Resumo
Este artigo objetiva analisar aspectos linguísticos e extralinguísticos da performance do professor contador de histórias em Língua Brasileira de Sinais que são considerados capazes de tornar a prática da contação mais atrativa e contributiva para alunos surdos. Fundamentado em Costa (2015) e Sutton-Spence (2021), o estudo analisa dados derivados da aplicação de questionário on-line, de entrevista realizada com uma professora de escola bilíngue e um vídeo de contação de história em Libras realizada por uma docente. Os resultados apontam que a fluência (aspecto linguístico) e a organização do ambiente (aspecto extralinguístico) são elementos inegociáveis para que a prática da contação de histórias ocorra de forma atrativa e contributiva para os alunos surdos. Os demais elementos podem ganhar mais ou menos destaque, a depender da modalidade de contação escolhida pelo professor.
Palavras-chave
Contador de histórias; Língua Brasileira de Sinais; Professor
Abstract
This article aims to analyze both linguistic and extralinguistic aspects of the performance of teachers who tell stories in Brazilian Sign Language (Libras) that are considered capable of making storytelling more engaging and beneficial for deaf students. Grounded in Costa (2015) and Sutton-Spence (2021), the study draws on data from an online questionnaire, an interview conducted with a teacher at a bilingual school, and an analysis of a video in which a teacher tells a story in Libras. The results indicate that fluency (a linguistic aspect) and the organization of the setting (an extralinguistic aspect) are non-negotiable elements for storytelling to be both engaging and meaningful for deaf students. Other elements may vary in relevance depending on the storytelling modality chosen by the teacher.
Keywords
Storyteller; Brazilian Sign Language (BSL); Teacher
E o artigo vai começar...
Um conto serve para tudo e para nada! Para mim, um conto serve para tudo, quando estamos abertos para recebê-lo, e para nada, se não o deixamos chegar com a verdade que o acompanha!
(Ordones, 2022. p. 32)
A epígrafe que inicia este artigo nos faz pensar, de alguma maneira, nas possibilidades de uso das histórias. Ao se contar histórias, espera-se envolver o espectador e proporcionar, a partir delas, um momento de entretenimento, de fruição, de imaginação. Ao se contar histórias para pessoas surdas no interior de uma instituição escolar, espera-se ainda que seja o começo de um trabalho pedagógico com possibilidades de contribuição para o desenvolvimento cognitivo, linguístico e cultural-identitário dos sujeitos, ainda que as intencionalidades, por parte do professor, não estejam claramente postas.
Destacamos que, quando nos referimos às contribuições da contação de histórias para a educação de surdos, falamos sempre em “potencial/possibilidades” e em como as histórias podem alavancar o desenvolvimento global. Essa perspectiva é discutida no artigo “Contribuições da contação de histórias em Libras para a educação de surdos” (Brito & Ribeiro, 2022), em que as autoras analisam o potencial de desenvolvimento cognitivo, linguístico e cultural-identitário proporcionado pela contação de histórias. Elas apontam que, ao se envolverem em narrativas contadas em língua de sinais, as crianças surdas têm acesso a aspectos que favorecem seu desenvolvimento global, mesmo que as intenções do professor, enquanto contador de histórias, não estejam explicitamente definidas (Brito & Ribeiro).
Consideramos que esse desenvolvimento, entre outras questões, pode ser favorecido, também, na e pela performance do contador da história, uma vez que a experiência preceptiva pode ser bastante diferente para os expectadores, a depender da apresentação do contador. Há um conjunto de elementos linguísticos e extralinguísticos da contação de histórias que compõe o que chamamos de performance e que tem efeitos no espectador antes, durante e depois da história.
Partindo desse preâmbulo, este artigo objetiva analisar aspectos linguísticos e extralinguísticos da performance do professor contador de histórias em Língua Brasileira de Sinais que são capazes de tornar a prática da contação mais atrativa e contributiva para os alunos surdos. Destacamos que a proposta não é prescrever como deve ser a contação de histórias em Língua Brasileira de Sinais, tampouco apontar um modelo preferencial ou um jeito “certo” de contar histórias, muito menos apontar um modelo que seja melhor que outro. Apesar disso, não iremos nos furtar de evidenciar o que funciona e o que caracteriza uma performance como capaz de criar engajamento, conexão, gerar emoções e aprendizagem. Acreditando que “um conto pode servir para muitas coisas” e que é a performance que abre as portas para que o espectador possa receber o conto e “a verdade que o acompanha”, o que queremos é entender como professores contadores de histórias em Libras têm feito e quais são os aspectos que compõem essa prática e que, quando observados, transformam a experiência em algo significativo com capacidades de repercussão da contação na formação dos sujeitos surdos.
A fim de atingir o objetivo proposto, apresentaremos três seções teóricas substanciais para o entendimento da performance do contador de histórias: “Contadores de histórias e suas performances”; “As modalidades de contação” e “A performance e seus elementos linguísticos e extralinguísticos”. Essas seções teóricas aliadas à seção de análise de um vídeo de contação de história em Libras, do questionário e da entrevista permitirão ao leitor o entendimento dos principais aspectos de uma performance e de como esses elementos podem ser usados de forma mais atrativa e contributiva nos processos. Por fim, apresentamos as considerações finais sobre as discussões realizadas.
Os caminhos metodológicos percorridos
Nesta seção, apresentamos os caminhos metodológicos percorridos, detalhando os instrumentos de pesquisa utilizados, questionário e entrevista, e relatando sobre a seleção do vídeo para análise. Apontando ainda brevemente para os referenciais teóricos mobilizados para a compreensão da performance do professor contador de histórias em Libras.
Com o intuito de perceber como os professores de surdos têm contado histórias nas escolas, foi elaborado e aplicado via plataforma Google um questionário semiestruturado dividido em seis seções intituladas: Perfil do professor participante, Sobre o contar histórias, Ainda sobre o contar histórias, Geral e Perguntas não obrigatórias, contendo vinte questões de múltipla escolha e dez questões discursivas no total. Neste estudo, privilegiamos principalmente a questão 22: Você utiliza algum recurso para contar histórias (livro, desenho, gravura, objeto)? Qual e por quê?, e a questão 18, da seção Perguntas não obrigatórias, em que os respondentes poderiam fazer relato de experiências vivenciadas com a contação de histórias e disponibilizar vídeos próprios contando histórias.
O questionário circulou por e-mail e WhatsApp no período de vinte e cinco de novembro de 2021 e seis de abril de 2022, e obtivemos um total de 18 (dezoito) respondentes. No entanto, optamos por utilizar 16 (dezesseis) formulários respondidos, tendo em vista que uma das respondentes em nenhum momento atuou com estudantes surdos e outra, mesmo tendo ministrado aulas para surdos, afirmou não contar histórias. Os 16 professores de surdos considerados nesta pesquisa, então, são contadores de histórias, habitam diferentes regiões do país e atuam em escolas inclusivas, escolas inclusivas com classe bilíngue, escolas especiais ou escolas bilíngues. Para resguardar a identidade dos professores participantes, eles serão identificados pela letra P (Professor) seguida de um número (P1, P2, P3…). Neste artigo, aparecem citações de P4 (respondente do questionário e entrevistada) e de P6 (respondente apenas do questionário). Os demais respondentes do questionário têm respostas apresentadas em outros artigos que, assim como este, compõem a dissertação intitulada Da tradição oral para a língua de sinais: contação de histórias na educação de surdos no Ensino Fundamental.1
Dos participantes que responderam ao questionário, 10 manifestaram a disponibilidade de conceder uma entrevista. Desses selecionamos 05, sendo 02 professores surdos (atuantes em escola bilíngue) e 03 ouvintes (01 que atua em escola bilíngue, 01 em escola regular inclusiva e 01 em escola especial). Apesar de nossos contatos, apenas uma professora respondeu disponibilizando-se a participar da entrevista semiestruturada.
