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Interpretação: Um Objetivo e um Método da Ciência de B. F. Skinner

Resumo

Este artigo tem por finalidade geral apresentar a visão de Skinner sobre a interpretação, seja como objetivo ou como método. Além disso, tem como propósitos específicos (a) definir a interpretação, conforme Skinner, (b) apontar quando e como o autor defende a sua realização, (c) relacionar a interpretação a outros objetivos e métodos propostos por Skinner e (d) indicar contribuições e limites da interpretação, segundo o autor. Para isso, examinamos 35 textos de Skinner ligados ao assunto, publicados entre 1931 e 1990. Seja como objetivo ou como método, mostramos que a interpretação oferece contribuições teóricas, metodológicas e tecnológicas à ciência de Skinner, ainda que ela apresente limites relacionados à sua natureza inferencial e especulativa, bem como ao seu caráter plausível e, às vezes, temporário.

Palavras-chave:
interpretação; Análise do Comportamento; B. F. Skinner

Abstract

This paper has the general purpose of presenting Skinner’s vision of interpretation, both as aim and method. Besides, it has as specific purposes (a) to define interpretation, according to Skinner; (b) to indicate when and how the author defends its accomplishment; (c) to relate interpretation with other aims and methods proposed by Skinner; (d) to indicate contributions and limits of interpretation, according to the author. In this regard, we examined 35 texts of Skinner related to the subject, published between 1931 and 1990. Both as aim and method, we show that interpretation offers theoretical, methodological, and technological contributions to Skinner’s science, although it presents limits related to its inferential and speculative nature, as well as to its plausible and sometimes temporary format.

Keywords:
interpretation; Behavior Analysis; B. F. Skinner

Ao contrário do que se imagina, a ciência proposta por B. F. Skinner não tem como únicos objetivos a previsão e o controle do comportamento humano. Da mesma forma, ela não adota como único método a análise experimental. Nessa linha, algumas revisões da literatura indicam diferentes objetivos e métodos nessa ciência (e.g., Baum, 2011Baum, W. (2011). Behaviorism, Private Events, and the Molar View of Behavior. The BehaviorAnalyst, 34, 185-200. https://doi.org/10.1007/BF03392249
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; Donahoe, 1998Donahoe, J. W. (1998). Interpreting verbal behavior. The Analysis of Verbal Behavior, 15, 107-112. https://doi.org/10.1007/BF03392929
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; Holland, 1992Holland, J. G. (1992). B. F. Skinner (1904-1990). American Psychologist, 47, 665-667.https://doi.org/10.1037/0003-066X.47.5.665
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; Moore, 2011Moore, J. (2011). Methodological Behaviorism as a Radical Behaviorist Views It. Behavior and Philosophy, 39, 145-202. ), dentre eles a interpretação. Em particular, a interpretação ora é apontada como objetivo (Hayes &Brownstein, 1986Hayes, S. C., & Brownstein, A. J. (1986). Mentalism, Behavior-Behavior Relations, and a Behavior-Analytic View of the Purposes of Science. The Behavior Analyst, 9, 175-190. https://doi.org/10.1007/BF03391944
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), ora é indicada como método (Andery, 2010Andery, M. A. P. A. (2010). Métodos de Pesquisa em Análise do Comportamento. Psicologia USP, 21, 313-342. https://doi.org/10.1590/S0103-65642010000200006
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). Apesar de Skinner ter dedicado boa parte de sua obra à interpretação, esta é uma atividade pouco explorada pelos analistas do comportamento. Assim, vale perguntar: a interpretação é um objetivo e/ou um método dessa ciência? Se for um objetivo, ela é equivalente ou secundária a outros objetivos? Se for um método, ela é equiparável ou subordinada à análise experimental? Ainda, o que significa interpretar nessa ciência?

Hayes considerou, em 2010Hayes, S. C. (2010). The Scientist as Behaving Organism. Behavior and Philosophy, 38, 169-171. , a interpretação um método. Para o autor, ela é um meio de atingir os fins principais da análise do comportamento: a previsão e o controle. Já Morris (1992Morris, E. K. (1992). The Aim, Progress, and Evolution of Behavior Analysis. The Behavior Analyst, 15, 3-29. https://doi.org/10.1007/BF03392582
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) inclui a interpretação entre os objetivos dessa ciência, atribuindo-lhe o mesmo valor da previsão e do controle. Segundo o autor, os diferentes objetivos representam formas de compreensão do objeto de estudo. Logo, compreende-se um comportamento quando é possível prevê-lo, controlá-lo ou interpretá-lo. Na mesma direção, Donahoe e Palmer (1989Donahoe, J. W. & Palmer, D. C. (1989). The Interpretation of Complex Human Behavior: Some Reactions to Parallel Distributed Processing, edited by J. L. McClelland, D. E. Rumelhart, and the PDP Research Group. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 51, 399-416. https://doi.org/10.1901/jeab.1989.51-399
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) definem a interpretação como o uso de princípios formulados por meio de análise experimental para explicar fenômenos complexos. Os autores defendem a sua realização quando os pré-requisitos da análise experimental (e.g., observação, mensuração e manipulação) não são possíveis ao investigar o objeto de estudo. Contudo, Palmer e Donahoe (1991Palmer, D. C., & Donahoe, J. W. (1991). Shared Premises, Different Conclusions. The Behavior Analyst, 14, 123-127. https://doi.org/10.1007/BF03392561
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) não consideram a interpretação secundária em relação à análise experimental. Esta, na verdade, estaria a serviço daquela. De acordo com eles, uma interpretação adequada respeita o escopo destinado a ela (e.g., comportamentos passados e privados), bem como os conceitos formulados no laboratório. “Engajamo-nos em análise experimental para podermos interpretar o mundo. Nossa compreensão da natureza seria frágil, na verdade, se fosse limitada aos fenômenos analisados experimentalmente. A maior parte da nossa compreensão científica do mundo é interpretação”, ressaltam (p. 125).

Donahoe (2004Donahoe, J. W. (2004). Interpretation and Experimental Analysis: An Underappreciated Distinction. European Journal of Behavior Analysis, 5, 83-89. https://doi.org/10.1080/15021149.2004.10446387
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) acrescenta que a interpretação aponta novos rumos à pesquisa básica e aplicada. Segundo o autor, quando os princípios se mostram insuficientes para explicar o objeto de estudo, realizam-se outras análises experimentais de fenômenos mais simples, tanto para completar a caracterização dos princípios quanto para formular novos conceitos. A esse respeito, Palmer (2011Palmer, D. C. (2011). Consideration of Private Events is Required in a Comprehensive Science of Behavior. The Behavior Analyst, 34, 201-207. https://doi.org/10.1007/BF03392250
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) destaca que a interpretação não revela a verdade sobre um fenômeno, mas permite compreendê-lo com base nos princípios disponíveis. Trata-se de uma prática comum na ciência, útil para solucionar problemas humanos. Em síntese, afirma: “A prática em uma ciência normativa, quando deparada com fenômenos não sujeitos à análise experimental, é se engajar em interpretação científica, isto é, oferecer explicações plausíveis que apelam apenas a princípios ou a observações estabelecidas em laboratório” (p. 206).

Dito isso, cabe perguntar: quais são as contribuições e os limites da interpretação na ciência de Skinner? Além disso, quando e como se deve interpretar? Segundo Palmer (2009Palmer, D. C. (2009). The role of private events in the interpretation of complex behavior. Behavior and Philosophy, 37, 3-19. ), enquanto a análise experimental é responsável pela descoberta e pelo refinamento de princípios no laboratório, a interpretação estende tais princípios à vida diária, na qual a observação, a mensuração e a manipulação de variáveis raramente são possíveis, práticas ou éticas, mas informações incompletas estão disponíveis. O autor, entretanto, aponta seus limites:

Interpretações não nos dizem como a natureza funciona, mas como ela pode funcionar; elas são apenas cenários plausíveis, não fatos sobre o mundo. Interpretações são apenas a extensão de princípios estabelecidos para domínios além do laboratório e não podem descobrir nada de novo. Consequentemente, elas não devem avançar quando estudo empírico é possível. Interpretação deve ser reservada apenas para aqueles fenômenos cujo controle experimental não é prático, ético ou possível. (pp. 14-15).

Considerando a relevância do tema e o número limitado de trabalhos dedicados a ele, este artigo tem por finalidade geral apresentar a visão de Skinner sobre a interpretação, seja como objetivo ou como método. Além disso, tem como propósitos específicos: (a) definir a interpretação, conforme o autor; (b) apontar quando e como Skinner defende a sua realização; (c) relacionar a interpretação a outros objetivos e métodos propostos pelo autor; (d) indicar contribuições e limites da interpretação, segundo Skinner.

O fato é que a análise do comportamento envolve um domínio teórico. Esse domínio não se opõe à pesquisa experimental (básica ou aplicada). Pelo contrário, baseia-se nela e a estende a outros fenômenos. Como ressalta Leigland (2010Leigland, S. (2010). Functions of Research in Radical Behaviorism for the Further Development of Behavior Analysis. The Behavior Analyst, 33, 207-222. https://doi.org/10.1007/BF03392220
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), a pesquisa teórica (como esta) contribui para o desenvolvimento de uma ciência por meio da revisão crítica de suas práticas. Com este artigo, esperamos colaborar nessa direção. Destacar a importância da interpretação na obra de Skinner é uma forma de esclarecer eventuais mal-entendidos sobre sua ciência, bem como uma maneira de estimular novas pesquisas sobre o tema − uma vez que o autor apontou em diferentes momentos as contribuições teóricas, metodológicas e tecnológicas da interpretação à análise do comportamento.

