórios: o conhecimento das mulheres está empiricamente enraizado em suas experiências cotidianas (Diniz, 2016bDINIZ, D. Zika virus and women. Cadernos de Saude Publica, v. 32, n. 5, 2016b.). No entanto, a epidemia de Zika e suas consequências também evidenciaram as armadilhas de pobreza que assolaram as famílias que vivem desigualdades históricas sobrecarregadas por diversas camadas de vulnerabilidades (Diniz, 2017b).

Combinando pesquisa em ciências sociais e mobilização comunitária, o objetivo da Anis tem sido colocar os direitos e as necessidades das mulheres no centro do debate público no Brasil e na América Latina. O trabalho de equipe da Anis durante a epidemia de Zika, mas também durante o período que se seguiu, reivindicou uma presença contínua nas comunidades, o que nos permitiu compartilhar espaços de poder para reinvindicação de direitos sociais e construir vínculos de confiança. Entre 2017 e 2020, a equipe da Anis realizou 70 reuniões para acesso à informação, com mais de 800 mulheres e profissionais de saúde em 10 estados brasileiros (Brito; Rondon, 2020aBRITO, L.; SANTOS, R. L.; REGO, S. Solidariedade, cidadania e justiça social: percepções de atores sociais sobre as respostas públicas à COVID-19. Ciência & Saúde Coletiva, v. 27, n. 11, p. 4117-4124, nov. 2022.). Os workshops foram fundamentais para reforçar a importância do papel das lideranças nos territórios e sensibilizar os profissionais de saúde para os temas relacionados à saúde sexual e reprodutiva em tempos de Zika. Foi por meio do vínculo com as mulheres e famílias, que produzimos materiais informativos respondendo às dúvidas mais compartilhadas sobre necessidades de saúde sexual e reprodutiva não satisfeitas, bem como materiais sobre os benefícios sociais a que as famílias tinham direito e os direitos das mulheres e crianças com deficiência.

A equipe da Anis tem estado continuamente em contato com as mulheres e famílias afetadas pelo Zika e suas associações, também durante a pandemia da Covid-19. Isso foi possível porque, no cenário da epidemia do vírus Zika, vários grupos de WhatsApp foram formados por mães e cuidadoras de crianças com SCZ, dos quais também participaram as pesquisadoras da Anis. As pesquisadoras respondiam às dúvidas sobre acesso aos direitos sociais e compartilhavam materiais informativos sobre diversos temas de interesse, conforme demanda do grupo (Ambrogi; Brito; Rego, 2022AMBROGI, I.; BRITO, L.; REGO, S. Reflections on research ethics in a public health emergency: Experiences of Brazilian women affected by Zika. Developing World Bioethics, 28 jun. 2022.). Os grupos foram criados por mulheres em diversos estados brasileiros para compartilhar conhecimentos e experiências sobre as rotinas de cuidado de bebês, mas também como ferramenta de luta pela saúde e justiça social (Carneiro; Fleischer, 2020CARNEIRO, R.; FLEISCHER, S. Em Brasília, mas em Recife: atravessamentos tecnometodológicos em saúde, gênero e maternidades numa pesquisa sobre as repercussões da epidemia do vírus Zika. Saúde e Sociedade, v. 29, n. 2, 11 maio 2020.). Os grupos virtuais se tornaram um espaço comunitário para partilha e distribuição de poder entre as mulheres e meninas afetadas pelo Zika. Os aplicativos de celulares, utilizados como como conectores virtuais, têm sido relatados como estratégias poderosas de mobilização social e como uma ferramenta de informação sobre saúde, especialmente em contextos vulneráveis durante emergências de saúde pública, como a pandemia da Covid-19 (Caperon et al., 2021CAPERON, L. et al. Identifying opportunities to engage communities with social mobilisation activities to tackle NCDs in El Salvador in the context of the global COVID-19 pandemic. International Journal for Equity in Health, v. 20, n. 1, p. 1-13, 9 out. 2021.; Ekzayez et al., 2020EKZAYEZ, A. et al. COVID-19 response in northwest Syria: innovation and community engagement in a complex conflict. Journal of Public Health, v. 42, n. 3, p. 504-509, 18 ago. 2020.).

As mulheres e as suas famílias afetadas pelo Zika enfrentaram duas epidemias nos últimos sete anos. A pandemia da Covid-19 também impactou desproporcionalmente as mulheres que cuidam de crianças com SCZ. A luta pelos direitos das pessoas com deficiência e por renda emergencial para a justiça social e econômica estava na agenda das mulheres líderes de associações comunitárias. As ações de proteção social, como os benefícios de transferência de renda, foram documentadas como uma medida significativa para melhorar a saúde e a equidade das populações (Rasella et al., 2013RASELLA, D. et al. Effect of a conditional cash transfer programme on childhood mortality: A nationwide analysis of Brazilian municipalities. The Lancet, v. 382, n. 9886, p. 57-64, 6 jul. 2013.). Durante a pandemia da Covid-19, uma conquista importante liderada pela sociedade civil e pelos parlamentares progressistas foi o direito das mulheres que eram o sustento das suas famílias de receberem o dobro do valor do benefício emergencial (Agência Senado, 2021AGÊNCIA SENADO. Mulheres provedoras com direito a duas cotas poderão receber auxílio retroativo. Senado Notícias, 11 jun. 2021. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2021/06/11/mulheres-provedoras-com-direito-a-duas-cotas-poderao-receber-auxilio-retroativo. Acesso em: 29 jan. 2023.
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). Nesse contexto, o WhatsApp tem sido uma importante ferramenta de mobilização e engajamento comunitário. As mulheres usaram o aplicativo para troca de experiências e apoio mútuo para cadastro e solicitação do benefício durante a pandemia – especialmente considerando as barreiras enfrentadas por essas mulheres durante seu cadastro na plataforma oficial disponibilizada pelo Estado brasileiro (Santana et al., 2022SANTANA, J. et al. Renda básica do zika à covid-19: amparando as trabalhadoras do cuidado em emergências humanitárias. Áltera, n. 14, p. 1-28, 2022.). A equipe da Anis também registrou as principais barreiras enfrentadas pelas famílias e produziu um documento que foi compartilhado com representantes do governo federal para o aprimoramento desta política.