Para a escolha de uma contação para a análise, pesquisamos no Google e YouTube pela expressão “contação de histórias em Libras” e apesar de experienciarmos a dificuldade de encontrar vídeos específicos de professores de surdos, descobrimos espaços virtuais que disponibilizam vídeos que podem ser utilizados por professores tanto para se inspirarem quanto para reproduzirem para as crianças.
Selecionamos uma história disponível no canal Professora Adriana Libras2, indicado por uma respondente do questionário e participante da entrevista dessa pesquisa, colega de trabalho da professora Adriana. A professora Adriana trabalha na Escola Bilíngue de Taguatinga3. Segundo informação da colega, a professora passou a postar suas aulas no canal durante a pandemia da Covid-19. São sessenta e dois vídeos disponíveis com conteúdo de Matemática, História, Geografia, Ciências, Português como L2, música em Libras, poemas e sete vídeos de contação de histórias. O vídeo escolhido para este estudo intitula-se Escola Feliz: História em Libras para o retorno às aulas presenciais4.
A escolha se deu por ser uma história contada por uma professora de escola bilíngue e por termos indícios de que a contação foi feita também presencialmente, da mesma forma que foi apresentada em vídeo. Assim, temos um contexto real de instituição escolar bilíngue, o que torna a nossa análise salutar para inspirar professores que queiram contar histórias.
Para a concepção dos aspectos linguísticos e extralinguísticos da performance do professor contador, trazemos os estudos de Costa (2015) e Sutton-Spence (2021). Costa objetiva compreender os aspectos linguísticos e extralinguísticos da sinalização de histórias — de um grupo de alunos de um curso de aperfeiçoamento em Libras — que influenciam positiva ou negativamente na compreensão da mensagem. Para isso, foca de modo específico nas inadequações e nos erros cometidos pelos estudantes que levam ao comprometimento do entendimento da mensagem. Notadamente, a autora não discute a performance na sinalização das histórias, mas apresenta aspectos que consideramos salutares para a performance e aponta como é melhor utilizá-los para atrair a atenção do espectador e produzir compreensão.
Já Sutton-Spence (2021) ocupa-se especificamente da performance, referindo se a ela como performance literária – a contação de histórias integra essa performance literária. No seu livro, Literatura em Libras, Sutton-Spence busca focar nos recursos da língua de sinais para criar fortes imagens visuais para a performance no contexto artístico. Neste sentido, são elencados pela autora elementos da linguagem estética da Libras importantes para criar narrativas fortemente visuais e gerar emoção nos espectadores.
Diante da ausência de referenciais sobre a performance de professores contadores de histórias em Libras nas escolas, neste estudo, os aspectos a serem considerados partem do que essas duas autoras discutem.
As categorias de análise foram definidas a partir desses dois referenciais teóricos — Costa (2015) e Sutton-Spence (2021) — e divididas em duas macrocategorias: aspectos linguísticos e aspectos extralinguísticos que, por sua vez, se subdividem em outras categorias. Os aspectos linguísticos contemplam na análise os classificadores, a incorporação e o ritmo. Nos aspectos extralinguísticos são analisadas a organização do ambiente, vestimentas e acessórios.
Contadores de histórias e suas performances
Esta é uma história muito antiga, que minha avó me contava quando eu era pequenina. Quem lhe contou foi o seu avô, que por sua vez a escutara de sua mãe, quando pequeno. Onde ela ouvira, não sei. Vou contá-la como minha avó costumava fazer.
(Garcia et al., 2003, p. 62)
A decisão de iniciar essa seção com essa fórmula mágica5 de começar a contar uma história deve-se, em primeiro lugar, ao fato de considerarmos que a fórmula mágica faz parte da performance do contador e é ela a responsável por abrir as portas para que o espectador receba o conto e entre no mundo da imaginação. Em segundo lugar, essa fórmula retrata a figura de um contador de histórias que aprendeu a contar uma história com uma geração familiar de forma despretensiosa, sem pensar em técnicas.
Busatto (2013) aponta dois tipos de contadores de histórias: o tradicional e o contemporâneo. Para a autora, o contador tradicional é aquele que faz parte de um grupo social e se revela no seio da sua comunidade. A sua ação atravessa o tempo pelos caminhos da recordação. Recordação no sentido de “trazer para o coração o que estava na memória, e fazer da memória um coração” (p. 13). Em relação à performance desse tipo de contador, a autora destaca que alguns deles preferem deixar que a narrativa aconteça naturalmente em meio a alguma atividade que estejam realizando, como enquanto preparam o almoço, costuram, bordam ou fazem tricô, por exemplo.
A autora revela, ainda, a necessidade de o contador tradicional legitimar as suas histórias com enunciados como o que abre esta seção. A contação se dá de forma descontraída, sem se deixar abalar pelo barulho que porventura possa ocorrer ao seu redor. A narrativa se constrói, por vezes, mesclando diferentes versões de histórias tradicionais e, talvez, pela própria história da contadora num ato de recordação do seu imaginário infantil. Ao finalizar uma contação, deixa uma reticência no ar, como se quisesse dizer que a história continua, que tem algo mais para acontecer, e esse algo mais fica por conta da imaginação do espectador. Para Café (2015), os contadores de histórias tradicionais
são aqueles cujos saberes populares tem (sic) origem nas observações cotidianas, diferentes dos [contadores contemporâneos] que já frequentaram uma academia e misturaram seus conhecimentos e vivências a estudos científicos e experimentos já sistematizados. Percebo que, mesmo entre os contadores tradicionais, há diferenças significativas entre os vários tipos de localidades, na forma, conteúdo e objetivos. Assim como são diferentes os enfoques dos pesquisadores que envolvem o contador de história. (p. 84)
Percebemos que as ideias de Busatto (2013) e Café (2015) se aproximam e se complementam. Busatto dialoga com Café quando evidencia que cada época e cada cultura têm percepções diferentes e, portanto, podem escolher caminhos diversos para a contação de histórias. Em relação ao contador de histórias contemporâneo, Busatto o define como sendo “aquele sujeito-contador da atualidade, o qual elegeu a expressão ‘contador de histórias’ para definir uma profissão” (p. 9). Ainda segundo a autora, o contador contemporâneo tem uma performance mais elaborada que a de um contador tradicional, ele se prepara para sua apresentação; organiza o espaço da contação; usa figurinos, acessórios e traz consigo objetos. Promove encontros, estuda, busca por técnicas, adota critérios de seleção das histórias a serem contadas e de apresentação. Ele está em diferentes lugares: escolas, bibliotecas, hospitais, parques, praças e no meio digital.
Para Busatto (2013), “abordar a performance do contador de histórias na era digital [...] implica uma mudança de foco, de entendimento e aceitação de outras perspectivas e paradigmas do aprendizado e da fruição dessa arte” (p. 97). Implica pensar, provoca a autora, em como encadear emoções, gerar percepções de imagens, expressões faciais e corporais no espaço diminuto que se tem. E, é preciso pensar nesses aspectos, pois a contação de histórias em espaços não convencionais, como o digital, tem crescido muito nos últimos anos, particularmente em 2020 e 2021, em decorrência da pandemia da Covid-19.
Ao trazer essas figuras do contador de histórias para a vivência de uma criança surda, evidencia-se que o contador tradicional é exceção, em especial nas famílias em que a criança surda é filha de pais ouvintes, tendo em vista que a maioria das famílias ouvintes não sabe a língua de sinais. A criança surda, neste caso, pode ter contato com esse contador tradicional no seio da comunidade surda e das associações de surdos. No entanto, possivelmente esse contato com a comunidade surda para crianças surdas, filhas de pais ouvintes, assim como o contato com a língua de sinais, só se dará tardiamente.
Já a figura do contador de histórias contemporâneo para surdos é possível de ser identificada, ainda que timidamente, em alguns grandes centros do país e em canais do YouTube.
