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Relações de cuidado junto a pessoas diagnosticadas com Transtorno do Espectro do Autismo

Care relationships with people diagnosed with Autism Spectrum Disorder

Relaciones de cuidado de personas diagnosticadas con Trastorno del Espectro del Autismo

Relations de soins avec les personnes atteintes par le trouble du spectre de l’autisme

Resumo

O Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) é descrito pela literatura médica como um transtorno do desenvolvimento que apresenta um quadro sintomatológico crônico que afeta a interação social, a comunicação, os comportamentos e o funcionamento sensorial da pessoa. Propomos uma reflexão acerca das dimensões de cuidado a pessoas diagnosticadas com TEA buscando compreendê-las em relações interdependentes pessoa-cultura. Conduziram-se entrevistas semiestruturadas com uma pessoa diagnosticada com TEA e três pessoas que convivem com pessoas com esse diagnóstico. Os dados foram coletados no Centro Terapêutico-Educacional Potencializar (Cetep), localizado em Jundiaí, São Paulo, Brasil. Conduzimos entrevistas semiestruturadas acerca das relações que os participantes estabelecem ou estabeleciam com o TEA. Nossos resultados e discussões destacam a importância de compreender processos multidirecionais, nos quais as dimensões do cuidado apontam para a responsabilidade dos agentes de cuidado diante de procedimentos adotados nas intervenções dirigidas a pessoas que recebem esse diagnóstico.

Palavras-chave:
Transtorno do Espectro do Autismo; relações de cuidado; cultura; relações dialógicas

Abstract

Autism Spectrum Disorder (ASD) is a developmental disorder with a chronic symptomatologic picture that affects a person’s social interaction, communication, behaviors and sensory functioning. This paper discusses care relationships established with people diagnosed with ASD focusing on their interdependent aspects. Data collection took place at Centro Terapêutico-Educacional Potencializar (CETEP) located in the city of Jundiaí, São Paulo, Brazil. We conducted semi-structured interviews about the relationships that participants establish or established with the TEA. All data underwent a dialogical analysis. Our results and discussions highlight the importance of understanding the multidirectional processes in which care relationships point to care agents’ responsibility regarding interventions aimed at this population.

Keywords:
autism spectrum disorder; care relationships; culture; dialogical relationships

Resumen

El trastorno del espectro del autismo (TEA) se describe en la literatura médica como un trastorno del desarrollo que implica diversos grados de dificultad en la interacción social, la comunicación, los comportamientos y el funcionamiento sensorial de la persona. En este texto proponemos discutir las relaciones de cuidado de personas diagnosticadas con TEA enfocándonos en los aspectos interdependientes persona-cultura. Realizamos entrevistas semiestructuradas a una persona diagnosticada con TEA y a otras tres que conviven con autistas. Recopilamos los datos del Centro Terapêutico-Educacional Potencializar (CETEP), ubicado en la ciudad de Jundiaí, São Paulo, Brasil. Realizamos entrevistas semiestructuradas sobre las relaciones que los participantes establecen o establecen con la TEA. Nuestros resultados apuntan la importancia del análisis sobre procesos multidireccionales, en los cuales las dimensiones del cuidado muestran una postura responsable de los agentes del cuidado ante los procedimientos adoptados en las intervenciones que se destinan a las personas con este diagnóstico.

Palabras clave:
trastorno del espectro del autismo; relaciones de cuidado; cultura; relaciones dialógicas

Résumé

Le Trouble du spectre de l’autisme (TSA) est décrit dans la littérature médicale comme un trouble du développement présentant un encadrement symptomatique chronique qui affecte l’interaction sociale, la communication, les comportements et le fonctionnement sensoriel du sujet. Cet article discute les dimensions du soin envers les personnes atteintes par le TSA en cherchant à les comprendre dans des relations d’interdépendance personne-culture. La collecte des données a eu lieu au Centro Terapêutico-Educacional Potencializar - CETEP situé dans la ville de Jundiaí, São Paulo, Brésil. Nous avons mené des entretiens semi-directifs sur les relations que les participants établissent ou ont établies avec le TEA. Nos résultats et débats soulignent l’importance de comprendre les processus multidirectionnels où les dimensions du soin mettent en évidence la responsabilité des agents de soins face aux procédures adoptées dans les interventions dirigées aux sujets touchés par ce diagnostic.

Mots-clés:
trouble du spectre de l’autisme; dimensions du soin; culture; relations dialogiques

O objetivo deste artigo é explicitar aspectos éticos envolvidos nas relações de cuidado com pessoas diagnosticadas com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), focalizando a interdependência pessoa-cultura. A partir da pesquisa conduzida, em que realizamos entrevistas com agentes de cuidado, traçaremos observações que apontam para a compreensão de tensões em relação a procedimentos empregados em intervenções terapêutico-educacionais1 1 Processos terapêutico-educacionais destacam propriedades altamente relevantes incutidos nas relações Eu-Outro-Mundo uma vez que a construção, manutenção e transformação de estruturas e processos na relação pessoa-cultura apontam para a capacidade das pessoas de, seletivamente, apreenderem aspectos tanto do outro quanto da cultura quando estão em relação com outras culturas ou entre diferentes gerações dentro de uma cultura (Freitas & Guimarães, 2013). e a responsabilidades em jogo entre as pessoas envolvidas.

Noções biomédicas que descrevem o TEA como um transtorno do desenvolvimento de ordem neurobiológica que afeta, em diferentes medidas e intensidades, as áreas da interação social, da comunicação, dos comportamentos e do funcionamento sensorial da pessoa (American Psychiatric Association, 2013American Psychiatric Association. (2013). Diagnostic and Statistical Manual of Mental disorders - DSM-5 (5th ed.). Washington, DC: APA.). Mesmo apresentando diferentes níveis de comprometimentos no seu desenvolvimento2 2 Whitman (2015) destaca nove domínios e processos que se configuram como possibilidades abrangentes de alterações no desenvolvimento de uma pessoa diagnosticada com TEA em comparação com o que é esperado no desenvolvimento típico de uma pessoa, são eles: sensorial, motor, estimulação/ativação/emoção, cognição, interação social, liguagem/comunicação, autorregulação, problemas comportamentais, características físicas/problemas médicos. , a pessoa diagnosticada com TEA tende a necessitar de intervenções terapêutico-educacionais por prazo indeterminado, sendo um quadro sintomatológico de cronicidade importante. Tendo isso em vista, as intervenções terapêutico-educacionais voltadas a essas pessoas visam criar condições para que elas se desenvolvam em direção ao previamente estipulado como desenvolvimento típico na cultura (Bosa, 2006Bosa, C. A. (2006). Autismo: intervenções psicoeducacionais. Revista Brasileira de Psiquiatria, 28, 47-53.; Freitas, 2016Freitas, D. F. C. L. (2016). Relações de cuidado em processos terapêutico-educacionais junto a pessoas diagnosticadas com Transtorno do Espectro do Autismo [Tese de Doutorado]. Universidade de São Paulo, São Paulo, SP. Recuperado de https://bit.ly/3sOrZFX
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; Whitman, 2015Whitman, T. L. (2015). O desenvolvimento do autismo: social, cognitivo, linguístico, sensório-motor e perspectivas biológicas. São Paulo, SP: M. Books.).

