Resumos
As misturas físicas de poliamida 6 (PA6) e policarbonato (PC) processadas a 240 ºC, durante 10, 30 e 60 minutos formam um copolímero de PA6-PC. A alta temperatura e o longo tempo de processamento podem causar modificações nas propriedades dessas misturas e degradar o copolímero, originando grupos isocianato e subseqüentemente CO2 e grupos NH2 terminais. A quantidade de copolímero PA6-PC formado durante o processo de mistura é maior com o aumento da proporção de PC na mistura. As ligações uretânicas de polímeros termoplásticos exibem mais baixas estabilidades térmica e oxidativa, resultando no aumento da concentração de grupos terminais NH2. A reatividade dessas misturas foi investigada através do torque durante o processo de mistura, da titulação potenciométrica dos grupos NH2 terminais e por microscopia eletrônica de varredura.
Poliamida 6; policarbonato; mistura reativa
Polyamide 6 (PA6) and polycarbonate (PC) blends processed at 240 °C, during 10, 30 and 60 minutes produced a copolymer of PA6-PC. The high temperature and long processing time can cause modifications on the properties of these blends and degradation of the copolymer. It can also form isocyanate groups and subsequently CO2 and NH2 "end groups". The amount of PA6-PC copolymer formed during the blending process was found to increase when the PC content is increased. The thermoplastic urethanes normally exhibit smaller thermal and oxidative stability, resulting in an increase in the concentration of NH2 terminal groups. The reactivity of the blends was investigated by monitoring the torque during the blending, potentiometer titration of NH2 terminal groups and scanning electronic microscopy (SEM).
Polyamide 6; polycarbonate; reactive blend
ARTIGO TÉCNICO CIENTÍFICO
Mistura reativa de poliamida 6 e policarbonato: reatividade do copolímero formado "in situ"
Polyamide 6 and polycarbonate reactive blends: reactivity of the copolymer formed "in situ"
Dilma A. CostaI; André L. S. SantosI; Nadir B. SanchesII; Clara M. F. OliveiraII; Marcos L. DiasII
IDepartamento de Engenharia Química, Instituto de Tecnologia, UFRRJ
IIInstituto de Macromoléculas Professora Eloisa Mano, UFRJ
Endereço para correspondência Endereço para correspondência Dilma A Costa DEQ, IT, UFRRJ Rodovia BR 465, km 07, Seropédica CEP: 23890-000, Rio de Janeiro, RJ E-mail: dilmact@ufrrj.br
RESUMO
As misturas físicas de poliamida 6 (PA6) e policarbonato (PC) processadas a 240 ºC, durante 10, 30 e 60 minutos formam um copolímero de PA6-PC. A alta temperatura e o longo tempo de processamento podem causar modificações nas propriedades dessas misturas e degradar o copolímero, originando grupos isocianato e subseqüentemente CO2 e grupos NH2 terminais. A quantidade de copolímero PA6-PC formado durante o processo de mistura é maior com o aumento da proporção de PC na mistura. As ligações uretânicas de polímeros termoplásticos exibem mais baixas estabilidades térmica e oxidativa, resultando no aumento da concentração de grupos terminais NH2. A reatividade dessas misturas foi investigada através do torque durante o processo de mistura, da titulação potenciométrica dos grupos NH2 terminais e por microscopia eletrônica de varredura.
Palavras-chave: Poliamida 6, policarbonato, mistura reativa.
ABSTRACT
Polyamide 6 (PA6) and polycarbonate (PC) blends processed at 240 °C, during 10, 30 and 60 minutes produced a copolymer of PA6-PC. The high temperature and long processing time can cause modifications on the properties of these blends and degradation of the copolymer. It can also form isocyanate groups and subsequently CO2 and NH2 "end groups". The amount of PA6-PC copolymer formed during the blending process was found to increase when the PC content is increased. The thermoplastic urethanes normally exhibit smaller thermal and oxidative stability, resulting in an increase in the concentration of NH2 terminal groups. The reactivity of the blends was investigated by monitoring the torque during the blending, potentiometer titration of NH2 terminal groups and scanning electronic microscopy (SEM).
