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Análise Fatorial Confirmatória e Normatização da Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS) 1 Apoio: Fundação de Apoio à Pesquisa e à Inovação Tecnológica do Estado de Sergipe (FAPITEC-SE).

Confirmatory Factor Analysis and Standardization of the Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS)

RESUMO

Os principais objetivos deste estudo foram realizar a análise fatorial confirmatória da Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS) e conduzir análises de curvas ROC para a normatização de seus pontos de corte, em uma amostra não-clínica. Os resultados exibiram evidências de validade estrutural da HADS e foram propostas mudanças para os parâmetros diagnósticos da ansiedade (≥7 pontos) e depressão (≥6 pontos). Ao final, destaca-se a necessidade de cautela na interpretação dos escores e decisão diagnóstica, principalmente na mensuração da depressão.

Palavras-chave:
análise fatorial confirmatória; curva ROC; HADS; ansiedade; depressão

ABSTRACT

The main objectives of this study were to perform a confirmatory factor analysis of the Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS) and to conduct ROC curves for standardization of cut-off points, in a nonclinical sample. The results showed evidences of the structural validity of HADS and changes were proposed to the diagnostic parameters of anxiety (≥7 points) and depression (≥6 points). Finally, we highlight that caution is needed for the interpretation of the scores and diagnostic decision, especially for the depression measure.

Keywords:
confirmatory factor analysis; ROC curve; HADS; anxiety; depression

No Brasil, os transtornos de ansiedade atingem de 12% a 20% da população e os transtornos depressivos variam entre 11% e 18%. Combinados, a prevalência chega a 24% na população em geral (Andrade et al., 2012Andrade, L. H., Andreoni, L., Silveira, C. M., Silva, A.C., Nishimura, R., James, A. C.,... Viana, M. C. (2012). Mental disorders in megacities: Findings from the São Paulo Megacity Mental Health Survey, Brazil. PLoS ONE, 7(2), e31879.). A ansiedade e a depressão figuram entre as principais causas de incapacidade no mundo, estando associadas a elevados riscos de morte prematura, doenças cardíacas, diversos tipos de câncer e mortalidade por causas externas, sendo uma relevante questão de saúde pública (Andrade et al., 2013Andrade, L. H., Baptista, M. C., Alonso, J., Petukhova, M., Bruffaerts, R., Kessler, R. C., ... Viana, M. C. (2013). Days out-of-role due to common physical and mental health problems: Results from the Sao Paulo Megacity Mental Health Survey, Brazil. Clinics, 68, 1392-1399.; Russ et al., 2012Russ, T. C., Stamakis, E., Hamer, M., Starr, J. M., Kivimãki, M., & Batty, G. D. (2012). Association between psychological distress and mortality: Individual participant pooled analysis of 10 prospective cohort studies. British Medical Journal, 345, e4933.).

A Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS) foi desenvolvida por Zigmond e Snaith (1983)Zigmond, A. S., & Snaith, R. P. (1983). The Hospital Anxiety and Depression Scale. Acta Psychiatrica Scandinavica, 67, 361-370. com o objetivo de identificar casos (possíveis ou prováveis) de transtornos de ansiedade e/ou depressão leves em populações não-clínicas. Embora os autores não tenham deixado claros os conceitos clínicos que orientaram a construção do instrumento, Bjelland, Dahl, Haug e Neckelmann (2002)Bjelland, I., Dahl, A. A., Haug, T. T., & Neckelmann, D. (2002). The validity of the Hospital Anxiety and Depression Scale: An update literature review. Journal of Psychosomatic Research, 52, 69-77. , em uma revisão da validade da HADS, encontraram que a escala se mostrou compatível tanto aos critérios diagnósticos do DSM-III, como do DSM-IV.

