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Controvérsias sobre o atomismo no século XIX

Controversies on atomism in the nineteenth century

Resumo

The present article reviews aspects of the controversy in nineteenth-century physical sciences between atomists and anti-atomists, and the scientific, philosophical and methodological aspects about the atomic debates. The meanings of the atom concept used by physicists and chemists in that century are also discussed.

atomism; scientific controversy; History of Chemistry


atomism; scientific controversy; History of Chemistry

ASSUNTOS GERAIS

Controvérsias sobre o atomismo no século XIX

Controversies on atomism in the nineteenth century

Maria da Conceição Marinho Oki* * e-mail: marinhoc@ufba.br

Departamento de Química Geral e Inorgânica, Universidade Federal da Bahia, 40170-290 Salvador - BA, Brasil

ABSTRACT

The present article reviews aspects of the controversy in nineteenth-century physical sciences between atomists and anti-atomists, and the scientific, philosophical and methodological aspects about the atomic debates. The meanings of the atom concept used by physicists and chemists in that century are also discussed.

Keywords: atomism; scientific controversy; History of Chemistry.

INTRODUÇÃO

Embora muitos historiadores da ciência tenham escrito sobre vários aspectos de controvérsias científicas que envolveram atomistas e anti-atomistas no século XIX, este é um tema pouco conhecido dos estudantes e professores de Química. Uma evidência para esta afirmação pode ser encontrada na insignificante abordagem desta questão na maior parte dos livros didáticos de Química Geral, onde o atomismo daltoniano é apresentado.

Na educação científica tradicional, uma abordagem dogmática sobre a ciência tem sido predominante, existindo pouco espaço para que controvérsias científicas sejam apresentadas. Entretanto, uma das mais interessantes controvérsias da História das Ciências aconteceu no século XIX e envolveu atomistas e anti-atomistas, justificando os altos e baixos da teoria atômica naquele período.

Esta controvérsia não resultou apenas da interpretação dos fatos ou da ausência de evidências para a existência de átomos, envolveu múltiplos aspectos: ontológicos, metodológicos e epistemológicos. Investigando esta questão, a historiadora da ciência americana Mary Jo Nye explicitou as dificuldades da comunidade científica para perceber a amplitude das dúvidas existentes, que estavam relacionadas a aspectos epistemológicos e metodológicos subjacentes aos debates sobre a possível realidade do átomo:

"O que muitas vezes tem sido omitido nas análises sobre os ásperos debates (sobre o atomismo) é que a crise na comu nidade científica do século passado (século XIX) não dizia respeito apenas a evidência e a interpretação, mas também, a metodologia científica e a epistemologia. Em questão não estavam apenas a teoria atômica mas o objetivo e a estrutura da teoria física". 1

Durante o século XIX, a idéia de átomo foi considerada por grande parte da comunidade científica como uma hipótese fundamental para uma interpretação quantitativa de dados empíricos, mesmo existindo dúvidas e especulações sobre a realidade dos átomos que, em parte eram de ordem filosófica. O grande desafio a ser enfrentado pelos atomistas para tornar a hipótese atômica amplamente aceitável era concretizar a necessária articulação entre as dimensões macroscópica e microscópica.

Este episódio da História da Ciência ilustra a dificuldade de cientistas e filósofos de submeterem certas "imagens de natureza" à comprovação empírica. Tais imagens incluem "os constituintes que são considerados últimos ou essenciais da realidade, suas modali dades de interação, bem como os processos fundamentais dos quais participam".2

O ATOMISMO DALTONIANO: INICIANDO UM LONGO DEBATE

A origem da hipótese atômica de Dalton é um episódio que tem demandado muita discussão pelos historiadores da Química, justificando a existência de várias versões. Nash3 identificou problemas com tais versões em função de três principais dificuldades: 1) o próprio Dalton apresentou três explicações contraditórias para a trajetória que originou a sua proposta teórica; algumas incoerências são identificadas no confronto das informações de diferentes fontes históricas; 2) os documentos contendo a sua teoria atômica sofreram alterações entre a apresentação pública e a publicação, para adaptá-los às novas descobertas, assim, a versão sobre a origem da sua teoria não pode tomar como base apenas a suposta seqüência de suas idéias e datas contidas nos registros; 3) muitos documentos foram destruídos durante a Segunda Guerra Mundial; as informações obtidas das anotações diárias feitas por Dalton em notebooks estão incompletas e carecem de datas importantes.

As idéias que levaram John Dalton (1766-1844) a sua hipótese atômica foram interpretadas, inicialmente, a partir de uma visão fortemente empirista, largamente aceita no século XIX e ainda hoje presente em alguns livros didáticos. Uma outra questão é o caminho indutivista proposto para o seu trabalho, considerado originário de problemas de Química Analítica. Contrariamente, o "contexto da descoberta" de Dalton parece ter seguido um percurso indireto e mais complexo, com relevante contribuição da sua intuição teórica.4 Neste episódio torna-se importante à distinção entre a "ciência privada", ou seja, como surge o problema na mente do cientista e como ele tenta resolvê-lo, além de outro importante aspecto da atividade científica, como as idéias são justificadas, sendo aceitas ou rejeitadas pela comunidade científica, a ciência pública.5 Esta questão está relacionada com a distinção entre os dois contextos: da descoberta e da justificação, preocupação que teria sido sistematizada por Hans Reichenbach, filósofo alemão de orientação neo-positivista.6 A discussão apresentada por ele sobre esta questão teve como objetivo distinguir o "sistema do conhecimento" e os "métodos de aquisição de conhecimento", tendo como pressuposto a dicotomização dos dois contextos.