Como se sabe, a produção bibliográfica de Skinner é vasta. Isso impôs um desafio à seleção de textos do autor ligados aos propósitos deste trabalho. No entanto, as revisões da literatura citadas anteriormente permitiram a construção de uma lista de palavras-chave usada para identificar alguns desses textos. O critério para incluir um termo na lista foi a recorrência do vocábulo. Dessa forma, a lista foi composta pelas seguintes palavras: description (descrição), explanation (explicação), prediction (previsão), control (controle), interpretation (interpretação), knowledge (conhecimento), understanding (compreensão), theory (teoria), concepts (conceitos), principles (princípios), science (ciência), behavior analysis (análise do comportamento), experimental analysis (análise experimental), aims (objetivos) e methods (métodos). Após a construção da lista, examinamos a compilação de publicações de Skinner feita por Andery et al. (2004Andery, M. A. P. A., Micheletto, N., & Sério, T. M. A. P. (2004). Publicações de B. F. Skinner: De 1930 a 2004. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, 7, 93-134. https://doi.org/10.31505/rbtcc.v6i1.69
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). Adotando a classificação sugerida pelas autoras, elegemos, como primeiro critério de inclusão, artigos e capítulos de livro teóricos (e.g., históricos, conceituais e interpretativos), dada a natureza deste trabalho. Assim, excluímos tanto artigos e capítulos de livro empíricos (e.g., relatos de pesquisa, descrições de equipamentos e discussões de pesquisas de terceiros) quanto outros (e.g., resenhas, entrevistas e cartas a editores). Uma vez pré-selecionados os artigos e os capítulos de livro teóricos, recorremos à lista de palavras-chave para examinar detalhadamente cada uma das publicações. Como segundo critério de inclusão, elegemos a presença de pelo menos uma das palavras-chave no título, no resumo, nos descritores, nos subtítulos ou no corpo dos textos pré-selecionados. Para identificá-las, usamos a ferramenta “Localizar” nos arquivos digitalizados dos artigos e dos capítulos. Após encontrar ao menos uma das palavras-chave nos textos pré-selecionados, lemos os parágrafos correspondentes, a fim de verificar a compatibilidade com o tema deste trabalho. Quando os parágrafos lidos permitiram responder a pelo menos uma das questões registradas neste artigo − o que constituiu o terceiro critério de inclusão −, acrescentamos o texto à amostra deste trabalho, composta por 35 textos de Skinner, publicados entre 1931 e 1990.

Aqui, o termo objetivo se refere ao significado tradicional de meta, propósito e finalidade (cf. Caldas, 2011Caldas, A. (2011). Novíssimo Aulete: Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguesa. Lexikon. ). Já o termo método, conforme sugerido por Andery et al. (1988/2003Andery, M. A. P. A., Micheletto, N., Sério, T. M. P., Rubano, D. R., Moroz, M., Pereira, M. E., Gioia, S. C., Gianfaldoni, M., Savioli, M. R., & Zanotto, M. L. (2003). Olhar para a História: Caminho para a Compreensão da Ciência Hoje. Em M. A. P. A. Andery, & N. Micheletto (Orgs.), Para Compreender a Ciência: Uma Perspectiva Histórica (5ª Ed., pp. 9-15). EDUC. ), alude tanto aos procedimentos (e.g., observação, mensuração e manipulação) usados pelos cientistas para atingir certos objetivos (e.g., previsão e controle) quanto aos pressupostos filosóficos que embasam uma determinada ciência (e.g., concepção do objeto de estudo, modelo de causalidade e critério de validade do conhecimento). Dito isso, mostraremos como Skinner introduz e desenvolve a interpretação ao longo dos anos.

Inicialmente, a ciência de Skinner (1931/1999Skinner, B. F. (1999). The Concept of the Reflex in the Description of Behavior. Em V. G. Laties, & A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 475-503). Copley Publishing Group. ) tem como objetivo a descrição do comportamento. A descrição não se limita à ação; ela inclui a relação funcional entre estímulos do ambiente e respostas do organismo. Segundo o autor, esse tipo de descrição é sinônimo de explicação. Trata-se de uma noção herdada do filósofo Ernst Mach (1838-1916). Para explicar o objeto de estudo, Skinner defende a elaboração de novos conceitos ou a redefinição de conceitos antigos. De acordo com ele, isso exige a identificação de relações funcionais por meio de análise experimental. Esta inclui procedimentos como a manipulação de variáveis independentes, a observação e a mensuração de eventuais efeitos sobre a variável dependente. Em The Behavior of Organisms, Skinner (1938/1991cSkinner, B. F. (1991c). Scope and Method. Em B. F. Skinner (Org.), The Behavior of Organisms: An Experimental Analysis (1ª Ed., pp. 44-60). Copley Publishing Group.) afirma que a análise do comportamento deve ultrapassar a identificação de regularidades. Ela precisa oferecer uma descrição simples e econômica do objeto de estudo, isto é, com o menor número possível de conceitos.

Além da explicação do comportamento, a ciência de Skinner (1938/1991aSkinner, B. F. (1991a). A System of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), The Behavior of Organisms: An Experimental Analysis (1ª Ed., pp. 3-43). Copley Publishing Group.) tem como objetivos a previsão e o controle. Os três objetivos estão relacionados, uma vez que (a) a previsão exige a identificação de relações funcionais e (b) o controle requer a manipulação das variáveis das quais o comportamento é função. Para Skinner (1938/1991bSkinner, B. F. (1991b). Conclusion. Em B. F. Skinner (Org.), The Behavior of Organisms: An Experimental Analysis (1ª Ed., pp. 433-444). Copley Publishing Group. ), a identificação das variáveis relevantes - alcançada via análise experimental - permite a previsão e orienta o controle. Ao final do livro, o autor diz que praticamente não extrapolou os dados obtidos com organismos mais simples, no laboratório, para o comportamento humano, na vida diária. Ainda assim, faz uma ressalva: “A importância de uma ciência do comportamento resulta largamente da possibilidade de uma extensão final a assuntos humanos” (p. 441). Tal extensão, como ficará mais claro adiante, refere-se à interpretaçãodo comportamento - seja no âmbito da produção de conhecimento (e.g., formulação de uma teoria), seja no contexto da aplicação tecnológica (e.g., solução de problemas cotidianos).

No âmbito da produção de conhecimento, Skinner (1945/1999Skinner, B. F. (1999). The Operational Analysis of Psychological Terms. Em V. G. Laties,& A.C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 416-430).Copley Publishing Group. ) rejeita a verdade por consenso entre observadores. Contrapondo-se aos operacionistas, o autor afirma que um conceito válido permite ao cientista agir de maneira eficaz sobre o objeto de estudo (e.g., previsão e controle). Segundo ele, os sistemas psicológicos que baseiam a elaboração de conceitos em relatos de eventos privados apresentam limites. Para Skinner, “qualquer tentativa do orador de falar consigo mesmo sobre o seu mundo privado (como no sistema psicológico) está repleta de autoengano” (p. 337). Afinal, como ensinar um indivíduo a emitir respostas verbais sob controle de estímulos privados, uma vez que a privacidade dificulta o reforçamento diferencial daquelas respostas por parte da comunidade verbal? O autor indica algumas possibilidades. Aqui, destacaremos apenas a inferência de estímulos privados, com base em respostas públicas correlatas. Acreditamos que esse procedimento, adotado pela comunidade verbal, é suficiente para ilustrar como a interpretação- enquanto método de inferência de relações funcionais entre eventos públicos e privados - contribui para a produção de (auto)conhecimento. Neste caso, a interpretação favorece o aprendizado de comportamento verbal sob controle de estímulos privados. Contudo, Skinner aponta um limite desse método: “A inferência não é sempre correta, e a acurácia da referência é novamente limitada pelo grau de associação [entre o estímulo privado e a resposta pública correlata]” (p. 421). Assim, conclui: “É, portanto, impossível estabelecer um vocabulário científico rigoroso para uso público, tampouco o falante pode claramente ‘conhecer-se’ no sentido em que conhecer identifica-se com comportar-se discriminativamente” (p. 422).

Somando-se à explicação, à previsão e ao controle, outro objetivo da ciência de Skinner (1947/1999Skinner, B. F. (1999). Current Trends in Experimental Psychology. Em V. G. Laties,& A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 341-359). Copley Publishing Group. ) é a compreensão. Segundo o autor, a compreensão talvez seja sinônimo de explicação, já que exige descobrir como o comportamento se relaciona com outros eventos. Em especial, requer a demonstração de relações funcionais. Essas relações, observa Skinner, representam os fatos da ciência. “Todavia, o catálogo de relações funcionais não é suficiente” (p. 301) à compreensão. Esta exige ultrapassá-los e construir uma teoria. Para o autor, tal construção cabe principalmente à análise experimental, envolvendo três etapas: (1) identificar o dado básico; (2) formular leis, isto é, relações entre dados que alcançam generalidade; e (3) refinar conceitos “derivados” das leis sobre o comportamento individual. Baseada em fatos, uma teoria não se limita a eles; transcende-os. “Uma teoria é essencial à compreensão científica do comportamento como objeto de estudo”, destaca (p. 348). Ao organizar, articular e transcender os fatos descobertos experimentalmente, a interpretação colabora para o desenvolvimento de uma teoria do comportamento e a compreensão do objeto de estudo para além dos limites impostos pelo método experimental, como a necessidade de observação, mensuração e manipulação. Nesse sentido, conforme será aprofundado à frente, análise experimental e interpretação se complementam enquanto métodos da ciência de Skinner, voltados não apenas aos objetivos práticos (i.e., previsão e controle), mas também aos propósitos teóricos (e.g., explicação ou compreensão).