Desde sua adaptação para o Brasil (Botega, Bio, Zomignani, Garcia Júnior, & Pereira, 1995Botega, N. J., Bio, M. R., Zomignani, M. A., Garcia Júnior, C., & Pereira, W. A. (1995). Transtornos do humor em enfermaria de clínica média e validação de escala de medida (HAD) de ansiedade e depressão. Revista de Saúde Pública, 29, 355-363. ), não há, até então, análise confirmatória da estrutura da HADS neste país, o que já é encontrado em outros países (López et al., 2012López, P. M., Ferrandis, E. D., Vailo, Y. A., Garrido, M. J. G., Murgui, M. J., Pérez, S. M., & Guerra, E. I. (2012). Structural validity and distress screening potential of the Hospital Anxiety and Depression Scale in cancer. International Journal of Clinical and Health Psychology, 12, 435-447.; Martin, Thompson, & Barth, 2008Martin, C. R., Thompson, D. R., & Barth, J. (2008). Factor structure of the Hospital Anxiety and Depression Scale in coronary heart disease patients in three countries. Journal of Evaluation in Clinical Practice, 14, 281-287.; Roberge et al., 2013Roberge, P., Doré, I., Menear, M., Chartrand, E., Ciampi, A., Duhoux, A., & Fournier, L. (2013). A psychometric evaluation of the French Canadian version of the Hospital Anxiety and Depression Scale in a large primary care population. Journal of Affective Disorders, 147, 171-179.). Por se tratar de uma escala bastante utilizada em nível mundial (Bjelland et al., 2002Bjelland, I., Dahl, A. A., Haug, T. T., & Neckelmann, D. (2002). The validity of the Hospital Anxiety and Depression Scale: An update literature review. Journal of Psychosomatic Research, 52, 69-77. ; López et al., 2012López, P. M., Ferrandis, E. D., Vailo, Y. A., Garrido, M. J. G., Murgui, M. J., Pérez, S. M., & Guerra, E. I. (2012). Structural validity and distress screening potential of the Hospital Anxiety and Depression Scale in cancer. International Journal of Clinical and Health Psychology, 12, 435-447.; Roberge et al., 2013Roberge, P., Doré, I., Menear, M., Chartrand, E., Ciampi, A., Duhoux, A., & Fournier, L. (2013). A psychometric evaluation of the French Canadian version of the Hospital Anxiety and Depression Scale in a large primary care population. Journal of Affective Disorders, 147, 171-179.) e que agrega características desejáveis para a condução de surveys no âmbito da saúde mental (por exemplo, pela parcimônia na quantidade de itens), julgou-se relevante a busca por evidências da estrutura latente e, também, a análise preditiva dos pontos de corte a partir de uma amostragem não-clínica.

Dado o exposto, os objetivos deste estudo foram: 1) Realizar a análise fatorial confirmatória da HADS; 2) Estabelecer a normatização dos pontos de corte diagnósticos da HADS; 3) Analisar sua validade concorrente com os inventários Beck de ansiedade (BAI) e depressão (BDI); e 4) Identificar a prevalência dos transtornos de ansiedade e de depressão leves em uma amostra não-clínica e representativa da população aracajuana.

Método

Participantes

A amostra final contou com 690 indivíduos, com maioria do sexo feminino (55,9%; n=386), idade média de 34,7 anos [Desvio-Padrão (DP)=12,55; mínimo = 18 e máximo = 65] e mediana de renda familiar em R$ 2.640,80. Em geral, os participantes mantinham relacionamento conjugal (52,2%; n=360), não possuíam doença crônica ou tomavam remédio controlado (85,5%; n=590). A maior parte trabalhava (67,1%; n=463) e, quanto à escolaridade, prevaleceu o ensino médio (42,3%; n=292), seguido do superior (33,8%; n=233), fundamental (12,0%; n=83) e não-alfabetizados (11,9%; n=82). Ressalta-se que este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Sergipe (CAAE - 0165.0.107.000-11).

Utilizou-se a técnica de amostragem por conglomerado, de acordo com a estratificação de cinco setores censitários em Aracaju (SE) (Norte, Sul, Centro, Leste e Oeste) e classificação dos bairros de cada setor por status socioeconômico predominante, cotejado a partir da renda média familiar, a saber: baixo (< R$ 1.164,00), médio (> R$ 1.164,00 e ≤ R$ 4.076,00) e alto (> R$ 4.076,00). Em cada setor foram sorteados três bairros (um por status), com coleta de dados proporcional (cerca de 45 moradores permanentes, um por residência). Controlou-se, também, a proporcionalidade por sexo e turno de coleta (manhã, tarde e noite).