A crítica à separação entre tais contextos e a não inclusão no âmbito filosófico do contexto da descoberta, o que aconteceu em meados do século XX, acompanhou as críticas ao empirismo lógico. Alguns filósofos, a exemplo de Thomas Kuhn7 e Paul Feyerabend8 passaram a defender o envolvimento desses contextos, questionando posições ortodoxas assumidas em relação à distinção entre eles; reconhecendo o conflito geralmente presente entre a descoberta e a justificação. Ao admitir a possibilidade de que os dois contextos sejam identificados, eles defenderam a possibilidade de articulação entre ambos, atribuindo-lhes a mesma importância. Kuhn considerava de grande relevância para a Filosofia da Ciência os detalhes relacionados a um avanço científico.

A historiografia da ciência contemporânea reconhece a complexidade envolvida no contexto de uma descoberta científica e a possibilidade de interferência de fatores acientíficos e não racionais neste processo. A compreensão dos fatores psicológicos, sociológicos, culturais entre outros, que levam à proposição de uma teoria científica, e dos procedimentos e negociações para a sua comprovação e validação são questões fundamentais no estudo de qualquer episódio da História da Ciência, adquirindo uma maior importância no estudo de controvérsias científicas.

Os primeiros trabalhos de Dalton envolveram estudos da atmosfera, já que ele sempre demonstrou grande interesse por meteorologia e a física do estado gasoso. Em 1793, publicou o trabalho "Meteorological Observations and Essays" e, na década seguinte, continuou estudando misturas gasosas e absorção de gases em água; tais estudos o levaram a propor a "lei das pressões parciais dos gases" e a sua hipótese atômica.

A sua explicação para as misturas entre os gases teve uma ampla divulgação tendo recebido críticas, assim como elogios de importantes químicos europeus. Para defender suas idéias e aprimorá-las, Dalton retoma a hipótese atômica, o que parece ter acontecido através de dois caminhos: investigando métodos analíticos para determinação das proporções de combinação de gases na formação de certos compostos e usando sua teoria para explicar a dissolução de gases na água.

Dalton acreditava que a absorção de gases na água era um processo físico, não envolvendo afinidade química e que dependia dos pesos relativos das partículas que formavam cada gás. No trabalho em que publicou estas idéias, em novembro de 1805, a sua tabela de pesos atômicos (massas atômicas relativas) foi apresentada oficialmente à comunidade científica. No trecho a seguir ele expressava algumas dessas idéias.

"[...]Por que a água não recebe um volume semelhante de cada tipo de gás? Considerei devidamente essa questão e, embora não seja capaz de me satisfazer completamente, estou quase persuadido de que essa circunstância depende do peso e do número das partículas últimas dos diversos gases: aqueles cujas partículas são mais leves e simples são os menos absorvíveis; os outros serão mais, à medida que aumentam de peso e de complexidade. Uma investigação sobre os pesos relativos das partículas últimas dos corpos é um assunto, até onde eu sei, inteiramente novo. Eu venho, ultimamente, empreendendo essa investigação com notável sucesso. O fundamento não pode aqui ser discutido neste trabalho, mas vou apenas anexar os resultados, até o ponto em que parecem verificados por meus experimentos [...]".9

Para determinar os pesos atômicos das "últimas partículas", de modo inovador, Dalton combinou elementos cujos pesos queria determinar com um elemento de referência, o hidrogênio, escolhido como padrão e ao qual atribuiu peso unitário. A sua maior dificuldade foi assumir de forma arbitrária, o número de átomos de cada elemento envolvido na combinação. Dalton utiliza o termo "última partícula" para se referir tanto aos átomos quanto às moléculas. Naquele período, os termos partícula, corpúsculo ou mesmo molécula eram preferidos à palavra átomo.

Ele adotou uma "regra da simplicidade", considerando que, quando existisse um único tipo de composto formado por dois elementos diferentes este seria binário, o que envolveria a combinação de apenas um átomo de cada elemento. Esta regra, segundo Dalton, resultava de circunstâncias físicas, uma vez que, um menor número de átomos combinados teria uma maior estabilidade mecânica. Qualquer outro composto que envolvesse novas combinações dos mesmos elementos deveria ter proporções distintas: 1:2 ou 1:3 ou outras, que envolvessem números inteiros e pequenos.

Nye10 considera que embora Dalton seja visto como sucessor de Lavoisier (1743-1794), seu trabalho está mais relacionado com idéias de personagens do século XVII, a exemplo de Newton (1643-1727) e Boyle (1627-1691). A explicação introduzida por Dalton sobre o comportamento dos gases atmosféricos contrariava um grupo de cientistas franceses, defensores da idéia que o vapor d'água e os gases nitrogênio e oxigênio se encontravam combinados quimicamente na atmosfera. Apesar disto, Dalton adotou como ponto de partida para suas determinações de pesos atômicos a tabela contendo 33 elementos, proposta por Lavoisier no seu "Traité Élémentaire de Chimie" (1789). Ele aprimorou o 'conceito de elemento' de Lavoisier, fornecendo-lhe uma fundamentação ontológica através da articulação deste conceito com o de átomo.