Assim como a interpretação, a previsão e o controle se relacionam com uma teoria do comportamento. A respeito do tema, Skinner (1951/1999Skinner, B. F. (1999). The Analysis of Behavior. Em V. G. Laties,& A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 101-107). Copley Publishing Group. ) avalia:

Quando estendemos uma análise experimental a assuntos humanos em geral, é uma grande vantagem ter um sistema conceitual que se refere ao indivíduo singular, preferencialmente sem comparação com um grupo. Uma aplicação mais direta à previsão e ao controle do indivíduo é assim alcançada. (p. 105)

Segundo Skinner (1951/1999Skinner, B. F. (1999). The Analysis of Behavior. Em V. G. Laties,& A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 101-107). Copley Publishing Group. ), os resultados observados no laboratório podem ser extrapolados para fora dele, tanto para fins teóricos (e.g., explicação ou compreensão) quanto para metas práticas (e.g., previsão e controle). A propósito, diz:

O que transferimos dos nossos experimentos para um mundo casual no qual quantificação satisfatória é impossível é o conhecimento de que certos processos básicos existem, são ordenados e provavelmente explicam os fatos desagradáveis e caóticos com que deparamos. O ganho em efetividade prática derivado de tal transferência de conhecimento deve ser, como as ciências físicas mostram, enorme. (pp. 106-107).

Estender resultados do laboratório à vida diária ou transferir conhecimento de processos básicos ao mundo geral é interpretar. Esta atividade oferece contribuições metodológicas (Skinner, 1945/1999Skinner, B. F. (1999). Can Psychology Be a Science of Mind? Em V. G. Laties, & A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 661-673). Copley Publishing Group. ), teóricas (Skinner, 1947/1999Skinner, B. F. (1999). Current Trends in Experimental Psychology. Em V. G. Laties,& A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 341-359). Copley Publishing Group. ) e tecnológicas (Skinner, 1951/1999Skinner, B. F. (1999). The Operational Analysis of Psychological Terms. Em V. G. Laties,& A.C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 416-430).Copley Publishing Group. ). No entanto, a interpretação enfrenta objeções. Há quem questione a extensão dos achados experimentais a situações mais complexas. Embora reconheça a diferença entre o laboratório e a vida diária, Skinner (1953/1965aSkinner, B. F. (1965a). A Science of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Science and Human Behavior (1ª Ed., pp. 11-22).The Free Press.) defende tal extensão. Ao mesmo tempo, o autor admite os limites de sua ciência ao explicar fatos passados. Nesses casos, a impossibilidade de realizar análise experimental permite apenas “suposições plausíveis” (Skinner, 1953/1965bSkinner, B. F. (1965b). Why Organisms Behave. Em B. F. Skinner (Org.), Science and Human Behavior (1ª Ed., pp. 23-42). The Free Press., p. 40), isto é, interpretações sobre as variáveis de controle. Para ele, um exemplo disso é a prática clínica. Na ausência de informações adequadas sobre a história genética e ambiental do cliente, o terapeuta interpreta seu comportamento com as informações atualmente disponíveis.

Portanto, para Skinner (1953/1965bSkinner, B. F. (1965b). Why Organisms Behave. Em B. F. Skinner (Org.), Science and Human Behavior (1ª Ed., pp. 23-42). The Free Press.), a interpretação é uma suposição plausível. Ela não constitui um fato, pois informações adicionais são necessárias para confirmá-la. Ainda assim, será válida se promover uma ação eficaz do cientista com o objeto de estudo. Ou, no caso da prática clínica, se favorecer uma ação eficaz do cliente na vida diária. Nesta situação, a interpretação mediará a relação entre análise experimental e aplicação tecnológica. Paralelamente, a interpretação envolverá a inferência sobre os processos de variação e seleção nos três níveis de determinação (i.e., filogênese, ontogênese e cultura), dado que fatos ocorridos no passado não são passíveis de observação, mensuração e manipulação (Skinner, 1953/1965aSkinner, B. F. (1965a). A Science of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Science and Human Behavior (1ª Ed., pp. 11-22).The Free Press.). Conforme o autor desenvolve o modelo de seleção por consequências, a análise experimental cada vez mais se unirá à interpretação enquanto métodos voltados à explicação e à intervenção sobre o objeto de estudo.

Outro objetivo desta ciência é o conhecimento do objeto de estudo. Há dois tipos de comportamento denominados conhecimento. Um deles resulta da exposição direta às contingências de reforçamento. O outro decorre da formulação de regras, isto é, descrições de contingências. No livro Verbal Behavior, Skinner (1957/1992Skinner, B. F. (1992). Logical and Scientific Verbal Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Verbal Behavior (1ª Ed., pp. 418-431). Copley Publishing Group. ) é claro a esse respeito: quanto mais próximo de um tato for o comportamento verbal do cientista, melhor. A propósito, afirma:

A teoria da evolução não pode ser confirmada por um conjunto de tatos aos reais eventos ocorridos em um passado remoto, mas um único conjunto de respostas verbais que aparentam ser tatos daqueles eventos se torna mais plausível - é fortalecido - por diversos tipos de construção baseados em respostas verbais na geologia, paleontologia, genética, entre outros. Apenas um evento atual da mesma natureza (por exemplo, o surgimento ou a produção de uma nova espécie sob circunstâncias apropriadas) geraria um tato de mesma forma e converteria a teoria em um fato naquele sentido. (pp. 426-427)

A teoria da evolução é uma interpretação, e não um fato. Parafraseando Skinner (1957/1992Skinner, B. F. (1992). Logical and Scientific Verbal Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Verbal Behavior (1ª Ed., pp. 418-431). Copley Publishing Group. ), quanto mais próxima de um tato for uma interpretação - entendida como uma afirmação plausível sobre relações funcionais entre estímulos do ambiente passado e respostas do organismo à época -, melhor. Ou, quanto mais próxima de um fato for uma interpretação - entendida como a inferência sobre processos de variação e seleção nos três níveis de determinação -, maior a probabilidade de contribuir para uma ação eficaz. Se promover tal ação, a interpretação será válida. Nesse sentido, colaborará para o desenvolvimento teórico (e.g., explicação, compreensão ou conhecimento) e para a aplicação tecnológica (e.g., previsão e controle) da análise do comportamento.

Enquanto afirmação plausível e, às vezes, temporária, a interpretação representa uma parte do comportamento verbal do cientista. Tal comportamento é modelado por uma comunidade específica, responsável por aprimorar o controle de estímulos das afirmações feitas por seus membros. Segundo Skinner (1957/1992Skinner, B. F. (1992). Logical and Scientific Verbal Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Verbal Behavior (1ª Ed., pp. 418-431). Copley Publishing Group. ), a comunidade científica pune ou coloca em extinção eventuais figuras de linguagem, mas tolera certas “extensões genéricas” (p. 419). Ao mesmo tempo, incentiva o uso de autoclíticos para revelar a natureza do controle de estímulos não verbal (p. 420) ou verbal (p. 422) das afirmações. Isso porque os cientistas descrevem contingências com base (a) na própria experiência com o objeto de estudo (e.g., modelagem pelas contingências) e (b) na experiência de outros cientistas com seus objetos de estudo (e.g., controle por regras). No entanto, qualquer afirmação científica (e.g., interpretação) requer confirmações, sobretudo “quando resposta [verbal] emergente nunca foi possuída como um tato ou como um intraverbal” (Skinner, 1957/1992Skinner, B. F. (1992). Logical and Scientific Verbal Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Verbal Behavior (1ª Ed., pp. 418-431). Copley Publishing Group. , p. 426).

Tanto no laboratório quanto na vida diária, a interpretação do objeto de estudo tem origem na análise experimental do comportamento não humano. Relacionando-a a outros objetivos, Skinner (1958/1999Skinner, B. F. (1999). The Operational Analysis of Psychological Terms. Em V. G. Laties,& A.C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 416-430).Copley Publishing Group. ) afirma:

Além da previsão e do controle possíveis graças à pesquisa [experimental] recente sobre reforçamento está o campo mais amplo da interpretação. É um tipo de interpretação tão intimamente ligado à previsão e ao controle que ação positiva e bem-sucedida frequentemente está ao alcance. (pp. 173-174)

Entretanto, Skinner (1958/1999Skinner, B. F. (1999). Reinforcement Today. Em V. G. Laties, & A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 165-175). Copley Publishing Group.) adverte: “O paralelo entre as contingências atualmente estudadas no laboratório e aquelas da vida diária requer atenção - e medidas corretivas” (p. 171). De acordo com o autor, em qualquer situação social, é necessário descobrir quem está reforçando quem, com o que e com qual efeito.

No livro The Analysis of Behavior: A Program for Self-Instruction, Holland e Skinner (1961Holland, J. G., & Skinner, B. F. (1961). Techniques and Aims of Science. Em J. G. Holland, & B. F. Skinner (Orgs.), The Analysis of Behavior: A Program for Self-Instruction (1ª Ed., pp. 276-280). McGraw-Hill. ) destacam três metas desta ciência: “Uma ciência do comportamento tem como seu objetivo a previsão, o controle e a interpretação do comportamento dos organismos vivos” (p. 279). A relação entre os objetivos explicita-se na seguinte afirmação: “Conhecendo-se um conjunto de condições, podemos prever o comportamento; manipulando um conjunto de condições, podemos controlar o comportamento; conhecendo-se um efeito, é possível que sejamos capazes de o interpretar em relação a suas causas” (p. 276).