Instrumentos

A HADS é composta por 14 itens divididos em duas subescalas: HADS-Ansiedade (HADS-A), com sete questões para o diagnóstico do Transtorno de Ansiedade Leve (TAL) (itens ímpares) e HADS-Depressão (HADS-D), com outras sete para o Transtorno Depressivo Leve (TDL) (itens pares). A escala de resposta varia entre zero e três pontos (de ausente a muito frequente) com escore máximo de 21 pontos por subescala. Os pontos de corte obtidos na literatura foram de ≥9 pontos para cada transtorno, propostos a partir de critérios teóricos e empíricos derivados de amostras clínicas (ver Botega et al., 1995Botega, N. J., Bio, M. R., Zomignani, M. A., Garcia Júnior, C., & Pereira, W. A. (1995). Transtornos do humor em enfermaria de clínica média e validação de escala de medida (HAD) de ansiedade e depressão. Revista de Saúde Pública, 29, 355-363. ; Zigmond & Snaith, 1983Zigmond, A. S., & Snaith, R. P. (1983). The Hospital Anxiety and Depression Scale. Acta Psychiatrica Scandinavica, 67, 361-370.).

Para as análises de validade concorrente e preditiva, utilizaram-se os inventários de Beck para ansiedade (BAI) e depressão (BDI), compostos, cada um, por 21 itens que visam à medida de sintomas comuns nesses transtornos. Os pontos de corte para diagnóstico positivo foram: ≥10 pontos no BAI e ≥11 no BDI (Cunha, 2001Cunha, J. A. (2001). Manual da versão em português das Escalas Beck. São Paulo, SP: Casa do Psicólogo.), correspondendo, pelo menos, ao grau leve. Neste estudo, os valores de alfa de Cronbach para o BAI e o BDI foram 0,900 e 0,894.

Análises dos Dados

Nas Análises Fatoriais Confirmatórias (AFC), o método de estimação utilizado foi o da Máxima Verossimilhança [Maximum Likelihood (ML)]. Para a avaliação do ajuste dos modelos foram selecionados quatro índices: 1) Razão do Qui-Quadrado (desejável ≤ 5,00), 2) GFI (desejável > 0,900), 3) CFI (desejável > 0,900) e 4) RMSEA[desejável ≤ 0,080; I.C. (≥ 0,000 - ≤ 0,080)] (Garson, 2012Garson, D. G. (2012). Structural equation modeling. Asheboro, NC: Statistical Association Publishing.). Para a comparação de modelos, utilizaram-se dois índices: o Critério de Informação de Akaike (AIC) e o Critério de Informação de Bayes (BIC). A análise da confiabilidade foi calculada com o alfa de Cronbach [(α) aceitável ≥ 0,600]. O cálculo da validade preditiva e estabelecimento de pontos de corte foram realizados com Curvas ROC e a análise de convergência com correlações de Pearson (r) (p < 0,05).

Resultados

Análise Fatorial Confirmatória

A AFC mostrou que todos os índices de ajuste foram satisfatórios, tanto na escala HADS completa (fatores HADS-A e HADS-D correlacionados), como por subescala. Na HADS completa, a razão do χ² ficou em 3,35 (χ² = 254,591; g.l. = 76; p< 0,001), com GFI e CFI satisfatórios (0,947 e 0,900, respectivamente) e RMSEA na margem desejada (0,058; I.C.= 0,051 - 0,066). Com a correlação entre fatores alta (r = 0,761), avaliou-se a presença de um fator de segunda ordem para a HADS. Os resultados foram: razão em 3,31 (χ² = 255,112; g.l. = 77; p < 0,001), GFI de 0,947, CFI de 0,900, com RMSEAem 0,058 (I.C. 0,050 - 0,066), sendo, basicamente, os mesmos valores do modelo com dois fatores correlacionados. No caso da HADS-A, a razão foi de 2,27 (χ² = 31,744; g.l. = 14; p = 0,004), com GFIde 0,986, CFI de 0,976 e RMSEA satisfatórios (0,043; I.C. = 0,023 - 0,063). Para a HADS-D, os índices obtidos foram: razão do χ²em 1,88 (χ² = 26,394; g.l. = 14; p = 0,023); GFI igual a 0,989 e CFI em 0,981, além do RMSEA dentro do esperado (0,036; I.C. = 0,013 - 0,057).