Mesmo reconhecendo a influência da filosofia mecanicista newtoniana no pensamento de Dalton, Bensaude-Vincent e Stengers11 consideram que o átomo daltoniano não é herdeiro dos átomos antigos, nem dos corpúsculos newtonianos; sua "reinvenção" e utilização aconteceram em outro contexto. A reelaboração do conceito possibilitou a compreensão dos átomos como unidades mínimas de combinação da matéria.

Dalton imaginava que as "últimas partículas" possuíam forma esférica e pesos diferentes, constituindo-se na menor quantidade de uma substância que ainda preservava as suas propriedades, uma perspectiva "substancialista". Cada átomo estaria envolvido por uma atmosfera de calor, formada de uma substância material fluida, o calórico,12 extremamente rarefeita e capaz de penetrar ou escapar de todo e qualquer lugar do espaço.

O calórico era fortemente atraído pela matéria e auto-repulsivo, entretanto Dalton admitiu, por princípio, que somente átomos idênticos se repeliam. Em seu importante livro publicado em 1808, "New System of Chemical Philosophy", o seu ponto de vista sobre esta questão foi assim apresentado: "Cada átomo de ambos ou de todos os gases de uma mistura deve ser o centro de repulsão para as partículas próximas do mesmo tipo, ignorando aquelas de outro tipo".13

Para explicar o fato da atmosfera não se separar em camadas de diferentes composições químicas e densidades, assim como a independência das pressões de diferentes gases que compunham as misturas gasosas, Dalton abandona a idéia original de Lavoisier que admitia uma repulsão universal dos calóricos e postula que só haveria repulsão entre átomos de um mesmo elemento. Estas suposições justificariam a não estratificação dos gases atmosféricos e a independência das pressões gasosas.14

Uma importante contribuição de Dalton à Química do século XIX foi um novo simbolismo para representação dos átomos e de suas combinações. Os átomos daltonianos eram representados através de círculos, traços e pontos; para as substâncias compostas, combinava símbolos usados para os 'átomos elementares'. Nestas representações Nye15 identificou concepções influenciadas pelo senso comum e com componentes de um realismo ingênuo.

Antes mesmo de Dalton publicar a primeira parte do "New System of Chemical Philosophy", o escocês Thomas Thomson (1773-1852), influente professor em Glasgow, iniciou a divulgação dessas idéias através da 3ª edição do seu importante livro, traduzido para o francês como "Système de Chimie", que introduziu o atomismo daltoniano na França.

As idéias de Dalton rapidamente se difundiram em revistas e livros científicos da época, suscitando algum acolhimento e também críticas. O grande problema foi a sua ousadia manifestada na determinação de pesos atômicos através de regras arbitrárias.

Neste período vários estudos envolvendo a estequiometria química estavam sendo realizados. Dalton procurou estabelecer regras levando em consideração o conhecimento existente sobre as combinações químicas, como explicitou a seguir:

"Análise química e síntese não vão além da separação de partículas umas das outras, e da sua reunião. Nem a criação ou destruição da matéria está ao alcance do agente químico[...]. Em toda a investigação química justamente tem sido considerado um importante objetivo para averiguação, os pesos relativos das unidades que constituem um composto. Mas, infelizmente, a investigação tem terminado aqui; entre tanto a partir dos pesos relativos em massa, os pesos relativos das 'últimas partículas' ou átomos dos corpos podem ter sido inferidos, dos quais seu número e peso em vários outros com postos apareceriam, de forma a ajudar e guiar investigações futuras e a corrigir seus resultados [...]".16

A oposição da comunidade química à hipótese atômica daltoniana esteve também relacionada com a dificuldade de diferenciar, adequadamente, os conceitos de átomo e molécula, inclusive pelo próprio Dalton.

A HIPÓTESE DE AVOGADRO E A NECESSIDADE DE ARTICULAÇÃO ENTRE AS IDÉIAS DE DALTON E GAY-LUSSAC

Em 1808, o químico francês Louis J. Gay-Lussac (1778-1850) enunciou uma lei empírica sobre a relação entre os volumes de reagentes gasosos em uma reação química. Esta lei foi publicada em 1809, e apresentada à "Sociedade de Arcueil"17 por Gay-Lussac, discípulo e amigo de Claude L. Berthollet (1748-1822), uma vez que ambos faziam parte desta sociedade:

"Gases [. . .] combinam-se entre si em proporções muito simples, e a contração de volume que eles experimentam durante a combinação também segue uma lei regular. Compostos de substâncias gasosas umas com as outras são sempre forma dos nas razões mais simples (nas proporções mais simples) e de forma que quando um dos termos é representado pela unidade, o outro é 1 ou 2 ou no máximo 3 [...]".18

Inicialmente, Gay-Lussac não interpretou esta lei usando idéias atomistas já que não compartilhava tais idéias com Dalton. Ele foi formado na École Polytechnique de Paris e, como experimentalista, deu grandes contribuições tanto para a ciência pura quanto para a tecnologia industrial. O seu trabalho enquadrava-se numa tradição empirista, comum no início do século XIX, que valorizava as propriedades mensuráveis, como volume e equivalente, questionando o uso de entidades não visíveis e hipotéticas como os átomos.