Para Holland e Skinner (1961Holland, J. G., & Skinner, B. F. (1961). Techniques and Aims of Science. Em J. G. Holland, & B. F. Skinner (Orgs.), The Analysis of Behavior: A Program for Self-Instruction (1ª Ed., pp. 276-280). McGraw-Hill. ), os três objetivos citados - previsão, controle e interpretação - associam-se à explicação. Isso porque, avaliam, “um fenômeno está explicado cientificamente quando podemos formular as maneiras de prevê-lo, controlá-lo ou interpretá-lo” (p. 280). Sobre a interpretação, em particular, os autores esclarecem: “Quando mostramos que uma relação estabelecida [experimentalmente] entre o comportamento e um dado conjunto de condições pode ser exemplificada em um caso particular, estamos interpretando” (p. 279). Conforme Skinner (1966/1969aSkinner, B. F. (1969a). The Experimental Analysis of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A theoretical analysis (1ª Ed., pp. 75-104). Appleton-Century-Crofts. ), perguntas, suposições plausíveis e afirmações provisórias (i.e., interpretações) marcam a investigação do cientista. Sobre a diferença em relação às hipóteses do método dedutivo, o autor anota:

Em acréscimo à manipulação sistemática de contingências, a interpretação de assuntos humanos é uma rica fonte de sugestões para experimentos. As condições detectadas em algum episódio da vida diária realmente produzem os efeitos observados quando controladas de forma mais cuidadosa? Pode-se demonstrar que uma certa história de reforçamento é responsável por uma performance atual? Quais mudanças nas contingências terão resultados diferentes e possivelmente mais aceitáveis? As suposições e palpites com que o experimentador prossegue para responder a questões desse tipo não são as hipóteses formais do método científico; são apenas afirmações provisórias para as quais suporte adicional é buscado. (pp. 82-83)

Ao mesmo tempo, Skinner (1966/1969aSkinner, B. F. (1969a). The Experimental Analysis of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A theoretical analysis (1ª Ed., pp. 75-104). Appleton-Century-Crofts. ) alerta: “O uso de conceitos e leis derivadas de uma análise experimental na interpretação da vida diária também é uma fonte de mal-entendidos” (p. 100). Segundo o autor, o objetivo da interpretação é “oferecer uma explicação plausível de fatos que não estão sob controle experimental no momento” (p. 100). Em alguns casos, tal explicação não poderá ser demonstrada no laboratório. Ainda assim, argumenta, ela é preferível a alternativas não baseadas em conceitos derivados da experimentação. A extrapolação de resultados do laboratório para assuntos humanos, sublinha Skinner, lança outro olhar sobre o objeto de estudo. Dessa forma, “extrapolamos de condições relativamente simples para relativamente complexas, não para confirmar o que alguém afirma ter visto no caso complexo, mas para começar pela primeira vez a vê-lo sob uma nova luz” (p. 103). Comparadas às contingências ontogenéticas, acrescenta Skinner (1966/1969bSkinner, B. F. (1969b). The Phylogeny and Ontogeny of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A Theoretical Analysis (1ª Ed., pp. 172-217). Appleton-Century-Crofts.), as contingências filogenéticas dificilmente são submetidas à análise experimental. Afinal, o caráter remoto destas últimas impõe obstáculos aos métodos experimentais. Não por acaso, o autor reafirma: “A seleção natural de uma determinada forma de comportamento, não importa quão plausivelmente argumentada, permanece uma inferência” (p. 181).

Cabe destacar a relação bilateral entre análise experimental e interpretação. De um lado, a interpretação do comportamento fora do laboratório se torna possível graças à prévia formulação de conceitos por meio de análise experimental. De outro lado, a interpretação do objeto de estudo na vida diária levanta questões a serem investigadas no laboratório. Esta contrapartida da interpretação à análise experimental contribui para o aperfeiçoamento teórico e refinamento metodológico dessa ciência. Observa-se tanto o movimento do simples (e.g., laboratório, análise experimental e comportamento não humano) ao complexo (e.g., vida diária, interpretação e comportamento humano), quanto o movimento contrário. O intercâmbio entre os métodos é fundamental para se alcançar os diferentes objetivos da análise do comportamento. Skinner (1969Skinner, B. F. (1969). The Role of the Environment. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A Theoretical Analysis (1ª Ed., pp. 3-28). Appleton-Century- Crofts. ) também propõe o uso de conceitos formulados no laboratório para aprimorar a tecnologia em diversas áreas. Para Skinner, a análise do comportamento tem por objetivo final a construção de uma cultura eficaz. Sobre isso, afirma: “A ciência básica sempre leva, finalmente, a uma tecnologia aprimorada, e uma ciência do comportamento não é exceção. Ela deve fornecer uma tecnologia do comportamento adequada à utópica meta final: uma cultura eficaz” (p. 22). De fato, as contingências de reforçamento planejadas pelo cientista no laboratório são mais simples do que as contingências de reforçamento existentes na vida diária. Todavia, a análise experimental no primeiro ambiente orienta a interpretação no segundo.

“É apenas quando analisamos comportamento sob contingências de reforçamento conhecidas que podemos começar a ver o que está acontecendo na vida diária. Coisas que uma vez negligenciamos começam então a comandar nossa atenção, e coisas que uma vez atraíram nossa atenção aprendemos a descartar ou ignorar.” (Skinner, 1969Skinner, B. F. (1969). The Role of the Environment. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A Theoretical Analysis (1ª Ed., pp. 3-28). Appleton-Century- Crofts. , p. 10).

Essas colocações de Skinner (1969Skinner, B. F. (1969). The Role of the Environment. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A Theoretical Analysis (1ª Ed., pp. 3-28). Appleton-Century- Crofts. ) sugerem que a análise experimental no laboratório altera o controle de estímulos na vida diária. Isso se torna possível, provavelmente, graças ao conhecimento adquirido (e.g., modelado pelas contingências e controlado por regras) em um ambiente simplificado. Fora do laboratório, o cientista interpreta a realidade sob controle de estímulos cujas propriedades foram salientadas pela pesquisa básica ou aplicada. A interpretação, por sua vez, orienta a aplicação tecnológica em inúmeros campos (e.g., educação e clínica), além de formular questões para a investigação experimental (Skinner, 1966/1969aSkinner, B. F. (1969a). The Experimental Analysis of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A theoretical analysis (1ª Ed., pp. 75-104). Appleton-Century-Crofts. ).

No livro Beyond Freedom and Dignity, Skinner (1971/2002Skinner, B. F. (2002). The Design of a Culture. Em B. F. Skinner (Org.), Beyond Freedom and Dignity (1ª Ed., pp. 145-183). Hackett Publishing Company.) volta a reconhecer as diferenças entre o laboratório e a vida diária. Para o autor, o primeiro é mais artificial, simples e ordenado. A simplificação das condições de trabalho, frisa, marca o início de qualquer ciência experimental. Não é diferente com a análise do comportamento. Diz ele:

Uma análise do comportamento naturalmente começa com organismos simples, comportando-se de maneira simples, em ambientes simples. Quando um grau razoável de ordem aparece, os arranjos podem se tornar mais complexos. Avançamos apenas tão rapidamente quanto nosso sucesso permite, e o progresso geralmente não parece rápido o suficiente (p. 159).

Comportamentos complexos são alvo tanto de análise experimental quanto de interpretação. Em geral, suas variáveis de controle se caracterizam por não serem observáveis, mensuráveis e manipuláveis. Ainda assim, o cientista especula a seu respeito, utilizando princípios elaborados via análise experimental. De fato, a análise experimental permite uma interpretação eficaz do objeto de estudo. Ao arranjar contingências mais simples e estudar seus efeitos no laboratório, ela contribui à inferência de contingências mais complexas na vida diária. A compreensão alcançada dessa forma orienta, por sua vez, a aplicação tecnológica. Quanto a isso, Skinner (1971/2002Skinner, B. F. (2002). The Design of a Culture. Em B. F. Skinner (Org.), Beyond Freedom and Dignity (1ª Ed., pp. 145-183). Hackett Publishing Company.) observa: “Além da interpretação está a ação prática. As contingências são acessíveis e, à medida que compreendemos as relações entre organismo e ambiente, descobrimos novas formas de alterar o comportamento” (p. 149). A modificação de comportamento complexo exige, pois, tanto a inferência quanto a manipulação das variáveis de que ele supostamente é função.

No livro About Behaviorism, Skinner (1974/1976aSkinner, B. F. (1976a). Summing Up. Em B. F. Skinner (Org.), About Behaviorism (1ª Ed., pp. 241- 277). Vintage Books.) também defende um avanço gradual do simples ao complexo. Segundo o autor, isso permite não apenas reconhecer processos comuns a diferentes espécies, mas também identificar características exclusivamente humanas. Skinner (1974/1976bSkinner, B. F. (1976b). The Causes of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), About Behaviorism (1ª Ed., pp. 10-23). Vintage Books. ) observa que qualquer informação sobre a herança genética e a história individual de um organismo colabora com os objetivos de previsão, controle e interpretação. No entanto, informações sobre a filogênese e a ontogênese geralmente são inacessíveis, o que dificulta a previsão e o controle. Nesses casos, o cientista atém-se à interpretação.

Assim como em outras ciências, muitas vezes não temos a informação necessária para a previsão e o controle e devemos nos satisfazer com a interpretação, mas nossas interpretações terão o suporte da previsão e do controle que teriam sido possíveis sob outras condições. (Skinner, 1974/1976cSkinner, B. F. (1976c). The Self and Others. Em B. F. Skinner (Org.), About Behaviorism (1ª Ed., pp. 184-207). Vintage Books. , p. 194)

Mais uma vez, Skinner (1974/1976aSkinner, B. F. (1976a). Summing Up. Em B. F. Skinner (Org.), About Behaviorism (1ª Ed., pp. 241- 277). Vintage Books.) identifica uma resistência à extrapolação dos resultados do laboratório à vida diária, onde a previsão e o controle não são alcançáveis com a mesma precisão. Entretanto, o autor lembra que a interpretação é uma prática comum. Não representa uma metaciência. Nas palavras dele:

Obviamente não podemos prever ou controlar o comportamento humano na vida diária com a precisão obtida no laboratório, mas ainda assim podemos usar os resultados do laboratório para interpretar comportamento em outro lugar. Tal interpretação do comportamento humano na vida diária tem sido criticada como uma metaciência, mas todas as ciências recorrem a algo muito parecido com ela (p. 251).

O caráter plausível e (às vezes) temporário da interpretação representa um de seus limites na análise do comportamento. Ainda assim, para Skinner (1974/1976dSkinner, B. F. (1976d). What is Inside the Skin? Em B. F. Skinner (Org.), About Behaviorism (1ª Ed., pp. 228-240). Vintage Books. ), trata-se de uma abordagem preferível às explicações mentalistas.

