Resumo
O objetivo geral desta pesquisa foi explicar como o barema e a redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) expõem e acirram as desigualdades sociais. Os objetivos específicos buscaram demonstrar como a escrita é afetada pelas relações de classe; relacionar os critérios de correção da redação do Enem às desigualdades sociais; e discutir, a partir das teorias de Bourdieu e Bernstein, como as competências evidenciam as desigualdades. A hipótese da pesquisa propõe a redação enquanto promotora das desigualdades entre os candidatos do Enem. O objetivo analisado foi o Guia do Participante Enem 2023, que traz 10 redações que alcançaram a nota 1000 em 2022. Metodologicamente, utilizou-se a Análise de Conteúdo para esmiuçar os itens, e os resultados mostram uma média de 15 operadores e conectivos argumentativos por redação. Em relação ao repertório sociocultural, foi mais comum o uso de fontes científicas nos textos e 12 personalidades sustentaram a argumentação dos participantes.
Palavras-chave
redação; Enem; repertório sociocultural
Abstract
This research had the general objective of explaining how Brazil’s National High School Exam (ENEM) essay and scoring criteria expose and exacerbate social inequalities. Specifically, the study aimed to demonstrate how writing is affected by class relations, relate the ENEM essay scoring criteria to social inequalities, and discuss — based on the theories of Bourdieu and Bernstein — how competencies highlight such inequalities. The hypothesis proposes that the essay promotes inequalities among ENEM applicants. The analysis focused on the 2023 Participant Booklet, which contains ten essays that achieved the highest score in 2022. As for methodology, Content Analysis was employed to analyze the items, with the results showing an average of 15 argumentative operators and connectives per essay. As for sociocultural repertoire, the texts predominantly used scientific sources, with twelve personalities supporting the arguments of applicants.
Keywords
essay; ENEM; sociocultural repertoire
Resumen
El objetivo general de esta investigación fue explicar cómo el barema y el ensayo del Examen Nacional de Enseñanza Media (Enem) exponen e intensifican las desigualdades sociales. Los objetivos específicos fueron demostrar cómo la escritura se ve afectada por las relaciones de clase; relacionar los criterios de corrección del ensayo del Enem con las desigualdades sociales; y discutir, a partir de las teorías de Bourdieu y Bernstein, cómo las competencias evidencian las desigualdades. La hipótesis de la investigación sostiene que el ensayo promueve las desigualdades entre los candidatos al Enem. El objeto analizado fue la Guía del Participante 2023, que incluye 10 ensayos que obtuvieron 1000 puntos en 2022. Metodológicamente, se utilizó el análisis de contenido para evaluar los ítems, y los resultados muestran un promedio de 15 operadores argumentativos y conectivos por ensayo. En cuanto al repertorio sociocultural, el uso de fuentes científicas en los textos fue más frecuente y 12 personalidades fundamentaron los argumentos de los participantes.
Palabras clave
ensayo; Enem; repertorio sociocultural
Introdução
Os processos seletivos para admissão nos cursos superiores estratificam a população e permitem que um grupo reduzido ocupe as carreiras acadêmicas (Bianchetti, 1996). Existem distintas formas de seleção dos candidatos para esse nível de ensino. Na Holanda, por exemplo, definem-se os candidatos a partir de sorteio. Enquanto isso, na Inglaterra, analisa-se o perfil do aspirante ao curso desejado, sendo uma avaliação puramente qualitativa. No leste europeu, a vaga universitária é conquistada pelo grau de motivação profissional do aspirante (Guimarães, 1984).
Atualmente, no Brasil, os resultados do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) são usados para ingressar nos cursos superiores das redes pública e privada. O Enem é o segundo maior vestibular do mundo, ficando atrás do Gaokao, aplicado na China. Ele avalia os conhecimentos em quatro grandes áreas1, além da escrita e argumentação mediante uma redação. Seu gerenciamento é feito pelo governo federal e sua finalidade é democratizar as chances de acesso à educação superior. Porém, assim como os vestibulares tradicionais, o Enem se tornou uma prática seletiva atenuadora das desigualdades (Bianchetti, 1996).
Do ponto de vista das ciências sociais, o Enem é um objeto promitente de análise, pois sua investigação pode focar o indivíduo, a estrutura social ou ambos. Este estudo empenha-se na interpretação das desigualdades, considerando a estrutura e as relações que ocorrem em seu interior. Tendo em vista que o vestibular é amplo e pode ser esmiuçado cientificamente por múltiplas óticas, escolheu-se a redação como objeto de estudo. Assim, acredita-se que ela disponha de elementos capazes de mostrar como a desigualdade social afeta os candidatos às universidades brasileiras.
As questões que mobilizaram esta pesquisa procuram compreender: como as desigualdades escolares são evidenciadas pelo barema da redação do Enem? O que torna um texto exemplar para os corretores do Ministério da Educação? Como isso explica os diferentes desempenhos dos candidatos? Como hipótese, acredita-se que a redação do Enem possa evidenciar e acirrar, por meio dos seus critérios, as desigualdades escolares entre os candidatos ao ensino superior. Essa relação procura entender quais elementos indicam as desigualdades, tarefa empreendida por vários sociólogos desde o século XX.