No trecho que se segue Thomas Thomson deixa transparecer o comprometimento filosófico de certos cientistas que faziam restrições ao uso de entidades hipotéticas para explicar dados empíricos.

"A única alteração que ele [Davy] fez foi substituir proporções pela palavra átomo de Dalton. O Dr. Wollaston substituiu-a pelo termo equivalente. O objetivo destas substituições foi evitar todo o comprometimento teórico. De fato, estes termos: proporção, equivalente, são mais convenientes que o termo átomo; e a menos que adotemos as hipóteses que Dalton apre sentou, principalmente que as últimas partículas dos corpos são átomos incapazes de divisões adicionais e que as combinações químicas consistem na união destes átomos uns com os outros, nós perdemos toda a nova luz que a teoria atômica lançou sobre a Química, trazendo nossas noções de volta à obscuridade dos dias de Bergman e de Berthollet".19

As divergências entre Dalton e Gay-Lussac revelam a influência das questões filosóficas, políticas, econômicas ou culturais nas atitudes do cientista, o que pode, até mesmo, dificultar a aceitação de novos conhecimentos.

O trabalho de Gay-Lussac sobre a combinação gasosa serviu de referência para o cientista italiano Amedeo Avogadro de Quarenga (1776-1856) formular, em 1811, duas importantes hipóteses. Partindo de resultados experimentais obtidos por Gay-Lussac, Avogadro questionou a possibilidade de interpretá-los usando o ponto de vista de Dalton sobre o assunto. Introduzindo suas próprias idéias sobre a constituição de moléculas, Avogadro usou preferencialmente o termo molécula em lugar de átomo na defesa do seu ponto de vista. Os dois termos eram usados no início do século XIX, embora os significados atribuídos diferissem dos atuais. Na sua hipótese mais popular, ele admitia que volumes iguais de gases diferentes, nas mesmas condições de temperatura e pressão continham o mesmo número de moléculas:

"A primeira hipótese que se apresenta a esse respeito, e que parece mesmo a única admissível, é supor que o número de moléculas integrantes num gás qualquer, é sempre o mesmo a volumes iguais, ou é sempre proporcional aos volumes[...]".20

A proposta de Avogadro ajudava a conciliar as idéias de Dalton e o trabalho de Gay-Lussac, no entanto, ele não foi bem sucedido neste empreendimento. A aceitação desta hipótese poderia possibilitar a diferenciação entre os conceitos de átomo e molécula, o que não aconteceu com facilidade naquele período. A hipótese "mesmo volume-mesmo número" foi também apresentada por André M. Ampère (1775-1836) em 1814, de modo independente.

Considerando esta hipótese, era possível se determinar massas moleculares relativas de substâncias gasosas e a proporção destas moléculas nas combinações químicas. Se volumes idênticos de gases continham igual número de partículas, a relação entre as densidades dos gases devia ser igual à relação entre as massas destas partículas. Avogadro usou esta hipótese para estimar a proporção de átomos nos compostos, encontrando resultados que divergiam daqueles obtidos por Dalton, a partir da regra da máxima simplicidade. Ele questionou esta regra e sua arbitrariedade, recomendando sua substituição pelo raciocínio fundamentado nas suas hipóteses.

Complementando sua idéia, numa segunda hipótese, Avogadro sugeriu que substâncias simples pudessem ser formadas por moléculas poliatômicas.

"[...] Mas um meio de explicar fatos deste tipo, em conformidade com a nossa hipótese se apresenta de modo bastante natural. A saber, vamos supor que as moléculas constituintes21 de qualquer gás simples não são formadas de uma molécula elementar solitária, mas são feitas de um certo número dessas moléculas elementares, unidas por atração para formar uma molécula única. E mais, supomos também que, quando moléculas destas substâncias vão se combinar com moléculas de uma outra, para formar a molécula de um composto, a molécula integral que se deveria formar se quebra em duas ou mais partes... compostas da metade ou da quarta parte, etc...., do número de moléculas elementares que formavam a molécula constituinte da segunda substância. Assim sendo, o número de moléculas integrais do composto se torna o dobro ou o quádruplo, etc...do que seria, caso houvesse a quebra da molécula integral e passa a ser exatamente o número que é necessário para satisfazer o volume do gás resultante".22

Esta segunda hipótese encontrou forte oposição, tanto de Dalton quanto de Berzelius, que imaginavam que átomos iguais se repeliam, o que tornava impossível a existência de 'partículas' formadas pela combinação de átomos idênticos.

A importância das hipóteses de Avogadro só foi reconhecida em 1860; caso este reconhecimento tivesse acontecido logo após sua formulação, a distinção entre os conceitos de átomo e molécula, possivelmente, teria acontecido anteriormente, antecipando a compreensão das implicações do atomismo. Uma das causas de dificuldade para aceitação das idéias de Dalton foi o demorado processo de reconhecimento da necessidade de articulação dessas idéias com as contribuições de Gay-Lussac e Avogadro.