Quando o comportamento humano é observado sob condições que não podem ser exatamente descritas e quando as histórias [genética e ambiental] estão fora do alcance, é possível prever e controlar muito pouco, mas uma abordagem comportamental é ainda mais útil do que uma mentalista ao interpretar o que uma pessoa está fazendo ou por que ela se comporta do modo que se comporta sob tais condições (pp. 230-231).

Assim, Skinner (1974/1976bSkinner, B. F. (1976b). The Causes of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), About Behaviorism (1ª Ed., pp. 10-23). Vintage Books. ) ultrapassa os fatos e especula sobre o comportamento, pois considera essa atividade indispensável ao desenvolvimento de métodos responsáveis por aumentar o controle sobre o objeto de estudo. Diz ele:

Todo campo científico apresenta uma fronteira além da qual a discussão, embora necessária, não pode ser tão precisa como se gostaria. Um escritor recentemente disse que “mera especulação que não pode ser submetida ao teste da verificação experimental não faz parte da ciência”, mas se isso fosse verdade uma grande parte da astronomia, por exemplo, ou da física atômica não seria ciência. Especulação é necessária, de fato, para inventar métodos que trarão um objeto de estudo sob melhor controle. (p. 21)

Segundo Skinner (1974/1976aSkinner, B. F. (1976a). Summing Up. Em B. F. Skinner (Org.), About Behaviorism (1ª Ed., pp. 241- 277). Vintage Books.), o desenvolvimento de tecnologia muitas vezes inclui um exercício anterior de interpretação. A esse respeito, o autor avalia:

Aqueles familiarizados com pesquisa de laboratório serão mais propensos a olhar para coisas importantes e saberão quais outras coisas perguntar; terão uma melhor compreensão do que veem. É por isso que podem interpretar mais precisamente a vida diária. A análise de laboratório torna possível identificar variáveis relevantes e descartar outras que, embora possivelmente mais fascinantes, ainda assim têm pouco ou nada a ver com o comportamento sob observação. Muitos dos avanços tecnológicos derivados do estudo do comportamento operante têm se beneficiado desse tipo de interpretação. (p. 253)

Embora ressalte a contribuição da interpretação ao desenvolvimento de tecnologia, Skinner (1974/1976aSkinner, B. F. (1976a). Summing Up. Em B. F. Skinner (Org.), About Behaviorism (1ª Ed., pp. 241- 277). Vintage Books.) faz uma observação. Para o autor, os princípios derivados da análise experimental e aplicados à compreensão e à solução de problemas humanos não apresentam todas as informações necessárias a casos particulares. A solução de problemas cotidianos exige aliar o conhecimento dos princípios gerais às especificidades das situações práticas. Nessa direção, Skinner (1977/1978aSkinner, B. F. (1978a). The Experimental Analysis of Behavior: A History. Em B. F. Skinner (Org.), Reflections on Behaviorism and Society (1ª Ed., pp. 113-126). Prentice-Hall. ) avalia que as decisões tomadas em diversos âmbitos seriam mais eficazes se aplicassem os princípios formulados pela análise do comportamento. Conforme Skinner (1977/1978bSkinner, B. F. (1978b). Why I Am Not a Cognitive Psychologist. Em B. F. Skinner (Org.), Reflections on Behaviorism and Society (1ª Ed., pp. 97-112). Prentice-Hall. ), o objetivo final de sua ciência é a transformação do mundo em que as pessoas vivem, e não de suas “mentes e corações” (p. 112). Avesso a explicações mentalistas, Skinner (1978Skinner, B. F. (1978a). The Experimental Analysis of Behavior: A History. Em B. F. Skinner (Org.), Reflections on Behaviorism and Society (1ª Ed., pp. 113-126). Prentice-Hall. ) frisa que o conhecimento dos ambientes filogenético e ontogenético permite explicar o objeto de estudo, colaborando para sua previsão, seu controle e sua interpretação. Sobre isso, afirma:

O erro recai, argumento, na sobrevivência do mentalismo. Quanto antes abandonarmos explicações do comportamento em termos de sentimentos e estados da mente, antes devemos nos voltar às condições genéticas e ambientais das quais o comportamento é função. O suficiente já é sabido sobre essas condições para assegurar razoável sucesso na interpretação, na previsão e no controle do comportamento humano. Uma recusa em levar vantagem do que está ao alcance pode significar a diferença entre a sobrevivência e a destruição da nossa civilização ou até mesmo da espécie. (pp. 94-95)

No texto Selection by Consequences, Skinner (1981/1987Skinner, B. F. (1987). Selection by Consequences. Em B. F. Skinner (Org.), Upon Further Reflection (1ª Ed., pp. 51-64). Prentice-Hall.) apresenta integralmente seu modelo de causalidade. O autor destaca os processos de variação e seleção nos três níveis de determinação e ressalta a importância da história na determinação do comportamento. Como já sinalizado, enquanto o método interpretativo envolve uma inferência sobre a história do comportamento, o método experimental inclui a observação, a mensuração e a manipulação de variáveis de controle no presente. Complexo e multideterminado, o objeto de estudo exige um intercâmbio constante entre análise experimental e interpretação, sem o qual a explicação ficaria incompleta.

Apesar disso, Skinner (1983/1987Skinner, B. F. (1987). Can the Experimental Analysis of Behavior Rescue Psychology? Em B. F. Skinner (Org.), Upon Further Reflection (1ª Ed., pp. 159-172). Prentice-Hall. ) avalia que a interpretação (a) não foi bem examinada pelos metodologistas científicos e (b) foi mal-entendida pelos críticos do campo operante. Preocupado com a relevância de sua ciência para os problemas do mundo, o autor crê que as soluções serão encontradas com a compreensão inicialmente oferecida pela análise experimental e com a aplicação tecnológica posteriormente orientada pela interpretação. No capítulo The Evolution of Behavior, Skinner (1984/1987Skinner, B. F. (1987). The Evolution of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Upon Further Reflection (1ª Ed., pp. 65-74). Prentice-Hall. ) interpreta a evolução dos processos pelos quais o comportamento mudaria. Trata-se de uma explicação plausível, de natureza inferencial, e não de fatos demonstrados experimentalmente. Articulando hipóteses e transcendendo fatos, ele “reconstrói” o processo evolutivo. Naturalmente, o autor não observou essa transformação histórica. Ele apenas supôs como as contingências filogenéticas, ontogenéticas e culturais teriam evoluído. Graças ao método interpretativo, Skinner elaborou afirmações prováveis sobre a multideterminação do objeto de estudo. Tais afirmações podem ou não ter um caráter temporário, sendo confirmadas ou refutadas por novos achados experimentais. O fato é que elas levantam questões a serem investigadas no laboratório, assim como os dados produzidos nesse ambiente modelam novas respostas verbais dos cientistas.

Referindo-se à análise experimental, Skinner (1984/1988bSkinner, B. F. (1988b). Contingencies and Rules [Response to the Comments of the Article “An Operant Analysis of Problem Solving”]. Em A. C. Catania,& S. Harnad (Orgs.), The Selection of Consequences: The Operant Behaviorism of B. F. Skinner (1ª Ed., pp. 236-277). Cambridge University Press.) também atesta: “Ela proporcionou termos e princípios de grande valor prático e, acredito, de igual valor na interpretação de comportamento humano observado sob circunstâncias menos favoráveis fora do laboratório” (p. 253). Na mesma linha, Skinner (1984/1988eSkinner, B. F. (1988e). Some Consequences of Selection [Response to the Comments of the Article “Selection by Consequences”]. Em A. C. Catania,& S. Harnad (Orgs.), The Selection of Consequences: The Operant Behaviorism of B. F. Skinner (1ª Ed., pp. 20-76). Cambridge University Press. ) afirma que há diversos campos “além da previsão e do controle” (p. 26). Em seguida, indaga:

Permanecemos em silêncio a respeito deles? Não, interpretamos observações nesses campos usando o que aprendemos da pesquisa na qual podemos prever e controlar. A maioria das pessoas instruídas aceita tais interpretações no lugar de explicações que chegaram até nós da cultura popular e da religião. O comportamento humano é um desses campos... (p. 26)

Paralelamente, Skinner (1984/1988aSkinner, B. F. (1988a). Coming to Terms with Private Events [Response to the Comments of the Article “The Operational Analysis of Psychological Terms”]. Em A. C. Catania,& S. Harnad (Orgs.), The Selection of Consequences: The Operant Behaviorism of B. F. Skinner (1ª Ed., pp. 164-217). Cambridge University Press. ) apresenta uma definição explícita de interpretação: “Uso de termos e princípios científicos ao falar sobre fatos a respeito dos quais muito pouco é conhecido para tornar a previsão e o controle possíveis” (p. 207). Novamente, exemplo disso é a teoria da evolução, vista por Skinner (1984/1988bSkinner, B. F. (1988b). Contingencies and Rules [Response to the Comments of the Article “An Operant Analysis of Problem Solving”]. Em A. C. Catania,& S. Harnad (Orgs.), The Selection of Consequences: The Operant Behaviorism of B. F. Skinner (1ª Ed., pp. 236-277). Cambridge University Press.) como uma interpretação eficaz.