Os valores de AIC e BIC dos modelos - dois fatores e fator de segunda ordem - para a HADS-A foram, respectivamente, iguais a: 312,591 e 444,155; 311,112 e 438,139. Na HADS-D, na mesma sequência, foram iguais a: 59,744 e 123,258; 54,394 e 117,908. Na Tabela 1 constam os pesos de regressão padronizados (cargas fatoriais) obtidos na análise.

Tabela 1
Pesos de Regressão Padronizados (Cargas Fatoriais) e Confiabilidade da Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS)

Normatização e Validade Convergente

Com as Curvas ROC (Tabela 2), viu-se que o ponto de corte proposto na literatura (≥ 9) revelou para a HADS-A sensibilidade mediana (54,1%) e especificidade elevada [valor de 1-especificidade (falsos positivos) = 11,0%], e para a HADS-D baixa sensibilidade (21,7%) e alta especificidade (6,4%). Seguindo critérios estatísticos, os pontos de corte ótimos indicados pelo programa foram de ≥7 pontos para a HADS-A (sensibilidade = 74,4%; especificidade = 23,0%) e de ≥5 pontos para a HADS-D (sensibilidade = 68,8%; especificidade = 27,1%). Os valores das Áreas Abaixo da Curva (Area Under the Curve; AUC) ficaram acima de 75%, o que indica capacidade discriminativa satisfatória, ainda que limítrofe na HADS-D.

Tabela 2
Sensibilidade e Especificidade da HADS-A e HADS-D em relação às Escalas BAI e BDI

Observou-se, então, que os valores propostos pelo programa apontaram para maior sensibilidade em ambas as escalas, o que se entende como desejável para instrumentos de rastreamento. No entanto, a mesma análise incrementou a quantidade de falsos positivos, em especial na HADS-D, que se aproximou de 30%. Assim, como nova proposta de corte, crê-se que para a HADS-A ≥7 pontos parece ser uma decisão aceitável, visto a proporção de falsos positivos em torno de 20%. No caso da HADS-D, seguindo-se da Tabela 2, acredita-se que um valor intermediário (≥6) entre o resultado da análise (≥5) e o corte encontrado na literatura (≥9) permite maior acurácia diagnóstica (redução para cerca de 20% de falsos positivos), ainda que a congruência (sensibilidade) fique apenas mediana (55,4%). Com essa explicação, a assunção de tais pontos de corte balizou as análises apresentadas a seguir.

Na análise da validade convergente, considerando-se a pontuação bruta das escalas, todas as correlações foram estatisticamente significativas (p < 0,001), com os seguintes valores de r: BAI x HADS-A = 0,607 e BDI x HADS-D = 0,515.

Distribuição Populacional

Na HADS-A, a média de pontuação foi de 6,6 (D.P. = 3,66) e, com ≥7 pontos como corte, o diagnóstico positivo ocorreu em 44,5% dos casos (n = 307). Com a HADS-A, os indivíduos "com" TAL pontuaram, em média, 9,9 (D.P. 2,60) e os "sem" TAL 3,8 (D.P. = 1,59). Na HADS-D a pontuação média ficou em 5,3 (D.P. = 3,31) e, com o corte em ≥6 pontos, o diagnóstico para TDL ficou em 41,6% (n = 287). Entre os que exibiram TDL, a média foi de 8,4 pontos (D.P. = 2,41), e os "sem" TDL 3,0 (D.P. = 1,53). Os diagnósticos combinados de TAL e TDL foram 29,0% (n = 200) e de algum transtorno, 28,1% (n = 194).

No BAI, a média de pontos foi de 8,0 (D.P. = 8,52), com diagnóstico positivo em 24,9% (n = 172) e médias para "com" e "sem" diagnóstico de transtorno de ansiedade em 20,0 (D.P. = 8,64) e 4,1 (D.P. = 2,99), respectivamente. No BDI, a média de pontos foi de 8,2 (D.P. = 8,23), com diagnóstico positivo em 34,8% (n = 240) e médias para "com" e "sem" transtorno depressivo em 16,8 (D.P. = 7,89) e 3,54 (D.P. = 3,01), respectivamente.