Levando-se em consideração o que foi dito anteriormente em relação a surdos nascidos em famílias de ouvintes, esse crescimento no meio digital mostra-se decisivamente positivo para os surdos, pois permite o acesso às contações de histórias em Libras daqueles que não têm a oportunidade de vivenciá-las na família e nem na comunidade surda. Antes de finalizar essa seção, lembramos aqui das palavras de Café (2015):
mais importante do que ficar classificando quem pertence a um ou outro grupo é entender a extensão e os significados desses tipos de contadores, para encontrar seu próprio caminho, que não precisa ser igual ao de ninguém. Tradicional ou não, todos os tipos de contadores têm seu lugar na atualidade. (p. 83)
Compartilhamos da ideia da autora e entendemos que encontrar o próprio caminho é construir a própria performance. Uma performance “entendida não apenas como emissão da palavra, transmissão de conhecimentos, mas corporificada e complexa” (Duarte & Canda, 2022, p. 146). Uma performance com base em “elementos diversos (palavra, cena, corpo, espaço e todos os sentidos compartilhados) e não fragmentados; não necessita de ordem ou direcionamentos, porque o processo ganha direção no estar com as crianças” (Duarte & Canda, 2022, p. 146). Uma performance que “requer um tipo de compreensão a respeito da sua complexidade, não podendo ser apenas vista e interpretada meramente por mecanismos de racionalidade técnica, mas captada por todos os sentidos, percebida em toda a sua integralidade, contexto e potencialidade” (Duarte & Canda, 2022, p.147). Uma performance, entendida dessa forma, será uma performance única, capaz de trazer significado às histórias contadas.
Como este artigo considera a perspectiva da contação de histórias em Libras na escola, logo, o que importa é pensar a performance servindo a processos educacionais (sendo a fruição um deles, não nos esqueçamos). Para isso é preciso pensar a performance como ação que mobiliza recursos didático-pedagógicos para além da língua e do corpo e que, como dizem Duarte e Canda (2022), deve ser compreendida na sua integralidade. Considerando que a performance é condicionada pelos recursos que o contador escolhe utilizar, assim como pelo tipo de contação escolhida, é preciso pensar nos tipos de contação presentes nas escolas de surdos e quais os elementos que compõem a performance em cada uma dessas modalidades; é sobre isso que falaremos a seguir.
As modalidades de contação de histórias
Partindo do questionário respondido por professores de surdos contadores de história, do conhecimento empírico dessa autora6 e do conhecimento da literatura sobre contação de histórias para ouvintes — Coelho (1999) e Garcia et al. (2003) — pudemos depreender cinco modalidades de contação de histórias mais frequentemente utilizadas pelos professores de surdos, quais sejam: i) simples narrativa; ii) contação com o livro literário; iii) contação com gravuras, imagens e desenhos; iv) contação com sucatas, objetos e acessórios e v) contação com linguagem e recurso teatral.
Segundo Coelho (1999), a simples narrativa “não requer nenhum acessório e se processa por meio da voz do narrador, de sua postura. Este, por sua vez, com as mãos livres, concentra toda sua força na expressão corporal” (p. 31). Na contação de histórias em Libras, a simples narrativa se processa por meio da sinalização do contador, da sua expressão corporal e facial. São utilizados, portanto, apenas recursos linguísticos.
Acerca da contação de história com o livro literário, Coelho (1999) afirma que “há textos que requerem, indispensavelmente, a apresentação do livro, pois a ilustração os complementa (sic)” (p. 32). Mesmo quando não é este o caso, o livro é muito utilizado pelos professores nas contações de história. Coelho afirma que “pela beleza do tema e integração gráfica, [os livros] devem ser mostrados durante a narrativa. Essa apresentação, além de incentivar o gosto pela leitura (mesmo no caso dos ainda não alfabetizados), contribui para desenvolver a seqüência (sic) lógica do pensamento infantil” (p. 33). Concordamos com Coelho e ressaltamos que, quando a contação é feita com o livro físico, estamos inserindo o livro na vida da criança surda. Ela vê que o livro é um portador de histórias e isso desperta o interesse de ir em busca desse mesmo livro, de outros livros e de outras histórias aportadas em livros.
O Referencial para o Ensino de Libras como L1 da Educação Infantil (Stumpf & Linhares, 2021) sugere posicionamento do professor quando vai contar uma história para um bebê7 surdo que consegue se sentar, tendo o livro como suporte para a contação. Na posição indicada no Referencial, o professor deve manter contato visual direto, respeitando a altura da criança: “se o bebê está sentado no chão, o professor deve sentar-se no chão, se o bebê está sentado em uma cadeira, o professor deve sentar-se de modo que fique na altura do bebê” (pp. 59-60). Os autores lembram que
[o] momento do conto, entretanto, apresenta características peculiares. Por se tratar de um gênero específico, o estilo da sinalização pode vir carregado com sinais que ocupam um espaço de sinalização maior, uso recorrente de classificadores, e expressões faciais e corporais específicas, de maneira que, a depender da situação, o professor pode escolher não sentar no chão na frente de bebês e preferir ficar em pé para contar as histórias. As expressões faciais e corporais são muito usadas pelos professores com os bebês. Eles percebem que a expressão facial do professor tem algum significado e também que professores executam uma expressão facial e logo fazem um sinal. Essa sequência de ações funciona como mensagem para o bebê, que percebe e imita o adulto. Nessa fase de inicial (sic) da comunicação, a visualidade ocupa espaço primordial na interação entre professores e bebês.
(Stumpf & Linhares, 2021, pp. 60-61)
As observações feitas na citação acima devem ser consideradas por professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental também. O relato da professora entrevistada confirma a utilização da posição sentada para a contação de histórias. A professora descreve que faz a contação de histórias com o apoio do livro, sentada, com os alunos sentados à sua frente, mostra a cena para todos os alunos, firma o livro na sua frente (encosta o livro no tronco), apoia o livro no colo e sinaliza. É possível, neste caso, segundo a professora, fazer uma “cola” da glosa8 e colocar na capa do livro para consulta durante a contação. É interessante a menção da professora em relação à “cola” na capa do livro, pois reforça a ideia de que o livro fique sempre virado para os alunos, mantendo o foco na história. Assim não é preciso que a professora fique virando o livro para recorrer ao que nele está escrito. Em relação à “cola” da glosa que a professora diz utilizar, convém não direcionar o olhar constantemente a ela. Cabe ressaltar que estamos nos referindo à contação da história e não à leitura da história9. A professora relata ainda ser “tranquila” a contação com o apoio do livro, pois o número de alunos que ela tem é pequeno.
Uma possibilidade para turmas com maior número de alunos e que tem sido observada nas contações em vídeos disponíveis em canais do YouTube é a digitalização e projeção do livro. No entanto, Flávia Scherner, em seu curso “O Maravilhoso Curso de Contação de Histórias da Fafá” (2022), chama a atenção dos contadores de histórias para a utilização desses recursos e para o risco “de compartilhar os ‘inofensivos’ PDFs” em razão dos direitos autorais e editoriais. Possivelmente não há problemas no uso deste recurso em sala de aula, mas para a divulgação das obras na íntegra nas redes sociais é necessário autorização do autor e/ou da editora.
Muitas vezes, na inviabilidade de utilizar o livro, ou devido a dadas intencionalidades pedagógicas, o professor opta por contar a história com gravuras, imagens e desenhos. A professora entrevistada nesta pesquisa, relatou usar com frequência gravuras na contação de histórias e que, à medida que vai contando a história, as gravuras vão sendo afixadas na parede. Coelho (1999) orienta que antes da narrativa com gravuras
empilham-se as gravuras em ordem, viradas para baixo, à medida que vai contando, o narrador as coloca uma a uma [...] Este movimento se faz com naturalidade, uma gravura substituindo a outra no momento exato, sem atropelos, a narrativa a fluir ininterrupta, mesmo durante a colocação e troca das gravuras. (p.39)
É importante salientar que não se trata de qualquer gravura, imagem ou desenho. O estudo do texto dará informações ao professor para a escolha. No caso de histórias contadas com desenho, por exemplo, existem livros que já trazem a proposta dos desenhos a serem feitos, e são esses desenhos que encadeiam a narrativa, como é o caso do livro Contos desenhados, de Per Gustavsson (2011), da Editora Callis. P6 (respondente do questionário), uma professora participante desta pesquisa, utiliza desenhos por se considerar uma ótima desenhista. Os desenhos podem ser feitos no quadro ou em um papel afixado na parede ou no chão, a depender do número de espectadores.