OS ATOMISMOS FÍSICO E QUÍMICO: SUTIS DIFERENÇAS NO SÉCULO XIX

Atualmente, a posição da Química em relação às outras ciências naturais tem sido bastante debatida.23 Existe o reconhecimento entre os filósofos das ciências da complexidade envolvida na questão do reducionismo da Química à Física. No entanto, no século XIX, mesmo com a proximidade dessas duas ciências, a compreensão dos físicos e químicos em relação a algumas questões científicas apresentava certas especificidades. A teoria atômica clássica, por exemplo, não era usada da mesma forma por físicos e químicos. Não existia uma única concepção de átomo adotada pelas duas comunidades científicas, gerando muitas discussões sobre as vantagens e desvantagens dessas concepções em vários encontros realizados século XIX.

Na Química, a idéia de átomo estava relacionada com a existência de elementos químicos formados de partículas indivisíveis. Com uma razoável fundamentação empírica que incluía métodos analíticos, analogias químicas, aplicação da lei dos calores específicos e do isomorfismo, a teoria atômica era aceita entre os químicos e possibilitava a representação e quantificação das transformações através de fórmulas químicas.24

O átomo químico caracterizava-se por ter um único peso e grande parte da química prática quantitativa fazia uso de pesos atômicos. O influente e respeitado químico Jöns J. Berzelius (1770-1848) usava a concepção atômica, tendo determinado pesos atômicos que tinham credibilidade entre os cientistas, entretanto, considerava o átomo como uma entidade hipotética, visto que não era objeto de inspeção direta. Seu ponto de vista sobre esta questão, reconhecendo o caráter hermético da hipótese atômica, foi apresentado no livro "Lehrbuch der Chemie" (1827).

"Isto é apenas uma hipótese e provavelmente permanecerá assim; porém, ela segue elegantemente a partir dos fatos; e por outro lado, quando assumido ser fato, ela fornece direções para importantes conclusões, como uma teoria que é completamente provada". 25

Em 1867, comentando sobre esta questão, outro importante químico, August Kekulé (1829-1896), expôs o seu modo químico de pensar, fazendo distinção entre a menor porção da textura da matéria, o "átomo físico" e o "átomo químico" que, na função de unidade química tornava-se indispensável a esta ciência:

"Eu não hesito em dizer que, de um ponto de vista filosófico, eu não acredito na existência real de átomos, tomando a palavra no seu significado literal de partículas indivisíveis de matéria. Eu prefiro esperar que nós possamos algum dia encontrar, para o que nós agora chamamos átomos, uma explicação mecânico-matemática para o peso atômico, a atomicidade e numerosas outras propriedades dos chamados átomos. Como químico, porém, eu recomendo a suposição de átomos, não apenas como recomendável, mas como ab solutamente necessária à química. Eu irei até mais longe, e declaro minha crença de que átomos químicos existem, de modo que o termo seja compreendido para denotar aquelas partículas da matéria que não possam ser submetidas a divisões posteriores em metamorfoses químicas. Deverá o progresso da ciência levar à uma teoria da constituição de átomos químicos, importante tal como um conhecimento poderia ser para a filosofia geral da matéria, isto seria apenas uma pequena alteração na própria química. O átomo químico permanecerá sempre a unidade química".26

Todavia, as dúvidas sobre a teoria atômica eram identificadas inclusive entre notáveis cientistas como Jean B. A. Dumas (1800-1884), influente químico francês, que, de início, aceitou algumas idéias de Dalton, entretanto, encontrou dificuldade para utilizá-las na interpretação dos seus resultados empíricos, o que o levou a questioná-las. No trecho a seguir extraído de uma publicação de 1836 ele manifesta o seu ponto de vista sobre esta teoria.

"O que nos resta da excursão ambiciosa que nos permitimos na região dos átomos? Nada ou pelo menos nada de necessário. O que nos resta é a convicção de que a química se perdeu aí, como sempre quando abandonando a experiência, quis caminhar sem guia através das trevas. Com a experiência à mão encontrareis os equivalentes de Wenzel, os equivalentes de Mitscherlich, mas procurareis em vão os átomos tal como a vossa imaginação os sonhou [...]. Se eu fosse o mestre, apagaria a palavra átomo da ciência, persuadido que ele vai mais longe que a experiência; e na química nunca devemos ir mais longe que a experiência". 27

Usando a hipótese de Avogadro e assumindo a existência de espécies diatômicas, Dumas determinou densidades de substâncias elementares na forma de vapor para calcular os pesos atômicos. Os resultados obtidos revelaram anomalias para o mercúrio, enxofre e fósforo.28 Os pesos atômicos calculados não correspondiam aos valores obtidos por pesquisadores como Berzelius. As dificuldades encontradas levaram Dumas a questionar a possibilidade de determinação do número real de átomos envolvidos numa reação química. Ele passou a duvidar da possível realidade atômica, imaginando o átomo como um construto hipotético. Embora a "entidade átomo" fizesse parte do discurso científico vigente, encontrava dificuldade para adquirir o estatuto de realidade.

Rocke29 considera que os conflitos sobre o atomismo, principalmente na Química, não decorreram de divergências envolvendo aspectos científicos ou metafísicos da questão, mas de dificuldades semânticas, principalmente do fracasso em se definir, precisamente, certos termos. Durante as duas primeiras décadas do século XIX, mesmo existindo um certo número de regras para determinação dos pesos atômicos, percebiam-se muitas divergências relacionadas à variedade de termos usados pelos químicos: átomos, equivalente e proporções.