Como objetivo mais amplo, pretende-se explicar como o barema da redação do Enem expõe e acirra as desigualdades sociais. Seus objetivos específicos consistem em demonstrar como a escrita é afetada pelas relações de classe; relacionar os critérios de correção da redação do Enem às desigualdades sociais; e discutir, a partir das teorias de Bourdieu e Bernstein, como as competências evidenciam as desigualdades sociais. O objeto analisado será o barema de correção e as redações disponíveis no material “A Redação do Enem 2023: cartilha do participante”, divulgado via internet2 pelo Ministério da Educação.
A redação nos exames de seleção para o ensino superior
Guimarães (1984), ao reconstruir a história da indústria dos vestibulares no Brasil, mostra que a inclusão dos itens dissertativos nos processos seletivos ocorreu durante a Ditadura Militar, quando o Ministério da Educação propôs um Grupo de Trabalho dedicado a pensar formas de melhorar o aprendizado da língua portuguesa nas escolas. A motivação para essa medida veio dos resultados insatisfatórios dos participantes nos vestibulares até a década de 1970. A autora afirma que existia uma crença de que a inclusão da redação nas seleções melhoraria a qualidade da educação básica.
Pelo contrário, a redação não alterou a situação dos estudantes. Ela abriu um espaço para que o seu ensino ocorresse nos preparatórios específicos focados no vestibular. Isso reduziu a capacidade de escrita àquilo que é exigido nos processos seletivos (Bianchetti, 1996; Guimarães, 1984). Tem-se aí uma evidência da desigualdade, pois o acesso aos “cursinhos” é reservado para uma parcela da população com capital cultural e econômico suficiente para investir em atividades extraescolares voltadas para o vestibular. Esse comportamento é adotado pelas novas classes médias, que agem de forma estratégica em relação à escolarização de seus filhos (Ball, 2011; Nogueira, 2010).
Retomando a discussão sobre o vestibular brasileiro, Bento Júnior, Bento & Ribeiro (2023) afirmam que na década de 1990 um misto entre a pressão dos movimentos sociais e dos órgãos de financiamento internacional levou o governo federal a criar o Enem, em 1998. De acordo com os autores, o objetivo do Enem era mensurar os conhecimentos dos concluintes do ensino médio, não sendo usado como um recurso para admissão na graduação. Em relação à redação, a primeira aplicação trouxe um trecho da música O que é O que é, de Gonzaguinha, e o tema foi “Viver e aprender”.
A primeira década dos anos 2000 foi marcada pela expansão das oportunidades de acesso à educação superior no Brasil. Azevedo e Vargas (2023) mostram vinte medidas3 adotadas pelo governo federal para ampliar as vagas nos cursos de graduação. Os autores sustentam a ideia de que tais iniciativas reduziram as desvantagens entre os estudantes que buscavam esse nível de escolarização, evidenciado pela mudança do nível socioeconômico (NSE) da população e o aumento dos estudantes oriundos das camadas com renda menor nas instituições de ensino superior.
Entre os empreendimentos feitos pelo Estado, a reformulação do Enem, ocorrida em 2009, aprimorou os critérios avaliativos da prova a partir das noções de competências e habilidades. Competência diz respeito a uma ação produzida por um estudante que será validado por quem o avalia, ou seja, sua performance (Aguiar & Ribeiro, 2010). Esse conceito é amplo e indica que mais de um caminho pode ser seguido para solucionar um problema. A ênfase é dada ao percurso escolhido e não, exclusivamente, ao resultado alcançado. Isso impede que a noção de competência se restrinja ao tecnicismo (Bento Júnior, 2023).
Banadusi (2011) mostra que o conceito de “competência”, no campo do trabalho, está associado à capacidade de exceder o que foi proposto em uma atividade. A definição desse constructo assume um viés plurifatorial, pois reúne elementos e causas numerosos e heterogêneos. Normalmente, quando se fala em competência, tem-se características ligadas ao conhecimento, ao know-how profissional, ou às disposições básicas que todos os indivíduos têm (saber-ser). Em uma postura crítica, Ropé (2011) afirma que as competências são a engrenagem central das avaliações de larga escala, pois todo o tipo de estatística explicará o maior ou menor desempenho dos estudantes.
Françoise Ropé (2011) reitera que as competências estão ligadas à produção de diagnósticos – que representam a racionalidade instrumental – feitos em avaliações centralizadas e que tentam qualificar aquilo que os partícipes não têm. Além disso, outro problema dessa concepção é a forma como sua operacionalização acontece nas escolas. Os saberes são fragmentados em objetivos técnicos, esvaziando o seu sentido. Mesmo assim, a utilização das competências é adotada em escala local e global para definir a eficácia dos estabelecimentos de ensino e compará-los a outros ao redor do mundo.
Na redação do Enem, cinco competências subsidiam a avaliação do texto feito pelos candidatos. Cada uma delas tem um valor de 200 pontos, divididos em cinco grupos que representam os níveis de proficiência averiguados pelos corretores. Essa escala é como um continuum em que os textos variam entre a ausência dos componentes daquela competência, até o seu pleno domínio. Quantitativamente, os níveis (de 0 a 5) são definidos a partir de um desvio-padrão de 40 pontos (Quadro 1). A nota final do candidato é a soma da pontuação obtida nas cinco competências, que pode totalizar 1000 pontos (Brasil, 2023).