Tanto quanto estou preocupado, a ciência não estabelece verdade ou falsidade; ela busca a maneira mais eficaz de lidar com os objetos de estudo. A teoria da evolução não é verdadeira ou falsa; ela é a melhor interpretação possível de uma vasta gama de fatos à luz de princípios que aos poucos estão se tornando mais conhecidos na genética e em ciências relacionadas. (p. 241)

Segundo Skinner (1984/1988cSkinner, B. F. (1988c). Reply to Harnad [Response to “What are the Scope and Limits of Radical Behaviorist Theory”]. Em A. C. Catania,& S. Harnad (Orgs.), The Selection of Consequences: The Operant Behaviorism of B. F. Skinner (1ª Ed., pp. 468-473). Cambridge University Press.), a análise de fenômenos semelhantes aos da vida diária, realizada no laboratório, permite explicar comportamentos não suscetíveis à previsão e ao controle. A esse respeito, o autor afirma:

Assim como na astronomia moderna, um laboratório de ciência do comportamento continuará, acredito, a oferecer a melhor explicação possível de fatos além do controle experimental - eventos do mundo em geral no caso do comportamento, ondas e partículas atingindo a Terra do espaço sideral no caso da astronomia. A profundidade e a amplitude dos dois campos dependerão não de aperfeiçoamentos na teoria, mas de sucesso na análise de fenômenos presumivelmente similares em que algum grau de previsão e controle seja possível. (p. 468)

Portanto, quando a previsão e o controle não são possíveis, a análise do comportamento detém-se na interpretação, isto é, no uso de conceitos e princípios estabelecidos em situações mais simples para explicar fenômenos mais complexos. Ao mesmo tempo, sublinha Skinner (1984/1988dSkinner, B. F. (1988d). Representations and Misrepresentations [Response to the Comments of the Article “Behaviorism at Fifty”]. Em A. C. Catania,& S. Harnad (Orgs.), The Selection of Consequences: The Operant Behaviorism of B. F. Skinner (1ª Ed., pp. 293-381). Cambridge University Press. ), “o valor heurístico de uma interpretação deve ser julgado pela qualidade da teoria e da pesquisa a que ela leva” (p. 307).

Como Skinner (1986/1987Skinner, B. F. (1987). The Evolution of Verbal Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Upon Further Reflection (1ª Ed., pp. 75-92). Prentice-Hall. ) indica no capítulo The Evolution of Verbal Behavior, “observamos os produtos da evolução, mas não muito do processo. A maioria da história ocorreu bastante tempo atrás e pouco permanece dos estágios iniciais” (p. 75). Em razão disso, admite, “provavelmente nunca saberemos com precisão o que aconteceu, mas devemos ser capazes de dizer o que poderia ter acontecido” (p. 75). Nessa linha, acrescenta, “a plausibilidade de uma reconstrução depende em parte do tamanho das variações que se assume terem ocorrido. Quanto menor as variações, mais plausível a explicação” (p. 76).

Para Skinner (1987Skinner, B. F. (1987). Why We Are Not Acting to Save the World. Em B. F. Skinner (Org.), Upon Further Reflection (1ª Ed., pp. 1-14). Prentice-Hall. ), então, a maioria das explicações do comportamento permanece uma questão de interpretação. A espécie humana se diferencia das outras por conta do comportamento verbal, ou seja, ela não apenas responde a contingências de reforçamento, mas também as descreve. Assim, tanto no laboratório quanto na vida diária, o comportamento humano deve ser visto como um produto das contingências de reforçamento prevalentes e do que as pessoas falam sobre elas. Entretanto, o que as pessoas dizem aos outros e a si mesmas resulta de uma história pessoal fora de alcance. Por esse motivo, o autor argumenta:

Por um longo tempo, o comportamento humano provavelmente permanecerá um objeto para interpretação em vez de [um objeto] para previsão e controle. Em razão disso, podemos ver a importância de uma ciência que estuda o comportamento de organismos cujos processos comportamentais básicos estão livres de complicações verbais - isto é, espécies não verbais ou participantes humanos que não adquiriram comportamento verbal extensivo. (p. 10)

Ainda conforme Skinner (1987Skinner, B. F. (1987). Why We Are Not Acting to Save the World. Em B. F. Skinner (Org.), Upon Further Reflection (1ª Ed., pp. 1-14). Prentice-Hall. /1989Skinner, B. F. (1989). Whatever Happened to Psychology as the Science of Behavior? Em B. F. Skinner (Org.), Recent Issues in the Analysis of Behavior (1ª Ed., pp. 59-71). ), a interpretação é uma prática legítima.

Os astrônomos interpretam as ondas e as partículas que atingem a Terra, provenientes do espaço exterior, através do que aprenderam sob condições controláveis do laboratório - como, por exemplo, na física de alta energia. De modo similar, utilizamos o que aprendemos com a análise experimental para explicar comportamentos que, ao menos por enquanto, não podemos colocar sob controle experimental, como, por exemplo, o comportamento encoberto ou o comportamento observado casualmente na vida diária. (p. 63)

Em seu último texto, Skinner (1990/1999Skinner, B. F. (1999). Can Psychology Be a Science of Mind? Em V. G. Laties, & A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 661-673). Copley Publishing Group. ) reafirma os três níveis de determinação do comportamento, atribuindo ao modelo de seleção por consequências a explicação do objeto de estudo. Ao mesmo tempo, o autor sinaliza que a interpretação representa um objetivo complementar à previsão e ao controle, assim como um método suplementar à análise experimental, constituindo uma atividade fundamental na análise do comportamento.

Discussão

A exemplo da revisão da literatura citada no início deste artigo (e.g., Baum, 2011Baum, W. (2011). Behaviorism, Private Events, and the Molar View of Behavior. The BehaviorAnalyst, 34, 185-200. https://doi.org/10.1007/BF03392249
https://doi.org/10.1007/BF03392249...
; Donahoe, 1998Donahoe, J. W. (1998). Interpreting verbal behavior. The Analysis of Verbal Behavior, 15, 107-112. https://doi.org/10.1007/BF03392929
https://doi.org/10.1007/BF03392929...
; Holland, 1992Holland, J. G. (1992). B. F. Skinner (1904-1990). American Psychologist, 47, 665-667.https://doi.org/10.1037/0003-066X.47.5.665
https://doi.org/10.1037/0003-066X.47.5.6...
; Moore, 2011Moore, J. (2011). Methodological Behaviorism as a Radical Behaviorist Views It. Behavior and Philosophy, 39, 145-202. ), a leitura de 35 textos de Skinner permitiu identificar diferentes objetivos e métodos na ciência proposta pelo autor. A seguir, indicamos alguns textos em que Skinner aponta os diferentes objetivos. Os exemplos não são exaustivos. Eles apenas ilustram, entre parênteses, momentos em que o autor se referiu aos diferentes propósitos de sua ciência: a descrição, explicação ou compreensão (e.g., Skinner, 1931/1999Skinner, B. F. (1999). The Operational Analysis of Psychological Terms. Em V. G. Laties,& A.C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 416-430).Copley Publishing Group. , 1947/1999Skinner, B. F. (1999). Current Trends in Experimental Psychology. Em V. G. Laties,& A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 341-359). Copley Publishing Group. , 1981/1987Skinner, B. F. (1987). Selection by Consequences. Em B. F. Skinner (Org.), Upon Further Reflection (1ª Ed., pp. 51-64). Prentice-Hall.), a previsão (e.g., 1938/1991aSkinner, B. F. (1991a). A System of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), The Behavior of Organisms: An Experimental Analysis (1ª Ed., pp. 3-43). Copley Publishing Group.), o controle (e.g., Skinner, 1938/1991bSkinner, B. F. (1991b). Conclusion. Em B. F. Skinner (Org.), The Behavior of Organisms: An Experimental Analysis (1ª Ed., pp. 433-444). Copley Publishing Group. ), a interpretação (e.g., Holland & Skinner, 1961Holland, J. G., & Skinner, B. F. (1961). Techniques and Aims of Science. Em J. G. Holland, & B. F. Skinner (Orgs.), The Analysis of Behavior: A Program for Self-Instruction (1ª Ed., pp. 276-280). McGraw-Hill. ) e o conhecimento (e.g., Skinner, 1957/1992Skinner, B. F. (1992). Logical and Scientific Verbal Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Verbal Behavior (1ª Ed., pp. 418-431). Copley Publishing Group. ).