Embora existam muitos procedimentos de intervenção elaborados e aplicados seguindo pressupostos teórico-metodológicos distintos no tratamento de TEA (Donvan & Zucker, 2017Donvan, J., & Zucker, C. (2017). Outra sintonia: a história do autismo (L. A. Araújo, Trad.). São Paulo, SP: Companhia das Letras.), questões atinentes ao cuidado nas condutas interventivas e que buscam compreendê-las em termos de relações interdependentes pessoa-cultura não têm sido foco de análise. A interdependência pessoa-cultura, por um lado, tem sido objeto da área de pesquisa denominada construtivismo semiótico-cultural em psicologia (CSC), proposta teórico-metodológica e ética que detalharemos mais adiante (Simão, 2004Simão, L. M. (2004). Semiose e diálogo: para onde aponta o construtivismo semiótico cultural? In M. T. C. C. Souza (Org.), Os sentidos de construção: o si mesmo e o mundo (pp. 13-24). São Paulo, SP: Casa do Psicólogo., 2010Simão, L. M. (2010). Ensaios dialógicos: do compartilhamento a diferença nas relações Eu-Outro. São Paulo, SP: Hucitec.; Simão, Guimarães, & Valsiner, 2015Simão, L. M., Guimarães, D. S., & Valsiner, J. (Eds.). (2015). Temporality: culture in the flow of human experience. Charlotte: Information Age.). As relações de cuidado aqui discutidas, por outro lado, se vinculam à noção de cuidado implicado e da reserva no cuidado, as quais se configuram como dimensões da metapsicologia do cuidado proposta por Figueiredo (2007Figueiredo, L. C. M. (2007). A metapsicologia do cuidado. Psychê, XI(21), 13-30.).

A metapsicologia do cuidado é resultado de reflexão genealógica a respeito das raízes epistemológicas, ontológicas e éticas do pensamento psicológico (Figueiredo 1989/2009Figueiredo, L. C. M. (2009). Matrizes do pensamento psicológico. Petrópolis, RJ: Vozes. (Trabalho original publicado em 1989), 1992/2007Figueiredo, L. C. M. (2007) A invenção do psicológico: quatro séculos de subjetivação 1500-1900. São Paulo, SP: Escuta. (Trabalho original publicado em 1992), 1996/2013Figueiredo, L. C. (2013) Revisitando as psicologias: da epistemologia à ética das práticas e discursos psicológicos. Petrópolis, RJ: Vozes. (Trabalho original publicado em 1996)). Em concomitância com a reflexão sobre a prática clínica, Figueiredo (1996/2013Figueiredo, L. C. (2013) Revisitando as psicologias: da epistemologia à ética das práticas e discursos psicológicos. Petrópolis, RJ: Vozes. (Trabalho original publicado em 1996)) aponta para a necessidade de problematizar a centralidade da legitimação dos discursos de práticas psicológicas que se balizam por uma aliança com pressupostos epistemológicos meramente voltados à avaliação e ao ajustamento dos sujeitos, adequando-os às condições rígidas de construção de conhecimento enfatizados na emergência das ciências modernas. Assim, o autor visa construir uma

plataforma básica para a elaboração de uma ética na medida dos novos modos de subjetivação: é melhor uma teoria que teorize a cisão - do que uma que nos mantenha na ilusão de uma unidade do sujeito e de uma soberania e transparência da consciência - e é melhor uma teoria que teorize e propicie o trânsito ao invés de uma que se estabeleça rigidamente em um dos lugares disponíveis, impedindo-se o contato com todos os impensáveis que deste lugar são constituídos. (Figueiredo, 1996/2013Figueiredo, L. C. (2013) Revisitando as psicologias: da epistemologia à ética das práticas e discursos psicológicos. Petrópolis, RJ: Vozes. (Trabalho original publicado em 1996), p. 56)

Figueiredo (2007Figueiredo, L. C. M. (2007). A metapsicologia do cuidado. Psychê, XI(21), 13-30.) destaca reflexões e defere críticas importantes diante de formas como o cuidado tem sido aplicado e entendido atualmente em diversos âmbitos das relações humanas, não apenas no exercício profissional em psicologia:

enfermeiros, por exemplo, “dão injeções”, “tiram a febre”, medicam e se responsabilizam pelos procedimentos mais sofisticados; mas cuidar, que é bom, não é com eles, nem lhes cabe como tarefa. Resta a família; mas quem é que pode, com a vida que temos, com esta correria diária etc., cuidar de um enfermo vinte e quatro horas? Quem é que, sendo leigo, sabe o que fazer diante de todos os equipamentos de um quarto de hospital moderno? E de qualquer forma, como introduzir a dimensão do cuidado em um ambiente tão asséptico, administrado e tecnológico? ... Estamos pouco preparados para cuidar, acompanhar os doentes, receber os moribundos em seus últimos passos, estudar com os filhos, escutar os amigos etc. Nossa capacidade de prestar atenção uns nos outros, por exemplo, parece drasticamente reduzida. Recuperar esta capacidade me parece uma tarefa urgente e preciosa, tanto para os agentes de cuidados ... quanto para todos os humanos. (Figueiredo, 2007Figueiredo, L. C. M. (2007). A metapsicologia do cuidado. Psychê, XI(21), 13-30., p. 28)

Como possibilidade de superar impasses nas relações de cuidado no mundo contemporâneo, Figueiredo propõe as dimensões do cuidado implicado - sustentar/conter, reconhecer, interpelar/reclamar - e da reserva no cuidado como aspectos essenciais para que cuidadores possam adequar suas estratégias de intervenção e condutas.

O CSC, por sua vez, desde 2004 vem se constituindo como uma perspectiva teórico-metodológica que discute a multidirecionalidade da relação Eu-Outro-Mundo, na qual cada um na relação é afetado pelo outro, promovendo, assim, uma transformação de todos os envolvidos no campo cultural. O CSC tem suas bases teóricas, metodológicas e filosóficas assentadas nas noções de cultura de Ernst Boesch (1991Boesch, E. E. (1991). Symbolic action theory and cultural psychology. New York: Springer.) e Jaan Valsiner, no dialogismo de Rommetveit e Marková, na filosofia de Lévinas e na filosofia hermenêutica de Gadamer. Baseado nestas propostas o CSC caminha na direção da compreensão de espaços psicológicos dinamicamente coconstruídos nas relações com o mundo e com os outros em meio a aproximações e diferenças nas coconstruções semiótico-culturais no curso de vida das pessoas.