Em outras ocasiões, é possível buscar imagens na internet ou gerar com Inteligência Artificial, sempre se atentando para as possibilidades de sentidos das imagens e, se possível, para a qualidade artística daquilo que está sendo oferecido aos estudantes. As imagens podem ainda ser organizadas em um Powerpoint e apresentadas com o auxílio de um projetor, muitos professores respondentes do questionário dessa pesquisa afirmaram utilizar esse recurso nas contações de histórias.
Para Garcia et al. (2003), na contação de histórias com sucatas, objetos e acessórios “a sucata não sofre nenhuma intervenção artística. Você pode usar a sucata da maneira que ela está, sem enfeitá-la ou modificá-la” (p. 97). E exemplifica: “uma tampinha pode ser usada para representar uma tartaruga” (p. 97). A autora lembra que, “contar histórias com sucata é diferente de contá-las usando fantoche feito de sucata” (p. 97). O fantoche de sucata é um recurso teatral, tem as suas especificidades na contação de histórias e integra outra modalidade na contação, da qual falaremos a seguir.
Em relação ao uso de objetos e acessórios, a professora entrevistada conta que às vezes os utiliza, mas nada que cubra o seu rosto e atrapalhe a expressão facial e a movimentação das mãos, “se for para usar uma luva10, por exemplo, ela deve ser branca e eu devo estar com uma roupa escura” (P4, Professora entrevistada). É relevante falar sobre o uso de luvas na contação de histórias em Libras. Numa interpretação formal, as luvas não são recomendadas, mas na contação de histórias trata-se de uma licença artística que pode auxiliar na construção das imagens e na compreensão do enredo, tornando a história singular. Se assistirmos à história “Casal Feliz”, contada por Cleber Couto11, disponível no Canal de Renata Garcia, perceberemos que o uso das luvas facilita a compreensão da história e a construção das imagens. Diríamos que, embora na contação da história “Casal Feliz” as luvas sejam determinantes, não significa que elas o serão em todas as histórias.
Outra história que pode se beneficiar pelo uso das luvas como recurso é a história “As luvas mágicas do Papai Noel”, de Alessandra Klein e Cláudio Mourão. No vídeo de contação produzido pelo Instituto Nacional de Educação dos Surdos (INES), a história contada é intercalada por cenas dramatizadas pelo Papai Noel, que usa as luvas mágicas.
Cabe salientar que em nenhuma das histórias exemplificadas aqui é feito o uso da luva branca, mas sim de luvas coloridas. Mesmo na história “As luvas mágicas do Papai Noel”, o lendário bom velhinho, que tem as luvas brancas como parte do seu figurino, utiliza na história luvas azuis. Diante do exposto, ressaltamos que cada recurso pode ser favorável, observadas as suas especificidades, o contexto de sua utilização e a história a ser contada; cabe ao contador avaliar quando e como deve se beneficiar dele.
Mesmo quando se trata de contação de histórias, arte diferente do teatro, a linguagem e recursos teatrais são por vezes utilizados pelos professores. Uma das participantes desta pesquisa afirma trabalhar com caixa de sombras, teatro de varas e bonecos, apesar de alegar ser complicado utilizar essa modalidade por manter as mãos ocupadas manuseando os bonecos. P4 relata que é sempre preciso contar com a ajuda de alguém, seja um aluno, seja um colega de trabalho ou os filhos. E reforça que “é sempre possível encontrar estratégias, afinal, não é porque a criança é surda que ela não deve passar por esse encantamento”. Se o professor não proporcionar isso na escola, é muito mais difícil de eles terem essa oportunidade em outros espaços, como uma criança ouvinte tem.
Em relação à caracterização de personagens para a contação de histórias, a professora (P4) ressalta que isso é mais corrente no teatro. Quando envolve caracterização de personagens e mais pessoas representando esses personagens, a ação se torna um teatro, e ela costuma fazer isso nos projetos de leitura na biblioteca, mas no dia a dia da sala de aula, segundo a participante, é preferível que a contação de histórias seja feita apenas com o apoio de recursos teatrais. Para melhor entendermos o que diz a professora, recorremos a Sisto (2020):
quem conta histórias, conta história e não faz teatro! A confusão com a linguagem teatral costuma ser grande! O fato de o contador de histórias usar a emoção para proferir o seu texto, expressar-se corporalmente, trabalhar intenções, climas, ritmos e até marcações cênicas não transforma o que ele faz em encenação. É claro que todos esses elementos são elementos dramáticos, mas não são suficientes para caracterizar o trabalho do contador como um trabalho de encenação. O que acontece, com frequência, é ter-se trechos de uma contação dramatizados, vivenciados como se a história que o contador está contando acontecesse naquele momento. Mas o contador sabe que isso tudo já aconteceu e o fato de dramatizar determinadas partes é apenas um recurso para tornar a história mais viva. Esse recurso tem que ser dosado no decorrer da história, para que ela não vire encenação. Se a história for o tempo todo dramatização, ela é teatro e não contação! (pp. 65-66)
O que Sisto (2020) evidencia na citação acima é que o fato de o professor usar elementos teatrais de forma dosada não torna a sua prática de contação de histórias uma prática teatral.
Ainda nessa modalidade, referenciamos uma técnica denominada Vernáculo Visual (VV), que atualmente tem ganhado destaque e relevância entre os surdos. Nela, os artistas surdos utilizam recursos cinematográficos, mímica e teatro para contar histórias sem usar sinais da Libras. Assim, a técnica não é propriamente mímica nem Libras (Sutton-Spence, 2021). Possivelmente, ela se encaixaria em outras modalidades, mas é, sobretudo, observada na modalidade linguagem e recurso teatral por se apropriar de técnicas do teatro.
Conhecidas as modalidades de contação de histórias que têm sido utilizadas pelos professores de surdos, cabe salientar que essa prática não se limita a predefinições e que não raramente se encontram contações mistas. A categorização apresentada tem finalidades teórico-metodológicas, e não se espera que as práticas de contação espelhem relatos teóricos, uma vez que é o contrário que se observa: a teoria nasce da observação do mundo, que é movente e mutável. A seguir, serão apresentados os aspectos linguísticos e extralinguísticos que compõem a performance dos contadores.
A performance e seus elementos linguísticos e extralinguísticos
Nesta seção, pensamos nos elementos linguísticos e extralinguísticos capazes de tornar a prática da contação mais atrativa e contributiva para um bom aproveitamento da história. Para isso, trazemos Costa (2015) e Sutton-Spence (2021).
Reafirmamos que, apesar de Costa (2015) apontar para inadequações e erros numa contação de histórias em Libras e Sutton-Spence (2021) aportar as suas observações para a performance de artistas surdos, invocamos essas duas autoras para este estudo por acreditar que os aspectos considerados por elas ajudam a pensar na performance dos professores que contam histórias nas escolas.
Costa (2015) divide os aspectos observados na sinalização em dois grupos: linguístico (expressões manuais e expressões não manuais) e extralinguístico (iluminação/fundo e posição do contador de histórias, em pé ou sentado). Destacam-se, nas expressões manuais, questões relacionadas à sinalização (variação do sinal, questões fonológicas e estrutura do sinal), uso do espaço, soletração, redundância (fluidez na sinalização e ação incorporada ao personagem/objeto), bem como a construção do sentido na enunciação, detalhamento e finalização da história. Nas expressões não manuais, são enfatizadas as expressões não manuais (faciais) e a direção do olhar.