Discussão

Este estudo reuniu evidências da validade estrutural da escala HADS em uma amostra brasileira não-clínica, no modelo de dois fatores correlacionados e com um fator de segunda ordem, bem como nas subescalas (HADS-A e HADS-D), corroborando achados compatíveis com pesquisas em outros países (Bjelland et al., 2002Bjelland, I., Dahl, A. A., Haug, T. T., & Neckelmann, D. (2002). The validity of the Hospital Anxiety and Depression Scale: An update literature review. Journal of Psychosomatic Research, 52, 69-77. ; Roberge et al., 2013Roberge, P., Doré, I., Menear, M., Chartrand, E., Ciampi, A., Duhoux, A., & Fournier, L. (2013). A psychometric evaluation of the French Canadian version of the Hospital Anxiety and Depression Scale in a large primary care population. Journal of Affective Disorders, 147, 171-179.).

Quanto à estrutura fatorial, autores têm sugerido a existência de um fator de segunda ordem que se ajustaria mais adequadamente que a separação das escalas HADS-A e HADS-D (Cosco, Doyle, Ward, & McGee, 2012Cosco, T. D., Doyle, F., Ward, M., & McGee, H. (2012). Latent structure of the Hospital Anxiety and Depression Scale: A 10-year systematic review. Journal of Psychosomatic Research, 72, 180-184. ; Norton, Cosco, Doyle, Done, & Sacker, 2013Norton, S., Cosco, T., Doyle, F., Done, J., & Sacker, A. (2013). The Hospital Anxiety and Depression Scale: A meta-confirmatory factor analysis. Journal of Psychosomatic Research, 74, 74-81.). Nesta pesquisa, o ajuste do fator de segunda ordem foi basicamente igual ao modelo correlato, com mínima diferença nos índices AIC e BIC, apontando para a ratificação de ambas as soluções. López et al. (2012)López, P. M., Ferrandis, E. D., Vailo, Y. A., Garrido, M. J. G., Murgui, M. J., Pérez, S. M., & Guerra, E. I. (2012). Structural validity and distress screening potential of the Hospital Anxiety and Depression Scale in cancer. International Journal of Clinical and Health Psychology, 12, 435-447. também encontraram um fator de segunda ordem e o denominaram como "distresse psicológico" (também aqui adotado), com ponto de corte em 16 pontos para detecção do distresse, o qual refletiria o nível de má adaptação do indivíduo a adversidades.

Tal como visto na literatura (Bjelland et al., 2002Bjelland, I., Dahl, A. A., Haug, T. T., & Neckelmann, D. (2002). The validity of the Hospital Anxiety and Depression Scale: An update literature review. Journal of Psychosomatic Research, 52, 69-77. ; López et al., 2012López, P. M., Ferrandis, E. D., Vailo, Y. A., Garrido, M. J. G., Murgui, M. J., Pérez, S. M., & Guerra, E. I. (2012). Structural validity and distress screening potential of the Hospital Anxiety and Depression Scale in cancer. International Journal of Clinical and Health Psychology, 12, 435-447.) e aqui corroborado, entende-se que a estrutura fatorial da HADS acumula achados que indicam a possibilidade da obtenção de um escore único para a avaliação de um estado geral de adaptação, além dos próprios diagnósticos de TAL e TDL, sem que os modelos anulem-se. Por outro lado, crê-se que são necessários mais estudos que averiguem a consistência teórica e validade concorrente desse fator de segunda ordem com escalas próprias para medida do distresse psicológico, pois os dados permanecem inconclusivos.

A prevalência de algum transtorno de humor na amostra total ficou em 28,1%, pouco abaixo do encontrado na Alemanha (33,1%), em uma amostra similar a deste estudo (Hinz & Brähler, 2011Hinz, A., & Brähler, E. (2011). Normative values for the Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS) in the general German population. Journal of Psychosomatic Research, 71, 74-78.). Na presente pesquisa, 29,0% dos indivíduos tiveram ambos os diagnósticos (TAL e TDL). Na HADS-A, 44,5% tiveram diagnóstico positivo, e na HADS-D, 41,6%. No trabalho de Hinz e Brähler (2011), o TAL foi de 23,2% e o TDL de 23,5%. Junto a pacientes infartados, Martin et al. (2008)Martin, C. R., Thompson, D. R., & Barth, J. (2008). Factor structure of the Hospital Anxiety and Depression Scale in coronary heart disease patients in three countries. Journal of Evaluation in Clinical Practice, 14, 281-287.detectaram: ansiedade em 30,0% na Inglaterra, 38,0% em Hong Kong e 35,0% na Alemanha; depressão em 15,0% na Inglaterra, 50,0% em Hong Kong e 28,0% na Alemanha.