Nos materiais orientadores do Ministério da Educação, no tocante ao texto produzido na redação do Enem, espera-se do candidato:
a produção de um texto em prosa, do tipo dissertativo-argumentativo, sobre um tema de ordem social, científica, cultural ou política. Os aspectos a serem avaliados relacionam-se às competências que devem ter sido desenvolvidas durante os anos de escolaridade.
(Brasil, 2023, p. 4)
As normas também exigem que o autor do texto argumente sobre um tema – previamente definido e divulgado apenas no momento da prova – a partir de repertório sociocultural, coerente e coeso, escrito em linguagem formal. Além disso, é necessária uma proposta de intervenção social à questão apresentada que respeite os direitos humanos e esteja alinhada com os elementos adotados no texto. A banca corretora do Enem desconsidera as redações em branco; que não obedeçam ao tipo dissertativo-argumentativo; com menos de sete linhas; textos em outra língua; e qualquer forma de comunicação que destoe das exigências citadas até aqui (Brasil, 2023).
As competências da redação pela ótica de Pierre Bourdieu: a reprodução da estrutura social
No campo da educação, Bourdieu abriu possibilidades para que os sociólogos compreendessem as relações sociais a partir da forma como a escola se organizava. Para Nogueira e Nogueira (2002), ele foi responsável por uma revolução educacional, pois aprofundou a análise acerca da relação do desempenho escolar com a origem social, escancarando a falácia presente na massificação da escola pública – justa, moderna e democrática – e explicando as frustrações dos jovens das camadas médias e populares que não alcançavam os mesmos resultados daqueles pertencentes às classes altas.
De acordo com Valle (2007), vários teóricos, incluindo Bourdieu, apontam a linguagem como um fenômeno sócio-histórico. Dessa maneira, quando sua institucionalização acontece – nos dicionários, livros e materiais que orientam a escrita formal –, é possível perceber uma diferença do habitus linguísticos entre as diferentes classes. As classes superiores lidam com mais naturalidade com as situações formais que exigem o domínio desse tipo de linguagem, isso acontece devido aos recursos simbólicos que possuem. Para compreender como se constrói esse habitus linguístico, é fundamental recorrer ao conceito de capital cultural.
Esse conceito foi uma contraposição ao inatismo da intelectualidade humana e expõe a ideia de que as classes sociais são responsáveis pela transmissão das estruturas mentais, ferramentas intelectuais, linguagem, cultura geral, posturas corporais, disposições estéticas, bens culturais e outros. A transmissão de cada um desses recursos é feita pelas famílias (Nogueira, 2011). A existência do capital cultural se dá em três formas: no estado incorporado, como uma disposição duradoura; no estado objetivado, presente nos bens culturais; e no estado institucionalizado, que acontece pela posse de títulos (Nogueira & Catani, 2007).
Versando sobre o quadro de competências da redação do Enem pela perspectiva bourdiesiana, torna-se previsível que o domínio das proficiências mais altas seria alcançado por indivíduos das camadas média-alta e alta. Ainda que essa explicação pareça óbvia, é necessário discutir como essa introjeção do capital acontece, bem como a sua capacidade de se expressar no vestibular. Para tal, retoma-se a Competência III, que prevê “selecionar, relacionar, organizar e interpretar informações, fatos, opiniões e argumentos em defesa de um ponto de vista” (Brasil, 2023).
Esta competência, de acordo com os materiais dos corretores de redação, avalia a capacidade do candidato em mobilizar diferentes fontes de informações na escrita de seu texto. Valoriza-se, portanto, o seu repertório sociocultural, entendido como todos os recursos que não são provenientes dos textos motivadores disponibilizados na proposta de redação, relacionados aos elementos do tema e validados por alguma área do conhecimento (Brasil, 2023). Portanto, busca-se a legitimidade, o uso produtivo e a pertinência dos elementos que extrapolam o que foi dado nos textos motivacionais.
As exigências para o alcance dos 200 pontos nesta competência, pela ótica de Bourdieu, indica a necessidade do estado objetivado do capital cultural. Ao aprofundar a sua definição, tem-se que a base deste capital são os suportes materiais e sua condição específica de apropriação (Nogueira & Catani, 2007). Sendo assim, o uso do repertório legítimo, como a citação de um livro clássico, exige a apropriação simbólica e material desse bem, exigindo a posse de capital econômico e cultural. Não basta ir a uma biblioteca com itens de acesso restrito, o indivíduo deve se apropriar daquele bem, e isso é algo mais comum nas classes altas.
Acerca disso, Almeida (2004) demonstra, ao analisar o ensino da Língua Portuguesa em duas escolas frequentadas pela elite de São Paulo, que os alunos com familiares formados na Universidade de São Paulo (USP) e que eram egressos de uma das instituições estudadas, expressavam seu capital cultural de forma mais natural durante a produção de seus textos, extrapolando o conteúdo dado em sala de aula. Nessa situação, a escola se propõe a despertar a sensibilidade dos discentes que, por sua vez, são favorecidos na realização do vestibular. Esse trecho ilustra a forma incorporada do capital cultural.
