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Singularidade e falibilismo: um diálogo inicial entre Milton Erickson e Charles Peirce

Singularity and fallibilism: Milton Erickson and Charles Peirce in dialogue

Singularité et faillibilisme : Milton Erickson et Charles Peirce en dialogue

Singularidad y falibilismo: un diálogo entre Milton Erickson y Charles Peirce

Resumo

Este trabalho busca desenvolver uma aproximação entre o pensamento de Milton Erickson (1901-1980) e Charles Peirce (1839-1914), focalizando as noções de singularidade e falibilismo, com o objetivo de demonstrar as semelhanças existentes, o papel que desempenham em suas obras, como se relacionam e as implicações teóricas que geram para a hipnose. Descreve-se brevemente como o contexto histórico de cada um influenciou suas concepções iniciais. Em seguida, discute-se o modo como o falibilismo presente na concepção de semiose considera a singularidade dos fenômenos existentes e viabiliza o sinequismo, bem como os processos de evolução constante por meio de mudança de hábitos. Este estudo desenvolve a observação de Erickson sobre o sujeito enquanto signo representante de experiências de vida e relaciona as implicações teóricas do conceito de mente como semiose em torno do processo constitutivo de fenômenos acessíveis em experiência de transe.

Palavras-chave:
hipnose; Milton Erickson; transe; semiótica; Charles Peirce

Abstract

This paper attempts a theoretical rapprochement between Milton Erickson’s (1901-1980) and Charles Peirce’s (1839-1914) thought, focusing on the concepts of singularity and fallibilism to point out their similarities, the role they play on their works, how they relate to each other, and their theoretical implications regarding hypnosis. First, the text briefly describes both authors’ historical background and its influence over their early conceptions. Then, it discusses how fallibilism, present in the concept of semiosis, considers the singularity of existing phenomena and enables synechism, as well as the processes of constant evolution through change of habits. This study develops Erickson’s observation about the subject as a representative sign of life experiences and relates, initially, the theoretical implications of mind-as-semiosis concerning the constitutive process of phenomena accessible in trance experience.

Keywords:
hypnosis; Milton Erickson; trance; semiotics; Charles Peirce

Résumé

Cet article tente un rapprochement entre la pensée de Milton Erickson (1901-1980) et celle de Charles Peirce (1839-1914), en se concentrant sur les concepts de singularité et de faillibilisme afin de mettre en évidence leurs similitudes, le rôle qu’ils jouent dans leurs œuvres, la façon dont ils se rapportent l’un à l’autre, et leurs implications théoriques concernant l’hypnose. Tout d’abord, le texte décrit brièvement le contexte historique des deux auteurs et son influence sur leurs premières conceptions. Ensuite, il aborde la manière dont le faillibilisme, présent dans le concept de sémiose, considère la singularité des phénomènes existants et permet le sinéquisme, ainsi que les processus d’évolution constante par le changement d’habitudes. Cette étude développe l’observation d’Erickson sur le sujet comme signe représentatif des expériences de vie et relate, dans un premier temps, les implications théoriques de l’esprit comme sémiose concernant le processus constitutif des phénomènes accessibles dans l’expérience de transe.

Mots-clés :
hypnose; Milton Erickson; transe; sémiotique; Charles Peirce

Resumen

Este trabajo busca desarrollar una aproximación entre el pensamiento de Milton Erickson (1901-1980) y el de Charles Peirce (1839-1914) enfocándose en las nociones de singularidad y falibilismo para demostrar las similitudes existentes, el papel que juegan en sus trabajos, cómo se relacionan y las implicaciones teóricas que generan para la hipnosis. El artículo describe brevemente el contexto histórico de ambos autores y cómo esto influyó en sus concepciones iniciales. A seguir, se discute cómo el falibilismo presente en la concepción de la semiosis considera la singularidad de los fenómenos existentes y viabiliza el sinequismo, así como los procesos de evolución constante a través del cambio de hábitos. Este estudio desarrolla la observación de Erickson sobre el sujeto como signo representativo de las experiencias vitales y relaciona, inicialmente, las implicaciones teóricas del concepto de mente como semiosis en torno al proceso constitutivo de los fenómenos accesibles en la experiencia de trance.

Palabras clave:
hipnosis; Milton Erickson; trance; semiótica; Charles Peirce

Apesar da retomada de interesse em pesquisas sobre hipnose como proposta terapêutica nas últimas duas décadas, os trabalhos realizados atêm-se à mensuração de eficácia da técnica (Ardigo et al., 2016Ardigo, S., Herrmann, F., Moret, V., Déramé, L., Giannelli, S., Gold, G., & Pautex, S. (2016). Hypnosis can reduce pain in hospitalized older patients: A randomized controlled study. BMC Geriatrics, 16(14), 1-8. doi: 10.1186/s12877-016-0180-y
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), cuja aplicação é compreendida sob uma lógica alopática (McKernan, Nash, & Patterson, 2018McKernan, L. C., Nash, M. R., & Patterson, D. R. (2018). Clinical hypnosis in the treatment of chronic and acute pain. In D. C. Turk & R. J. Gatchel (Eds.), Psychological approaches to pain management: A practitioner’s handbook (pp. 160-176). New York, NY: Guilford Press.; Saltis, Tan, & Cyna, 2017Saltis, J., Tan, S., & Cyna, A. (2017). Hypnosis for pain relief. In R. Young, M. Nguyen, E. Nelson & R. D. Urman (Eds.), Pain medicine: An essential review. New York, NY: Springer .). No entanto, discussões teóricas sobre a emergência da experiência de transe, a articulação de processos de dimensões subjetivas e somáticas no seu desenvolvimento e a constituição subjetiva implicada geralmente não são priorizadas por pesquisadores. Concomitantemente, nenhum modelo explicativo neurológico tem se demonstrado capaz de esclarecer como a comunicação hipnótica age de forma a promover reconfigurações duradouras - envolvendo dimensões somáticas e subjetivas do sujeito -, a fim de consolidá-la enquanto proposta terapêutica (Halsband & Wolf, 2019Halsband, U., & Wolf, T. G. (2019). Functional changes in brain activity after hypnosis: Neurobiological mechanisms and application to patients with a specific phobia - limitations and future directions. International Journal of Clinical and Experimental Hypnosis, 67(4), 449-474, doi: 10.1080/00207144.2019.1650551
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).