Na Física, a idéia de átomo surgiu no contexto da teoria dinâmica do calor, retomada na primeira metade do século XIX e que enfrentou muitos debates. Os átomos eram imaginados como partículas inelásticas ou pontos inerciais, submetidos a forças atrativas e repulsivas que agiriam tanto dentro destas partículas quanto no meio entre elas.

A estrutura discreta do mundo microscópico foi utilizada para descrever outros fenômenos, como a luz. Modelos mecânicos considerando átomos como pontos foram usados na descrição do éter, fluido imponderável que alguns cientistas presumiam que tivesse uma constituição particulada.

O atomismo na Física era uma hipótese que se apoiava em suposições mecânicas sobre a natureza íntima das substâncias, despertando grande oposição. Os aspectos epistemológicos desta questão também ocasionaram debates nas comunidades científicas, que foram influenciados por idéias de alguns pensadores franceses.

A discussão sobre o estatuto das teorias científicas implicava na necessidade de se debater questões mais amplas: o conceito de teoria científica e seus objetivos, o papel das hipóteses e da experimentação, a separação entre ciência e metafísica.30 As divergências entre as comunidades científicas sobre tais questões e sobre a importância da matemática na Física eram preocupações identificadas naquele período.

No século XIX, acumularam-se evidências que levaram a uma aproximação entre os dois tipos de atomismo, originando um modelo de átomo comum à Química e à Física. Entretanto, a oposição ao atomismo naquele período ignorava as singularidades dos dois pontos de vista e o ataque ao atomismo físico era estendido ao químico.31

ATOMISMO E EQUIVALENTISMO: CONVERGÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS

O "atomismo químico" começou a se concretizar em 1808 com a publicação da principal obra de Dalton: "New System of Chemical Philosophy". A essência deste tema estava contida em apenas 5 páginas deste livro. Em 1810, Dalton publicou a segunda parte do seu trabalho, paginada como continuação do livro anterior e a terceira parte, preparada como um segundo volume, mesmo não tendo sido concluída só foi publicada em 1827.32

Entre 1810 e 1814, as idéias de Dalton passaram a ser amplamente discutidas. Importantes químicos como Humpry B. Davy, Thomas Thomson, William H. Wollaston e Jöns J. Berzelius propuseram pesos atômicos alternativos àqueles determinados por Dalton.

O atomismo químico fundamentava-se na idéia de que os corpos eram formados por um conjunto de átomos homogêneos. A base conceitual do atomismo químico era a relação entre as leis de combinações químicas, os pesos atômicos determinados e o esquema teórico proposto para explicá-los. Na verdade, como não era possível obter informações microscópicas sobre as características dos compostos químicos, a certeza sobre o número de átomos destes compostos inexistia, justificando as divergências nos valores obtidos.

Grande parte dos químicos operava usando 'pesos equivalentes', que correspondiam aos pesos relativos de combinação das substâncias. Na definição de equivalente químico encontram-se implícitas três importantes características: eram obtidos empiricamente de dados analíticos; o valor calculado dependia do tipo de composto analisado; existia possibilidade de um mesmo elemento apresentar mais de um valor de equivalente. Os pesos equivalentes de um dado elemento podiam ser numericamente iguais ao peso atômico ou a submúltiplos destes.

O termo equivalente, que já havia sido introduzido no século XVIII por Henry Cavendish (1731-1810), foi retomado por J. B. Richter e popularizado por William H. Wollaston (1766-1828) em importante artigo publicado em 1814, "A synoptic scale of chemical elements". Ele usou este conceito, de modo inovador, escolhendo um único equivalente para cada elemento.33

Os valores obtidos por Wollaston correspondiam a pesos de combinações químicas ou pesos proporcionais. Ele tomou como padrão para os cálculos o elemento oxigênio, embora diferentes elementos tivessem sido usados como padrões por outros investigadores, tendo o valor numérico adotado variado conforme o investigador.

Em suas publicações iniciais Wollaston mostrou-se fortemente atomista, entretanto, considerava que a teoria atômica postulava entidades cujos pesos eram arbitrariamente obtidos e cujos arranjos propostos eram inacessíveis. Gradativamente, percebeu a necessidade de fazer distinção entre dados empíricos e modelos teóricos utilizados nas explicações. Suas investigações o levaram a se afastar do atomismo daltoniano e a propor a substituição dos pesos atômicos por pesos equivalentes.

O equivalente químico de Wollaston tinha um único valor, era determinado da mesma forma que o peso atômico e usado na dedução de fórmulas e pesos moleculares. Contudo, Dalton fez determinações de pesos a partir de fórmulas que, embora propostas arbitrariamente, eram consideradas muito prováveis. Wollaston, por outro lado, considerava suas fórmulas como convenções, que obedeciam a critérios de simplicidade, mas que não tinham como implicação a correspondência no âmbito da realidade molecular.

Esta diferença expressava dois pontos de vistas conflitantes no âmbito do atomismo químico: o realismo e o convencionalismo. Apesar das divergências, ambos aceitavam a visão corpuscular da matéria e definiram pesos atômicos invariantes para explicar os resultados experimentais.

