Resumos
No presente estudo pretendeu-se verificar a sensibilidade toxicológica e especificidade do Teste de Microfixação de Complemento (MCF) na detecção de toxinas botulínicas C e D no sobrenadante de cultivos bacterianos e em fígados de camundongos inoculados com doses letais e subletais. As toxinas foram produzidas em meio de cultura Hemoline, tituladas através da determinação da DL50 pelo Bioensaio em Camundongo e diluídas nas concentrações de 10, 1, 0,1, 0,01 e 0,001 DL50. Desta forma, foram utilizadas em dois modelos experimentais, onde foi determinada a sensibilidade toxicológica do MCF no sobrenadante do meio de cultura com as diluições descritas acima e ainda em extratos hepáticos de camundongos com peso corporal de 20g, inoculados com as mesmas diluições. A tentativa de evidenciação das toxinas botulínicas nos extratos hepáticos de camundongos foi realizada através da sua extração após a morte pela administração das doses letais e ainda pelo sacrifício dos animais inoculados com doses subletais, em intervalos de 5 dias. Os resultados evidenciaram uma sensibilidade toxicológica para o MCF de 100% para os dois tipos de toxinas ao nível de 0,01 DL50, quando testados os sobrenadantes de meio de cultura, portanto 100 vezes superior ao Bioensaio em Camundongo. A sensibilidade toxicológica do MCF, quando examinados extratos hepáticos de camundongos inoculados com 1 e 10 DL50 de toxinas botulínicas C e D, foi inferior, com valores de 100, 80, 89 e 72%, respectivamente. Pelo teste foi possível detectar toxinas botulínicas tipos C e D nos extratos hepáticos de camundongos inoculados com doses subletais até 15 dias após a sua inoculação. A especificidade do MCF foi de 88 e 92%, quando testados extratos hepáticos de camundongos sadios, e confrontados com as antitoxinas C e D; e 100% no sobrenadante do meio de cultura. Os resultados apontam para uma possível utilização do teste como importante instrumento de pesquisa e ainda na eventual substituição dos testes in vivo pelas suas implicações éticas e limitações práticas.
Toxinas botulínicas; microfixação de complemento; sensibilidade; especificidade; camundongo
The toxicological sensitivity and specificity of the micro-complement fixation test (MCF) for the detection of botulinum toxins C and D were studied in supernatants of the bacterial cultures and in livers of mice inoculated with lethal and sublethal doses. Botulinum toxins C and D were produced in Hemoline culture medium, titered through the determination of LD50 by the mouse test and adjusted to dilutions of 10, 1, 0.1, 0.01 and 0.001 LD50. Two experimental models were used to determine the toxicological sensitivity of MCF in the supernatant of the culture medium with the dilutions described, and also in liver extracts of mice weighing 20 g and inoculated with the same dilutions. Detection of the botulinum toxins was attempted in liver extracts of mice which had received lethal doses of the respective toxins, and in others which had been inoculated with sublethal doses and were sacrificed in intervals of 5 days. The results show that the toxicological sensitivity of MCF, regarding the two types of toxins at the level of 0.001 LD50, was 100% when the supernatants of the culture medium were tested; this means that the sensitivity was 100 times higher than with the mouse test. The toxicological sensitivity of MCF in the liver extracts of mice inoculated with 1 and 10 LD50 of botulinum toxins C and D was inferior, giving values of 100, 80, 89 and 72% respectively. By this test it was also possible to detect botulinum toxins type C and D in liver extracts of mice inoculated with sublethal doses, up to 15 days after the injection. The specificity of MCF was 88% and 92%, when liver extracts of healthy control mice were tested and when challenged with antitoxins C and D; and 100% when challenged with the supernatant of the culture medium. These results indicate that MCF could be of importance for research and could substitute in vivo tests.
Botulinum toxins; micro-complement fixation test; sensitivity; specificity; mouse test
Sensibilidade toxicológica e especificidade do teste de microfixação de complemento na detecção de toxinas botulínicas C e D em meio de cultura e fígado de camundongos1 1 Aceito para publicação em 27 de janeiro de 1998. Trabalho realizado com auxílio da FAPESP.