O psiquiatra americano Milton H. Erickson (1901-1980) foi o maior responsável pela retomada do uso da hipnose em psicoterapia no século XX (Neubern, 2009Neubern, M. S. (2009) Psicologia, hipnose e subjetividade: Revisitando a história. Belo Horizonte, BH: Diamante.). De forma enigmática, utilizava metáforas, contos de histórias e prescrições de tarefas para a promoção de mudanças terapêuticas no sujeito, as quais ampliaram substancialmente os questionamentos em relação aos processos de mudança humana (Erickson, 1980Erickson, M. H. (1980). The collected papers of Milton H. Erickson (Vol. 1-4, E. L. Rossi, Ed.). New York, NY: Irvington .; Haley, 1973/1991Haley, J. (1991). Terapia não-convencional: As técnicas psiquiátricas de Milton H. Erickson (N. Telles, Trad.). São Paulo, SP: Summus. (Trabalho original publicado em 1973)). Erickson desenvolveu uma prática clínica pautada na singularidade do sujeito, na qual o consciente não é o centro das intervenções nem o mediador mandatório das comunicações para a ocorrência das mudanças terapêuticas. O psiquiatra não se afiliou a nenhuma abordagem psicológica, assim como não se posicionou nas discussões históricas de estado e sugestão1 1 O debate sobre estado e sugestão na história da hipnose reflete contribuições feitas ao campo desde o século XIX, pela escola de Paris, liderada por Charcot, e pela escola de Nancy, liderada por Liébault e Bernheim (Neubern, 2009). A escola de Paris explicava a hipnose como um estado especial por razões fisiológicas, enquanto a escola de Nancy a compreendia como resultante de processos sociais de expectativas, complacência e autoridade. (Neubern, 2009Neubern, M. S. (2009) Psicologia, hipnose e subjetividade: Revisitando a história. Belo Horizonte, BH: Diamante.). Seu posicionamento ateórico lhe permitia pensar articulações entre interno/externo, determinismo/autonomia e mudança/permanência no domínio subjetivo sem rigidez dogmática. Erickson trabalhava o transe como estado e, ao mesmo tempo, como sugestão, devido ao seu caráter subjetivo, elusivo e fluido. Dessa forma, ele, por vezes, se refere à hipnose essencialmente como comunicação de ideias (Erickson, 1980Erickson, M. H. (1980). The collected papers of Milton H. Erickson (Vol. 1-4, E. L. Rossi, Ed.). New York, NY: Irvington ., p. 237) que, em terapia, constrói um contexto de mudança e de exploração de recursos próprios do sujeito.

No entanto, Erickson não publicou teorias elaboradas sobre sua forma de pensar o processo terapêutico. Sua noção de inconsciente enquanto um outro saber dotado de recursos capazes de serem acessados em estado de transe (Bioy, 2018Bioy, A. (2018). Cachez cet inconscient que je ne saurais voir ! Transes, (5), 35-39.) faz oposição ao inconsciente freudiano, mas não chega a ser apresentado explicitamente em um sistema teórico. Neubern (2017b)Neubern, M. S. (2017b). Contribuições epistemológicas da hipnose de Milton Erickson para a psicologia moderna. In D. M. Amparo, E. R. Lazzarini, I. M. Silva & L. Polejack (Orgs.), Psicologia clínica e cultura contemporânea (Vol. 3, pp. 684-709). Brasília, DF: Technopolitik. expõe a possibilidade de a lacuna teórica de Erickson ter sido proposital para que sua forma de clinicar perseverasse diante das posturas institucionais dogmáticas das comunidades científica e de regulação de práticas psicoterápicas daquela época. Por isso, seus artigos que descreviam o emprego de suas técnicas e estudos de caso investigando fenômenos hipnóticos (Erickson, 1980Erickson, M. H. (1980). The collected papers of Milton H. Erickson (Vol. 1-4, E. L. Rossi, Ed.). New York, NY: Irvington .) suscitaram questionamentos sobre sua forma de comunicação terapêutica e as capacidades da hipnoterapia. Isso fez que os pesquisadores preterissem as concepções ericksonianas sobre a constituição do ser humano. Desse modo, ao pesquisar a hipnose ericksoniana em busca de tais concepções, cabe contemplar a obra de Erickson como um todo, dando atenção minuciosa a suas práticas, enquanto se tecem teorias próprias que lhe sejam pertinentes.

No que tange à pesquisa, algumas complicações surgem tanto em relação às características do fenômeno hipnótico em si quanto à ausência de uma teoria demarcando o processo de construção das intervenções psicoterápicas de Erickson. Primeiramente, a natureza da experiência de transe permite alteração espontânea ou voluntária de alguns processos envolvidos na assimilação e manutenção de memórias, de modo que fenômenos hipnóticos como memórias falsas (Erickson & Rossi, 1994Erickson, M. H., & Rossi, E. L. (1994). O homem de fevereiro. Campinas, SP: Psy II.) e amnésia seletiva podem se estabelecer de maneira temporária ou duradoura (Erickson, 1966Erickson, M. H. (1966). The interspersal hypnotic technique for symptom correction and pain control. The American Journal of Clinical Hypnosis, 8(3), 198-209. doi: 10.1080/00029157.1966.10402492
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; Erickson & Weitzenhoffer, 1960/1980Erickson, M. H., & Weitzenhoffer, A. (1980). The problem of amnesia in waking and hypnotic states. In E. L. Rossi (Ed.), The collected papers of Milton H. Erickson (Vol. 3, pp. 58-70). New York, NY: Irvington . (Trabalho original publicado em 1960)). Em alguns casos, elas comprometem a fidedignidade do relato do sujeito sobre a própria experiência de transe. Depois, ao considerar as variadas e criativas formas que as intervenções de Erickson adquiriam, alguns terapeutas as justificam como um fazer espontâneo e intuitivo advindo de um potencial criativo sobre-humano, considerando-as inapreensíveis e rejeitando a possibilidade de que fossem embasadas em um elaborado pensamento adquirido em experiência de vida (O’Hanlon, 1994O’Hanlon, W. H. (1994). Raízes profundas: Fundamentos da terapia e da hipnose de Milton Erickson. Campinas, SP: Psy II .).