Nesse sentido, a incorporação do capital cultural – que pressupõe a sua inculcação e assimilação – exige um investimento do ponto de vista individual, como um cultivo, tornando-o uma parte da pessoa, ou seja, um habitus (Nogueira & Catani, 2007). Essa aquisição não é instantânea ou hereditária, mas sugere um esforço ao decorrer do tempo para que os bens simbólicos sejam naturalizados. Ao conquistar essa faceta, demonstra-se como alguns bens ou eventos são tratados de forma metódica, satisfatória e contempladora para aqueles que fazem o seu usufruto (Bourdieu, 2007).
Para encerrar, é importante destacar que Bourdieu produziu um estruturalismo crítico, cuja função era escancarar a forma como a sociedade estava organizada (Thiry-Cherques, 2006). Ele percebeu a reprodução de classes ocorrida no espaço escolar, indo contra o discurso do “otimismo pedagógico” dos anos 1960. O sistema escolar valoriza os inteligentes, vocacionados e com acesso aos bens simbólicos (Valle, 2007), mas camufla o capital cultural detido por esses sujeitos. O mesmo parece ocorrer com o Enem, pois valorizam-se aqueles que alcançam as competências, tornando-os exemplos para os futuros vestibulandos, mas encobrem-se os múltiplos fatores responsáveis pelo êxito.
Bernstein e o discurso pedagógico: o Enem como um caso de classificação e enquadramento fortes
Basil Bernstein foi um sociólogo contemporâneo de Bourdieu que apresentou outra leitura para as relações sociais que ocorriam na escola. Seus trabalhos dialogam com seus críticos – como Pierre Bourdieu – e propõem uma teoria focada nas relações entre a comunicação, classe social e poder no interior das instituições de ensino (Bernstein, 1984; Bernstein, 2003; Santos, 2003a; Santos, 2003b). A partir desses três constructos, a crítica à noção de competência na redação do Enem terá continuidade. Porém, antes de iniciá-la, é mister conhecer algumas partes da teoria bernsteinsiana.
O interesse de Bernstein se concentrava nas hierarquias presentes na escola. Ele destaca o conceito de competência, reiterando que “são intrinsecamente criativas e se adquirem tacitamente por meio de interações informais. São realizações práticas” (Bernstein, 2003, p. 77). As competências são fundamentais para a construção e a participação no mundo e sua aquisição extrapola as relações de poder, mesmo quando essas relações acontecem despercebidamente (Bernstein, 1996; Bernstein, 2003). No contexto escolar, as pedagogias baseadas nas competências almejam o fortalecimento do poder de um sujeito ou grupo, opondo-se à ideia de desempenho – que valoriza os resultados individuais e a estratificação (Santos, 2003a).
As práticas pedagógicas adotadas na educação resultam da tensão produzida por recontextualizações pedagógicas sucessivas, que abarcam desde o currículo até as práticas pedagógicas dos professores (Santos, 2003b). A recontextualização é a regulação do o que e como um processo de transmissão-aquisição acontecerá. Essa decisão pode abranger a gestão escolar ou o Estado (recontextualização oficial) e é o passo principal para que o conhecimento científico seja reapropriado, realocado, refocalizado e relacionado com outros discursos que produzirão uma nova ordem específica (Santos, 2003b).
O discurso pedagógico ergue-se das regras de recontextualização e sua principal característica é a regulação, que tem um caráter moral e modela as posturas dos estudantes. Durante as aulas, os conteúdos derivam de lógicas próprias, formadas por regras que asseguram a validade do discurso institucional (Santos, 2003b). Apropriando-se dessa dinâmica, forjou-se uma ideia de que a capacitação é uma habilidade vital para os sujeitos. Ela foi incorporada pelas reformas pedagógicas e indica a prontidão dos alunos para serem ensinados ou responderem eficientemente aos conteúdos (Bernstein, 2003).
Entendida dessa maneira, a capacitação é o substrato do discurso socialmente vazio e genérico utilizado por agências especializadas na recontextualização e reprodução de conceitos abstratos, como vida e trabalho. Nesses espaços, que podem ser exemplificados pelos cursinhos pré-vestibular, a formação crítica é sufocada (Bernstein, 2003). Dois conceitos que explicam esse quadro são classificação e enquadramento. A classificação é direcionada à manutenção das fronteiras entre os diferentes grupos, já o enquadramento trata das relações sociais estabelecidas por eles (Morais & Neves, 2007).
Esses conceitos clarificam a forma como o poder se difunde na interação pedagógica. Em situações com classificação e o enquadramento forte, há um maior controle sobre as regras e os conhecimentos transmitidos. Nesse caso, o controle é explícito, e a posição ocupada pelos sujeitos é naturalizada. Por outro lado, quando o controle é implícito, as ações são espontâneas e passíveis de indagações, ou seja, a delimitação entre os envolvidos é menos clara. São essas relações que moldam os códigos e procedimentos expressos nas regras (Morais & Neves, 2007).