Edna A. Menegucci2 2 Aluna de Pós-graduação em Medicina Veterinária, Área de Concentração em Medicina Veterinária Preventiva, Unesp, FCAVJ, Rod. Carlos Tonanni, Km 5, Jaboticabal, SP 14870-000. , Iveraldo S. Dutra3 3 Departamento de Apoio, Produção e Saúde Animal, Unesp-Campus de Araçatuba, Curso de Medicina Veterinária, Caixa Postal 533, Araçatuba, SP 16015-050; bolsista do CNPq (305967/85-1). e Jürgen Döbereiner4 4 Projeto Sanidade Animal Embrapa/UFRRJ, Km 47, Seropédica, RJ 23851-970; bolsista do CNPq (309294/88-1).
ABSTRACT.- Menegucci E.A., Dutra I.S. & Döbereiner J. 1998. [Toxicological sensitivity and specificity of the micro-complement fixation test for the detection of botulinum toxins C and D in culture medium and liver of mice.] Sensibilidade toxicológica e especificidade do teste de microfixação de complemento na detecção de toxinas botulínicas C e D em meio de cultura e fígado de camundongo. Pesquisa Veterinária Brasileira 18(2):47-52. Depto Apoio, Produção e Saúde Animal, Unesp-Campus de Araçatuba, Cx. Postal 533, Araçatuba, SP 16015-050, Brazil.
The toxicological sensitivity and specificity of the micro-complement fixation test (MCF) for the detection of botulinum toxins C and D were studied in supernatants of the bacterial cultures and in livers of mice inoculated with lethal and sublethal doses. Botulinum toxins C and D were produced in Hemoline culture medium, titered through the determination of LD50 by the mouse test and adjusted to dilutions of 10, 1, 0.1, 0.01 and 0.001 LD50. Two experimental models were used to determine the toxicological sensitivity of MCF in the supernatant of the culture medium with the dilutions described, and also in liver extracts of mice weighing 20 g and inoculated with the same dilutions. Detection of the botulinum toxins was attempted in liver extracts of mice which had received lethal doses of the respective toxins, and in others which had been inoculated with sublethal doses and were sacrificed in intervals of 5 days. The results show that the toxicological sensitivity of MCF, regarding the two types of toxins at the level of 0.001 LD50, was 100% when the supernatants of the culture medium were tested; this means that the sensitivity was 100 times higher than with the mouse test. The toxicological sensitivity of MCF in the liver extracts of mice inoculated with 1 and 10 LD50 of botulinum toxins C and D was inferior, giving values of 100, 80, 89 and 72% respectively. By this test it was also possible to detect botulinum toxins type C and D in liver extracts of mice inoculated with sublethal doses, up to 15 days after the injection. The specificity of MCF was 88% and 92%, when liver extracts of healthy control mice were tested and when challenged with antitoxins C and D; and 100% when challenged with the supernatant of the culture medium. These results indicate that MCF could be of importance for research and could substitute in vivo tests.
INDEX TERMS: Botulinum toxins, micro-complement fixation test, sensitivity, specificity, mouse test.
RESUMO.- No presente estudo pretendeu-se verificar a sensibilidade toxicológica e especificidade do Teste de Microfixação de Complemento (MCF) na detecção de toxinas botulínicas C e D no sobrenadante de cultivos bacterianos e em fígados de camundongos inoculados com doses letais e subletais. As toxinas foram produzidas em meio de cultura Hemoline, tituladas através da determinação da DL50 pelo Bioensaio em Camundongo e diluídas nas concentrações de 10, 1, 0,1, 0,01 e 0,001 DL50. Desta forma, foram utilizadas em dois modelos experimentais, onde foi determinada a sensibilidade toxicológica do MCF no sobrenadante do meio de cultura com as diluições descritas acima e ainda em extratos hepáticos de camundongos com peso corporal de 20g, inoculados com as mesmas diluições. A tentativa de evidenciação das toxinas botulínicas nos extratos hepáticos de camundongos foi realizada através da sua extração após a morte pela administração das doses letais e ainda pelo sacrifício dos animais inoculados com doses subletais, em intervalos de 5 dias. Os resultados evidenciaram uma sensibilidade toxicológica para o MCF de 100% para os dois tipos de toxinas ao nível de 0,01 DL50, quando testados os sobrenadantes de meio de cultura, portanto 100 vezes superior ao Bioensaio em Camundongo. A sensibilidade toxicológica do MCF, quando examinados extratos hepáticos de camundongos inoculados com 1 e 10 DL50 de toxinas botulínicas C e D, foi inferior, com valores de 100, 80, 89 e 72%, respectivamente. Pelo teste foi possível detectar toxinas botulínicas tipos C e D nos extratos hepáticos de camundongos inoculados com doses subletais até 15 dias após a sua inoculação. A especificidade do MCF foi de 88 e 92%, quando testados extratos hepáticos de camundongos sadios, e confrontados com as antitoxinas C e D; e 100% no sobrenadante do meio de cultura. Os resultados apontam para uma possível utilização do teste como importante instrumento de pesquisa e ainda na eventual substituição dos testes in vivo pelas suas implicações éticas e limitações práticas.