Pesquisas recentes sobre hipnose e subjetividade têm se respaldado na semiótica de Charles Peirce como alternativa para compreensão dos processos comunicativos em hipnose (Neubern, 2016Neubern, M. S. (2016). Iconicidade e complexidade na comunicação hipnótica. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 32(n. esp.), 1-9. doi: 10.15900102-3772e32ne217
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, 2017cNeubern, M. S. (2017c). Iconicidade como possibilidade de pesquisa qualitativa em hipnose. Psicologia em Estudo, 22(4), 505-515. doi: 10.4025/psicolestud.v22i4.37020
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) e como possibilidade de explicação para as intervenções de Erickson (Neubern & Nogueira, 2019Neubern, M. S., & Nogueira, H. G. (2019). Iconicidade como alternativa de explicação para a hipnose de Milton Erickson. Revista da Abordagem Gestáltica, 25(1), 62-72. doi: 10.18065/RAG.2019v25.5
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). Para tais fins, a experiência de transe é conceituada como um conjunto de processos nos quais as referências eu-mundo são alteradas (Neubern, 2016Neubern, M. S. (2016). Iconicidade e complexidade na comunicação hipnótica. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 32(n. esp.), 1-9. doi: 10.15900102-3772e32ne217
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, 2017aNeubern, M. S. (2017a). Contribuições da hipnose para a pesquisa qualitativa. Psico-USF, 22(2), 361-370. doi: 10.1590/1413-82712017220214
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). Já a compreensão dos signos em seus níveis lógicos de significação de Peirce facilita a formulação de possibilidades explicativas sobre como as comunicações hipnóticas co-constroem e favorecem a emergência da experiência de transe. Essa perspectiva de co-construção é relevante por abranger a hipnogênese dos processos psicoterápicos, ou seja, o modo como estes produzem nos interlocutores aquilo que anunciam (Neubern, 2018Neubern, M. S. (2018). Hipnose, semiótica e complexidade: Problemas de pesquisa clínica. In M. Neubern (Org.), Clínicas do transe. Etnopsicologia, hipnose e espiritualidade no Brasil (pp. 127-159). Curitiba, PR: Juruá.), transcendendo a discussão entre sugestão e estado2 2 Isso se dá porque (1) Erickson tinha uma concepção de self transitório, atravessado pela dimensão social, na qual a natureza das forças influentes (real/imaginário) não difere em seu resultado, semelhante à concepção de Peirce (Colapietro, 2014); e (2) a comunicação hipnótica, sob a perspectiva semiótica, passa por um processo interpretativo que não se reduz em perspectivas de fabricação ou revelação da realidade (Neubern 2017a, 2017b, 2018; Nogueira, 2019). . Considerar os processos subjetivos enquanto configurações semióticas permite articular a forma como as comunicações hipnóticas interagem com tais processos. Partindo do que a relação terapêutica comunica em si, a semiótica possibilita conceber as potenciais razões que levaram Erickson a se comunicar de determinada maneira em demandas clínicas específicas.

As obras de ambos os autores demonstram pertinência na forma de construção de seus conhecimentos e, apesar de não desenvolverem diretamente uma concepção de subjetividade, as concepções implícitas se complementam em pontos específicos. Logo, o objetivo deste trabalho é demonstrar as semelhanças existentes entre o pensamento presente nas obras de Milton Erickson e de Charles Peirce, especificamente, o papel que a singularidade e o falibilismo desempenham em suas ideias, como se relacionam e as implicações teóricas que geram para a hipnose. É necessário pontuar que tal aproximação teórica é muito recente em termos de pesquisa, portanto, as ideias e relações discutidas neste estudo estão em estágios iniciais, traçando possiblidades teóricas e articulações arriscadas, mas importantes para o desenvolvimento do conhecimento nesse campo.

Charles S. Peirce

Charles Sanders Peirce (1839-1914) nasceu em Cambridge, no estado norte-americano de Massachusetts. Seu pai, Benjamin Peirce (1809-1880), era professor da Universidade Harvard e matemático renomado de sua época; desse modo, C.S. Peirce cresceu rodeado de intelectuais importantes e foi introduzido aos campos da matemática, astronomia e física. Também entrou em contato muito cedo com a filosofia kantiana, a qual dominava desde os 16 anos. Sua proximidade com a ciência o levou a se graduar em química, em Harvard, em 1863. Seus interesses, na época, se encontravam entre a filosofia e a teoria da ciência moderna, a qual se dizia portadora de um método que permitia alcançar o conhecimento verdadeiro a partir da experiência (Barrena & Nubiola, 2007Barrena, S., & Nubiola, J. (2007). Antropología pragmatista: El ser humano como signo en crecimiento. In J. F. Sellés (Ed.), Propuestas antropológicas del siglo XX (pp. 39-58). Pamplona, España: Eunsa.). Assim, suas reflexões se inspiravam no método das ciências experimentais e ocorriam em três etapas gerais. Na primeira, Peirce refletia livremente sobre a experiência e hipóteses explicativas; na segunda, empenhava-se na consideração das possíveis consequências e implicações dessas hipóteses; por fim, na terceira, verificava, por indução, se essas consequências correspondiam à realidade (Peirce, CP 5.358-387Peirce, C. S. (1931-1958). Collected papers of Charles Sanders Peirce (Vol. 1-6, C. Hartshorne & P. Weiss, Eds.). Cambridge, MA: Harvard University Press.)3 3 CP é o formato de referência padrão para os Collected Papers de Charles Peirce, citados como: CP, volume, ponto, parágrafo. .

A influência positivista e materialista em Peirce não o levou ao empiricismo ou à negação de uma realidade interna; na verdade, ela urgiu que seu conhecimento considerasse uma realidade independente do ser humano, cujas leis agem sobre ele constantemente e não se fazem claras à consciência ou a seus sentidos. Esses aspectos culminaram em uma fenomenologia própria, sobre a qual se compreende que a realidade também comunica algo em si, além de uma teoria em que o signo assume o papel de intermediário entre polos dicotômicos como objetivo x subjetivo, singular x geral, concreto x abstrato, momentâneo x etéreo.

Fenomenologia para Peirce não se refere a uma ciência da realidade, mas a uma ciência dos modos de ser de toda a experiência. Peirce pensa a experiência em si, enquanto “limitada àquilo que somos irracionalmente, imediatamente e absolutamente constrangidos a aceitar” (MS 299Peirce, C. S. (1906). Phaneroscopy: Or the natural history of concepts. MS 299.)4 4 MS é o formato de referência padrão aos manuscritos não publicados de Charles Peirce citados, segundo a ordem de R. Robin. . No que se refere à constituição da experiência por fenômenos materiais ou mentais, essa definição é ambígua, contudo, a inclusão de fenômenos mentais fica clara quando descreve uma experiência como “um evento singular, ou uma expectativa dele” (Peirce, MS 319Peirce, C. S. (1907). Pragmatism. MS 319.). A fenomenologia, em sua obra, constitui-se enquanto base a partir da qual se erigem estética, ética, lógica e metafísica (Peirce, CP 5.39Peirce, C. S. (1931-1958). Collected papers of Charles Sanders Peirce (Vol. 1-6, C. Hartshorne & P. Weiss, Eds.). Cambridge, MA: Harvard University Press.). Sua semiótica se fundamenta em três categorias fenomenológicas crescentes em nível de complexidade, traçadas cuidadosamente ao longo de 13 anos, de forma que abarcassem precisamente os fenômenos que compõem uma experiência.