Comentando sobre esta questão, Goodman34 registra a crítica feita pelo filósofo positivista francês, Auguste Comte, sobre o trabalho de Wollaston publicado em 1814. Comte considerava que a troca de átomos para equivalentes implicava apenas em um "mero artifício de linguagem", porque as idéias corpuscularistas podiam ser identificadas nos dois pontos de vista.35

Na primeira metade do século XIX, os termos equivalente, de Wollaston, e peso atômico, de Dalton, foram usados muitas vezes como sinônimos. O importante químico Humphry Davy (1778-1829) preferiu usar o termo "números proporcionais" e Berzelius usou o termo "volumes proporcionais" com significados equivalentes. Através do trabalho de Wollaston que tinha maior prestígio acadêmico que Dalton, Berzelius tomou conhecimento do atomismo daltoniano. Considerando as idéias atomistas, ele realizou inúmeras análises químicas, tanto para determinar os pesos atômicos de cada elemento quanto para obter uma maior exatidão nas determinações.

Entre 1808 e 1860, os químicos utilizaram indiferentemente os termos átomos, equivalentes e proporções; os debates envolvendo atomistas e equivalentistas estiveram presentes nos principais países europeus. Este período é chamado por alguns historiadores da Química, a exemplo de Papp e Prelat,36 de "intervalo equivalentista", caracterizado pelo uso do peso equivalente como suporte experimental na interpretação quantitativa das reações químicas e na menor valorização dos pesos atômicos. Bensaude-Vincent e Stengers37 consideram que "o retrocesso sobre os equivalentes foi acompanhado de uma desconfiança em relação aos métodos físicos e de um abandono categórico das pretensões realistas na química."

Para se estabelecer um acordo sobre esta questão programou-se o primeiro congresso científico de âmbito internacional da emergente área da química.

O CONGRESSO DE KARLSRUHE E A BUSCA DO ENTENDIMENTO

Este encontro aconteceu em setembro de 1860 em Karlsruhe, Alemanha, com a presença de 129 químicos pertencentes a 12 países. O principal objetivo era buscar algum consenso sobre questões que interessavam a esta comunidade na busca de sua consolidação e ampliação.

As divergências entre atomistas e equivalentistas agravaram-se com o crescimento das investigações em Química Orgânica. As teorias usadas para explicar a formação de compostos orgânicos admitiam uma arquitetura molecular fixa e a possível troca de um átomo por outro ou por um grupo de átomos (radical). Apesar das dúvidas sobre a possível realidade do átomo, algumas representações espaciais eram propostas para os compostos químicos, sugerindo uma possível realidade atômica.

Naquele período, uma parte da comunidade dos químicos, em especial os orgânicos, já utilizava a notação baseada na hipótese de Avogadro admitindo a combinação entre átomos iguais. Esta opção confrontava-se com a teoria dualista desenvolvida por Berzelius que só admitia a combinação entre átomos ou grupos de átomos de cargas opostas; considerava-se que forças de natureza elétrica mantinham as espécies químicas unidas.

Os diferentes sistemas de determinação dos pesos atômicos e equivalentes químicos utilizados naquele período ocasionavam divergências nos valores obtidos, nas notações das fórmulas químicas e nas definições de termos da linguagem química. Um mesmo composto, como o ácido acético, podia ser representado por 19 fórmulas químicas diferentes, o que não era surpreendente no contexto da época.38

Duas questões foram priorizadas nos debates: a diferença entre os conceitos de átomo e molécula, o que poderia esclarecer a possibilidade de divisão das moléculas em reações químicas e a busca de convergência entre o atomismo químico e o físico.

A idéia do encontro partiu de August Kekulé, que tinha a intenção de trazer para os debates importantes aspectos da química daquele período. Para organização do evento, contou com a ajuda do químico francês Charles A. Wurtz (1817-1884) e do alemão Karl Weltzien, professor da Escola Politécnica de Karlsruhe.

Wurtz foi um destacado atomista francês que contestou idéias do notável químico orgânico Marcelin P. E. Berthelot (1827-1907) que era também político e ocupou importantes cargos públicos, como Senador da República, Presidente da Academia das Ciências e Ministro da Instrução Pública. Aproveitando a sua presença no governo, Berthelot afastou atomistas que ocupavam importantes cargos públicos, buscando manter a notação equivalentista na França até mesmo quando os físicos já se ocupavam com a caracterização do elétron.

Em 1869, nas publicações da revista de divulgação científica Le Bulletin, da Sociedade Química de Paris, registravam-se 25 estrangeiros e 23 franceses que utilizavam a notação equivalentista contra 191 estrangeiros e 22 franceses que eram atomistas. Dos 22 atomistas, a metade deles era formada de alunos de Wurtz.39

Na circular sobre o encontro enviada aos congressistas foram delineados os principais objetivos:

"O grande desenvolvimento que teve a química nesses últimos anos e as divergências manifestadas nas opiniões teóricas, tornaram oportuno e útil a realização de um congresso, tendo como objetivo a discussão de algumas questões importantes do ponto de vista dos progressos futuros da ciência. Tal assembléia não poderia tomar resoluções ou deliberações obrigatórias para todos, mas, através de uma discussão livre e aprofundada, ela poderia acabar com certos mal-entendidos e facilitar um entendimento comum a respeito de alguns dos seguintes pontos: Definição de noções químicas importantes, como as que são exprimidas pelas palavras: átomo, molécula, equivalente, atômico, básico; Exame da questão dos equivalentes e das fórmulas químicas; Estabelecimento de uma notação e de uma nomenclatura uniforme".40

As rivalidades entre congressistas de diferentes nacionalidades manifestaram-se na dificuldade de entendimento. Os químicos franceses mostraram-se mais conservadores, defendendo o equivalentismo, e os alemães mantiveram uma atitude mais progressista, apoiando o atomismo. Bensaude-Vincent41 considera que o Congresso de Karlsruhe marcou a bifurcação da química alemã e da francesa, que adotaram percursos teóricos diferenciados. A opção dos alemães pelo atomismo facilitou o desenvolvimento da química estrutural e estudos estereoquímicos, fundamentais para a construção de um império industrial apoiado na exploração da arquitetura molecular dos compostos orgânicos.