TERMOS DE INDEXAÇÃO: Toxinas botulínicas, microfixação de complemento, sensibilidade, especificidade, camundongo.
INTRODUÇÃO
O botulismo é uma neuroparalisia causada pela ação de toxinas de natureza protéica produzidas por Clostridium botulinum, acometendo não sòmente os seres humanos, como também várias outras espécies de mamíferos, aves e peixes (Seifert & Böhnel 1994). As toxinas C e D são consideradas responsáveis pela intoxicação em bovinos e ovinos em diversos países (Thomas 1991, Döbereiner et al. 1992, Coetzer et al. 1994). O Bioensaio em Camundongo, seguido da soroneutralização com antitoxinas padrões homólogas, é internacionalmente aceito para a titulação e tipificação das toxinas botulínicas (Smith 1977). A baixa sensibilidade do teste em camundongo, associada às questões éticas da experimentação com animais, faz com que novas alternativas sejam verificadas no sentido de se otimizar o diagnóstico da intoxicação. Diversas tentativas neste sentido tem sido realizadas (Takahachi et al. 1990). Weiss & Weiss (1988) desenvolveram o Teste de Microfixação de Complemento (MCF) e verificaram preliminarmente a sua superioridade quando comparado ao Bioensaio em Camundongo. Dutra et al. (1993) utilizaram o MCF no diagnóstico do botulismo em bovinos no Brasil e ressaltaram a importância da verificação da sua sensibilidade e especificidade tanto toxicológica quanto epidemiológica.
O presente trabalho pretendeu verificar a sensibilidade toxicológica do MCF, utilizando-se como base diferentes diluições de toxinas botulínicas C e D, obtidas em cultivo bacteriano, e em extratos hepáticos de camundongos inoculados experimentalmente. Da mesma maneira, verificou a sua especificidade utilizando-se de amostras de fígado de camundongos sadios e sobrenadante proveniente de meio de cultura não inoculado.
MATERIAL E MÉTODOS
Amostras de Clostridium botulinum tipos C e D
Foram utilizadas amostras de Clostridium botulinum produtoras de toxinas dos tipos C e D, liofilizadas e mantidas na bacterioteca do Laboratório de Enfermidades Infecciosas dos Animais, Departamento de Apoio, Produção e Saúde Animal da Unesp-Campus de Araçatuba, São Paulo. Estas amostras foram tipificadas pelo Instituto Pasteur, Paris, França e gentilmente cedidas pelo Dr. Hans-Erich Weiss, do Instituto de Diagnóstico de Heidelberg, República Federal da Alemanha.
Cultivo para obtenção das toxinas botulínicas tipos C e D
As amostras liofilizadas de Clostridium botulinum C e D foram suspendidas em uma solução de 0,9% de NaCl, estéril e inoculadas em meio de cultura líquido "Hemoline"5 5 Laboratório Becton-Dickinson, Heidelberg, República Federal da Alemanha. . Após 7 dias de incubação a 35°C, os sobrenadantes das culturas foram centrifugados, filtrados em Millipore (0,22 mm) e testados preliminarmente, em diluições de 1:10 e 1:100, quanto à sua toxidez. Para tal finalidade foram inoculados camundongos com peso corporal em torno de 20g; foi considerada amostra de boa toxidez aquela capaz de matar camundongos entre 16-20 horas, quando inoculadas na quantidade de 0,5 ml via intraperitoneal. Os preparados tóxicos foram mantidos sob refrigeração (-4°C) até a sua utilização. A confirmação da tipificação das toxinas utilizadas foi realizada pela soroneutralização com descrito por Smith (1977).