A categoria mais primitiva e abstrata é a primeiridade, presente em toda e qualquer experiência e sobre a qual se erguem as outras duas categorias. Na primeiridade, encontram-se sentimentos e qualidades puras, os quais assumem o papel de maior importância em seu sistema. Peirce entende que a primeiridade é composta por qualidades que se perdem quando categorias analíticas são envolvidas (Medeiros, 2009Medeiros, T. T. Q. (2009). A fenomenologia pragmaticista de Charles S. Peirce. Prometheus, 2(3), 55-68. doi: 10.52052/issn.2176-5960.pro.v2i3.728
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). Essa dimensão é de potencialidade, embora constituinte das demais. A forma em si é secundária, encontra-se na secundidade, categoria de resistência, relação e singularidade, em que a qualidade de sentimento se restringe aos meios de ocorrência da realidade para poder ser expressa.

A terceiridade conclui as categorias fenomenológicas acatando elementos indispensáveis como lei, convenção, generalidade, representação e inteligibilidade. A aprendizagem e concepção de ideias só são possíveis através da sistematização de experiências e criação de signos gerais, de um nível de complexidade superior a relações singulares, que as representem de forma a incluir possível causalidade e especulação sobre leis determinantes. A existência dessas leis, no entanto, não depende necessariamente das ocorrências singulares que a tornam concebível, isto é, existente à parte da realidade mental, representando parte de sua atuação em ocorrências singulares (Silva, 2017Silva, F. A. Q. (2017). Razoabilidade em Charles S. Peirce: Uma proposta pragmaticista para o crescimento da razão (Tese de doutorado, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo). Recuperado de https://tede2.pucsp.br/handle/handle/20888
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).

Parte do que sustenta a conexão lógica entre essas categorias fenomenológicas de naturezas tão distintas é a estrutura triádica irredutível da ação do signo, na qual os universos de experiência se apresentam a uma mente que interpretará essa realidade. O signo representa o objeto para uma mente, gerando nessa mente um resultado subjetivo, ou seja, um outro signo chamado de interpretante (Peirce, CP 8.343Peirce, C. S. (1931-1958). Collected papers of Charles Sanders Peirce (Vol. 7-8, A. Burks, Ed.). Cambridge, MA: Harvard University Press .), o qual nunca representa plenamente o objeto; pode apenas se aproximar dele, tornando a semiose um processo mais complexo do que uma constante captação perfeita do objeto.

A complexidade da semiose é consequência do falibilismo intrínseco aos processos interpretativos que, em vez de produzir um interpretante idêntico ao objeto, gera uma infinidade de interpretantes. Esse falibilismo traz implicações e reflexões importantes para a obra de Peirce. Primeiramente, abre a possibilidade de evolução, seja da mente intérprete em um processo de semiose ou de uma teoria que se propõe a elucidar fenômenos e se depara com uma proposição não condizente com a realidade (Peirce, CP 2.75Peirce, C. S. (1931-1958). Collected papers of Charles Sanders Peirce (Vol. 1-6, C. Hartshorne & P. Weiss, Eds.). Cambridge, MA: Harvard University Press.). Além disso, atribui à semiose elementos subjetivos da mente intérprete na urdidura do interpretante, fundamentando teoricamente a singularidade de cada interpretação, sistemas de ideias e mente, sendo esta também um signo, como será esclarecido adiante.

Cada signo manifesto em realidade necessariamente se expressa limitando qualidades puras (primeiridade) em formas viáveis de expressão (secundidade) e representa algo (terceiridade) (Jappy, 2013Jappy, T. (2013). Introduction to peircean visual semiotics. New York, NY: Bloomsbury.). Esse processo de limitação das qualidades ao meio de expressão gera uma infinidade de signos possíveis, por mais semelhantes que sejam. A singularidade de expressão da qualidade é preservada na constituição do signo em si, e a mente do intérprete, incapaz de assimilar o signo na sua completude, tece um interpretante habitado pela singularidade da articulação entre o que é comunicado pelo signo e as referências utilizadas para a interpretação em si.

O processo de semiose resguarda os aspectos tênues que tornam singulares mesmo os signos que representam ideias gerais, evitando que os objetos representados ofusquem as características sutis do signo e do contexto em que a semiose ocorre. Dessa forma, à medida que as interpretações são organizadas em sistemas de ideias mais elaborados, chamados hábitos, esses aspectos singulares da experiência podem influenciar o sistema como um todo. Hábito para Peirce se refere à característica inerente aos fenômenos de atenderem a leis gerais, possibilitando continuidade, regularidade e tendência (Santaella, 2016Santaella, L. (2016). The originality and relevance of Peirce’s concept of habit. In D. West & M. Anderson (Eds.), Consensus on Peirce’s concept of habit: Before and beyond consciousness (pp. 153-170). New York, NY: Springer .).

Os hábitos exercem um papel importante na semiótica de Peirce, pois se constituem como diversas leis mentais mutáveis que regem processos de semiose e ensaios mentais, exercendo influências de mesma capacidade que semioses de signos materiais. No entanto, esses hábitos são organizados em uma certa hierarquia, na qual alguns são responsáveis por instâncias de mudanças de hábitos, capazes de formar ou abandonar hábitos com algum objetivo, propósito ou intenção em mente (Nöth, 2016Nöth, W. (2016). Habit, habit change, and the habit of habit change according to Peirce. In D. West & M. Anderson (Eds.), Consensus on Peirce’s concept of habit: Before and beyond consciousness (pp. 35-63). New York, NY: Springer.). Os ensaios mentais, particularmente, desempenham um grande papel no processo de mudança de hábitos.

Todos esses aspectos permitem discutir a semiótica de Peirce para além de um sistema de construção de significados de forma coerente com outros escritos em que são pensados o mundo, o ser humano e a relação da consciência com a realidade. Colapietro (1989/2014)Colapietro, V. (2014). Peirce e a abordagem do self: Uma perspectiva semiótica sobre a subjetividade humana (N. Milanez, Trad.). São Paulo, SP: Intermeios. (Trabalho original publicado em 1989) discute a abordagem do self contida na teoria geral de signos de Peirce, na qual este considera a mente como um signo em constante evolução (Peirce, CP 5.313Peirce, C. S. (1931-1958). Collected papers of Charles Sanders Peirce (Vol. 1-6, C. Hartshorne & P. Weiss, Eds.). Cambridge, MA: Harvard University Press.), utilizando faculdades de autocontrole, autocrítica e autoconsciência. Assim, a consciência avalia a adequação e orienta a mudança de hábitos . No entanto, como mencionado anteriormente, evolução implica falibilidade.