Sutton-Spence (2021) contribui com a discussão investigando como artistas surdos podem usar os recursos estéticos da língua de sinais para gerar imagens visuais e emoções no público. Na obra Literatura em Libras, a autora afirma que há três caminhos principais para se atingir a intenção ilustrativa “contar – falar sobre as coisas por meio de vocabulário [...] Mostrar – mostrar a forma e o movimento das coisas com classificadores [...] Se tornar – mostrar a forma e o comportamento das coisas através da incorporação” (pp. 47-48, grifos da autora). Mas, como a própria autora reitera, a literatura transpõe o vocabulário da língua e para se criar literatura visual é preciso, ainda, mobilizar outros elementos estéticos, como:
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Velocidade
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Espaço e simetria
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Mesmas configurações de mão (quando se repetem na realização dos sinais produzem o sentido de rima, um efeito estético e metafórico)
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Morfismo (mudando a configuração de mão os sinais se fundem de forma fluida para formar outro sinal)
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Incorporação (descreve personagens humanos pela incorporação)
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Antropomorfismo (mostra não humanos — animais, plantas e objetos inanimados — por incorporação)
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Classificadores (convencionais e novos classificadores)
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Elementos não manuais (movimento da boca, cabeça, olhar)
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Mostrar diferentes perspectivas
As contribuições de Sutton-Spence (2021) não cessam nesses elementos apresentados. Em outros momentos da obra mencionada, a autora examina atentamente a lista de elementos importantes para se contar histórias e se criar imagens visuais na narrativa a partir do suporte de Stephen Ryan (1993). Listamos abaixo os itens apresentados por Sutton-Spence (2021, pp. 68-70 e pp. 95-100):
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Usar contato visual e cumprimentar o público
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Considerar a idade e o interesse do público
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Criar fortes imagens visuais
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Usar gestos com sinais, mas variar gestos com sinais
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Usar pausas para permitir “cair a ficha”
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Celebrar o patrimônio surdo
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Criar personagens descrevendo sua forma e seu comportamento
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Não utilizar muita soletração manual
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Pode-se aumentar, dramatizar ou exagerar os personagens
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Usar o corpo tanto quanto as mãos
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Usar o espaço de forma clara, mostrando o espaço do mundo das personagens
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Usar muita repetição
É perceptível que alguns elementos (incorporação, classificadores) se repetem nas ideias apresentadas por Sutton-Spence (2021), no entanto, acreditamos ser oportuno mencioná-los novamente, pois isso pode evidenciar a sua importância numa performance de contação de histórias.
As contribuições de Costa (2015) e Sutton-Spence (2021) são fundamentais para entender os aspectos relevantes da contação de histórias na escola. Como dito, Costa aborda aspectos linguísticos e extralinguísticos, enquanto Sutton-Spence foca no apelo estético. Optamos por usar os termos "linguísticos" e "extralinguísticos", conforme Costa, pois eles abrangem os elementos estéticos de Sutton-Spence e evitam o apelo artístico mais forte de sua terminologia, uma vez que nosso foco está nos aspectos linguísticos e extralinguísticos relevantes para a performance do professor contador de histórias no Ensino Fundamental, incluindo implicitamente os aspectos estéticos.
A figura a seguir apresenta esses aspectos com base nas discussões de Costa (2015) e Sutton-Spence (2021) e em nossa própria visão do que é importante numa sinalização, assim como os elementos considerados relevantes nos estudos sobre a contação de histórias para ouvintes.
Aspectos linguísticos e extralinguísticos da performance do professor contador de histórias
Considerando o esquema disposto na Figura 1, priorizamos na análise do vídeo, dentro do grupo dos aspectos linguísticos, o uso de classificadores, a incorporação e o ritmo, tendo em vista que a aplicabilidade desses aspectos mobiliza outros elementos, como o uso do espaço e a expressão facial e corporal. No grupo dos aspectos extralinguísticos, priorizamos, na análise a seguir, a organização do ambiente, vestimentas e acessórios, por entendermos que todos os elementos vão estar presentes em todas as performances, mas alguns deles se tornam indispensáveis para uma contação fluida e compreensível.
Cabe pontuar a supressão do aspecto “fluência na sinalização” da nossa análise. A fluência era condição básica (elemento de inclusão) para a seleção do vídeo a ser analisado e, portanto, a professora era indubitavelmente fluente em Libras. Ademais, a fluência na sinalização é condição sine qua non para a contação de qualquer história em Libras. Se não houver fluência, a contação fica entrecortada, o contador deixa de revelar uma série de fatos da história e de explorar o que a história lhe permite, não se fazendo entender. Neste sentido, entendemos ser conveniente analisar os demais aspectos da performance que vão oferecer uma experiência prazerosa para os alunos surdos.
Reconhecendo os elementos performáticos na história Escola Feliz
Neste estudo, focamos na performance de professores contadores de histórias e selecionamos um vídeo do YouTube, indicado por nossa entrevistada. A professora contadora atua em uma Escola Bilíngue e, segundo informações da nossa entrevistada, a contadora começou a postar suas aulas no canal durante a pandemia da Covid-19. O canal contém 62 vídeos sobre diversos temas e 7 vídeos de contação de histórias. O vídeo escolhido para nossa análise é Escola Feliz: História em Libras para o retorno às aulas presenciais. Optamos por este vídeo por nos proporcionar um contexto real de uma instituição bilíngue, em uma situação de contação presencial filmada na escola, o que torna a contação analisada autêntica.
A professora inicia a história se apresentando, utiliza a soletração para se identificar e para apresentar o título da história. Logo em seguida, indica qual sinal representa o título soletrado. O autor da história não é apresentado, ficando a dúvida se é uma produção autoral13 ou de outrem.
Consideramos que na contação da história Escola Feliz a professora se utiliza prioritariamente da modalidade iv) contação com sucatas, objetos e acessórios, mas faz uso também, da modalidade iii) contação com gravuras, imagens e desenhos, apresentando, portando, uma modalidade mista. A professora contadora se mostra uma contadora contemporânea, por utilizar recursos mais elaborados para a contação, como a caixa caracterizada como escola, garrafas descartáveis com desenhos representando as crianças, as mini máscaras colocadas nos desenhos das crianças, o desenho do vírus, o relógio e imagens que são projetadas nos cantos da tela, como mostra a figura a seguir.
Sequência de sinalização que apresenta os diferentes recursos usados pela professora contadora
Sendo a Libras uma língua visual-espacial, valorizam-se processos de ensino de surdos por meio da visualidade. Considera-se, portanto, o uso de imagens na contação de história como elementar para a idealização da história, de seu cenário e personagens e, consequentemente, para a construção de significados por parte do espectador. No entanto, em relação à produção do vídeo, nota-se que em alguns momentos da história, como o retratado na Figura 2 (cena 3), o uso de duas imagens nos extremos da tela, ao mesmo tempo em que objetos ainda estão todos dispostos sobre a estrutura, pode causar uma atenção visual dividida, o que pode ser complexo para crianças surdas.
Focalizando aspectos linguísticos
Uso de classificadores
Na história Escola Feliz, os classificadores são pouco utilizados. Observando os sinais usados pela professora contadora consideramos que a maioria deles são sinais do léxico da Libras.
Segundo Carine de Oliveira (2021, on-line), “muitos classificadores são utilizados com tanta frequência que se tornam um ‘padrão’.” Oliveira evidencia que, na maioria das vezes, é preciso, contudo, visualizar o objeto, a cena ou o personagem e usar a imaginação para referenciá-lo através do classificador. É preciso usar a criatividade e idealizar novas configurações de mão visualmente mais expressivas.