Determinação da DL50 em camundongo
A titulação da toxicidade dos preparados obtidos dos cultivos das amostras de C. botulinum C e D foi realizada pela inoculação via intraperitoneal de 0,5 ml, utilizando-se de diluições decimais a partir dos preparados originais, em camundongos brancos suiços com peso corporal de 20g e com período de observação de 96 h . Para cada diluição foram inoculados 5 camundongos. A DL50 foi determinada pela correlação entre a quantidade de toxina e a taxa entre mortos (50%)/sobreviventes, de acordo com o método de Reed & Muench (1938).
Antitoxinas botulínicas C e D
As antitoxinas botulínicas C e D padrão internacional foram obtidas junto ao "Statens Seruminstitut", Copenhagen, Dinamarca, e diluidas conforme o seu propósito: em tampão gelatina-fosfato, pH 6,6, quando utilizada para a soroneutralização em camundongo, ou tampão Veronal, quando empregada no teste de fixação de complemento. As antitoxinas C e D foram reconstituídas na concentração de 1 UI por 0,1 ml, conforme Weiss & Weiss (1988). Até a sua utilização, foram armazenadas sob refrigeração (-4°C) em alíquotas. Para uso no Teste de Fixação de Complemento, após diluição 1:5 em Tampão Veronal pronto para uso foi realizada a inativação do complemento por 30 min a 56°C em Banho-Maria.
Preparo dos antígenos para verificação da sensibilidade e especificidade
A partir dos filtrados dos cultivos. Após a titulação dos preparados de toxinas, calculados em DL50, os antígenos C e D foram diluídos de maneira a se obter as concentrações de 10 DL50, 1 DL50, 0,1 DL50, 0,01 DL50 e 0,001 DL50 em 25 ml de Tampão Veronal ou 0,5 ml em Tampão fosfato glicerinado. Desta forma, foram considerados como antígenos pronto para uso e empregados para a verificação da sensibilidade toxicológica no teste de microfixação de complemento ou para a inoculação em grupos de camundongos, respectivamente. Para a verificação da especificidade, dentro do modelo experimental empregado, foi utilizado meio de cultura não inoculado, mas processado nas mesmas condições que os inoculados. As mesmas diluições foram realizadas, tal como para a obtenção das concentrações de toxinas estabelecidas anteriormente. Como controle negativo tanto para a determinação da sensibilidade como da especificidade foram utilizados os preparados como descrito para a especifidade.
A partir do fígado de camundongo. Camundongos com peso corporal de aproximadamente 20 g foram inoculados via intraperitoneal com preparados das toxinas botulínicas C e D, nas concentrações de 10 DL50, 1 DL50, 0,1 DL50, 0,01 DL50 e 0,001 DL50/ 0,5 ml. Foram inoculados grupos constituidos por 25 camundongos para cada diluição e tipo de toxina. Dos que morreram no período de observação de 96h, foram retirados os fígados para a tentativa de extração de toxina. Os camundongos sobreviventes foram sacrificados em períodos distintos, com a mesma finalidade. A obtenção dos antígenos para uso no Teste de Microfixação de Complemento foi realizada pela maceração das amostras de fígado em cadinho. Para facilitar a homogeneização foi utilizada uma solução de Tampão Veronal, na proporção de 1:2. Os macerados foram mantidos por 24 h sob refrigeração (4-8°C), para possibilitar a extração de eventual toxina botulínica, segundo procedimento recomendado por Seifert & Böhnel (1994). Após duas centrifugações (3000 g ), sob refrigeração (4°C) por 20 minutos, os mesmos foram levados a Banho-Maria (56°C) por 30 minutos para inativação do complemento, seguindo-se à filtração em filtro Millipore (45 mm). Após estes procedimentos, os materiais foram considerados antígenos pronto para uso no teste. Quando não processados imediatamente, os mesmos foram submetidos novamente à inativação do complemento, centrifugação e filtração. Para a verificação da especificidade em amostras de fígado, foram utilizados 50 camundongos sadios, com as mesmas características dos descritos acima, e inoculados com sobrenadante do meio de cultura diluido e estéril. Para a obtenção das amostras de fígado os camundongos foram sacrificados 96 horas após a inoculação do sobrenadante. Os mesmos procedimentos relacionados quando da eventual extração de toxina botulínica foram observados. Os materiais foram confrontados com as Antitoxinas C e D no MCF. Como controle negativo foram utilizados fígados de camundongos sadios.