Numa experiência em sala de aula, essas relações tornam parte daquele contexto. Se a classificação e o enquadramento mudarem, as normas deixam de ter aquele significado (Morais & Neves, 2007). Bernstein (2003) usa o modelo de desempenho de práticas e contexto pedagógico para distinguir competência e desempenho, considerando os critérios tempo, espaço e discurso; orientação para avaliação; controle; texto; autonomia e economia. Para a análise da redação do Enem, serão aprofundados os modelos de competência e desempenho aplicados ao texto pedagógico.
A produção textual no contexto de um modelo de competência indica “o desenvolvimento da competência do adquirente, de modo cognitivo-afetivo ou social, e esses são os enfoques. O professor opera com uma teoria de leitura que o adquirente lhe oferece (ou não)” (Bernstein, 2003, p. 84). Há, nessa situação, um monopólio, por parte do docente, em relação ao significado dos signos usados pelo estudante durante a correção do texto. Em outras palavras, o professor recontextualiza os conhecimentos acadêmicos para corrigir aquilo que foi produzido por um estudante. No Enem, a banca corretora assume esse papel.
Retomando o barema da redação, a Competência I – demonstrar domínio da modalidade escrita formal da língua portuguesa – e a Competência IV – demonstrar conhecimento dos mecanismos linguísticos necessários para a construção da argumentação – exemplificam o modelo de competência mencionado anteriormente. Para os dois critérios há uma orientação própria de codificação específica, cujas regras de realização exigem uma produção adequada a um contexto que é responsável pela produção de significados. Assim, para alcançar o esperado, o texto feito deve mostrar o domínio e reconhecimento das regras (Morais & Neves, 2007).
Por outro lado, o corretor da prova de redação encontra-se em um contexto em que a classificação e o enquadramento são fortes, de tal modo que sua posição não é questionada. Uma evidência da desigualdade é a dificuldade na compreensão e seleção dos significados necessários para produzir um texto que certos alunos têm (Morais & Neves, 2007). Em uma avaliação de larga escala como o Enem há, nesse caso, um modelo de desempenho, em que o texto, ainda que avaliado por competências, é expresso por notas (Bernstein, 2003). Isso representa, como já dito, a manutenção de algumas instituições no topo da hierarquia.
Segundo Bernstein (2003), o modelo de desempenho impõe uma teoria diagnóstica que faz uma varredura dos acertos e erros, convertendo-os numericamente. Há uma pedagogia visível marcada por critérios claros, procedimentos de mensuração explícitos e a padronização dos textos feitos pelos estudantes. Essas características permitem a comparação das falhas e sucessos das instituições, sujeitos e professores. Além disso, é possível fazer um ajustamento dos alunos às escolas a partir do seu perfil acadêmico (Bernstein, 1984), modulando o mercado escolar.
Dados do Nexo Jornal, publicados em 2023, exibem um ranking do desempenho dos participantes no Enem. As conclusões revelam que apenas 5% dos 2,7 milhões dos avaliados obteve média superior a 700 pontos nas quatro áreas do conhecimento com a redação. Essa informação realça elementos que compõem o discurso pedagógico oficial – produzido pelo Estado – sobre o aprendizado dos vestibulandos, fortalecendo (ou enfraquecendo) a classificação e o enquadramento. Nas escolas, modela-se o discurso regulador posicionando os docentes e discentes no contexto da reprodução educacional (Morais & Neves, 2007).
Surge dessa dinâmica a exigência pela excelência e a melhoria dos resultados modificando o discurso instrucional – conhecimentos e competências cognitivas – ao molde do discurso regulador – normas, regras, valores, competências socioafetivas adquiridas no meio escolar (Morais & Neves, 2007). Esse conjunto de parâmetros reforça os valores de classe e é responsável, no interior das escolas, por concentrar os holofotes naqueles que reproduzem o discurso regulador, silenciando aqueles que não veem sentido nos significados de alguns comandos, como a realização do vestibular (Morais & Neves, 2007; Santos, 2003b).
Metodologia
Esta pesquisa é classificada como exploratória. Estudos com este caráter buscam aprofundar um problema, aumentando a visibilidade do problema investigado ou construindo hipóteses capazes de ampliar as descobertas relacionadas a um certo objeto (Gil, 2002). Por se tratar de uma imersão em um assunto, metodologicamente, este é um estudo qualitativo. Minayo (2007) afirma que pesquisas deste tipo lidam com representações, intencionalidades e relações que não são explicadas exclusivamente por meio da quantificação ou objetividade. Conceituar a pesquisa qualitativa de uma única forma é incabível (Alves & Aquino, 2012).
Para Alves & Aquino (2012), a pesquisa qualitativa é uma forma de compreensão, interpretação e explicação de acontecimentos marcados por consensos e conflitos resultantes de interações proporcionadas pelas distintas visões de mundo. Na condução da análise dos dados, optou-se pela Análise de Conteúdo. Bardin (1977) explica que esse instrumento abrange técnicas voltadas à busca dos procedimentos sistemáticos e objetivos, capazes de compreender as condições de (re)produção das mensagens. Ao adotar esse procedimento, espera-se uma postura crítica e dinâmica em relação à linguagem em sua mais ampla acepção (Franco, 2008).