Embora não se tenha uma razão específica a respeito das diferenças entre índices, supõe-se, pelo menos, um possível motivo: a composição amostral, já que neste estudo e no de Hinz e Brähler (2011)Hinz, A., & Brähler, E. (2011). Normative values for the Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS) in the general German population. Journal of Psychosomatic Research, 71, 74-78. a amostragem foi da população em geral, e na pesquisa de Martin et al. (2008)Martin, C. R., Thompson, D. R., & Barth, J. (2008). Factor structure of the Hospital Anxiety and Depression Scale in coronary heart disease patients in three countries. Journal of Evaluation in Clinical Practice, 14, 281-287. foram selecionadas pessoas que sofreram infarto. Portanto, o critério amostral pode ajudar a entender essas discrepâncias, porém, vale ressaltar que não o faz de modo pleno, visto que, particularmente na HADS-D, houve uma diferença de 18,1% frente aos resultados de Hinz e Brähler na Alemanha e de 8,4% de Martin et al. em Hong-Kong. Com efeito, pode ser que outras variáveis não cotejadas nessas pesquisas tenham impacto na produção dessas discrepâncias. Dessa maneira, espera-se que futuras investigações em outros países, e mesmo no Brasil, possam contribuir com a explicação dos motivos da alta disparidade entre índices.

A análise da validade convergente sugere a aplicabilidade da HADS para a detecção de transtornos de ansiedade e depressão leves. No entanto, as Curvas ROC apontam para a necessidade de cautela na interpretação de escores e diagnósticos, principalmente da HADS-D, que se mostrou mais problemática. Sobre isso, ressalva-se que ainda que não exista um critério único para a decisão pelo ponto de corte (Burgueño, Garcia-Bastos, & González-Buitrago, 1995Burgueño, M. J., Garcia-Bastos, J. L., & González-Buitrago, J. M. (1995). Las curvas ROC en la evaluación de las pruebas diagnósticas. Medicina Clínica (Barcelona), 104, 661-670. ), a opção por um critério estatístico não satisfaz inteiramente a adequação da escolha, pois neste trabalho não se privilegiaram critérios clínicos e teóricos para sua determinação. Eis uma limitação desta pesquisa e que, portanto, demanda mais estudos.

Recomenda-se que novas investigações avancem no escrutínio da validade de critério da HADS, explorando possibilidades de normatização e mesmo de caracterização dos diagnósticos, pois as elevadas prevalências então obtidas para TAL e TDL incitam a pensar que podem se tratar, pelo menos em parte, de quadros subclínicos diagnosticados como o grau leve dos transtornos. Para tanto, embora seja relativamente esperado que instrumentos de rastreamento privilegiem a sensibilidade, em detrimento à especificidade, o controle de falsos positivos é crucial. Isso tende a minimizar problemas como a prática do "superdiagnóstico", possivelmente tão deletério quanto a subnotificação.

Enfim, sugere-se que futuros estudos utilizem outro instrumento diagnóstico como padrão-ouro (referência para TAL e TDL), visto que com o BDI a AUC foi limítrofe (76%) e a sensibilidade mediana, e mesmo na HADS-A, que teve uma AUC mais alta em relação ao BAI, a quantidade de falsos positivos foi elevada. Espera-se, portanto, que os valores de sensibilidade e especificidade ora detectados contribuam com essa continuidade, uma vez que possibilitam questionar, comparar e averiguar as decisões pelos pontos de corte diagnósticos.

Referências

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  • Apoio: Fundação de Apoio à Pesquisa e à Inovação Tecnológica do Estado de Sergipe (FAPITEC-SE).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2015

Histórico

  • Recebido
    07 Ago 2013
  • Revisado
    10 Mar 2014
  • Aceito
    02 Dez 2014
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