Existem situações em que as faculdades de autocontrole podem se demonstrar insuficientes para conduzir o abandono de hábitos que desempenham uma determinada função (como abandonar um vício) ou inaptas à formação apropriada de um hábito específico para um objetivo estipulado (como fazer um planejamento). Igualmente falíveis, as faculdades de autocrítica e autoconsciência podem se revelar cegas diante da necessidade de se formar novos hábitos, seja para o cumprimento de uma meta futura ou para a inadequação de um hábito prejudicial a longo prazo. Essas faculdades também são passíveis de aperfeiçoamento ao longo de processos de semiose experienciados.

Relações com o pensamento de Milton Erickson

Erickson é comumente retratado como um ateórico (Zeig, 1980Zeig, J. K. (1980). A teaching seminar with Milton H. Erickson M.D. New York, NY: Brunner; Mazel.) por dois motivos: em primeiro lugar, sua prática clínica foi profundamente embasada por suas próprias observações e aprendizados de vida, sem fazer relação às grandes correntes teóricas da psicologia da época (Erickson, 1980Erickson, M. H. (1980). The collected papers of Milton H. Erickson (Vol. 1-4, E. L. Rossi, Ed.). New York, NY: Irvington .); depois, intervenções terapêuticas eram tramadas tendo como eixo noções captadas a partir da experiência vivenciada com o sujeito em terapia, sem fazer referência a ideias dogmáticas a priori. A tentativa de enquadrar um sujeito em uma teoria ou em um diagnóstico frequentemente leva o terapeuta a intervenções traçadas linearmente e a ações protocolares que desconsideram características singulares do sujeito. Logo, a perspectiva de Erickson era a de que cada pessoa se desenvolve dentro das interpretações que faz daquilo que experiencia ao longo da vida e, por ser natural, devia ser aceito como tal, marcando o princípio clínico de aceitação (O’Hanlon, 1994O’Hanlon, W. H. (1994). Raízes profundas: Fundamentos da terapia e da hipnose de Milton Erickson. Campinas, SP: Psy II .).

Ao relacionarmos o modo como Erickson concebe o vir a ser do ser humano e o processo de formação de hábitos a partir de interpretantes, podemos traçar ideias iniciais de uma compreensão orgânica dos processos de aprendizagem. A formação de hábitos não corrobora a existência de sistemas encerrados, imutáveis, isentos de singularidades. À medida que compreendemos os diversos processos humanos nessa perspectiva, incluindo aqueles de dimensão somática, os elementos singulares envolvidos na produção dos interpretantes que compõem o hábito podem estar resguardados, mesmo que inapreensíveis.

Em relação ao devir de uma dimensão psíquica, cabe-nos pensar sobre a abordagem da mente enquanto signo em evolução e suas implicações teóricas. A mente passa a ser considerada em movimento tal como o da semiose, orientada por um objeto inapreensível que, por meio de experiências, age de modo a se determinar em seus interpretantes (Peirce, MS 319Peirce, C. S. (1907). Pragmatism. MS 319.). Essa perspectiva coloca a mente sob uma teleologia evolutiva na qual as experiências em si, ou a generalização delas, são infinitas formas de representação de uma proposta inconcebível em sua totalidade, mas aproximável. Em outras palavras, a mente é orientada em direção a sua forma de expressão mais completa, seu interpretante final, e, para tal, se representa em infinitos interpretantes, tecidos a partir de suas experiências singulares.

Peirce também identifica a mente como semiose, em parte para ressaltar seu aspecto de exterioridade, visto que, enquanto pensamento, está submissa a leis de lógica e ao controle (Colapietro, 1989/2014Colapietro, V. (2014). Peirce e a abordagem do self: Uma perspectiva semiótica sobre a subjetividade humana (N. Milanez, Trad.). São Paulo, SP: Intermeios. (Trabalho original publicado em 1989)). Erickson, em diversos momentos, aponta na hipnose o potencial do sujeito de acessar capacidades que se manifestam em situações vividas, mas que ele não sabe que possui (Neubern, 2009Neubern, M. S. (2009) Psicologia, hipnose e subjetividade: Revisitando a história. Belo Horizonte, BH: Diamante.; O’Hanlon, 1994O’Hanlon, W. H. (1994). Raízes profundas: Fundamentos da terapia e da hipnose de Milton Erickson. Campinas, SP: Psy II .; Zeig, 1980Zeig, J. K. (1980). A teaching seminar with Milton H. Erickson M.D. New York, NY: Brunner; Mazel.). Essas normalmente passam despercebidas, devido a ideias ou modos de ser inflexíveis do sujeito. Em uma perspectiva peirceana, o objeto não obtém interpretantes suficientemente maduros das experiências que o representam, pois hábitos de interpretação se encontram demasiadamente cristalizados. Isto é, variados fenômenos hipnóticos evocados em experiência de transe são processos do próprio sujeito, com outras possibilidades de articulação, mas que se encontram restritos na lógica de funcionamento atual.

Nesse sentido, Erickson propunha uma observação refinada, de modo a reconhecer no sujeito um entrelaçamento de experiências significadas em diferentes níveis, que se apresentavam na forma por meio da qual o sujeito se expressa, podendo ou não estar relacionadas com sua demanda. Dessa forma, ao priorizar a observação da totalidade do sujeito, certificava-se que seu pensamento se construísse considerando processos intrapsíquicos, modos de relação social e com o mundo, assim como a forma de gesticulação que expressa e as habilidades que demonstra possuir. Esses aspectos, a seu ver, comunicam tanto sobre o sujeito e sua demanda quanto sobre a comunicação verbal, e carregam em si potencial terapêutico (Erickson, Rossi, & Rossi, 1976Erickson, M. H., Rossi, E. L., & Rossi, S. I. (1976). Hypnotic realities: The induction of clinical hypnosis and forms of indirect forms. New York, NY: Irvington., 1979Erickson, M. H., & Rossi, E. L. (1979). Hypnotherapy: An exploratory casebook. New York, NY: Irvington .; Zeig, 1985Zeig, J. K. (1985). Experiencing Erickson: An introduction to the man and his work. New York, NY: Brunner; Mazel .). Semioticamente, essa postura se traduz em uma contemplação do sujeito enquanto signo em seu caráter dinâmico, captando suas minúcias e atentando-se ao que a experiência da relação em andamento comunica em si, por vezes expressando possíveis reconfigurações pertinentes à lógica de funcionamento daquele sujeito.