Para Sutton-Spence (2021), “os classificadores são a principal maneira de mostrar informações” (p. 53). Pensando dessa maneira, poderíamos dizer que a professora poderia fazer mais uso dos classificadores para passar as informações e dar mais fluidez à história. Entretanto, consideramos que sua escolha em contar essa história com recursos visuais desonerou a professora do uso de muitos classificadores, pois os recursos auxiliam na construção da visualidade da história.
Incorporação
Esse é um dos elementos que aparece reiteradamente nas ideias de Sutton-Spence (2021) e também no quadro proposto por Costa (2015) por tornar as contações de histórias mais fluidas e atraentes a partir da criação de imagens visuais mais bem delineadas, juntamente com o uso de classificadores.
Segundo Sutton-Spence (2021), “às vezes o corpo incorpora um personagem assistindo o que outro personagem exibido com a mão está fazendo” (p. 53). Na história analisada, é possível perceber essa incorporação em alguns momentos a partir da marcação do espaço dividido, das expressões faciais e corporais. A professora inicia a sinalização da história com o corpo centralizado e o olhar direcionado para a câmera, ou seja, é como se ela estivesse olhando para o espectador. Para Costa (2015), manter esse olhar fixo na câmera, pode promover uma ligação narrador/espectador, mas isso não pode perdurar durante a narrativa, pois o olhar complementa informações gramaticais, incorpora personagens, dá vida à história e às ações que se passam nela. E é isso que acontece no decorrer da história.
Quando vemos na contação da história a professora olhando para cima e para os lados pensando por que as crianças faltaram, ou com o olhar distante enquanto sinaliza a espera pela chegada das crianças, interpretamos que esse é o olhar da escola enquanto aguarda as crianças. Concebemos, portanto, que esse é um momento de incorporação e personificação da personagem escola. Conforme Sutton-Spence (2021), o olhar “mostra as emoções por incorporação dos personagens e o narrador pode usar essa parte do corpo para sugerir as emoções que ele quer gerar no público” (p. 98). Ademais, o olhar cria a ideia de espaço e movimento, dando harmonia à história.
Para Busatto (2013), “[a] contação de histórias pede olho no olho, intimidade e cumplicidade com o ouvinte” (p. 32), e em outro momento a autora complementa que “[n]a performance do narrador ao vivo, há um tempo presente num corpo presente, constituído de intenção, atenção, tensão, que se atualiza a cada instante e se perpetua na memória dos participantes” (pp. 96-97). Na história em análise, a direção do olhar é sempre bem marcada e, mesmo não tendo um público presencial, a contadora consegue manter esse elo direcionando seu olhar para o ponto certo da câmera, desviando o olhar para se referir às crianças da história e à escola, mas sem quebrar o elo entre história, contador e espectador. É o que Sisto (2020, p. 48) chama de olhar diagnóstico, múltiplo, voltado para dentro de si, para as imagens mentais da história que está sendo contada, para o público e, no caso específico da Libras, para o espaço onde se situam os acontecimentos. É esse olhar bem distribuído que mantém o espectador atento à narrativa.
Notamos que o uso do espaço enquanto elemento linguístico da performance da contadora é bem concebido e não extrapola o campo visual do espectador da história.
Além da incorporação por meio do olhar, o tronco e o corpo também se movem para a direita ou para a esquerda dando a entender a mudança de personagem. Para Sutton-Spence (2021), esse “mostrar os personagens é algo visualmente muito satisfatório para a plateia, que por vezes se sente como se estivesse assistindo a personagens de um filme” (p. 59). Ou como se estivéssemos vivenciando a história, pois cria-se um efeito visual de realidade.
Ritmo
Referenciando Cynthia Peters (2000), Sutton-Spence (2021) pondera que “as línguas de sinais têm ritmos visuais e uma musicalidade visual que sempre estiveram associados ao corpo” (p. 87). Num outro momento da sua obra, a autora descreve que
ritmo é o efeito que percebemos quando os padrões de repetição são organizados no espaço ou no tempo. Em Libras, o ritmo vem do fluxo visual dos sinais, e vemos padrões de tempo (por exemplo, variação organizada na velocidade ou duração do movimento de sinais e pausas entre eles), ou da ênfase do movimento (alteração entre movimento agudo e suave, por exemplo). Qualquer tipo de padrão nos sinais e de variações desse padrão pode criar um ritmo visual e temporal. Por exemplo, o aumento ou a diminuição no número de dedos usados em uma forma de mão, a alteração no tamanho de uma imagem ou o uso das diferentes articulações (dedo, punho, cotovelo ou ombro). (pp. 189 - 190)
Com essa contribuição da autora é possível observar, na história em análise, um ritmo temporal quando a contadora marca a passagem dos meses com o número de dedos usados em uma das mãos. As expressões da professora contadora e a repetição na realização de sinais marcam o ritmo visual da história. Até os 3min.37seg. de história, aproximadamente, a expressão dá um ritmo dinâmico, de alegria à história. A partir desse ponto, a história ganha um novo ritmo: a alegria dá lugar à tristeza, à dúvida, à preocupação e ao questionamento pela ausência dos alunos.
Antes de finalizar a história, o ritmo muda mais uma vez, e as expressões de alegria retornam. Esse apontamento vem ao encontro das ideias de Sisto (2020), pois ele alude que “um ritmo que se usa para introduzir os elementos que serão desenvolvidos numa história não pode ser o mesmo utilizado quando a história vai se aproximando de seu ápice ou de seu momento de impasse” (p. 52). Do mesmo modo,
nenhuma história tem o mesmo clima do início ao fim. [...] A manipulação dos climas de uma história faz parte da perspicácia do contador de antecipar que efeitos ele quer atingir, naquele momento, em sua plateia, para que o prazer com a história seja cada vez maior.
(Sisto, 2020, p. 52)
Como se pode observar, a sagacidade do contador em moderar o ritmo e o clima da narrativa é um dos elementos da performance determinantes para o sucesso da história.
Em Escola Feliz percebemos essa sagacidade da professora contadora. Há uma estrutura narrativa bem definida com ritmo diferente para cada bloco. O início é definido pelo cumprimento ao público e pela apresentação da contadora seguida da fala “hoje vou contar uma história: Escola Feliz”. A contadora soletra o título da história e logo em seguida sinaliza o título. Esse é o único momento da história em que se utiliza soletração. É plausível que a soletração seja utilizada para títulos curtos, nomes de autores, palavras que ainda não tenham ou das quais ainda não se saiba o sinal. Mas, como evidenciam Costa (2015) e Sutton-Spence (2021), o uso reiterado da soletração acaba por romper com o ritmo da história e torná-la desinteressante.
A introdução da história é feita mostrando quem é a Escola Feliz e explicando por que ela é feliz. As crianças são apresentadas e há uma descrição de como elas chegam à escola, mas nada muito extenso, pois, por vezes, detalhar demais pode provocar um declínio no ritmo da história (Sutton-Spence, 2021). Logo após a introdução, inicia-se a complicação, momento em que se apresenta o problema: as crianças deixam de frequentar a escola, começam as reflexões e informações sobre o que aconteceu e por quê até se chegar à resolução do problema que é o retorno das crianças com todas as medidas de segurança. É nesse bloco da estrutura narrativa que há uma mudança considerável no ritmo da história.
Nesse bloco de complicação, o recurso de sinalização lenta é aplicado para intensificar as ações e provocar suspense e emoção nos espectadores. A expressão facial da contadora fica introspectiva.
Sabemos que, num contexto real, o dia transcorreu na velocidade normal, mas a professora sinalizou com efeito lento, demonstrando a espera pelos alunos e, de certa forma, a sensação vivida por todos que ficaram em casa durante o período de isolamento social na expectativa de poder sair novamente. De alguma maneira, demonstrar essa situação emociona o espectador da história.
A sinalização repetida do ato de pensar da escola (mais uma vez a contadora incorpora a escola e dimensiona o olhar para o alto como se a escola olhasse para cima e pensasse na situação) funciona como uma breve pausa na história para projetar o espectador a pensar também nessa espera e no que estava acontecendo e o motiva a continuar assistindo à história a fim de descobrir o que está por vir.