Teste de Fixação de Complemento em Microplacas
Foram observados os procedimentos descritos por Weiss & Weiss (1988) foram observados.
Determinação da sensibilidade e especificidade
A sensibilidade toxicológica do MCF foi determinada com base em dois modelos experimentais: um em que a tentativa de detecção das toxinas tipos C e D foi realizada em sobrenadante de meio de cultura, com concentrações previamente conhecidas, e outro onde a tentativa foi realizada em amostras de fígado de camundongos experimentalmente inoculados. Os critérios observados foram os estabelecidos por Martin et al. (1988), sendo os resultados expressos em percentagem. A especificidade da MCF foi realizada com base no modelo experimental proposto, ou seja examinando-se sobrenadante estéril do meio de cultura, processado nas mesmas condições que para a determinação da sensibilidade e em extrato hepático de camundongos sadios, observando-se também os critérios enunciados por Martin et al. (1988).
RESULTADOS
Os resultados do cálculo da DL50 para as toxinas produzidas pelas amostras de Clostridium botulinum utilizadas no presente trabalho foram de 8,0 x 104 DL50/ml para o tipo C e 4,0 x 104 DL50/ml para o tipo D. Através do teste de neutralização com as antitoxinas homólogas pode-se confirmar a identificação previamente estabelecida.
Os resultados contidos no Quadro 1 evidenciam a sensibilidade toxicológica do Teste de Microfixação de Complemento (MCF), quando examinadas as toxinas C e D obtidas através do cultivo bacteriano e diluídas na razão decimal. Pode-se verificar que a sensibilidade foi de 100% para os dois tipos de toxinas ao nível de 0,01 DL50, portanto 100 vezes superior ao nível mínimo detectado pelo Bioensaio em Camundongo.
O Quadro 2 mostra a sensibilidade toxicológica do MCF quando da análise de amostras de fígado de camundongos inoculados com toxina tipo C e mortos dentro de um período de 96 h ou sacrificados em intervalos regulares para a tentativa de evidenciação de toxina botulínica em intervalos de tempo distintos. Quando inoculados com 10 DL50, todos 25 camundongos morreram dentro do período, sendo que 80% apresentaram reação considerada positiva no teste. Dos animais inoculados com 1 DL50, dez morreram no período de observação de 96 h e foram positivos no MCF. A sensibilidade para este limiar de toxina inoculada foi de 100%, quando desconsiderado os outros 50% que foram sacrificados posteriormente. Foi possível detectar toxina botulínica tipo C pelo MCF em um dos camundongos sacrificados, até 15 dias após a inoculação. Os grupos inoculados com toxina abaixo da DL50 não apresentaram reatividade no MCF após 10 dias da inoculação. No grupo de camundongos inoculados com 0,01 DL50, e que não apresentaram sintomas de botulismo ou morreram, foi detectada toxina tipo C no fígado 5 dias após a inoculação, desaparecendo qualquer reação positiva no MCF após este período. A percentagem total de positivos no Teste, quando calculados globalmente dentro do modelo de estudo proposto e para as diluições decimais decrescentes de toxina tipo C inoculadas, foram de 80, 60, 28 e 20%, respectivamente. As amostras de fígado de camundongos inoculados com 0,001 DL50 foram todas negativas no MCF.
Na determinação da sensibilidade toxicológica, através da análise de amostras de fígado de camundongos inoculados com toxina tipo D, os resultados também apresentaram uma certa linearidade, conforme demonstra o Quadro 3. Desta forma, a sensibilidade foi de 72 e 89% para as amostras de fígado correspondentes às concentrações de 10 e 1 DL50, respectivamente. Até 15 dias após terem sobrevivido à inoculação de 1 DL50, dois dos três camundongos examinados apresentaram reação positiva no MCF. Da mesma forma, foi possível detectar toxina botulínica tipo D no fígado de camundongos inoculados até com a diluição de 0,01 DL50, 5 dias após o início do experimento. Os resultados percentuais globais, calculados para as diluições decrescentes utilizadas foram de 72, 68, 32, 20 e 0%, respectivamente, quando consideradas também as concentrações abaixo da DL50 e as amostras de fígado dos camundongos sobreviventes e examinados até 25 dias após a inoculação.