A singularidade das intervenções de Erickson reside igualmente nos modos como transmitiam suas ideias a seus sujeitos. Muitas vezes, prescrevia que executassem tarefas ou que se comunicassem com pessoas de outros ambientes que frequentavam, ou ainda que o acompanhassem a um restaurante. Dessa maneira, Erickson não limitava os processos terapêuticos ao consultório nem à relação terapeuta-sujeito ou a comunicações verbais (Erickson, 1980Erickson, M. H. (1980). The collected papers of Milton H. Erickson (Vol. 1-4, E. L. Rossi, Ed.). New York, NY: Irvington .). Assim, suas intervenções, vivenciadas pelo sujeito, movimentavam vários signos colaterais, envolvendo aspectos relevantes da apresentação da demanda e incluindo diferentes hábitos no processo de mudança terapêutica. Esse processo de transmissão de sugestões terapêuticas mediante ampla gama de signos colaterais é uma das características da comunicação indireta de Erickson (Neubern, 2016Neubern, M. S. (2016). Iconicidade e complexidade na comunicação hipnótica. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 32(n. esp.), 1-9. doi: 10.15900102-3772e32ne217
https://doi.org/10.15900102-3772e32ne217...
; Nogueira, 2019Nogueira, H. G. (2019). Iconicidade na comunicação hipnótica (Dissertação de mestrado, Universidade de Brasília, Brasília). Recuperado de https://repositorio.unb.br/handle/10482/37036
https://repositorio.unb.br/handle/10482/...
).

As sugestões hipnóticas não são exceção em termos de singularidade e abrangência comunicativa. Por meio de descrições, metáforas e contos de histórias, Erickson veiculava ideias que pretendia comunicar, as quais, envolvidas por signos, faziam sentido para realidade do sujeito, de acordo com as referências captadas ao longo da terapia. Cabe notar que, em relação à hipnose, Erickson coloca em prática o uso de ensaios mentais ou meditação preparatória (Peirce, CP 6.286Peirce, C. S. (1931-1958). Collected papers of Charles Sanders Peirce (Vol. 1-6, C. Hartshorne & P. Weiss, Eds.). Cambridge, MA: Harvard University Press.) como forma efetiva de mudança de hábitos (O’Hanlon & Hexum, 1990O’Hanlon, W. H., & Hexum, A. L. (1990). An uncommon casebook: The complete clinical work of Milton H. Erickson, M.D. New York, NY: W.W. Norton & Company.).

A falibilidade pode ser considerada em três momentos diferentes no pensamento de Erickson: (1) sugestões mal comunicadas podem transmitir algo que não condiz com a intenção do terapeuta, por isso, precisão e clareza são necessárias; as comunicações não precisam ser diretas e objetivas, mas devem orientar adequadamente o sujeito para a experiência proposta; (2) é esperado que em algum momento o sujeito, com seus próprios hábitos interpretativos, faça uma interpretação imprevista pelo terapeuta, cabendo ao contexto terapêutico abarcar esse potencial criativo e (3) alguns sintomas são apenas hábitos que permanecem, apesar de não desempenharem mais uma função, devido a uma inflexibilidade ou inabilidade do sujeito de se desfazer deles em sua condição atual, sem estar ligado a uma causa maior (O’Hanlon, 1994O’Hanlon, W. H. (1994). Raízes profundas: Fundamentos da terapia e da hipnose de Milton Erickson. Campinas, SP: Psy II .).

Como consequência, a falibilidade sustenta a responsabilidade do terapeuta sobre a sua forma de comunicação e o princípio clínico da aceitação, o que requer dele resistência ao impulso de impor sua visão de mundo, respeitando modos de ser e de pensar em prol da autonomia do sujeito. Erickson, de modo a incentivar esse potencial criativo do sujeito, fazia uso de sugestões abertas (open-ended suggestions), nas quais restringia o processo construtivo da resposta do sujeito de forma breve e segura, permitindo a ele criar (Erickson & Rossi, 1979Erickson, M. H., & Rossi, E. L. (1979). Hypnotherapy: An exploratory casebook. New York, NY: Irvington .).

Implicações teóricas

O falibilismo de Peirce concede a possibilidade de evolução, e ambos sustentam seu sinequismo, o princípio de continuidade universal que não separa hermeticamente realidades qualitativas, materiais e racionais (Peirce, CP 6.169-173Peirce, C. S. (1931-1958). Collected papers of Charles Sanders Peirce (Vol. 1-6, C. Hartshorne & P. Weiss, Eds.). Cambridge, MA: Harvard University Press.). Essa proposta entra em acordo com o entrelaçamento que a experiência de transe gera entre processos tidos como inacessíveis ou incontroláveis, senão por uma lógica biomédica como a analgesia, anestesia e hipersensibilidade tátil, assim como processos muitas vezes associados a um funcionamento patológico, como a alucinação visual, auditiva ou tátil e a dissociação. Considerando a trajetória evolutiva dos signos, esses processos, enquanto signos, são colocados em perspectiva diante da totalidade das experiências passadas em que se manifestaram, tomando-as como parte de sua constituição, conectando-os a dimensões sociais, de relação com o mundo e com outros. Essa possiblidade não ignora aspectos herdados e determinados biologicamente; apenas leva em conta que se desenvolvem por meio da formação de hábitos em constante relação com uma secundidade - um universo externo de relação. Por exemplo, consta no reflexo de um atleta as experiências, o contexto, as emoções e as relações singulares em que essas emoções foram desenvolvidas; na sensibilidade, à dor de um arranhão estão implícitas experiências em que o sujeito se feriu e as variadas interpretações que gerou a partir delas.