A Análise de Conteúdos é executada em três etapas: pré-análise, exploração do material e análise e interpretação dos dados. Na pré-análise, faz-se a seleção dos itens e a delimitação do corpus com a preparação do material. No momento de exploração, se estabelecem as codificações que originam categorias simbólicas e temáticas. A partir delas, é feita a comparação dos dados que envolvem a sua classificação e interpretação (Bardin, 1977). O que se espera com essa prática é a compreensão e generalização das características do corpus de significado presentes na linguagem (Franco, 2008).
Segundo Franco (2008), a linguagem expressa a existência humana que define representações sociais dinâmicas provenientes da interação entre linguagem, pensamento e ação. Complementarmente, a autora sentencia que o sentido atribuído a algo resulta de um posicionamento individual e objetivado, concretizado na prática social e manifesto por vias cognitivas, valorativas e emocionais dentro de um contexto. O corpus deste estudo são os textos disponíveis na Cartilha do Participante do Enem 2023. Este material se refere ao Enem do ano antecedente, ou seja, serão analisadas as redações de 2022, cujo tema foi “Desafios para a valorização de comunidades e povos tradicionais no Brasil” (Figura 1).
Resultados e discussões
Pré-análise e exploração dos materiais
O processo de pré-análise se organizou com a seleção das dez redações divulgadas no Guia do Participante de 2023. Poderiam ser escolhidas distintas versões do material norteador dos candidatos, porém, a proposta de análise buscou o isolamento do constructo tema. Ao isolá-lo, é impossível considerar que a complexidade do tema afetou a forma de escrita dos autores. Ainda que a utilização das competências permita uma comparação ao longo do tempo, o foco foi entender como a escrita dos candidatos com notas excepcionais se estruturou naquele contexto específico.
Na preparação do material, é fundamental retomar a conceituação de texto dissertativo-argumentativo. Para o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), esse gênero é caracterizado pela formalidade em sua escrita (Brasil, 2023). Ao escrever um texto desse tipo, espera-se que o estudante domine as habilidades de outros textos, como o expressivo; informativo-referenciais; e criativos (Bittencourt, 1989). As características de cada um, bem como as capacidades básicas exigidas, foram sistematizadas no Quadro 2. Ele também apresenta as especificidades da escrita argumentativa.
As instruções para a produção da redação do Enem impõem que o texto explane o tema no parágrafo introdutório; em seguida, nos parágrafos de desenvolvimento, deve-se defender um ponto de vista a partir da argumentação e repertório sociocultural legitimado. Por fim, a conclusão traz a proposta de intervenção, que é formada por uma ação (o quê?), por um agente (quem?), por um meio (como?), por um efeito (para quê?) e por detalhamento. A proposta de intervenção pode aparecer ao longo dos outros parágrafos, no entanto, há um consenso entre os professores de redação, que sugerem a sua presença no fim da redação.
Durante a leitura flutuante do material, a formatação supracitada foi encontrada em todas as redações. Simultaneamente, a regra da exaustividade favoreceu a produção das codificações que emergiram da exploração do corpus. Com isso, considerou-se o número de conectivos nos textos; os autores citados; os sinônimos; os argumentos apresentados nos parágrafos de desenvolvimento 1 e 2, que também são expostos na introdução; e a fonte dos repertórios socioculturais, classificados como histórica, literária, artística ou midiática, científica ou legislativa.
Análise e interpretação dos dados
Antes de trazer os primeiros resultados, faz-se necessário compreender o que seria a excelência, sobretudo no caso da escrita. De acordo com Almeida (2004), as escolas – da elite paulista, foco de sua análise – empenham-se para que seus estudantes acessem uma multiplicidade de obras literárias e audiovisuais e sejam capazes de desenvolver a crítica e a interpretação desses bens. A intenção dessas práticas é a naturalização das competências e, consequentemente, o seu uso no vestibular. Há instituições em que o capital cultural é percebido de maneira fluída, em função do público dos estudantes; e em outras, ele carece de direcionamento diário. Os dois casos exemplificam a excelência escolar.
Os textos analisados foram destrinchados com codificações que representam a posse do capital cultural e, por outro lado, a classificação e o enquadramento fortes explícitos nas redações. A primeira codificação que demonstra esses constructos é o uso dos operadores e conectivos argumentativos. Segundo Peixoto (2017), os operadores e conectivos argumentativos são fundamentais para persuadir o leitor. Conceitualmente, “os operadores argumentativos são elementos linguísticos que afetam a interpretação da sentença e têm impacto sobre todo o domínio gramatical” (Peixoto, 2017, p. 164).
Nas redações observadas, a média de conectivos foi 15 (Tabela 1). Na Tabela 1, apresenta-se a quantidade desses recursos adotados em cada parágrafo. Sua análise também constatou a existência de 149 operadores argumentativos, que foram representados em uma nuvem de palavras (Figura 2). As expressões mais comuns foram: portanto, nesse contexto, ademais, além disso, logo, desse modo, nesse sentido, assim, dessa forma e a fim de. A aparição desses conectivos sucessivas vezes pode indicar, segundo Morais e Neves (2007), um afastamento entre o discurso educacional e aquele feito no quotidiano. Isso resulta da classificação forte que regula aquilo que é entendido como legítimo.