O CSC pressupõe, então, que a pessoa pode assumir o papel de sujeito ativo com potencial de transformações, em um dado tecido cultural, considerando o caráter processual e dialógico da relação pessoa-cultura:

O desenvolvimento caracteriza-se como um processo, em tempo irreversível, de contínua transformação estrutural do organismo em sua trajetória multilinear de interação com o meio, possibilitando a emergência de novas formas de organização nesse organismo e na própria relação com o meio. (Simão, 2010Simão, L. M. (2010). Ensaios dialógicos: do compartilhamento a diferença nas relações Eu-Outro. São Paulo, SP: Hucitec., pp. 25-26)

Dessa maneira, vemos o CSC com foco na apreensão de transformações diante das relações Eu-Outro-Mundo, assim como é defendido por Simão (2010Simão, L. M. (2010). Ensaios dialógicos: do compartilhamento a diferença nas relações Eu-Outro. São Paulo, SP: Hucitec.), “A vertente construtivista que estou chamando de Semiótico-Cultural focaliza especialmente o processo individual de desenvolvimento humano, em que as interações Eu-Outro, que se desdobram do espaço sociocultural, assim como o formam, têm papel primordial” (p. 20).

Parte dos pressupostos do CSC pode ser sistematizada visando a compreensão dialógica entre as dimensões biopsicossociais articuladas no processo de desenvolvimento da pessoa e da cultura, focalizando:

  1. a construção contínua e ininterrupta de estruturas e processos culturais e pessoais que se dão nas relações correntes da vida das pessoas;

  2. o papel da interação - enquanto relação - entre a cultura pessoal e cultura coletiva em dinâmicas de internalização e externalização de constructos semiótico-culturais;

  3. o desenvolvimento bi e multidirecional nos processos semióticos incutidos na relação pessoa-cultura.

A compreensão dialógica das relações interpessoais sistematizadas permite focalizar tensões emergentes na relação agente de cuidados-paciente-família como desafios que a pessoa diagnosticada ou diagnosticável com TEA enfrenta ao se relacionar com a cultura.

Propomos uma articulação teórico-metodológica entre a compreensão sobre relações interdependentes pessoa-cultura, refletidas no âmbito do CSC em psicologia, e a metapsicologia do cuidado de Figueiredo (2007Figueiredo, L. C. M. (2007). A metapsicologia do cuidado. Psychê, XI(21), 13-30.) como caminho para reflexão ética sobre as práticas terapêutico-educacionais de intervenção com pessoas que apresentam rotas de desenvolvimento convencionalmente consideradas como atípicas.

Com isso, as dimensões do cuidado aqui discutidas apontam para a necessidade de construir algum grau de sintonia com a sintonia do outro, ao mesmo tempo em que é relevante assegurar ao paciente a possibilidade de desenvolver uma trajetória singular de elaboração de seu percurso de vida. A noção de entrada em sintonia com a sintonia do outro tem sido amplamente discutida na esfera do CSC, desde Rommetveit (1974Rommetveit, R. (1974). On message structure: a framework for the study of language and communication. London: Wiley.) a Simão (2010Simão, L. M. (2010). Ensaios dialógicos: do compartilhamento a diferença nas relações Eu-Outro. São Paulo, SP: Hucitec.) e Guimarães (2010Guimarães, D. S. (2010). Symbolic objects as sediments of the intersubjective stream of feelings. Integrative Psychological and Behavioral Science, 44(3), 208-216., 2015Guimarães, D. S. (2015). Temporality in cultural trajectories: a psychological approach on semiotic constructions. In: L. M. Simão, D. S. Guimarães, & J. Valsiner (Orgs.), Temporality: culture in the flow of human experience (Vol. 1, pp. 331-358). Charlotte: IAP, 2016Guimarães, D. S. (2016). Descending and ascending trajectories of dialogical analysis: seventh analytic interpretation on the short story “The guerrillero”. Psicologia USP, 27(2), 189-200.). Neste trabalho, tomamos o processo de sintonização como o estabelecimento de correspondências e equivalências compartilhadas (Freitas, 2016Freitas, D. F. C. L. (2016). Relações de cuidado em processos terapêutico-educacionais junto a pessoas diagnosticadas com Transtorno do Espectro do Autismo [Tese de Doutorado]. Universidade de São Paulo, São Paulo, SP. Recuperado de https://bit.ly/3sOrZFX
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) entre os envolvidos em relações de cuidado que visam ser generalizadas para processos relacionais entre a pessoa diagnosticada com TEA e seu ambiente cultural/social.

A seguir, passaremos à exposição dos procedimentos empregados na pesquisa e à discussão de seus resultados.

Dialogando com agentes de cuidado junto a pessoas diagnosticadas com TEA

Uma pessoa diagnosticada com TEA e três agentes de cuidado (duas mães e uma terapeuta ocupacional) foram convidados a participar, individualmente, de uma entrevista conduzida com auxílio de um roteiro semiestruturado focalizando três eixos temáticos: (a) sua compreensão quanto ao desenvolvimento da pessoa diagnosticada com TEA; (b) seu entendimento quanto às terapias que foram conduzidas ao longo da vida de uma pessoa diagnosticada com TEA; e (c) sua noção quanto às implicações dessas terapias na vida do paciente.

Os dados foram construídos em sala privada no Centro Terapêutico-Educacional Potencializar (Cetep), localizado na cidade de Jundiaí, São Paulo, Brasil. Foi utilizada uma sala composta por duas poltronas, uma defronte à outra, uma escrivaninha e um armário. A iluminação era artificial. Os participantes foram conduzidos/orientados a sentarem-se em uma das poltronas.

Foram realizados três encontros com uma hora de duração com os participantes 1 e 2; dois encontros com uma hora de duração com o participante 3; e um encontro com uma hora de duração com o participante 4. Em cada encontro com cada participante, seguimos uma entrevista semiestruturada como baliza para o diálogo.

Com isso, construímos como dados de pesquisa aproximadamente nove horas de conversas com os participantes, divididos em: (a) três horas de conversa gravada com o participante 1; (b) três horas de conversa gravada com o participante 2; (c) duas horas de conversa com o participante 3; e (d) uma hora de conversa com o participante 4.

Utilizamos um gravador de áudio que permitiu uma coleta acurada das falas dos participantes diante das questões apresentadas pelo pesquisador/entrevistador. Todas as conversas com cada participante foram transcritas de modo literal e, posteriormente, analisadas.

Tabela 1
Participantes da pesquisa

Em função dos três eixos temáticos que estruturaram as entrevistas, articulamos o conteúdo das respostas, para fins de análise, às dimensões de cuidado implicado - sustentar/conter, reconhecer e interpelar - e de reserva no cuidado. Também focalizamos aspectos das respostas que apontavam para a percepção de exageros no cuidado implicado e na reserva.

Todos os participantes consentiram livremente acerca de sua participação, leram o termo de consentimento livre e esclarecido e o assinaram, conforme as normas da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep).

As dimensões do cuidado na relação agente de cuidados-paciente-família

Figueiredo (2007Figueiredo, L. C. M. (2007). A metapsicologia do cuidado. Psychê, XI(21), 13-30.) destacou posturas que o agente de cuidado pode ocupar. Para o autor, podemos assumir, como agentes de cuidado, as posturas de (a) sustentar/conter, (b) reconhecer, (c) interpelar e (d) reserva no cuidado. Tendo tais posturas em vista, adiante discutiremos as entrevistas realizadas com cada participante.