Nesse sentido, o sinequismo de Peirce permite explicar o modo como processos de uma dimensão somática adquirem novas formas de manifestação, pois nenhum signo está de fato completo, mas em constante evolução (Peirce, CP 5.313Peirce, C. S. (1931-1958). Collected papers of Charles Sanders Peirce (Vol. 1-6, C. Hartshorne & P. Weiss, Eds.). Cambridge, MA: Harvard University Press.), uma vez que nenhuma soma de individualidades pode constituir uma generalidade (Peirce, MS 319Peirce, C. S. (1907). Pragmatism. MS 319.). Logo, um fenômeno vivenciado, como uma anestesia, não pode ser limitado às situações em que se manifestou previamente. Ele é um processo não encerrado, ainda em desenvolvimento, podendo se atualizar a cada manifestação, produzindo interpretantes mais complexos de si, mas sem ignorar a possiblidade de apresentar rigidez e resistência a mudanças. Em muitos casos, Erickson, ao clinicar, evocava esses fenômenos descrevendo ao sujeito diversas experiências passadas em que manifestou aquelas capacidades naturalmente e sugeria outras possibilidades de experiências nas quais poderiam se manifestar. É possível que a alteração de referências do sujeito construa o contexto necessário para que esses fenômenos sejam acessados pela sua iconicidade - suas semelhanças qualitativas e relacionais (Neubern & Nogueira, 2019Neubern, M. S., & Nogueira, H. G. (2019). Iconicidade como alternativa de explicação para a hipnose de Milton Erickson. Revista da Abordagem Gestáltica, 25(1), 62-72. doi: 10.18065/RAG.2019v25.5
https://doi.org/10.18065/RAG.2019v25.5...
; Nogueira, 2019Nogueira, H. G. (2019). Iconicidade na comunicação hipnótica (Dissertação de mestrado, Universidade de Brasília, Brasília). Recuperado de https://repositorio.unb.br/handle/10482/37036
https://repositorio.unb.br/handle/10482/...
) - e, a partir da experiência de transe, redes de hábitos flexibilizem-se para que tais fenômenos trabalhem em prol do sujeito.

Relevante lembrarmos que a experiência de transe pode ocorrer em um nível sutil, no qual as alterações das referências de relação eu-mundo possibilitam uma despotencialização da lógica racional, permitindo que outros processos comumente inibidos se envolvam na elaboração da experiência. Esse aspecto lhe confere caráter singular que se assemelha à natureza de um sonho, na qual a totalidade dos eventos não pode ser reduzida à capacidade do sujeito de relatar o ocorrido. Ademais, a experiência é igualmente caracterizada por uma estrutura fugaz em que fenômenos hipnóticos como a amnésia e alteração da capacidade de assimilação podem se manifestar espontaneamente, resultando em uma menor participação dos processos conscientes, para preservar um hábito das significações produzidas ou vice-versa. Por outro lado, esses fenômenos podem ser evocados de modo a resguardar uma sugestão perante hábitos dominantes, como as estruturas falhas de autocrítica e autoconsciência, que impediriam a mudança terapêutica. Em vez de racionalizar as intervenções terapêuticas, submetendo-as aos seus hábitos interpretativos, o sujeito primeiro experiencia as articulações de processos sugeridas; assim, estabelecem novos interpretantes e possibilidades de modos de ser, para depois assimilá-los aos seus hábitos de autocontrole, autocrítica e autoconsciência.

Por um lado, a hipnose não responde ao critério de reprodutibilidade de resultados comumente utilizado em pesquisas na área da saúde, devido à natureza inconstante da experiência de transe. O comprometimento da relatabilidade dessa experiência não considera o sujeito como fonte única e soberana de inteligibilidade da experiência vivenciada, rompendo com critérios de legitimação de teorias contemporâneas de subjetividade (Gonzalez Rey, 2003Gonzalez Rey, F. (2003). Sujeito e subjetividade. São Paulo, SP: Thomsom.). Conforme Peirce, isso revela seu caráter subjetivista, visto que isola a mente em uma interioridade privada e excluída das interações com os signos públicos (Peirce, CP 2.222Peirce, C. S. (1931-1958). Collected papers of Charles Sanders Peirce (Vol. 1-6, C. Hartshorne & P. Weiss, Eds.). Cambridge, MA: Harvard University Press.).

Porém, a noção de mente como semiose compreende que pensamentos podem se expressar externamente, representando-se no autocontrole que cada um exerce sobre si. É evidente que um pensamento pode não se manifestar de forma tão pública e objetiva como um signo material; no entanto, essa afirmação fundamenta, de certa forma, a conexão singular que se faz em determinadas experiências de transe em que se aparenta vivenciar o mundo do outro.

Além disso, considerando a experiência de transe como uma alteração das referências eu-mundo, é possível que as novas referências de relação para aquela experiência específica surjam sobre a concordância entre finalidade e intencionalidade de ambas as partes, ou seja, terapeuta e sujeito, considerando, inclusive, o conhecimento que o terapeuta demonstra ter dos hábitos de interpretação daquele sujeito. A dissonância entre alguns desses elementos pode levar o sujeito a retornar a suas referências anteriores, de modo a deixar-se menos vulnerável ao ponto de recuperar a sensação de controle sobre si, reduzindo, todavia, a presença do outro em seu mundo, até então, exteriorizado.

Considerações finais

Ambos os autores, inspirados por mentalidades afins, desprenderam-se de paradigmas dominantes de pensamento das suas épocas, rejeitando teorias reificadas de explicação da realidade. Tomando a experiência em si como ponto de partida, Erickson desenvolveu seu pensamento clínico centrando-se na singularidade do sujeito, enquanto Peirce elaborou a base conceitual de sua fenomenologia de forma que não encerrasse a singularidade dos fenômenos, mesmo que representassem características gerais. Essas categorias fundamentaram uma perspectiva de realidade infinita, ao mesmo tempo que determinada.

Este estudo é, acima de tudo, uma tentativa de aproximação entre dois autores com extensas obras, dotadas de pontos conflitantes. Peirce buscou expor seu pensamento de forma mais clara e objetiva, almejando, ao mesmo tempo, que captassem da forma mais fidedigna possível as suas ideias. Erickson, por sua vez, omitiu detalhes, explicações intelectuais e teóricas a seus discípulos e aos pesquisadores que o procuravam, concedendo diversas descrições de sua prática clínica para que chegassem a suas próprias conclusões (Neubern, 2017cNeubern, M. S. (2017c). Iconicidade como possibilidade de pesquisa qualitativa em hipnose. Psicologia em Estudo, 22(4), 505-515. doi: 10.4025/psicolestud.v22i4.37020
https://doi.org/10.4025/psicolestud.v22i...
).

Reconhece-se que este trabalho contribui para compreensão de alguns fenômenos característicos da experiência de transe à medida que relaciona seus processos constitutivos enquanto simultâneos às experiências em que se manifestam, sem sacrificar seu aspecto filogenético. No entanto, compreende-se que outras relações também são possíveis entre as características de singularidade e falibilismo estabelecidas pelos autores, e qualquer afirmação nesse sentido seria demasiadamente contraditória.