Os dados também lançam luz sobre a distinção entre os estudantes com notas excepcionais e os participantes do Enem do ano de 2022, que tiveram uma média na redação igual a 645 pontos (Gomes & Alfano, 2023). Essa discrepância extrapola a estrutura social ao demonstrar outros elementos que fazem parte do aparelho pedagógico (Santos, 2003). Há, nesses casos, uma modalidade introvertida de desempenho, cuja marca é a apropriação do discurso especializado com poucas variações no desempenho esperado dos estudantes e comum aos membros desse grupo (Bernstein, 2003).
A mesma constatação foi identificada ao observar o uso de sinônimos nas redações nota 1000 (Tabela 2). Os sinônimos, assim como os operadores e conectivos argumentativos, são elementos que podem servir para evidenciar o discurso especializado e, com isso, favorecer o distanciamento dos sujeitos de diferentes classes sociais. Tem-se aí um exemplo de como as relações de poder agem na construção dos textos e como o discurso pedagógico impede que os indivíduos possam mobilizar discursos não acadêmicos na produção de textos (Bernstein, 2003; Morais & Neves, 2007).
Em uma perspectiva pautada na classe social, o domínio dos distintos recursos linguísticos aponta como os estratos dominantes se apropriam diretamente dos meios e formas de produção cultural (Bernstein, 1984). Isso vai ao encontro da matéria do O Globo sobre o Enem 2022, que mostra uma vantagem de 182 pontos entre os estudantes da rede privada e os egressos das escolas públicas (Gomes & Alfano, 2023). As escolas privadas, no caso brasileiro, atendem às várias camadas da classe média. Esses públicos tentam garantir o seu sucesso a partir da educação (Nogueira, 2010), evidenciando a relação direta com a reprodução cultural e indireta com seus meios e formas de produção (Bernstein, 1984).
Ainda sobre a relação entre classe social e desempenho no Enem, em 2023, sessenta estudantes obtiveram a nota total na redação, um aumento de 233% em relação a 2022 (com somente dezoito notas 1000). Entre os candidatos com desempenho excepcional, apenas quatro eram estudaram da rede pública (Zanlorenssi & Froner, 2024). O grupo dos estudantes com excelência na escrita revela o atendimento às agências difusoras responsáveis pela manutenção da classificação forte, isto é, pela separação entre as categorias e demonstração do poder, que emerge quando a separação se torna evidente (Bernstein, 2003).
Os difusores da reprodução cultural são agentes e agências que disseminam certos princípios, práticas, atividades e formas simbólicas ou que se apropriam de princípios, práticas ou formas simbólicas para consumir mercadorias, serviços, atividades ou as próprias formas simbólicas (Bernstein, 1984). Em relação às redações, Ferreira (2000) afirma que os textos nunca são destituídos de intencionalidade. Um autor, quando escreve de maneira menos rebuscada e mais objetiva, por exemplo, expressa sentidos produzidos culturalmente e compartilhados ao longo de sua vida. Isso emite seus anseios e a leitura da realidade em que se encontra (Munhoz & Zanella, 2008).
Prosseguindo com a análise, houve a tipificação dos repertórios presentes nas redações da Cartilha dos Participantes 2023. A leitura exaustiva originou quatro grupos: históricas; científicas; artes e mídias; e legislativa. Um mesmo texto pode se enquadrar em múltiplos grupos, pois o candidato pode adotar diferentes fontes ao longo de sua argumentação. Inclusive, essa é uma tática sugerida pelo Inep. A construção das categorias considerou a fonte do repertório, distinguindo ideias ou teorias de acontecimentos históricos.
Citações artísticas (como poemas, músicas e obras literárias) foram agrupadas com as notícias. Essa decisão considerou a divulgação feita pela grande mídia. Artigos da Constituição Federal de 1988, da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) e da Organização das Nações Unidas (ONU) foram agrupados conjuntamente. Nos textos, encontrou-se 32 repertórios (Tabela 3), e o mais corriqueiro foi o científico, presente em um terço dos casos. A sua recorrência reforça um enquadramento forte, pois os estudantes adotam os recursos do aparelho pedagógico usado pelos difusores (Bernstein, 1984; Bernstein, 1996; Bernstein, 2003).
Nas citações científicas, o uso de autores é uma conditio sine qua non. Ao mencionar um conceito, é necessário apresentar o seu fundador, pois isso assegura maior legitimidade ao argumento. Segundo Gonzaga (2017), as escolhas das ideias no texto dissertativo-argumentativo precisam ser consistentes e não contraditórias. Para que isso ocorra, os argumentos podem ser feitos por um raciocínio lógico, feito por relações de causalidade; por provas concretas, fundamentadas em estatísticas, exemplos, fatos reais, leis e fontes confiáveis; e pela autoridade, quando se reproduz a fala ipsis litteris de um especialista. Doze personalidades foram encontradas, como mostra o Quadro 3.