Postura implicada no cuidado: sustentar e conter

No diálogo que se deu entre o Participante 1 e o pesquisador acerca das influências exercidas pelos terapeutas sobre a vida do paciente, notamos uma predisposição a agir e interpretar a realidade por meio do que é predeterminado no âmbito sociocultural, isto é, pelo próprio terapeuta:

Pesquisador: Quem decide as coisas a serem trabalhadas, é você ou a terapeuta ocupacional?

Participante 1: A terapeuta ocupacional. Na maioria das vezes.

Pesquisador: Ela se baseia em quê para decidir o caminho a ser tomado com você?

Participante 1: Nas coisas que eu digo pra ela.

Pesquisador: Foi você que falou que você precisava comer? O molho, por exemplo?

Participante 1: O molho, pra mim, eu não sou fã.

Pesquisador: Eu sei, mas você comeu, com a terapeuta ocupacional.

Participante 1: Tive que comer, porque eu ia fazer na faculdade um evento gastronômico. E, se eu demonstrasse que sentisse nojo na frente dos meus amigos, ia pegar meio mal.

Podemos observar que, ao mesmo tempo em que o Participante 1 aceita as intervenções da terapeuta ocupacional, ele se posiciona como aquele que, embora tenha voz e se baseie em suas reflexões para a tomada de decisão, permite que seja a terapeuta quem determina ou predetermina as ações a serem tomadas.

As formas de entender e lidar com o mundo envolvente e com os mecanismos de regulação na relação que a pessoa diagnosticada TEA estabelece com os outros e com o mundo caminham de forma distinta das demais pessoas. Isso os coloca em uma posição de ter que aceitar e se sujeitar a ações e significações advindas do ambiente sociocultural em sua tentativa de aproximação com o que é esperado no desenvolvimento típico. Essas constatações estão incutidas na forma de cuidado implicado, no qual a pessoa que assume o cuidado “é um outro englobante, o ambiente (social e físico) ou um objeto que desempenha as funções de acolher, hospedar, agasalhar, alimentar” (Figueiredo, 2007Figueiredo, L. C. M. (2007). A metapsicologia do cuidado. Psychê, XI(21), 13-30., p. 17). Ou seja, essa forma de relação se aproxima ao que é destacado por Figueiredo como cuidado implicado Sustentar/Conter. Assim, ao sustentar e conter, as pessoas envolvidas no cuidado implicado assumem uma função de oferecer continuidades e estabilidades ao objeto de cuidado, negociando o processo de aceitação do cuidado por parte do paciente.

Eu venho com a mesma história, né? Vou te dar três meses de prazo, se nesses meses não ver a coisa acontecer, nosso contrato termina por aqui. Só que a terapeuta ocupacional atual foi cativando o Participante 1 de uma maneira e foi dominando ele. (Participante 1)

Na fala do Participante 2 emerge uma relação em que a terapeuta busca cativar e dominar o paciente. Entendemos que cativar e dominar, do ponto de vista do participante 2, está implicado numa forma de cuidado que pressupõe uma ação do terapeuta sobre o paciente e submissão do paciente diante de tais ações. Esse processo faz parte da dinâmica relacional do cuidado e deve, em diferentes medidas, ser utilizado quando eticamente necessário.

Isso é, diante das demandas inerentes à vida humana em um tecido cultural, pessoas que assumem a função e papel de dar continência para o desenvolvimento de outros têm importância significativa no desenvolvimento da pessoa e da cultura (Valsiner, 2012Valsiner, J. (2012). Fundamentos da psicologia cultural: mundos da mente, mundos da vida. Porto Alegre, RS: Artemed.), uma vez que guiam rotas de transformações, ou seja, situam balizas (Valsiner, 1998Valsiner, J. (1998). The guided mind: a sociogenetic approach to personality. Cambridge, MA: Harvard University Press.) que orientam e regulam semioticamente as ações das pessoas em sua constante relação com constructos semiótico-culturais.

Entra muito o desejo da família e da terapeuta. Eu procuro, lógico, sempre mais o da família. Mas é como eu falei, eu tenho algumas famílias que não conseguem identificar muito qual é o real quadro daquele paciente ... assim, eu tento sempre colocar esses pais,, com o pé no chão, entendendo que existe uma escada de desenvolvimento e que a gente precisa trabalhar isso nesse fluxo. (Participante 4)

A partir da fala do participante 4, observamos que o papel de sustentação e contenção são partes necessárias no processo terapêutico-educacional, uma vez que permite um preenchimento da lacuna entre desenvolvimento típico e desenvolvimento atípico por fornecer algum tipo de estabilidade e/ou continuidade diante de toda a irregularidade, tanto para paciente e família quanto para o próprio profissional.

Por isso observamos que sustentar/conter na dinâmica relacional do cuidado são das dimensões necessárias incutidas nos processos terapêutico-educacionais, especialmente diante de pessoas que apresentam rotas de desenvolvimento que caminham em direções nem sempre convergentes com as da cultura envolvente.

Tendo essas questões em vista, destacamos que sustentar e conter nos cuidados podem assumir a função de balizas semiótico-culturais na regulação de ações tomadas diante da pessoa diagnosticada com TEA. Isso destaca uma aproximação importante entre constructos caros ao CSC em psicologia e à metapsicologia do cuidado, uma vez que processos de adaptação da pessoa ao mundo estão vinculados à noção de Ethos3 3 Figueiredo (2008) ao discutir a noção de ética, afirma que ela se relaciona com o modo das pessoas habitarem o mundo; num plano etimológico, ethos - o objeto da ética - refere-se tanto aos “costumes e hábitos como à morada” (p. 68). , que opera como pano de fundo na obra de Figueiredo, e de balizas, que opera de modo central no desenvolvimento teórico-metodológico do CSC.

Postura implicada no cuidado: reconhecer

Articulamos essa postura com a noção de balizas semiótico-culturais, dirigida à compreensão de processos de mediação temporários, assim como de criação de significados mais ou menos estáveis que possibilitam ao outro participar de um dado tecido cultural que permanece em constante relação entre variações e transformações (Freitas, 2013Freitas, D. F. C. L., & Guimarães, D. S. (2013). An experimental study about cultural transmission process. Psychology & Society, 5(1), 67-86.). Numa direção similar, o reconhecimento no cuidado diz respeito às relações entre eu, outro e mundo que possibilitam a emergência de um movimento dinâmico e processual vinculados a aspectos aparentemente estáveis do mundo. Isso traz uma percepção de estabilidade sobre as ininterruptas variações e transformações em tempo irreversível (Valsiner, 1994Valsiner, J. (1994). Culture and human development: a co-constructionist perspective. In P. van Geert, L. P. Mos, & W. J. Barker (Eds.), Annals of theoretical Psychology (Vol. 10, pp. 247-298). New York: Plenum.). O excerto a seguir caminha nessa direção:

Na minha avaliação, quando eu vou discriminando lá com os pais (o que faz, não faz, tal), eu sempre pergunto: mas não faz por quê? Isso não faz parte da cultura da família ou porque ele não consegue? Ou não faz porque você nunca ensinou? Ou ele não consegue? Porque isso é outro fator relevante, às vezes não faz porque a mãe não deixa, acha que é incapaz, e aí entra toda uma questão da família, que complica ainda mais o quadro funcional da criança. Então, pra mim, essa questão social é muito relevante, né? Acho que isso tem que permear toda a avaliação e o tratamento da criança, não dá pra gente colocar que é o que eu faço na minha casa. O que eu faço, eu faço. É a minha cultura, e não a da minha família. Então eu sempre pergunto: “É assim que vocês fazem?”, até pra poder ter uma intervenção dentro do que aquela família faz. (Participante 4)

A fala do participante 4 explicita um movimento dialógico que se dá no cuidado na compreensão de ações e significados em uma rota de análise que aponta para uma relação entre conhecimento particular e geral (Freitas, 2018Freitas, D. F. C. L. (2018). The methodological approaches in an experimental study of cultural transmission process. Culture & Psychology, 24(4), 418-442. doi: 10.1177/1354067X17729996
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). Destacamos, dessa fala, que o reconhecimento das inerentes assimetrias entre eu e outro constitui a forma de trabalho da participante 4. Ou seja, é pressuposto um distanciamento, o reconhecimento de diferentes posições entre agente de cuidados, paciente e família. Reconhecer as posições parciais do que pode ser o outro e valorizar isso permite também um reconhecimento de si, assim como um movimento dialógico de cuidado entre as pessoas, destacando, com isso, a dimensão de alteridade inerente às relações pessoais (Simão, 2010Simão, L. M. (2010). Ensaios dialógicos: do compartilhamento a diferença nas relações Eu-Outro. São Paulo, SP: Hucitec.).

Nessa dimensão do cuidado implicado, as pessoas exercem a função de reconhecer, uma diante da outra, as demandas de vida particulares e gerais. Entendemos que essa dimensão do cuidado enfatiza o aspecto dialógico de reconhecimento mútuo e incompleto sobre o que é ou o que foi e o que poderia ser aquela pessoa, assim como aquela relação. Essa incompletude, como característica das relações dialógicas, abre a possibilidade de emergência de diálogos que assegurem o posicionamento, sempre parcial, de cada um dos envolvidos. O diálogo e o reconhecimento no cuidado pressupõem que o pensamento social e a linguagem são fenômenos em ritmo de mudança (Marková, 2006Marková, I. (2006). Dialogicidade e representações sociais: as dinâmicas da mente (H. M. Filho, Trad.). Petrópolis, RJ: Vozes. (Trabalho original publicado em 2003)). São, portanto, relações que permitem e/ou restringem os movimentos de aproximação e afastamento entre as pessoas.

Destacamos que a ação de reconhecimento das pessoas no cuidado pode ser muitas vezes silenciosa, mas que possibilita à pessoa ser produtora de transformações que promoverão tanto a manutenção e propagação de estruturas pessoais e coletivas como suas rupturas em descontinuidades (Freitas & Guimarães, 2013Freitas, D. F. C. L., & Guimarães, D. S. (2013). An experimental study about cultural transmission process. Psychology & Society, 5(1), 67-86.). Ou seja, no reconhecimento, os envolvidos na relação se transformam, em alguma medida, mesmo que de forma não explícita.

Com isso, destacamos que permitir a emergência e manutenção de costumes e do habitar no mundo a partir do Ethos (Figueiredo, 2008Figueiredo, L. C. M. (2008). Revisitando as psicologias: da epistemologia à ética das práticas e discursos psicológicos. São Paulo, SP: Vozes.) está vinculado a processos de mediação semiótico-cultural, desde a noção de balizas (Valsiner, 1998Valsiner, J. (1998). The guided mind: a sociogenetic approach to personality. Cambridge, MA: Harvard University Press.), que ocorrem ao longo do tempo por meio da sustentação da pessoa nos cuidados. Isso nos possibilita perceber que, para além do que se busca na ocasião de conter e agasalhar a pessoa diagnosticada com TEA, no momento do reconhecimento, as descontinuidades, rupturas e aquilo que escapa à percepção nas relações multidirecionais Eu-Outro-Mundo são aspectos a serem levados em consideração nas práticas terapêutico-educacionais. Isto é, fazem parte de um processo no qual reconhecer o Outro é muito mais do que aquilo que os olhos são capazes de apreender.

Postura implicada no cuidado: interpelar e reclamar

Articulamos essa postura à multidirecionalidade no processo de desenvolvimento humano que implica considerar que as ações dirigidas mutuamente, uns para os outros, serão elaboradas de diferentes formas por todos aqueles envolvidos na relação (Valsiner, 1998Valsiner, J. (1998). The guided mind: a sociogenetic approach to personality. Cambridge, MA: Harvard University Press.). A interdependência e irredutibilidade da tríade Eu-Outro-Mundo (Simão, 2010Simão, L. M. (2010). Ensaios dialógicos: do compartilhamento a diferença nas relações Eu-Outro. São Paulo, SP: Hucitec.), no campo cultural, impõe um movimento recursivo-dialógico que é fonte de tensões que mobilizam ações e possibilitam a dinâmica de emergência de novidade, em tempo irreversível, no curso da vida humana em que a cultura interpela o Eu que, por sua vez, interpela o Outro, que vem a interpelar a cultura e o Eu recursivamente. Isso quer dizer que variação, descontinuidades, rupturas, disponibilidade, assim como aquilo que escapa do/no Outro são partes inerentes à relação de cuidado entre as pessoas.

Eu fui acreditando que ele, fazendo essas determinadas coisas ... ele não “tava” correndo risco, perigo, de ir na farmácia sozinho. Porque eu tinha muito medo, porque ele não tem visão nem de atravessar a rua. Então a gente foi acreditando que ele podia... . E aí ela foi acreditando que ele podia prestar vestibular. Aí ela acendeu na gente também essa esperança, e a gente começou, os três, os quatro (com o pai), a batalhar por isso, que ele era capaz. (Participante 2)

A fala do participante 2 aponta que o “acreditar no outro” permite o contato com o distanciamento - com a alteridade -, que é parte das relações humanas. As ações da terapeuta sobre o paciente e sobre a família trouxeram e convidaram a todos os envolvidos a participar do movimento de “acreditar no outro” de diferentes formas. Esse é um movimento de cuidado implicado que envolve o acolhimento, o reconhecimento e a capacidade de questionar o Outro, convidando-o à ação.

O convite à ação, como o destacado pelo “acreditar no outro”, analisado na fala do participante 2, aponta para um cuidado do profissional que se propõe a permitir a ação, a permitir a vida, isto é, a permitir ao outro e a si mesmo o interpelar e ser interpelado, o reclamar e ser reclamado à “sua presença viva e interativa” (Figueiredo, 2007Figueiredo, L. C. M. (2007). A metapsicologia do cuidado. Psychê, XI(21), 13-30., p. 19). Assim, nessa dimensão do cuidado “o outro constitui-se em oportunidade para o sujeito indagar a e ser indagado”, e, “ao indagar o outro, o sujeito acabará por indagar-se a si próprio” (Simão, 2010Simão, L. M. (2010). Ensaios dialógicos: do compartilhamento a diferença nas relações Eu-Outro. São Paulo, SP: Hucitec., p. 236). Nos termos de Figueiredo (2007Figueiredo, L. C. M. (2007). A metapsicologia do cuidado. Psychê, XI(21), 13-30.), tratar o Outro como aquele que é “marcado sempre pela diferença e incompletude” (p. 19), demarca a capacidade do agente de cuidados de ser uma fonte facilitadora de desafios que outrora não eram possíveis.