Keywords: Polyamide 6, polycarbonate, reactive blend.
Introdução
As misturas físicas de poliamida 6 (PA6) e policarbonato (PC) são consideradas termodinamicamente imiscíveis, entretanto, dependendo das condições de processamento a partir da fusão, elas podem formar copolímeros em bloco, resultantes da reação química entre os grupos NH2 do PA6 e O-CO-O do PC. Esses copolímeros podem atuar como agente interfacial, melhorando a compatibilidade da mistura[1-6]. O Esquema 1 apresenta a reação de troca entre as cadeias de PA6 e de PC com a formação do copolímero em bloco[1-3]. O Esquema 2 apresenta as possíveis reações ocorridas no copolímero formado de PA6-PC em altas temperaturas e na presença de umidade. As ligações uretânicas presentes no copolímero são instáveis acima de 200 °C e formam isocianatos, que em presença de umidade liberam CO2 e formam grupos NH2 terminais[3].
Durante o desenvolvimento da compatibilização de polímeros reativos podem ocorrer variações na viscosidade da massa polimérica fundida, devido à formação de novas estruturas, resultantes de interações intermoleculares. O aumento da viscosidade, resultante da interação ou reação entre os componentes da mistura, leva à uma mudança nos valores de torque durante o processo de mistura[6].
A poliamida 6 pode ser caracterizada pelo número de grupos NH2 ou COOH terminais, presentes em cada cadeia polimérica. A concentração desses grupos, em certas misturas, pode ser determinada por titulação[2,3,7].
Este trabalho teve como objetivo confirmar a formação do copolímero em bloco PA6-PC, durante o processo de mistura física dos homopolímeros de PA6 e PC, através da variação dos valores de torque, da titulação potenciométrica de grupos NH2 terminais e da morfologia desenvolvida.
Experimental
Materiais e métodos
Os homopolímeros usados neste estudo foram: PA6 (NYLODUR, NT2700) de Mw = 30.927, cedido pela DeMillus S.A. e PC (LEXAN 141.111) de Mn @ 26.2 e Mw = 55.299, cedido pela COPLEN IND. e COM. (General Electric Co.) Os homopolímeros PA6 e PC foram secos previamente em estufa a 80 ± 2 °C, durante 72 horas e acondicionados em dessecador sob vácuo, na presença de sílica, para assegurar a ausência de qualquer vestígio de umidade. As misturas de PA6/PC foram preparadas na câmara de mistura Haake Rheomix 600, velocidade do rotor de 30 rpm e tempo de mistura de 10, 30 e 60 minutos à temperatura de 240 ºC. Foram preparadas misturas de PA6/PC 95/5, 90/10, 85/15. Após o preparo das misturas, essas foram prensadas utilizando uma prensa hidráulica marca Carver, nas seguintes condições: pressão - 5000 lbf, temperatura - 245 °C, tempo de prensagem - 7 minutos.
Caracterização das misturas
A verificação da formação e possível degradação do copolímero PA6-PC foi realizada pela determinação quantitativa de grupos NH2 terminais, utilizando o método de titulação potenciométrica e a microscopia eletrônica de varredura (SEM).
As misturas de PA6/PC foram analisadas pela variação dos valores de torque em relação ao tempo de processamento da mistura.
A determinação de grupos terminais NH2 do homopolímero PA6 e das misturas poliméricas PA6/PC foi realizada por titulação potenciométrica, utilizando-se soluções das amostras a 4% p/v (ácido fórmico como solvente), após a prensagem. Utilizou-se o ácido perclórico em metanol, 0,5N, como solução titulante[2,3,7].
Com os valores obtidos de volume de titulante foi possível calcular a concentração meq NH2/Kg polímero segundo a fórmula.
onde:
a é o volume de titulante para amostra,
b é o volume de titulante para o branco,
N é a concentração da solução titulante,
m é a massa de amostra [7]
A microscopia eletrônica de varredura possibilitou a análise da morfologia das misturas poliméricas. As misturas PA6/PC foram analisadas em um microscópio eletrônico de varredura (SEM), JEOL, modelo JSM-5300 com metalizador, nas seguintes condições: voltagem de aceleração de elétrons = 20 KV e ampliação de 5000 vezes.