No final da narrativa, a contadora estabelece um contato com o público, mesmo que virtualmente. Ela pergunta: “E então, vocês já aprenderam as novas regras?” Após uma resposta imaginária, afirma: “Ok. Então podem entrar na escola.” A história termina de forma positiva com uma explicação e um alerta: “A escola está feliz porque os alunos podem voltar a estudar, sempre obedecendo às novas regras. A vida não voltou ao normal como antes, mas se todos seguirem as regras, no futuro tudo voltará ao normal. Tchau!”
Nesta seção, vimos como o uso dos aspectos linguísticos torna a performance da professora contadora espontânea e natural. Com a utilização do vocabulário da Libras, dos classificadores e da incorporação, conectados às expressões faciais e corporais e ao uso do espaço, a professora sinaliza e manuseia os objetos sem quebrar o ritmo da história. Isso proporciona o entendimento da história e o conhecimento dos aspectos gramaticais da língua, ainda que isso não seja especificado para a criança. Assim, além de todos os benefícios de uma boa contação para os processos educativos envolvendo surdos, quando a criança for contar uma história verídica ou de ficção, poderá se lembrar desses aspectos e empregá-los na sua sinalização.
Focalizando os aspectos extralinguísticos
Organização do ambiente
Em relação à organização do ambiente, observamos que houve um bom enquadramento da câmera. Entretanto, a estrutura usada de base para dispor e movimentar as garrafas que representavam as crianças da história ficou um pouco limitada. É oportuno mencionar que a história também foi contada presencialmente na escola e, pelas fotos divulgadas no Instagram da instituição, percebe-se que essa estrutura era mais espaçosa, possibilitando melhor distribuição dos personagens, em especial quando se fala da importância de manter o distanciamento dos colegas, isso permite entender melhor o que significa esse distanciamento.
No que concerne ao local da contação da história presencialmente, não é possível considerar se o espaço é aberto ou fechado, tampouco como é o fluxo de pessoas. Apesar disso, é importante ressaltar que um local sem o trânsito intenso de pessoas e interrupções sustenta a atenção das crianças na história.
Quando a criança já conhece a história que está sendo contada, se ela se distrai ao retornar a atenção para a história, é possível que consiga se concentrar novamente e entender a sucessão dos acontecimentos, mas, se é uma história nova para ela, não haverá essa continuidade e é possível que ela perca a compreensão e o interesse.
No vídeo e nas imagens apresentadas no Instagram da instituição, é possível observar que tanto na contação no meio virtual quanto presencialmente o ambiente era bem iluminado e o fundo neutro contava com um tecido azul, proporcionando uma melhor visualização da sinalização e entendimento da história.
Vestimentas e acessórios
No que concerne à vestimenta utilizada pela professora contadora, a cor neutra da blusa facilita a visualização da sinalização, exceto quando ela apresenta o desenho do vírus feito em um papel verde, mesma cor da blusa. A diversidade de cores da saia, dispostas na vertical, promove, no momento em que os personagens são dispostos sobre a estrutura, uma demasia de informações visuais, como pode ser observado na Figura 2 já apresentada. A saia acabou virando um pano de fundo dos personagens. Se a estrutura de apoio dos personagens estivesse um pouco acima, e a saia só fosse vista quando a contadora movimentasse para além da estrutura, o efeito seria outro.
Conforme Garcia et al. (2003), “sempre que [...] [se] for contar uma história, é bom utilizar algum adereço que marque a mudança de papéis, ou seja, transforme-se em contador de histórias. Assim, [...] [o espectador] terá mais um motivo para entrar neste mundo da imaginação” (p. 52). Essa citação vem ao encontro de nosso pensamento, pois acreditamos que o uso de uma vestimenta ou acessório como uma saia, um chapéu, uma mala, a depender da história e seus personagens, marca essa mudança da figura do professor para o professor contador de histórias, retirando do momento da história a aparência de mais uma aula habitual. Eventualmente, o uso da saia não comprometeu o entendimento da história, mas é importante que o professor contador observe esses detalhes e cuide da visualidade na contação de histórias em Libras.
Nesta última seção, priorizamos a organização do ambiente, a vestimenta e os acessórios, mas sabemos que a posição do contador e do público também é importante. A posição do público, a nosso ver, está diretamente ligada à do contador, a fim de permitir uma melhor visualização. Apesar de Araújo et al. (2021) afirmarem que o fato de se contar uma história em Libras sentado estabelece um contato singular e dá a sensação de proximidade com o espectador, na história Escola Feliz,, em que a contadora permanece em pé durante a narrativa, essa proximidade foi estabelecida pelo olhar bem distribuído da contadora e pelos questionamentos que ela apresenta na história. Ademais, o fato de ela estar em pé ao contar a história deu maior flexibilidade para o manuseio dos recursos.
No que tange à posição do público, é perceptível, nas fotos postadas no Instagram, que as crianças assistiram presencialmente à contação sentadas em cadeiras enfileiradas, o que, certamente, põe o campo de visão das crianças na altura dos recursos apresentados e do espaço de sinalização. O ideal é que o público seja organizado em semicírculo para facilitar a visualização, colocando as crianças menores à frente, mais próximas do contador. Mas, neste caso, entendemos que o fato de as cadeiras estarem enfileiradas não atrapalha a visibilidade, levando-se em consideração o número circunscrito de espectadores. Ademais, a performance da professora contadora e os recursos utilizados contribuem para o entendimento das informações e para alcançar os objetivos propostos. A história também proporciona o desenvolvimento linguístico e cognitivo das crianças.
E o artigo chegou ao fim...
[...]Com os pés descalços, as tantas regras do que pode e o que não pode, que mais funcionam como sapatos apertados que nos aprisionam e limitam a criação artística, já não fazem mais sentido na caminhada. Interessa-nos a busca incessante dos modos de contar cada história do jeito que o nosso pé na terra puder.
(Geroldi, 2021, p. 103)
Introduzimos este artigo abordando exatamente isso que Geroldi (2021) nos traz nessa citação. Destacamos que não era nosso intuito prescrever um modelo ou jeito certo de contar histórias e, parafraseando Geroldi, também não é nosso intuito colocar “sapatos apertados” em nenhum professor contador, pois cada contador constrói o seu perfil “do jeito que o pé na terra puder”, descalço dos “sapatos apertados que aprisionam e limitam a criação artística”.
Constatamos que há várias possibilidades e estratégias para se contar histórias. A modalidade da contação de histórias escolhida pelo professor contador é que define a sua performance. É preciso que o professor tenha consciência de que a contação escolar está a serviço de um processo de desenvolvimento cognitivo, linguístico e cultural-identitário e que alguns aspectos da performance, como a fluência na sinalização, por exemplo, são inegociáveis e fundamentais para que a prática ocorra e proporcione o desenvolvimento. A fluência na sinalização é um dos elementos comuns em todas as contações de histórias e substancial na performance do professor contador.
No que concerne aos aspectos extralinguísticos, consideramos como substanciais a organização do ambiente e o uso de vestimentas e acessórios, na medida em que esses recursos proporcionam a visualidade do que está sendo sinalizado. Os demais elementos linguísticos e extralinguísticos estarão presentes na performance, mas ganharão mais ou menos destaque e serão mais ou menos determinantes da prática a depender da modalidade de contação escolhida pelo professor contador de história.
No vídeo Escola Feliz, notamos que a utilização dos classificadores ficou limitada pela escolha dos recursos que foram empregados – o que não se apresentou como problema. O manuseio dos recursos criando as cenas da história; a apresentação da escola ornada com olhos, boca, sobrancelha e nariz, que transmitiam expressões; os portões que se abriam e as crianças representadas por desenhos colados nas garrafas puderam desonerar a professora de classificar os personagens e as situações vivenciadas por eles. Nessa modalidade de contação, o aspecto extralinguístico “organização do ambiente”, no ambiente virtual, fica de certo modo limitado, pois o espaço da estrutura escolhida para apresentar os personagens da história era pequeno para a quantidade de objetos apresentados, o que não significa prejuízos à experiência.