Portanto é nesse contexto que as relações de cuidado colocam o profissional diante do paciente e da família como aquele que permite e não impõe, possibilita e não determina, a emergência de questões, limites e caminhos de existência, bem como de preenchimento e pertencimento na lacuna que se dá entre desenvolvimento típico e atípico. Essa é uma tarefa desafiadora para todos os envolvidos e é imposta pela própria contingência que o quadro diagnóstico de TEA traz. Isto é, destaca-se um quadro de cronicidade sintomatológica importante no qual os profissionais escolhem atuar terapêutico-educacionalmente, mas que, por outro lado, a família e o paciente nunca escolhem estar nessa condição. Tendo isso em vista, considerando a dinâmica dialógico-recursiva e a alteridade das relações humanas, mecanismos de mobilização de ações de interpelação emergem, em diferentes medidas, sobre aqueles que escolhem se envolver e sobre aqueles que são impostos nessa condição, balizando diferentes rotas de ação e significação semiótico-cultural.

No que se refere às dimensões de interpelar e reclamar no cuidado implicado, retomamos questões inerentes à perspectiva do CSC em psicologia acerca de sujeito ativo, transformação multidirecional e alteridade nas relações. Com isso, destacamos que cada pessoa em relação transforma ativamente o que recebe do outro buscando integrá-las em seu próprio conteúdo que pode ser transformado durante esse processo em distintas e/ou similares rotas de ação (Freitas & Guimarães, 2013Freitas, D. F. C. L., & Guimarães, D. S. (2013). An experimental study about cultural transmission process. Psychology & Society, 5(1), 67-86.).

A reserva nas relações de cuidado

Na reserva, “o cuidador exerce a renúncia à sua própria onipotência e à aceitação de sua própria dependência” (Figueiredo, 2007Figueiredo, L. C. M. (2007). A metapsicologia do cuidado. Psychê, XI(21), 13-30., p. 21). Isso quer dizer que, desde o movimento de acolher e envolver a pessoa de cuidado, o cuidador deve, antes de um engolfamento do outro, saber se retirar cuidadosamente do cuidado. Para isso, “é preciso saber cuidar do outro, mas também cuidar de si e deixar-se cuidar pelos outros, pois a mutualidade nos cuidados é um dos mais fundamentais princípios éticos a ser exercitado e transmitido” (Figueiredo, 2007Figueiredo, L. C. M. (2007). A metapsicologia do cuidado. Psychê, XI(21), 13-30., p. 21). Sobre isso, destacamos o excerto a seguir:

nem sempre dá pro paciente, a gente, ele, tomar a decisão e a gente falar pros pais: “Ele escolheu, pronto, acabou” né? Apesar de eu achar que isso seria o correto. Porque, de verdade, ninguém fica falando pra gente o que a gente tem que fazer. A gente faz isso com eles porque já sabe, já tem o diagnóstico, então não vai dar conta de escolher, né? Então eu acho isso extremamente invasivo, mas o que eu tento fazer é isso. Eu tento… onde é possível chamar todos esses atores aí, participantes, e a gente tentar encontrar um meio termo pra isso. E foi o que a gente fez, deu certo, ele escolheu, inclusive teve consequências... . E ele aceitou isso, assumiu, bancou isso. E foi uma experiência bem legal. (Participante 4)

Observamos na fala do participante 4 as relações entre sustentar/conter, reconhecer e interpelar/reclamar; ademais, o que salta aos olhos é a responsabilidade e sensibilidade ética do profissional ao se manter no cuidado se abstendo dele. Isto é, o terapeuta “cuida” se reservando de modo implicado - fazendo coisas cuidando e se reservando de costumes e hábitos da morada no sentido de Ethos de Figueiredo (2008Figueiredo, L. C. M. (2008). Revisitando as psicologias: da epistemologia à ética das práticas e discursos psicológicos. São Paulo, SP: Vozes.) articulado aos mecanismos de regulação semiótico-cultural, isto é, balizas (Valsiner, 1998Valsiner, J. (1998). The guided mind: a sociogenetic approach to personality. Cambridge, MA: Harvard University Press.). Isso possibilitou, no caso do paciente, as ações de escolha, lidar com as consequências de tal escolha e, como mencionou o participante 4, “bancar” isso.

Trata-se de um posicionamento reservado do profissional em relações de cuidado, pois, independentemente do grau de complexidade dos comprometimentos desenvolvimentais da pessoa diagnosticada com TEA, o profissional que presta cuidado deve, eticamente falando, saber que o bom desenvolvimento de seu trabalho está diretamente relacionado ao saber se reservar deste, bem como saber se implicar com a reserva se responsabilizando com a antinomia (Marková, 2006Marková, I. (2006). Dialogicidade e representações sociais: as dinâmicas da mente (H. M. Filho, Trad.). Petrópolis, RJ: Vozes. (Trabalho original publicado em 2003)), que guarda a relação de “Cuidado implicado e de Reserva”. Assim, a reserva também apresenta suas vicissitudes enquanto parte de um processo de cuidado no qual tensões, continuidades, variações, descontinuidades, rupturas, disponibilidade ao Outro e alteridade se fazem presentes. Pois sua insuficiência e moderação está dialógica e recursivamente articulada à pessoa de cuidado - no caso discutido, está dialogicamente articulada no cuidado prestado à pessoa que apresenta uma rota de desenvolvimento que se desvia, em diferentes medidas, daquela compreendida como típica.

A reserva em relações de cuidado pressupõe um abster-se cuidadoso do agente de cuidados. Este abster-se protege a pessoa, de modo dialógico, justamente dos excessos que podem ser exercidos sobre a pessoa que é alvo das ações dos cuidadores. Assim, cuidar também é deixar ser cuidado e, mais que isso, cuidar é, simplesmente e complexamente, deixar cuidadosamente de cuidar.

Exageros da implicação e da reserva

Saber que sustentar/conter, reconhecer, interpelar/reclamar e reservar são aspectos dinâmicos, dialógicos e recursivos de relações de cuidado traz implicações de ordem ética no cuidado a qualquer pessoa. A partir disso emerge a necessidade de o agente de cuidados se atentar para a necessidade de transitar sobre todas as dimensões do cuidado implicado e, ademais, saber se posicionar em reserva. Pois, uma vez que se detém somente a sustentar e conter, se restringe e restringe o paciente a uma mera repetição de cuidados atrelados à sobreposição do profissional diante de qualquer variável relevante das pessoas envolvidas. Isso impossibilita qualquer tipo de reconhecimento no processo de cuidado e o interpelar/reclamar, bem como a própria postura de reserva.