Resultados e Discussão
Torque
As misturas físicas de PA6/PC quando processadas a 240 °C durante 10, 30 e 60 minutos, apresentam aumento nos valores de torque durante o processo de mistura[2-7]. Nos 5 minutos iniciais, as misturas sofrem processo de fusão, que é caracterizado pela diminuição do torque. O aumento dos valores de torque após 5 minutos de mistura indica a possível ocorrência de interação e/ou de reação química entre os homopolímeros.
As Figuras 1 - 3 mostram as curvas de variação dos valores de torque versus tempo das misturas de PA6/PC em relação ao torque do homopolímero PA6.
As curvas de variação do torque mostram também a dependência da velocidade de reação entre PA6 e PC, com relação a composição da mistura[6]. Essas variações podem ser atribuídas a reações entre os homopolímeros, que são dependentes da composição e do tempo de processamento das misturas, como também a possíveis reações de degradação do copolímero formado, com liberação de moléculas pequenas. Pode-se verificar (Figura 1) que a variação dos valores de torque aumenta à medida que cresce a percentagem de PC na mistura. Nas Figuras 2 e 3, pode-se observar que na mistura PA6/PC (90/10% m/m), a possível reação se inicia em tempo mais curto, tanto para 30 minutos quanto para 60 minutos de processamento. Esse fato deve estar relacionado com a maior interação entre as moléculas de PA6 e PC. Uma quantidade menor de PC (95/5% m/m) causa um atraso na formação do copolímero, devido a menor percentagem de grupos carbonato reativos do PC. O aumento na quantidade de policarbonato para 15% parece dificultar a dispersão entre os polímeros, diminuindo ligeiramente a velocidade de reação.
Pode-se verificar nessas figuras, que há um aumento dos valores de torque superior a 100% em relação ao tempo de processamento. As misturas processadas a 60 minutos apresentam dois patamares distintos de aumento do torque. Esses patamares podem ser atribuídos às reações entre as moléculas de PA6 e PC, entre 10 e 20 minutos (mecanismo proposto no Esquema 2) e a possíveis reações de degradação do copolímero PA6-PC formado, com a produção de compostos de baixo peso molecular e ou a reticulação das cadeias, entre 35 e 50 minutos.
Concentração de grupos terminais NH2 - Titulação potenciométrica
A reatividade do copolímero de PA6-PC formado "in situ" foi analisada através da determinação de grupos NH2 terminais. A Figura 4 mostra a variação da concentração de NH2 terminal em função da variação da percentagem de PC nas misturas, para os três tempos de processamento. Pode-se verificar que há um aumento nos valores de NH2 terminal, quando comparados com os valores de PA6 puro. Esses resultados indicam que podem existir grupos NH2 não reagidos, quando pequenas quantidades de PC estão presentes na mistura, além da formação de mais grupos NH2 pela degradação do copolímero.
A pequena diminuição do teor de NH2, verificada na composição da mistura, está diretamente relacionada com a diminuição da percentagem de PA6 e com a dispersão entre os polímeros, que terá influência sobre a formação do copolímero PA6-PC e conseqüentemente sobre sua degradação, formando grupos NH2 "livres" e liberando CO2.
A variação do torque, apresentada nas Figuras 1-3, indica que o copolímero de PA6-PC foi formado após 5 minutos de processamento. Porém, para as misturas processadas durante 10 minutos houve formação de pequena concentração de copolímero, ainda restando grupamentos NH2 "livres" no PA6. Este fato pode ser explicado pelo curto tempo de processamento da mistura, insuficiente para a dispersão dos homopolímeros. Para as misturas processadas a 30 e 60 minutos, as variações nos valores de torque foram bem mais significativas. Pode-se concluir que um alto teor de grupos NH2 terminais reagiu para formar o copolímero, porém ocorreu uma posterior degradação das ligações uretânicas, formadas durante a reação, produzindo grupos NH2 "livres" e liberando CO2 (reação de grupos isocianato com água). Esse alto teor de NH2 também pode estar relacionado com a possível degradação do PA6, provocada pelo longo tempo de processamento. A estrutura porosa apresentada pelas amostras durante o processamento (30 e 60 minutos) indica a liberação de substância gasosa (CO2) durante o processo de mistura.