Uma limitação do trabalho é que Erickson não expôs um conceito claro do que considerava o inconsciente, apesar de se referir e se endereçar a ele repetidamente. Seu intuito ao utilizar a comunicação indireta era que esta se direcionasse a instâncias inconscientes do sujeito (Erickson & Rossi, 1979Erickson, M. H., & Rossi, E. L. (1979). Hypnotherapy: An exploratory casebook. New York, NY: Irvington .). Peirce, por sua vez, desenvolveu muitas das noções apresentadas neste texto fazendo referência à consciência racional. Colapietro (1989/2014)Colapietro, V. (2014). Peirce e a abordagem do self: Uma perspectiva semiótica sobre a subjetividade humana (N. Milanez, Trad.). São Paulo, SP: Intermeios. (Trabalho original publicado em 1989) deixa claro que Peirce se referia a uma consciência racional e a hábitos de conceitos intelectuais quando expõe suas formulações a respeito do ser enquanto signo. De início, seu sistema semiótico foi desenvolvido para signos materiais, e a mudança de hábitos foi concebida em relação a conceitos intelectuais. Contudo, em seus escritos tardios, ele começa a apresentar novas definições de seus conceitos, abrangendo experiências mentais e expandindo sua concepção de razão, o que tornou seu pragmaticismo mais conciso (Silva, 2017Silva, F. A. Q. (2017). Razoabilidade em Charles S. Peirce: Uma proposta pragmaticista para o crescimento da razão (Tese de doutorado, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo). Recuperado de https://tede2.pucsp.br/handle/handle/20888
https://tede2.pucsp.br/handle/handle/208...
).

A clínica de Erickson pode aparentar ser avessa à ética de conhecimento de Peirce, visto que não há testagem indutiva da hipótese no sentido experimental. Porém, o pensamento de Erickson não era destituído de lógica, à medida que absorvia o maior número de informações possíveis sobre o sujeito, refletia possiblidades terapêuticas na sua perspectiva e propunha intervenções no que Peirce compreenderia como indução qualitativa:

A indução qualitativa consiste primeiro na dedução do investigador da hipótese retrodutiva como um peso evidente de predições condicionais genuínas que este pode convenientemente empreender para fazer e trazer à prova, sendo a condição sob a qual ele as afirma ser a da hipótese retrodutiva com tal grau e tipo de verdade que assegure a sua verdade. Ao chamá-las de “previsões”, não quero dizer que elas devam se relacionar com acontecimentos futuros, mas que devem anteceder o conhecimento do investigador da sua verdade, ou, pelo menos, que devem praticamente antecedê-la. (Peirce, CP 2.759Peirce, C. S. (1931-1958). Collected papers of Charles Sanders Peirce (Vol. 1-6, C. Hartshorne & P. Weiss, Eds.). Cambridge, MA: Harvard University Press., tradução nossa)

A teorização de uma proposta que vise compreender como se articulam os processos envolvidos na experiência de transe deve reconhecer a natureza hipnogênica do contexto clínico, as especificidades apresentadas pelo campo e suas implicações metodológicas (Neubern, 2018Neubern, M. S. (2018). Hipnose, semiótica e complexidade: Problemas de pesquisa clínica. In M. Neubern (Org.), Clínicas do transe. Etnopsicologia, hipnose e espiritualidade no Brasil (pp. 127-159). Curitiba, PR: Juruá.). Apesar de Peirce (CP 7.95-96Peirce, C. S. (1931-1958). Collected papers of Charles Sanders Peirce (Vol. 7-8, A. Burks, Ed.). Cambridge, MA: Harvard University Press .) argumentar em prol da experimentação no que tange à validação de teorias, inúmeros de seus conceitos se estabeleceram pela força de sua argumentação lógica e de sua pertinência na relação com o empírico. Portanto, deve-se ponderar que ambos os autores não se oporiam à pesquisa qualitativa em hipnose, desde que exercida com o rigor metodológico adequado. Logo, propõe-se o aprofundamento da investigação do fenômeno hipnótico sob uma perspectiva semiótica.

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  • 1
    O debate sobre estado e sugestão na história da hipnose reflete contribuições feitas ao campo desde o século XIX, pela escola de Paris, liderada por Charcot, e pela escola de Nancy, liderada por Liébault e Bernheim (Neubern, 2009Neubern, M. S. (2009) Psicologia, hipnose e subjetividade: Revisitando a história. Belo Horizonte, BH: Diamante.). A escola de Paris explicava a hipnose como um estado especial por razões fisiológicas, enquanto a escola de Nancy a compreendia como resultante de processos sociais de expectativas, complacência e autoridade.
  • 2
    Isso se dá porque (1) Erickson tinha uma concepção de self transitório, atravessado pela dimensão social, na qual a natureza das forças influentes (real/imaginário) não difere em seu resultado, semelhante à concepção de Peirce (Colapietro, 2014Colapietro, V. (2014). Peirce e a abordagem do self: Uma perspectiva semiótica sobre a subjetividade humana (N. Milanez, Trad.). São Paulo, SP: Intermeios. (Trabalho original publicado em 1989)); e (2) a comunicação hipnótica, sob a perspectiva semiótica, passa por um processo interpretativo que não se reduz em perspectivas de fabricação ou revelação da realidade (Neubern 2017aNeubern, M. S. (2017a). Contribuições da hipnose para a pesquisa qualitativa. Psico-USF, 22(2), 361-370. doi: 10.1590/1413-82712017220214
    https://doi.org/10.1590/1413-82712017220...
    , 2017bNeubern, M. S. (2017b). Contribuições epistemológicas da hipnose de Milton Erickson para a psicologia moderna. In D. M. Amparo, E. R. Lazzarini, I. M. Silva & L. Polejack (Orgs.), Psicologia clínica e cultura contemporânea (Vol. 3, pp. 684-709). Brasília, DF: Technopolitik., 2018Neubern, M. S. (2018). Hipnose, semiótica e complexidade: Problemas de pesquisa clínica. In M. Neubern (Org.), Clínicas do transe. Etnopsicologia, hipnose e espiritualidade no Brasil (pp. 127-159). Curitiba, PR: Juruá.; Nogueira, 2019Nogueira, H. G. (2019). Iconicidade na comunicação hipnótica (Dissertação de mestrado, Universidade de Brasília, Brasília). Recuperado de https://repositorio.unb.br/handle/10482/37036
    https://repositorio.unb.br/handle/10482/...
    ).
  • 3
    CP é o formato de referência padrão para os Collected Papers de Charles Peirce, citados como: CP, volume, ponto, parágrafo.
  • 4
    MS é o formato de referência padrão aos manuscritos não publicados de Charles Peirce citados, segundo a ordem de R. Robin.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    27 Mar 2020
  • Revisado
    15 Fev 2022
  • Aceito
    19 Maio 2022
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