Da mesma forma, se o profissional se colocar somente em uma posição silenciosa de reconhecer no outro e esperar que este reconheça nele as possibilidades que o cuidado defere, muito provavelmente o que poderia ser construído no sustentar/conter e o que viria a abrir possibilidades no interpelar/reclamar e na reserva se tornam aspectos ou dimensões da relação Eu-Outro-Mundo inviáveis.

Os excessos da implicação são bem mais graves do que um mero mal-estar gástrico. Quando a “sustenção” e “contenção” domina em excesso, configura-se uma experiência de engolfamento totalitário e claustrofóbico. É o cuidado que não dá sossego, sufoca. Mas também o reconhecimento ilimitado - que vai muito além e se desvia do testemunho autêntico e veraz - produz ... a dependência diante da atenção e da aprovação alheia, um estado de alienação... . e quando o outro reclamante e interpelador, o outro-questão sobressai demasiadamente ... seja pela impotência a que o sujeito se vê reduzido, ... esta forma de cuidado pode ser das mais perniciosa quando atuada em excesso. (Figueiredo, 2007Figueiredo, L. C. M. (2007). A metapsicologia do cuidado. Psychê, XI(21), 13-30., p. 20)

Somente interpelar/reclamar ou tomar ações exageradas nesse contexto, sem permitir o desenvolvimento da pessoa desde o cuidado de sustentar/conter e reconhecer, pode impedir qualquer mecanismo de regulação e desenvolvimento pessoal. Figueiredo (2007Figueiredo, L. C. M. (2007). A metapsicologia do cuidado. Psychê, XI(21), 13-30.) aponta que “o melhor equilíbrio das funções da presença implicada do cuidador nem seria suficiente nem seria viável se ao cuidador não coubesse a sabedoria de ausentar-se, ou melhor, de manter-se também em presença reservada” (p. 20).

Ademais, o exagero da reserva também se torna prejudicial quando não é possível se abster cuidadosamente do cuidado, ou seja, se convidamos à vida alguém que não possui condições, no momento, para isso. Colocar-se na posição de reserva sem passar pelas demais dimensões do cuidado ou ainda antecipá-la, ou sobrepô-la às demais dimensões do cuidado avaliza uma relação na qual somente existe uma ideia, muitas vezes, nem mesmo a intenção de cuidado e, portanto, não há cuidado.

Ela tá que nem a primeira terapeuta ocupacional no começo. Você não consegue falar com ela... . Mas, tipo: onde ela estava na sexta? Sei lá também né? Ela não respondeu em tempo algum. Imagina se tivesse esperado até às nove horas da noite pra secretária dela ligar. “Ah, pode ficar tranquila”, ela falou. “Vocês podem ficar tranquilos, mas vêm aqui amanhã”. Nem falou comigo, não achei legal a postura dela. Mas porque, até então, acho que nunca tinha precisado. (Participante 3)

Da fala do participante 3 é possível compreender que se abster demais é prejudicial a qualquer forma de cuidado. Ou seja, a pessoa ou o profissional que se presta ao cuidado deve saber que sua presença implicada é requerida e que sua ausência deve ser muito bem construída.

Considerações finais

Analisamos neste estudo as dimensões da metapsicologia do cuidado propostas por Figueiredo (2007Figueiredo, L. C. M. (2007). A metapsicologia do cuidado. Psychê, XI(21), 13-30.) - sustentar/conter, reconhecer, interpelar/reclamar -, a reserva no cuidado e os exageros do cuidado articulados às propostas do CSC em psicologia, como aquelas que trazem importantes implicações sobre as relações e os processos que são imprescindíveis para que agentes de cuidado possam adequar suas ações com aqueles que necessitam de cuidado - como é o caso de pessoas diagnosticadas com TEA.

Apresentamos, a seguir, um quadro-síntese da articulação entre as dimensões do cuidado propostas na metapsicologia de Figueiredo (2007Figueiredo, L. C. M. (2007). A metapsicologia do cuidado. Psychê, XI(21), 13-30.) e noções construídas no âmbito do CSC em psicologia. Esse quadro-síntese permite uma articulação teórico-conceitual entre áreas de conhecimento que possuem trajetórias distintas, embora encontrem em sua gênese e em reflexões contemporâneas possibilidades de articulação.

A metapsicologia do cuidado é, em grande medida, tributária das reflexões fenomenológicas e hermenêuticas de Figueiredo, articuladas a reflexões emergidas em sua prática clínica acompanhada de elaborações teórico-metodológicas nessa interface. O CSC em psicologia compartilha, por sua vez, dos fundamentos oriundos das tradições fenomenológicas e hermenêuticas, enfatizando os aspectos relativos à tradição na formação da pessoa (Bildung) em seus processos de subjetivação sócio-histórica e culturalmente situados (Simão, 2005Simão, L. M. (2005). Bildung, Culture and Self; A Possible Dialogue with Gadamer, Boesch and Valsiner? Theory & Psychology, 15(4), 549-574., 2010Simão, L. M. (2010). Ensaios dialógicos: do compartilhamento a diferença nas relações Eu-Outro. São Paulo, SP: Hucitec.).

Destacamos da Tabela 2 uma articulação entre as dimensões do cuidado e constructos teórico-metodológicos do CSC em psicologia. Notamos que existe uma dinamicidade entre cada postura de cuidado implicado, assim como na reserva. Mais que isso, a Tabela 2 destaca uma crescente complexidade de postura que o agente de cuidado pode tomar. Ademais, cada postura pressupõe uma complementariedade em relações implicadas em modos de relações Eu-Outro-Cultura circunscritas nos constructos destacados na Tabela 2 e discutidas ao longo deste texto.

Tabela 2
Articulações entre a metapsicologia do cuidado e o construtivismo semiótico-cultural em psicologia

De modo pormenorizado, a síntese que trazemos evidencia que processos de regulação semiótico-cultural são partes intrínsecas de processos relacionais atinentes às posturas que o agente de cuidado pode assumir diante de pessoas diagnosticadas com TEA. Com isso, as dimensões de cuidado destacam possibilidades de o profissional afetar e ser afetado por mecanismos socioculturais de regulação semiótico-cultural.

Nesse sentido, a relação entre paciente, profissional e a família - cuidadores - pode, eventualmente, extrapolar as diretrizes previstas nas normas de conduta e de procedimento tecnicamente orientadas para o tratamento do outro. As relações de cuidado demandam disponibilidade para viver experiências que, muitas vezes, são imprevisíveis. Com isso, as diferentes formas de cuidado, quando articuladas, pressupõem uma relação dialógica que se estabelece entre agente de cuidado e pessoa a ser cuidada, ou seja, processos de regulação semiótico-cultural multidirecionais. Isto é, consideramos que o desenvolvimento humano, instaurado no paciente, no terapeuta, no profissional, no professor, no pai, na mãe, no irmão, na família, no cuidador etc., implicada, inevitavelmente, nos processos de desenvolvimento da cultura pessoal e da cultura coletiva (Valsiner, 1998Valsiner, J. (1998). The guided mind: a sociogenetic approach to personality. Cambridge, MA: Harvard University Press., 2007Valsiner, J. (2007). Culture in minds and societies: foundations of cultural psychology. New Delhi: Sage Publications., 2012Valsiner, J. (2012). Fundamentos da psicologia cultural: mundos da mente, mundos da vida. Porto Alegre, RS: Artemed.) de todos os envolvidos no cuidado.