Neste artigo, ao discutirmos a contação de histórias em Libras na escola e fazer apontamentos sobre a performance do professor contador, nos deparamos com várias modalidades de contação de histórias utilizadas, que explicitam diferentes aspectos performáticos, o que, a nosso ver, indica uma atuação criativa dos professores com vista ao processo educacional dos surdos. Acreditamos ser importante para o professor transitar por essas modalidades ao contar histórias na escola, a fim de proporcionar diferentes experiências aos alunos surdos, já que cada um vivencia e interage com o mundo de uma forma única e particular.
Ao final deste artigo, o nosso desejo é de que os professores, apoiados pela escola, que é um espaço de múltiplas aprendizagens, não deixem se dissipar essa prática de múltiplas modalidades, performances e possibilidades para a contação de histórias. E para terminar, vamos puxar mais uma fórmula mágica, como fizemos no início de uma das seções deste artigo e como gostamos de fazer ao final de nossas contações de histórias: “Contei a minha história e agora deixo-a em suas mãos”. Em outras palavras, apresentamos os elementos importantes para se contar uma história em Libras e agora os deixamos nas mãos dos leitores para que eles possam construir a sua própria performance.
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Apoio e financiamento:
Programa Institucional de Bolsas para Qualificação de Servidores do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de Minas Gerais (PBQS-IFNMG). Edital nº 76/2021 e Edital nº 141/2022 Programa de Bolsas para Qualificação de Servidores – PBQS-IFNMG. Processo no Sistema Eletrônico de Informações (SEI) do IFNMG Nº 23396.002031/2022-18.Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) – Unimontes.
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Ética em pesquisa:
A pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Plataforma Brasil, conforme Parecer nº 5.147.976.
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Revisão textual:
Normalização bibliográfica (APA 7ª Ed.), preparação e revisão textual em português: Maria Thereza Sampaio Lucinio thesampaio@uol.com.br>Versão e revisão em língua inglesa: Francisco López Toledo Corrêa francisco.toledocorrea@gmail.com>
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1
Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes, Programa de Pós-Graduação em Educação/PPGE, 2023. https://repositorio.unimontes.br/handle/1/855
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2
https://www.youtube.com/@AdrianaReis1973/videos; acesso em 26 out. 2022.
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3
A Escola Bilíngue de Taguatinga é a primeira escola bilíngue para surdos da rede pública de Brasília - DF. Atende estudantes surdos desde a Estimulação Linguística Precoce até o Ensino Médio e a Educação de Jovens e Adultos nas três etapas.
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4
https://www.youtube.com/watch?v=kLJSuPo3-Q4; acesso em 26 out. 2022.
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5
Fórmula mágica ou senha mágica é o nome dado por Garcia (2003, p. 61) à maneira de começar a contar uma história. Outras fórmulas mágicas sugeridas pela autora são: “Era uma vez… Foi uma vez… Há muito… muito tempo… No tempo em que as pedras não eram duras…”
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6
Os conhecimentos empíricos das autoras decorrem da observação de contação de histórias de outros contadores e da sua atuação de uma das autoras como contadora de histórias em diferentes momentos da sua trajetória acadêmica e profissional e em diferentes contextos de atuação, sociais e educacionais, incluindo escolas, hospitais, aniversários infantis e formação de professores. Assim, as autoras vivenciaram diversas modalidades de contação em contextos inclusivos e multiculturais, com presença de surdos e ouvintes.
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7
O “Referencial para o Ensino de Libras como L1 da Educação Infantil” (Stumpf & Linhares, 2021) considera como bebê a criança com idade entre 0 a 1 ano e 6 meses.
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8
A glosa corresponde a um rascunho da história ou do texto que se quer traduzir sem se fazer a tradução literal ou sem se fazer parecer um português sinalizado. É um texto escrito usando palavras grafadas em maiúsculas e símbolos de acordo com a gramática da língua de sinais. Preparar a glosa antes de uma tradução ou contação de histórias é relevante, pois a organização das frases em língua de sinais vai dar sentido à mensagem para os sujeitos surdos.
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9
Quando contamos uma história colocamos algo nosso nela, empregamos nossas palavras. Quando lemos uma história, precisamos seguir o texto, sermos fiéis à escrita do autor.
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10
A luva branca foi usada por muito tempo em apresentações artísticas, em especial apresentações de músicas em Libras. No entanto, parte da comunidade surda se opõe ao uso de luvas brancas, pois distorce a interpretação da Libras e pode repercurtir como uma ridicularização, uma desvalorização à Libras. Para essa parte da comunidade surda numa contação de histórias as luvas podem até ser utilizadas, caso façam parte do figurino.
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11
Cleber Couto é surdo, autor e ilustrador do livro Casal Feliz. Ele integra o grupo “Palhaços Surdos” com o nome artístico “Palhaço Sem Voz". O grupo faz espetáculos teatrais totalmente por mímica, não há oralização e nem tradução em Libras. Ouvintes e surdos conseguem compreender as apresentações, pois é tudo visual. No vídeo aqui referenciado, Cleber Couto realiza a contação da história com recursos teatrais, mas há sinalização em Libras e oralização.
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12
Conforme Sutton-Spence (2021, p. 113-120) a estrutura da história em Libras pode ser dividida em três partes básicas: o início, a ação complicadora e o fim, mas existem outras estruturas, parecidas com essa, porém com mais divisões, como a estrutura conhecida por Pirâmide de Freytag com: início; introdução; ponto de partida da ação; ação, clímax e resolução; conclusão – coda (coda aqui se refere à parte final da história que traz a conclusão e não a CODA – filho de pais surdos). E ainda, a estrutura de narrativa pessoal descrita por Labov (1972), que conta com: resumo, orientação, ação compiladora, resolução, avaliação e coda. Para Sutton-Spence (2021), o paratexto (título da história, capa do livro, ilustrações/imagens, saudações e despedidas) também faz parte da estrutura da obra. Neste sentido, também deve fazer parte da estrutura das narrativas em Libras.
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13
A professora foi contatada em uma de suas redes sociais para que pudéssemos obter algumas informações sobre a contação dessa história, mas até o fim dessa análise não obtivemos resposta.
Disponibilidade de dados:
Os conteúdos subjacentes ao texto da pesquisa estão contidos no manuscrito.
Referências
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Brito, L. R., & Ribeiro, M. C. M. A. (2022). Contribuições da contação de histórias em Libras para a educação de surdos. Revista da FAEEBA: educação e contemporaneidade, 31(68), 181-199. https://doi.org/10.21879/faeeba2358-0194.2022.v31.n68.p130-147
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Café, A. B. (2015). Os Contadores de histórias na contemporaneidade: Da prática à teoria, em busca de princípios e fundamentos. [Tese de Doutorado em Arte, Universidade de Brasília]. https://repositorio.unb.br/handle/10482/19310
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Duarte, T. B., & Canda, C. N. (2022). A performance da contação de histórias: uma coreografia do pensamento a partir das infâncias. Revista da FAEEBA: educação e contemporaneidade, 31(68), 130-147. https://doi.org/10.21879/faeeba2358-0194.2022.v31.n68.p130-147
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Editado por
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Editores responsáveis:
Editor Associado: Eduardo José Manzini https://orcid.org/0000-0002-7420-6146>Editora Chefe: Helena Sampaio https://orcid.org/0000-0002-1759-4875>
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
08 Ago 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
-
Recebido
08 Out 2024 -
Revisado
23 Abr 2025 -
Aceito
10 Maio 2025



Fonte: Elaboração própria
Fonte: Canal “Professora Adriana Libras” no YouTube; “Escola Feliz’ (2021)