A adoção dos autores ocorreu a partir de seus conceitos mais populares e das suas principais obras. Houve uma adequação ao tema da redação para que sua pertinência fosse alcançada. Um exemplo foi o conceito de estigma, proposto por Goffman, que explicou o tratamento dos povos tradicionais pelo Estado e a sociedade ao longo da história brasileira. Também houve citações literais dos pensadores, reforçando a legitimidade do argumento, ainda que sejam curtas e genéricas, como a fala de Sêneca: “Para a ganância, toda a natureza é insuficiente”.
Considerações finais
Esta foi uma pesquisa que surgiu da inquietação relacionada à noção de competência adotada pelo Estado em relação ao Enem. No decorrer deste trabalho, foram sintetizados alguns elementos das teorias de Pierre Bourdieu e Basil Bernstein para discutir a aplicação de uma avaliação de larga escala no contexto brasileiro. A escolha dos autores ocorreu de maneira cuidadosa devido às vias seguidas por cada um desses sociólogos. Por isso, a pretensão esperada neste curto ensaio tentou lançar luz sobre um objeto a partir de correntes distintas de interpretação.
A noção de capital cultural de Bourdieu possibilitou uma análise dos critérios avaliativos da redação pela ótica estrutural, baseada na reprodução das classes; enquanto isso, os conceitos de classificação e enquadramento de Bernstein permitiram pensar na forma como a redação favorece a construção do discurso pedagógico nas escolas e salas de aula. A combinação entre classe, discurso e poder fica clara quando nem todos os estudantes conseguem compreender os significados exigidos pelo vestibular. A interseção entre os autores consistiu no reconhecimento de que as desigualdades são endógenas e exógenas aos indivíduos e à escola.
Em relação ao alcance dos objetivos, este trabalho conseguiu demonstrar como a escrita no caso dos vestibulares indica a presença das desigualdades. Considerando mais do que a teoria da reprodução social, houve uma atenção focada nas relações de poder e controle social que acontecem no ambiente intraescolar. A análise dos critérios de correção do Inep também sugere a reprodução das desigualdades sociais, sendo entendidas como regras com pouca maleabilidade e que exigem a produção de um texto em contexto específico. Em relação ao último objetivo, houve a discussão das teorias de Bourdieu e Bernstein, contudo, devido ao objeto de análise, os dados foram lidos prioritariamente sob a ótica de Bernstein.
Esta pesquisa representou um esforço teórico à problematização de uma das faces do Enem, a produção textual. Ela é um objeto passível de análises por conhecimentos plurais como a sociolinguística, a sociologia da educação, a pedagogia, a psicologia e outras. O mérito desta pesquisa foi retomar sociólogos notáveis da contemporaneidade para tratar de algo específico da educação brasileira, o vestibular. A produção de reflexão a partir desses referenciais indica a capacidade de dialogar com problemas locais pela ótica global.
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Em seus itens objetivos o Enem avalia os candidatos nas áreas de Linguagens, Códigos e suas tecnologias; Ciências Humanas e suas tecnologias; Matemática e suas tecnologias; e Ciências da Natureza e suas tecnologias. O exame acontece em dois finais de semana. No primeiro, acontecem as provas de Linguagens, Ciências Humanas e Redação; e no segundo, das demais áreas.
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2
https://download.inep.gov.br/publicacoes/institucionais/avaliacoes_e_exames_da_educacao_basica/a_redacao_no_Enem_2023_cartilha_do_participante.pdf
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3
Expansão: Programa de Expansão das Universidades Federais (2003-2007); ProUni: Programa Universidade Para Todos (2004); Prolind: Programa de Apoio à Formação Superior e Licenciaturas Indígenas (2005); Incluir: Programa Acessibilidade na Educação Superior (2005); UAB: Sistema Universidade Aberta do Brasil (2006); PDE: Plano de Desenvolvimento da Educação (2007); Reuni: Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (2007-2012); Pnaes: Plano e, depois, Programa Nacional de Assistência Estudantil (2007); Fies (modificação): Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (2007); Procampo (implementação): Programa de Apoio à Formação Superior em Licenciatura em Educação do Campo (2007); Uniafro: Programa de Ações Afirmativas para a População Negra nas Instituições Federais e Estaduais de Ensino Superior (2008); ENEM (reformulação): Exame Nacional do Ensino Médio (2009); Sisu: Sistema de Seleção Unificada (2010); Pnaest: Programa Nacional de Assistência Estudantil para as Instituições de Ensino Superior Públicas Estaduais (2010); Ampliação do Fies (2010); Lei de Cota/Lei nº 12.711/2012 (2012); Programa de Expansão do Ensino Médio (2012); Ampliação do Procampo (2012); Programa Educação Bilíngue: formação de professores e tradutores/intérpretes da Língua Brasileira de Sinais (2012); e PBP: Programa Bolsa Permanência (2013).
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Editoras responsáveis
Editora Associada: Vanessa Fonseca Barbosa https://orcid.org/0000-0003-2901-015X>Editora Chefe: Helena Sampaio https://orcid.org/0000-0002-1759-4875>
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
27 Jun 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
06 Set 2024 -
Aceito
04 Dez 2024



Fonte: 