Conclusão: ampliando as perspectivas de defesa da justiça reprodutiva

Após mais de sete anos de mobilização em torno das múltiplas necessidades de saúde e de justiça social exacerbadas pela epidemia de Zika, pode ser possível dizer que hoje a interseccionalidade das exigências que estiveram no centro da crise do Zika tem sido mais debatida no cenário público. O fortalecimento da liderança entre as mulheres das comunidades mais afetadas pelo vírus e a qualificação do debate público sobre questões sensíveis são ganhos significativos e sustentáveis para a continuidade da luta pela justiça reprodutiva, justiça social e justiça das pessoas com deficiência no Brasil.

No mundo pós-pandemia da Covid-19, esses ganhos serão fundamentais para garantir os direitos das mulheres e das meninas. Compreendemos que nenhuma resposta eficiente ou justa às emergências de saúde pública ocorrerá sem ouvir e compreender as experiências e necessidades das mulheres. Combinando pesquisa em ciências sociais, mobilização comunitária e múltiplas estratégias de incidência, incluindo litígio estratégico, uma resposta feminista deve colocar os direitos das mulheres e as necessidades interseccionais no centro do debate público no Brasil e na América Latina.

Defender tais ideias, após uma pandemia e a derrota de um governo autoritário que teve efeitos devastadores nos indicadores de saúde do país, especialmente para as populações mais vulneráveis, pode parecer contraintuitivo. Houve, inegavelmente, um retrocesso, inclusive nos indicadores de igualdade de gênero, e muitas das exigências aqui elencadas ainda não foram atendidas. No entanto, gostaríamos de insistir que o legado da mobilização em torno do Zika não desapareceu e, pelo contrário, proporciona um quadro relevante de estratégias e um fortalecimento contínuo de mulheres líderes que podem e devem orientar a reconstrução de políticas que tenham justiça e cuidado no seu centro, e onde a justiça reprodutiva e a justiça da deficiência se cruzam e se reforçam mutuamente.

Mesmo que, por vezes, a vitória parcial numa exigência, como a da pensão vitalícia para as vítimas do Zika, possa ser combinada com um atraso noutros debates, como o arquivamento da ação constitucional sobre o zika. E uma compreensão de que este arquivamento pode ter impedido o avanço de uma discussão mais substancial sobre injustiça reprodutiva, acesso à contracepção e aborto, ainda insistiríamos na importância de trazer todos estes temas como parte do debate sobre justiça reprodutiva. Eventuais decisões estratégicas que priorizam determinadas demandas em detrimento de outras também urgentes, podem gerar políticas desiguais. Mas as conquistas, ainda que parciais, não deslegitimam o argumento da interconectividade das demandas e necessidades em sua diversidade. Em circunstâncias contingentes e instáveis, estamos criando e reforçando o compromisso ético com a proteção das necessidades das pessoas em todas as formas de viver suas sexualidades, reprodução e acesso a recursos para proteger seus projetos de vida.

Apresentamos alguns exemplos de como a equipe da Anis tem trabalhado em táticas de incidência que abrangem três aspectos principais: coletar evidências para transformar as políticas públicas e reformular as narrativas da mídia hegemônica, promover um litígio estratégico baseado em valores feministas para proteger e expandir direitos e a justiça reprodutiva, bem como para cultivar espaços de aprendizagem mútua e compartilhamento dos espaços de poder. Ao mesmo tempo, é importante mencionar que a equipe da Anis não trabalhou sozinha. Capacidades complementares de um ecossistema de parceiros foram fundamentais para o fortalecimento das iniciativas. O trabalho contínuo das mulheres e famílias que vivem em territórios afetados pelo zika e o cultivo mútuo e permanente de alianças, mesmo durante a pandemia da Covid-19 foram também importantes neste processo.

As vitórias na defesa de direitos são múltiplas e não ocorrem apenas quando uma lei é aprovada ou um processo judicial é ganho. Mudanças de opinião pública que permitam uma visibilidade mais frequente de assuntos antes ignorados, ou o reposicionamento de questões que antes não eram sequer questionadas, também podem ser entendidas como ganhos, embora devam ser continuamente mobilizadas para gerar transformações concretas na vida das pessoas. Mesmo as aparentes perdas nas estratégias de incidência constituem uma memória relevante na luta pelos direitos, tensionando o quadro hegemônico de exclusão e fornecendo vocabulário e ferramentas para a luta continuada pela justiça. É nosso dever, no entanto, não ficarmos satisfeitos com estas vitórias parciais: devemos levar adiante as lições aprendidas e não permitir que os efeitos contínuos das epidemias sejam esquecidos.

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Editora: Jane Russo

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    30 Jan 2023
  • Aceito
    01 Ago 2023
  • Revisado
    14 Jun 2023
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