Isso aponta para relações e experiências que destacam um processo no desenvolvimento humano, em que a regulação de ações de um para com o outro concernem a processos coconstrutivos e transformativos (Freitas, 2016Freitas, D. F. C. L. (2016). Relações de cuidado em processos terapêutico-educacionais junto a pessoas diagnosticadas com Transtorno do Espectro do Autismo [Tese de Doutorado]. Universidade de São Paulo, São Paulo, SP. Recuperado de https://bit.ly/3sOrZFX
https://bit.ly/3sOrZFX...
). Nesses processos, o desenvolvimento da cultura pessoal e da cultura coletiva está necessariamente imbricado nas relações que as pessoas estabelecem com seu ambiente sociocultural, enfim, com o ambiente e com as outras pessoas em espaços de compartilhamento de ações e significados (Valsiner, 2012Valsiner, J. (2012). Fundamentos da psicologia cultural: mundos da mente, mundos da vida. Porto Alegre, RS: Artemed.).

As relações de cuidado são, portanto, dispositivos de regulação pessoal e cultural que funcionam ou operam por meio do desenvolvimento de estruturas e processos, comumente tomados como apropriados desde as lentes socioculturais. Estas lentes, por sua vez, participam da conformação de sentidos que o cuidador estabelece junto e sobre o paciente diagnosticado com TEA.

Existe uma linha tênue que separa o cuidado que promoverá, na dinâmica e crescente complexidade estabelecida entre sustentar/conter, reconhecer, interpelar/reclamar e reservar, à pessoa de cuidado e à agência de cuidados capacidades de se estabelecer e se desenvolver de modo saudável diante das demandas de vida. Quando em doses erradas, a intervenção pode acarretar um aprisionamento tanto da pessoa de cuidado quanto do agente de cuidados na relação. Essa linha tênue não diz respeito ao abandono dos processos vinculados ao cuidado, ao contrário, aponta para saber a dose certa de reserva na relação com os outros tantos envolvidos em tais processos. Em outras palavras, trata-se de saber seu posicionamento e seu lugar diante daquilo que se destaca como valor cultural de responsabilidade ética em relações de cuidado.

Nessa medida, consideramos que todas as pessoas estão guiadas por balizas culturais advindas das relações que estabelecem com o tecido social que as envolve (Valsiner, 1998Valsiner, J. (1998). The guided mind: a sociogenetic approach to personality. Cambridge, MA: Harvard University Press.), ou seja, utilizando mecanismos semiótico-culturais de autorregulação. Contudo é suposto que a pessoa diagnosticada com TEA possui restrições orgânico-corporais que a impedem de lançar mão de mecanismos semiótico-culturais de autorregulação, da mesma maneira que o faz pessoas que não apresentam tal rota de desenvolvimento (Whitman, 2015Whitman, T. L. (2015). O desenvolvimento do autismo: social, cognitivo, linguístico, sensório-motor e perspectivas biológicas. São Paulo, SP: M. Books.).

É neste ponto, então, que relações de cuidado assumem seu papel e função enquanto aquelas que irão estabelecer, criar e manter as possibilidades de regulação semiótico-cultural. Porém podem ganhar propriedades relacionais e funcionais que podem exceder os limites humanos do cuidado.

Cabe ao agente de cuidados oferecer ao objeto de seu cuidado um espaço vital desobstruído, não-saturado por sua presença e seus fazeres. É neste espaço vital, que o cuidador deixa livre e vazio - sendo sua tarefa justamente a de protegê-lo contra a presença excessiva de objetos e representações -, que o sujeito poderá exercitar sua capacidade para alucinar, sonhar, brincar, pensar e, mais amplamente, criar o mundo na sua medida e segundo suas possibilidades. A base de todo o movimento é exatamente o da retirada estratégica do agente cuidador: ele se mantém em reserva para convocar à ação, ou seja, dar ensejo à atividade criativa. (Figueiredo, 2007Figueiredo, L. C. M. (2007). A metapsicologia do cuidado. Psychê, XI(21), 13-30., p. 22)

Isso aponta a necessidade de termos um olhar cuidadoso e criterioso sobre a pessoa diagnosticada com TEA, desde fatores biopsicossociais, mas focalizando a relação dialógico-recursiva que se dá entre essas pessoas e toda a rede de cuidados às quais se submetem, bem como com a cultura, destacando, com isso, o caráter importante das discussões sobre relações Eu-Outro-Mundo trabalhadas no CSC em psicologia.

Portanto a responsabilidade e conduta ética do profissional que se propõe a fazer parte de relações de cuidado com pessoas diagnosticadas com TEA se configura como uma dinâmica relacional que envolve o se aproximar dessa pessoa, criar formas e caminhos para que esta possa se desenvolver diante de suas demandas de vida, e também envolve a reserva do profissional em relação à função que ocupa de regulação semiótico-cultural na vida da pessoa diagnosticada com TEA.

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  • 1
    Processos terapêutico-educacionais destacam propriedades altamente relevantes incutidos nas relações Eu-Outro-Mundo uma vez que a construção, manutenção e transformação de estruturas e processos na relação pessoa-cultura apontam para a capacidade das pessoas de, seletivamente, apreenderem aspectos tanto do outro quanto da cultura quando estão em relação com outras culturas ou entre diferentes gerações dentro de uma cultura (Freitas & Guimarães, 2013Freitas, D. F. C. L. (2013). Um estudo sobre o processo de transmissão cultural [Dissertação de Mestrado]. Universidade de São Paulo, São Paulo, SP. Recuperado de https://bit.ly/3gAhZLD
    https://bit.ly/3gAhZLD...
    ).
  • 2
    Whitman (2015Whitman, T. L. (2015). O desenvolvimento do autismo: social, cognitivo, linguístico, sensório-motor e perspectivas biológicas. São Paulo, SP: M. Books.) destaca nove domínios e processos que se configuram como possibilidades abrangentes de alterações no desenvolvimento de uma pessoa diagnosticada com TEA em comparação com o que é esperado no desenvolvimento típico de uma pessoa, são eles: sensorial, motor, estimulação/ativação/emoção, cognição, interação social, liguagem/comunicação, autorregulação, problemas comportamentais, características físicas/problemas médicos.
  • 3
    Figueiredo (2008Figueiredo, L. C. M. (2008). Revisitando as psicologias: da epistemologia à ética das práticas e discursos psicológicos. São Paulo, SP: Vozes.) ao discutir a noção de ética, afirma que ela se relaciona com o modo das pessoas habitarem o mundo; num plano etimológico, ethos - o objeto da ética - refere-se tanto aos “costumes e hábitos como à morada” (p. 68).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Out 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    07 Fev 2019
  • Revisado
    08 Jan 2021
  • Aceito
    10 Ago 2021
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