O Quadro 4 mostra a especificidade do MCF quando considerados para efeito de análise o extrato hepático de camundongos sadios inoculados com placebo e o sobrenadante do meio de cultura. Os resultados apontam uma especificidade de 100% quando examinados o sobrenadante do meio de cultura não inoculado e testados frente às antitoxinas C e D. Quando examinados os extratos hepáticos de camundongos os valores obtidos foram de 88 e 92%, testados frente às antitoxinas C e D, respectivamente.
DISCUSSÃO
No modelo experimental utilizado para quantificar a sensibilidade toxicológica do Teste de Microfixação de Complemento (MCF), utilizando-se de toxinas botulínicas C e D produzidas em meio de cultura ¨Hemoline¨ e diluídas na razão decimal da DL50 , de maneira a conterem quantidades decrescentes de toxinas, os resultados contidos no Quadro 1 revelaram uma sensibilidade de 100% até o nível de diluição de 0,01 DL50. Isto posto, e considerando o modelo experimental empregado, pode-se concluir que a sensibilidade toxicológica do MCF foi pelo menos 100 vezes superior ao Bioensaio em Camundongo, quando testadas as toxinas C e D frente às antitoxinas homólogas. A superioridade do teste foi descrita inicialmente por Weiss & Weiss (1988), quando verificaram em estudos preliminares através da inoculação de toxina botulínica tipo C em coelho e camundongo e cálculos indiretos, uma superioridade de 40 vezes do MCF quando comparado com o Bioensaio.
A verificação da eficácia do teste na detecção de toxinas botulínicas C e D, quando inoculadas previamente em camundongos e utilizando-se da tentativa de evidenciação das toxinas nos seus fígados em períodos distintos, revelaram alguns dados importantes. Segundo Seifert & Böhnel (1994), o fígado de animais intoxicados naturalmente pode apresentar níveis de toxina ainda detectáveis pelo Bioensaio após a sua morte, constatação esta também efetuada por Dutra et al. (1993) através da utilização do MCF. No modelo experimental empregado para verificar a eficácia do teste e ao mesmo tempo a dinâmica na detecção das toxinas C e D após a inoculação em camundongos, os resultados demonstraram que as sensibilidades foram de 80 e 72%, quando examinadas amostras de fígado dos grupos de animais que receberam 10 DL50 e de 100 e 89% para os grupos que foram inoculados com 1 DL50, respectivamente (Quadros 2 e 3). Os animais sobreviventes que receberam 1 DL50 e ainda os grupos inoculados com doses subletais das toxinas foram sacrificados em períodos distintos para se verificar até quando e em que níveis permanecem detectáveis as toxinas C e D no fígado de camundongos quando se utiliza o MCF. Os resultados apresentados no Quadro 2 demonstraram que foi possível detectar toxina botulínica tipo C no fígado de todos camundongos sacrificados aos 5 e 10 dias e ainda em 1 material, de 3 inoculados, após 15 dias do início dos trabalhos e inoculados com 1 DL50. Os fígados provenientes de camundongos inoculados com doses subletais de 0,1 e 0,01 DL50 apresentaram reações positivas ao teste até 10 e 5 dias, respectivamente. Não foi detectada toxina nos camundongos inoculados com 0,001 DL50.
Resultados semelhantes foram observados quando da tentativa de detecção de toxina botulínica tipo D. Aos 5, 10 e 15 dias após a inoculação dos camundongos com 1 DL50, ainda foi possível detectar toxina nos seus extratos hepáticos. Quando inoculados com 0,1 e 0,01 DL50 os resultados positivos foram observados ainda aos 10 e 5 dias, respectivamente. No grupo inoculado com a dose mínima utilizada não foi detectada toxina botulínica pelo MCF (Quadro 3). Quando comparados os resultados da detecção das toxinas C e D pelo MCF no extrato hepático de camundongos e no sobrenadante do meio de cultura, observa-se uma aparente uniformidade.