Microscopia eletrônica de varredura
As superfícies fraturadas das misturas foram observadas por microscopia eletrônica de varredura. A Figura 5 apresenta as micrografias dos homopolímeros PA6 e PC obtidas sob um feixe eletrônico de 20 kv e ampliação de 5000 vezes. Essas figuras mostram que as amostras não sofreram qualquer degradação devido a influência da intensidade do feixe elétronico ou da ampliação da micrografia. No entanto, as misturas de PA6/PC apresentaram sensibilidade crescente à medida que se aumentou a percentagem de PC na mistura ou o tempo de processamento. Com o aumento da percentagem de PC e do tempo de processamento houve interferência na nitidez da imagem das amostras. Durante o processo de análise microscópica as amostras mostraram-se sensíveis a intensidade do feixe eletrônico e ao aumento da ampliação da imagem devido a degradação, com formação de rachaduras e algumas vezes de crateras, durante a focalização e submissão de uma área desejada da amostra à radiação em até 60 segundos. Esse fato foi atribuído a presença do copolímero de PA6-PC, formado durante o processo de mistura. A análise dessas amostras mostrou que, provavelmente, a presença de ligações uretânicas no copolímero torna as misturas de PA6/PC mais susceptíveis à degradação. A degradação dessas amostras durante a análise microscópica origina estrias e/ou rachaduras e até algumas "crateras" nas estruturas das mesmas, como mostrado nas Figuras de 6-8.
Conclusões
O aumento do torque das misturas PA6/PC comprova a ocorrência de forte interação ou reação entre as moléculas desses dois homopolímeros, levando à formação do copolímero. As misturas de PA6/PC apresentam maior concentração de grupos NH2 que o homopolímero de PA6. Esses resultados podem estar relacionados à reação entre as cadeias de PA6 e de PC, que gera um número maior de grupos NH2 terminais, devido à degradação da ligação uretânica e posterior reação dos grupos isocianato com a umidade absorvida pela amostra. Essa reação foi também verificada através da microscopia eletrônica de varredura.
Agradecimentos
Ao CNPq e CEPG/UFRJ pelo apoio financeiro e pela bolsa IC (PIBIC/UFRRJ), concedida à André Luis da Silva dos Santos.
Enviado: 23/10/03
Aprovado: 20/05/04
- 1. Gattiglia, E.; Turturro, A.; Lamantia, F. P. & Valenza, A. - J. Appl. Polym. Sci., 46, p. 1887 (1992).
- 2. Montaudo, G.; Puglisi, C.; Samperi, F. & Lamantia, F. P. - J. Polym. Sci., Part A, 34, p. 1283 (1996).
- 3. Montaudo, G.; Puglisi, C. & Samperi, F. - J. Polym. Sci., Part A, 32, p. 15 (1994).
- 4. Costa, D. A. & Oliveira, C. M. F. - J. Appl. Polym. Sci., 69, p. 857 (1998).
- 5. Costa, D. A. & Oliveira, C. M. F. - J. Appl. Polym. Sci., 8, p. 2556 (2001).
- 6. Costa, D. A. & Oliveira, C. M. F. - Int. J. Polym. Mat. 51, p. 393 (2002).
- 7. Frey, H. J. & Knox, J. R. - "Analysis of Monomers and Polymeric Materials Plastics Resins Rubbers Fibres", in: Analytical Chemistry of Polymers, Part I, G. M. Kline (ed.), Interscience Publishers, Inc., New York (1989).
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
11 Nov 2004 -
Data do Fascículo
2004
Histórico
-
Aceito
20 Maio 2004 -
Recebido
23 Out 2003