Enquanto objetivo da análise do comportamento, a interpretação apresentou um status equivalente ao dos demais objetivos (e.g., Morris, 1992Morris, E. K. (1992). The Aim, Progress, and Evolution of Behavior Analysis. The Behavior Analyst, 15, 3-29. https://doi.org/10.1007/BF03392582
https://doi.org/10.1007/BF03392582...
; Skinner, 1958/1999Skinner, B. F. (1999). Reinforcement Today. Em V. G. Laties, & A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 165-175). Copley Publishing Group.), estabelecendo com eles uma relação de complementaridade (e.g., Skinner, 1990/1999Skinner, B. F. (1999). The Operational Analysis of Psychological Terms. Em V. G. Laties,& A.C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 416-430).Copley Publishing Group. ). Definida por Skinner (1966/1969aSkinner, B. F. (1969a). The Experimental Analysis of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A theoretical analysis (1ª Ed., pp. 75-104). Appleton-Century-Crofts. , 1974/1976dSkinner, B. F. (1976d). What is Inside the Skin? Em B. F. Skinner (Org.), About Behaviorism (1ª Ed., pp. 228-240). Vintage Books. ) como uma explicação plausível e (às vezes) temporária, a interpretação costuma ser realizada quando a previsão e o controle do objeto de estudo (ainda) não são possíveis (Donahoe & Palmer, 1989Donahoe, J. W. & Palmer, D. C. (1989). The Interpretation of Complex Human Behavior: Some Reactions to Parallel Distributed Processing, edited by J. L. McClelland, D. E. Rumelhart, and the PDP Research Group. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 51, 399-416. https://doi.org/10.1901/jeab.1989.51-399
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; Palmer, 2009Palmer, D. C. (2009). The role of private events in the interpretation of complex behavior. Behavior and Philosophy, 37, 3-19. , 2011Palmer, D. C. (2011). Consideration of Private Events is Required in a Comprehensive Science of Behavior. The Behavior Analyst, 34, 201-207. https://doi.org/10.1007/BF03392250
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; Skinner, 1974/1976cSkinner, B. F. (1976c). The Self and Others. Em B. F. Skinner (Org.), About Behaviorism (1ª Ed., pp. 184-207). Vintage Books. , 1984/1988eSkinner, B. F. (1988e). Some Consequences of Selection [Response to the Comments of the Article “Selection by Consequences”]. Em A. C. Catania,& S. Harnad (Orgs.), The Selection of Consequences: The Operant Behaviorism of B. F. Skinner (1ª Ed., pp. 20-76). Cambridge University Press. , 1987/1989Skinner, B. F. (1989). Whatever Happened to Psychology as the Science of Behavior? Em B. F. Skinner (Org.), Recent Issues in the Analysis of Behavior (1ª Ed., pp. 59-71). ). Apesar da natureza inferencial e especulativa, a interpretação não constitui especulação irrestrita, uma vez que se baseia nas leis, conceitos e princípios derivados da análise experimental (e.g., Skinner, 1966/1969bSkinner, B. F. (1969b). The Phylogeny and Ontogeny of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A Theoretical Analysis (1ª Ed., pp. 172-217). Appleton-Century-Crofts., 1984/1988bSkinner, B. F. (1988b). Contingencies and Rules [Response to the Comments of the Article “An Operant Analysis of Problem Solving”]. Em A. C. Catania,& S. Harnad (Orgs.), The Selection of Consequences: The Operant Behaviorism of B. F. Skinner (1ª Ed., pp. 236-277). Cambridge University Press., 1986/1987Skinner, B. F. (1987). The Evolution of Verbal Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Upon Further Reflection (1ª Ed., pp. 75-92). Prentice-Hall. ). Trata-se de uma parte do conhecimento científico (Skinner, 1957/1992Skinner, B. F. (1992). Logical and Scientific Verbal Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Verbal Behavior (1ª Ed., pp. 418-431). Copley Publishing Group. ). Isso porque o conhecimento produzido na análise do comportamento é tanto experimental quanto interpretativo (e.g., Skinner, 1947/1999Skinner, B. F. (1999). Current Trends in Experimental Psychology. Em V. G. Laties,& A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 341-359). Copley Publishing Group. , 1984/1987Skinner, B. F. (1987). The Evolution of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Upon Further Reflection (1ª Ed., pp. 65-74). Prentice-Hall. ). Juntos, os diferentes objetivos desta ciência convergem para uma meta maior: o desenvolvimento de uma cultura eficaz, por meio da aplicação tecnológica dos princípios descobertos no laboratório (Palmer, 2011Palmer, D. C. (2011). Consideration of Private Events is Required in a Comprehensive Science of Behavior. The Behavior Analyst, 34, 201-207. https://doi.org/10.1007/BF03392250
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; Skinner, 1969Skinner, B. F. (1969). The Role of the Environment. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A Theoretical Analysis (1ª Ed., pp. 3-28). Appleton-Century- Crofts. , 1977/1978aSkinner, B. F. (1978a). The Experimental Analysis of Behavior: A History. Em B. F. Skinner (Org.), Reflections on Behaviorism and Society (1ª Ed., pp. 113-126). Prentice-Hall. , 1977/1978bSkinner, B. F. (1978b). Why I Am Not a Cognitive Psychologist. Em B. F. Skinner (Org.), Reflections on Behaviorism and Society (1ª Ed., pp. 97-112). Prentice-Hall. ).

Quanto aos métodos da ciência de Skinner, a leitura de 35 textos do autor revelou destaque tanto para a análise experimental (e.g., Skinner, 1931/1999Skinner, B. F. (1999). The Concept of the Reflex in the Description of Behavior. Em V. G. Laties, & A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 475-503). Copley Publishing Group. ) quanto para a interpretação (e.g., Skinner, 1945/1999Skinner, B. F. (1999). The Operational Analysis of Psychological Terms. Em V. G. Laties,& A.C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 416-430).Copley Publishing Group. , 1957/1992Skinner, B. F. (1992). Logical and Scientific Verbal Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Verbal Behavior (1ª Ed., pp. 418-431). Copley Publishing Group. ). Geralmente realizada no laboratório com organismos não humanos, a análise experimental visa à identificação e à demonstração de relações funcionais, a fim de prever e controlar o objeto de estudo, aplicando-se sobretudo a comportamentos públicos, mais simples e necessariamente presentes (Palmer, 2009Palmer, D. C. (2009). The role of private events in the interpretation of complex behavior. Behavior and Philosophy, 37, 3-19. ; Skinner, 1938/1991aSkinner, B. F. (1991a). A System of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), The Behavior of Organisms: An Experimental Analysis (1ª Ed., pp. 3-43). Copley Publishing Group., 1938/1991bSkinner, B. F. (1991b). Conclusion. Em B. F. Skinner (Org.), The Behavior of Organisms: An Experimental Analysis (1ª Ed., pp. 433-444). Copley Publishing Group. ). Para isso, exige a manipulação de variáveis independentes, a observação e a mensuração de eventuais efeitos sobre a variável dependente. Este método se destaca pelo fato de o comportamento de um organismo ser comparado ao comportamento do próprio organismo em diferentes condições experimentais. Dessa forma, opõe-se à tradicional comparação entre um grupo controle e um grupo experimental, por meio de testes estatísticos (Skinner, 1951/1999Skinner, B. F. (1999). Current Trends in Experimental Psychology. Em V. G. Laties,& A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 341-359). Copley Publishing Group. ). Graças à análise experimental, é possível formular indutivamente as leis, conceitos e princípios que compõem uma teoria do comportamento (Skinner, 1938/1991aSkinner, B. F. (1991a). A System of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), The Behavior of Organisms: An Experimental Analysis (1ª Ed., pp. 3-43). Copley Publishing Group., 1938/1991bSkinner, B. F. (1991b). Conclusion. Em B. F. Skinner (Org.), The Behavior of Organisms: An Experimental Analysis (1ª Ed., pp. 433-444). Copley Publishing Group. ). Já o método interpretativo possibilita o desenvolvimento do conhecimento científico para além dos limites impostos pela análise experimental, sendo fundamental para a investigação de comportamentos passados, privados e mais complexos (e.g., Donahoe & Palmer, 1991Palmer, D. C., & Donahoe, J. W. (1991). Shared Premises, Different Conclusions. The Behavior Analyst, 14, 123-127. https://doi.org/10.1007/BF03392561
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; Skinner, 1945/1999Skinner, B. F. (1999). The Operational Analysis of Psychological Terms. Em V. G. Laties,& A.C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 416-430).Copley Publishing Group. , 1953/1965bSkinner, B. F. (1965b). Why Organisms Behave. Em B. F. Skinner (Org.), Science and Human Behavior (1ª Ed., pp. 23-42). The Free Press., 1987Skinner, B. F. (1987). Why We Are Not Acting to Save the World. Em B. F. Skinner (Org.), Upon Further Reflection (1ª Ed., pp. 1-14). Prentice-Hall. ). Aplicado no laboratório e na vida diária, ele envolve a inferência de relações funcionais, a suposição de variáveis de controle e a especulação sobre processos de variação e seleção nos três níveis de determinação (e.g., Skinner, 1957/1992Skinner, B. F. (1992). Logical and Scientific Verbal Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Verbal Behavior (1ª Ed., pp. 418-431). Copley Publishing Group. , 1966/1969aSkinner, B. F. (1969a). The Experimental Analysis of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A theoretical analysis (1ª Ed., pp. 75-104). Appleton-Century-Crofts. , 1966/1969bSkinner, B. F. (1969b). The Phylogeny and Ontogeny of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A Theoretical Analysis (1ª Ed., pp. 172-217). Appleton-Century-Crofts.). Enquanto método, a interpretação tende a ser adotada quando a análise experimental (ainda) não é possível (e.g., Palmer, 2011Palmer, D. C. (2011). Consideration of Private Events is Required in a Comprehensive Science of Behavior. The Behavior Analyst, 34, 201-207. https://doi.org/10.1007/BF03392250
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; Skinner, 1987/1989Skinner, B. F. (1989). Whatever Happened to Psychology as the Science of Behavior? Em B. F. Skinner (Org.), Recent Issues in the Analysis of Behavior (1ª Ed., pp. 59-71). ).

Na ciência de Skinner, destaca-se o intercâmbio entre os métodos. Afinal, como indicado anteriormente, a interpretação exigiu a formulação prévia de leis, conceitos e princípios derivado de análise experimental. Nesse sentido, ela foi subordinada à primeira. Por outro lado, a interpretação indicou novos rumos à análise experimental. Neste caso, ela a subordinou (Donahoe, 2004Donahoe, J. W. (2004). Interpretation and Experimental Analysis: An Underappreciated Distinction. European Journal of Behavior Analysis, 5, 83-89. https://doi.org/10.1080/15021149.2004.10446387
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; Skinner, 1966/1969aSkinner, B. F. (1969a). The Experimental Analysis of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A theoretical analysis (1ª Ed., pp. 75-104). Appleton-Century-Crofts. , 1974/1976bSkinner, B. F. (1976b). The Causes of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), About Behaviorism (1ª Ed., pp. 10-23). Vintage Books. ). Não se trata, pois, de uma via unilateral ou de um caminho percorrido apenas do simples ao complexo, da experimentação à interpretação, do laboratório à vida diária (cf. Skinner, 1974/1976aSkinner, B. F. (1976a). Summing Up. Em B. F. Skinner (Org.), About Behaviorism (1ª Ed., pp. 241- 277). Vintage Books.). Trata-se, sim, de uma relação bilateral (e.g., Skinner, 1981/1987). O fato é que algumas relações funcionais inferidas via interpretação serão demonstradas ou verificadas experimentalmente, conforme as técnicas do laboratório se aperfeiçoarem. Nesses casos, a interpretação terá uma função temporária. Outras relações talvez nunca sejam demonstradas ou verificadas experimentalmente - seja por envolverem aspectos históricos, seja por não permitirem a observação, a mensuração ou a manipulação de variáveis. Nesses casos, a interpretação será primordial (Palmer & Donahoe, 1991Palmer, D. C., & Donahoe, J. W. (1991). Shared Premises, Different Conclusions. The Behavior Analyst, 14, 123-127. https://doi.org/10.1007/BF03392561
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; Skinner, 1953/1965aSkinner, B. F. (1965a). A Science of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Science and Human Behavior (1ª Ed., pp. 11-22).The Free Press., 1953/1965bSkinner, B. F. (1965b). Why Organisms Behave. Em B. F. Skinner (Org.), Science and Human Behavior (1ª Ed., pp. 23-42). The Free Press.). De fato, a relação complementar entre os métodos se torna indispensável. Até porque, como o próprio Skinner (1966/1969aSkinner, B. F. (1969a). The Experimental Analysis of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A theoretical analysis (1ª Ed., pp. 75-104). Appleton-Century-Crofts. ) admitiu, a ciência não é um processo estritamente ordenado em que apenas um experimento leva a outro, mas também no qual suposições plausíveis e afirmações provisórias (i.e., interpretações) orientam a busca de dados adicionais.