É importante ressaltar, no entanto, a variação nos resultados apresentados, principalmente quando da tentativa de detecção das toxinas botulínicas C e D nas amostras de fígado dos camundongos inoculados com doses letais e subletais. Os melhores índices foram obtidos quando testados extratos hepáticos de camundongos inoculados com 1 DL50, ou seja, 100% para a toxina tipo C (Quadro 2) e 89% para o tipo D (Quadro 3). As amostras dos animais inoculados com 10 DL50, apresentaram resultados inferiores. Isto poderia ser atribuído às características da Fixação de Complemento quando na presença de grandes quantidades de antígenos ou anticorpos. No entanto, os resultados do Quadro 1 não corroboram este raciocínio, uma vez que as amostras de sobrenadante continham proporcionalmente maiores quantidades de toxina embora utilizadas nas mesmas diluições. Com grande probabilidade a toxina inoculada se distribuiu nos 20 g de peso corporal dos animais da mesma forma que parcialmente agiu na musculatura esquelética provocando a morte dos camundongos. Uma vez tendo agido na sinápse neuromuscular a toxina perde o seu efeito biológico (Seifert & Böhnel 1994). Os sobrenadantes continham portanto as mesmas diluições em 25 ml, com toda toxina ativa biologicamente. Portanto, observaram-se variações na sensibilidade toxicológica do MCF, quando utilizado o modelo experimental em camundongo, que permanecem obscuras. Da mesma forma, foi observada uma excelente especificidade do MCF (100%) quando testados os sobrenadantes do meio de cultura, e valores inferiores (88 e 92% frente às antitoxinas C e D, respectivamente) quando testados os extratos hepáticos de camundongos inoculados com placebo (Quadro 4).
De relevância e interesse prático apresentam-se também importantes os resultados obtidos sobre a persistência das toxinas C e D em níveis detectáveis pelo MCF no fígado de camundongos inoculados com doses sub-letais de toxinas (Quadros 2 e 3). Dutra & Döbereiner (1996) detectaram toxina botulínica tipo C no fígado de bovinos clinicamente sadios e abatidos em matadouro, após sobreviverem a um surto da intoxicação. Com base nestes resultados, constatou-se que eventualmente podem ser encontradas toxinas botulínicas C e D no fígado de animais que receberam a DL50 e sobreviveram e ainda naqueles que receberam doses subletais
Inexistem estudos sistemáticos sobre a dinâmica da toxina botulínica quando inoculada em níveis subletais em animais, mesmo porque o teste in vitro anteriormente considerado mais próximo em nível de sensibilidade do Bioensaio em Camundongo, que detecta 1 DL50, era o ELISA (Shone et al. 1986), com capacidade 9 vezes inferior. Desta forma, os resultados apresentados são inéditos e apontam para uma possível utilização do teste não somente como importante instrumento na pesquisa sobre as toxinas botulínicas C e D, mas na eventual substituição do Bioensaio e Neutralização em Camundongo; além de exigir pelo menos 6-7 dias para a sua realização estes testes demandam um enorme número de camundongos, tendo portanto implicações éticas além das suas limitações práticas.
CONCLUSÕES
Considerando os resultados obtidos no presente trabalho, pode-se concluir que:
A sensibilidade toxicológica do MCF, quando utilizadas toxinas botulínicas tipos C e D produzidas em meio de cultura e testadas com antitoxinas homólogas, foi pelo menos 100 vezes superior ao nível mínimo de detecção do Bioensaio em Camundongo.
A sensibilidade toxicológica do MCF, quando examinados extratos hepáticos de camungondos inoculados com 1 e 10 DL50 de toxinas botulínicas C e D, foram inferiores ao modelo experimental anterior, registrando-se valores de 100, 80, 89 e 72%, respectivamente.
Foi possível detectar pelo MCF toxinas botulínicas tipos C e D nos extratos hepáticos de camundongos inoculados com 1 DL50 e sobreviventes, até 15 dias após a inoculação.
Até 10 dias após a inoculação foi possível detectar toxinas botulínicas tipos C e D pelo MCF nos extratos hepáticos de camundongos inoculados com doses subletais.
Até 5 dias após a inoculação foi possível detectar toxinas botulínicas tipos C e D pelo MCF nos extratos hepáticos de camundongos inoculados com dose subletal de 0,001 DL50.
A especificidade do MCF foi inferior quando testados extratos hepáticos de camundongos sadios (88 e 92% quando confrontados com as antitoxinas C e D, respectivamente), e comparada com os resultados obtidos pela utilização do teste no sobrenadante do meio de cultura (100% frente às duas antitoxinas).
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
25 Fev 2000 -
Data do Fascículo
Abr 1998