Contribuições e Limites

Seja como objetivo ou como método, a interpretação ofereceu contribuições teóricas, metodológicas e tecnológicas à ciência de Skinner. Do ponto de vista teórico, ela foi responsável pela organização, articulação e extrapolação dos fatos descobertos experimentalmente, ampliando o conhecimento científico e permitindo uma compreensão do comportamento na vida diária (Skinner, 1947/1999Skinner, B. F. (1999). Current Trends in Experimental Psychology. Em V. G. Laties,& A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 341-359). Copley Publishing Group. ). Já no laboratório, enquanto suposição plausível sobre as variáveis de controle, a interpretação orientou a manipulação experimental. Esta, por sua vez, buscou demonstrar a plausibilidade das relações funcionais supostas via interpretação (Skinner, 1957/1992Skinner, B. F. (1992). Logical and Scientific Verbal Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Verbal Behavior (1ª Ed., pp. 418-431). Copley Publishing Group. ). Assim, coube à análise experimental confirmar ou não a natureza temporária das interpretações feitas pelos cientistas (Skinner, 1966/1969aSkinner, B. F. (1969a). The Experimental Analysis of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A theoretical analysis (1ª Ed., pp. 75-104). Appleton-Century-Crofts. ). Se as interpretações promoviam uma ação eficaz, elas eram consideradas válidas. Graças ao intercâmbio entre os métodos, houve um aperfeiçoamento da teoria do comportamento (Skinner, 1984/1987Skinner, B. F. (1987). The Evolution of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Upon Further Reflection (1ª Ed., pp. 65-74). Prentice-Hall. ). Nessa linha, a interpretação também ofereceu contribuições metodológicas à ciência de Skinner. Isso ocorreu de diferentes formas: (a) ao inferir estímulos privados ao examinar o comportamento, superando limites metodológicos na definição do objeto de estudo (Skinner, 1945/1999Skinner, B. F. (1999). The Operational Analysis of Psychological Terms. Em V. G. Laties,& A.C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 416-430).Copley Publishing Group. ); (b) ao especular sobre processos de variação e seleção nos três níveis de determinação, suplementando a explicação via análise experimental (Skinner, 1953/1965bSkinner, B. F. (1965b). Why Organisms Behave. Em B. F. Skinner (Org.), Science and Human Behavior (1ª Ed., pp. 23-42). The Free Press., 1966/1969bSkinner, B. F. (1969b). The Phylogeny and Ontogeny of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A Theoretical Analysis (1ª Ed., pp. 172-217). Appleton-Century-Crofts.); (c) ao constituir fonte de sugestões para novos experimentos (Skinner, 1966/1969aSkinner, B. F. (1969a). The Experimental Analysis of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A theoretical analysis (1ª Ed., pp. 75-104). Appleton-Century-Crofts. ); (d) ao estimular o desenvolvimento de procedimentos responsáveis por aumentar o controle sobre o objeto de estudo (Skinner, 1974/1976bSkinner, B. F. (1976b). The Causes of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), About Behaviorism (1ª Ed., pp. 10-23). Vintage Books. ). Dessa forma, a interpretação ainda proporcionou contribuições tecnológicas à ciência de Skinner. Ao extrapolar os dados obtidos no laboratório, com organismos mais simples, para o comportamento humano, na vida diária, ela estabeleceu uma ponte entre análise experimental e aplicação tecnológica (Skinner, 1969Skinner, B. F. (1969a). The Experimental Analysis of Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Contingencies of Reinforcement: A theoretical analysis (1ª Ed., pp. 75-104). Appleton-Century-Crofts. ). Essa transferência de conhecimento sobre processos básicos ao mundo facilitou a previsão e orientou o controle do objeto de estudo (e.g., Hayes, 2010Hayes, S. C. (2010). The Scientist as Behaving Organism. Behavior and Philosophy, 38, 169-171. ; Skinner, 1951/1999Skinner, B. F. (1999). The Analysis of Behavior. Em V. G. Laties,& A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 101-107). Copley Publishing Group. ). Movendo -se do simples ao complexo, do comportamento não humano ao comportamento humano, do laboratório à vida diária, a interpretação colaborou à solução de problemas em diferentes áreas, aprimorando uma tecnologia do comportamento (Palmer, 2011Palmer, D. C. (2011). Consideration of Private Events is Required in a Comprehensive Science of Behavior. The Behavior Analyst, 34, 201-207. https://doi.org/10.1007/BF03392250
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; Skinner, 1974/1976aSkinner, B. F. (1976a). Summing Up. Em B. F. Skinner (Org.), About Behaviorism (1ª Ed., pp. 241- 277). Vintage Books., 1977/1978aSkinner, B. F. (1978a). The Experimental Analysis of Behavior: A History. Em B. F. Skinner (Org.), Reflections on Behaviorism and Society (1ª Ed., pp. 113-126). Prentice-Hall. ). Retornando do complexo ao simples, do comportamento humano ao não humano, da vida diária à análise experimental, a interpretação também expôs ao laboratório os desafios da realidade externa, onde a previsão e o controle requerem o constante aperfeiçoamento teórico e metodológico desta ciência (Skinner, 1984/1988dSkinner, B. F. (1988d). Representations and Misrepresentations [Response to the Comments of the Article “Behaviorism at Fifty”]. Em A. C. Catania,& S. Harnad (Orgs.), The Selection of Consequences: The Operant Behaviorism of B. F. Skinner (1ª Ed., pp. 293-381). Cambridge University Press. ). Em suma, ao intermediar a relação bilateral entre análise experimental e aplicação tecnológica, a interpretação fomentou uma ação eficaz do analista do comportamento, tanto no laboratório quanto na vida diária (Skinner, 1958/1999Skinner, B. F. (1999). Reinforcement Today. Em V. G. Laties, & A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 165-175). Copley Publishing Group.).

Por outro lado, é necessário reconhecer, a interpretação também apresentou limites na ciência de Skinner. Por constituir uma explicação plausível e às vezes temporária, de natureza inferencial e especulativa, ela pode ser equivocada (Skinner, 1945/1999Skinner, B. F. (1999). The Operational Analysis of Psychological Terms. Em V. G. Laties,& A.C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 416-430).Copley Publishing Group. ). Afinal, não traduz os fatos, sendo apenas uma versão provável (Skinner, 1953/1965bSkinner, B. F. (1965b). Why Organisms Behave. Em B. F. Skinner (Org.), Science and Human Behavior (1ª Ed., pp. 23-42). The Free Press.). Nesse sentido, a interpretação não é responsável por descobertas, mas por especulações baseadas em dados do laboratório (Palmer, 2009Palmer, D. C. (2009). The role of private events in the interpretation of complex behavior. Behavior and Philosophy, 37, 3-19. , 2011Palmer, D. C. (2011). Consideration of Private Events is Required in a Comprehensive Science of Behavior. The Behavior Analyst, 34, 201-207. https://doi.org/10.1007/BF03392250
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). Por mais plausíveis que sejam, tais especulações ainda exigem confirmações experimentais (Skinner, 1974/1976dSkinner, B. F. (1976d). What is Inside the Skin? Em B. F. Skinner (Org.), About Behaviorism (1ª Ed., pp. 228-240). Vintage Books. ). Aliás, Skinner (1986/1987Skinner, B. F. (1987). The Evolution of Verbal Behavior. Em B. F. Skinner (Org.), Upon Further Reflection (1ª Ed., pp. 75-92). Prentice-Hall. ) foi claro a esse respeito, ao afirmar que as interpretações não dizem como os fatos ocorreram, mas como poderiam ter ocorrido. Ainda assim, cumpre lembrar, o valor de uma interpretação está na possibilidade de gerar uma ação eficaz sobre os problemas do mundo, e não em sua verdade (Skinner, 1984/1988bSkinner, B. F. (1988b). Contingencies and Rules [Response to the Comments of the Article “An Operant Analysis of Problem Solving”]. Em A. C. Catania,& S. Harnad (Orgs.), The Selection of Consequences: The Operant Behaviorism of B. F. Skinner (1ª Ed., pp. 236-277). Cambridge University Press.).

Fonte de objeções e de mal-entendidos, a interpretação cumpre uma importante função na ciência de Skinner. Trata-se de um objetivo complementar à previsão e ao controle, assim como de um método suplementar à análise experimental, oferecendo uma valiosa contribuição à análise do comportamento (Skinner, 1990/1999Skinner, B. F. (1999). Can Psychology Be a Science of Mind? Em V. G. Laties, & A. C. Catania (Orgs.), Cumulative Record: Definitive Edition (1ª Ed., pp. 661-673). Copley Publishing Group. ).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Fev 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    07 Fev 2019
  • Revisado
    13 Maio 2020
  • Aceito
    04 Jun 2020
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