O uso da ciência pura e aplicada para a fabricação de artefatos e no desenvolvimento de técnicas sofisticadas consolidou a aplicação da uma tecnologia apoiada em conhecimentos e instrumentos criados pela pesquisa científica. Esta maior aproximação entre ciência e tecnologia foi um dos importantes legados do século XIX, possibilitada por uma maior interação entre o cientista e o industrial, cada vez mais evidente e planejada. A incorporação da ciência ao sistema produtivo foi um dos pilares de sustentação da revolução industrial, especialmente no seu estágio mais avançado.

A participação do químico italiano Stanislao Cannizzaro (1826-1910) no encontro de Karlsruhe foi decisiva para que antigas dúvidas fossem resolvidas. Ao final do Congresso, distribuiu-se entre os participantes, um artigo de sua autoria "Sunto di um Corso di Filosofia Chimica". Este documento trazia esclarecimentos sobre os conceitos de átomo e molécula, retomando idéias de Avogadro necessárias à distinção entre os dois conceitos, além de defender a importância do peso atômico como propriedade fundamental para os cálculos estequiométricos.

Após este evento ainda aconteceram tentativas para se chegar a um acordo sobre a definição dos pesos atômicos e sua notação; entretanto, anti-atomistas como Berthelot, ignoravam evidências em favor da hipótese atômica e continuavam fazendo uso de fórmulas obtidas com base nos pesos equivalentes. Esta resistência explica a incorporação tardia da notação atomista no ensino de química na França e as dificuldades para a sua aceitação.

Os átomos se fizeram presentes nos manuais escolares franceses a partir de 1894; entretanto até 1930, estes manuais ainda usavam a designação hipótese atômica e não teoria atômica.42 Muitos livros apresentavam o átomo como um termo "cômodo" que possibilitava uma linguagem útil para exprimir resultados empíricos, entretanto, o consenso sobre a existência dos átomos não era percebido.

O atomismo mobilizou outros importantes encontros envolvendo a comunidade de químicos e físicos como o da Chemical Society de Londres em 1869, o da Académie des Sciences de Paris em 1889, o Encontro de Genève em 1892 e a Conferência de Lübeck em 1895.

Uma importante conseqüência do encontro de Karlsruhe foi à ascensão da teoria da valência e a descoberta de que os átomos tinham capacidades de combinação definidas e limitadas, indicando que o poder de combinação estava de algum modo localizado em diferentes partes do átomo. Esta hipótese originou especulações sobre a possibilidade de uma estrutura interna subatômica contendo regiões onde se localizavam o poder e a força do átomo.43

Outra importante conseqüência do Congresso de Karlsruhe (1860) foi o reconhecimento pelo próprio Dmitri I. Mendeleev (1834-1907) que as definições de átomo e molécula, 'votadas' no primeiro dia do Congresso, foram as principais mensagens do encontro que o levaram à lei periódica e a sua principal conseqüência, a tabela periódica dos elementos químicos.

Os congressistas não pretendiam se posicionar sobre a existência de átomos ou moléculas; considerava-se a hipótese atômica indispensável para a produção do conhecimento químico, entretanto, a discussão sobre o caráter metafísico envolvido na existência do átomo como uma entidade física não teve prioridade.

Nesta ocasião, o objetivo dos químicos era se posicionar defendendo seu ponto de vista, diferente dos físicos. A reação contra o realismo ingênuo dos modelos mecânicos de átomo, uma atitude convencionalista ou, até mesmo, instrumentalista, passou a ser identificada posteriormente.44

UMA ALTERNATIVA AO ATOMISMO: O ENERGETICISMO

Na segunda metade do século XIX, a filosofia anti-mecanicista era aceita por importantes cientistas, como Ernst Mach (1838-1916), que questionavam o emprego de hipóteses arbitrárias e entidades não observáveis na ciência.

Segundo Nye,45 Mach, que além de físico foi historiador e filósofo, era um "fenomenista ou fenomenólogo". Suas idéias exerceram influência tanto em físicos, como Max C. E. Planck (1858-1947) e Albert Einstein (1879-1955), quanto nos princípios que fundamentaram o positivismo lógico do Círculo de Viena. Ele considerava os átomos como símbolos para representação dos fenômenos, não admitindo a sua existência real e revelando-se um "convencionalista".46

Uma segunda alternativa ao atomismo foi o energeticismo ou energetismo, fundamentado no conceito de energia. Este novo programa de pesquisa originou-se com o desenvolvimento da termodinâmica, considerada uma teoria fundamental que não necessitava de explicações mecânicas e apelo à existência de entidades invisíveis; fazendo parte de um movimento de reação contra o positivismo e sua influência na ciência. Os energeticistas colocavam-se contra uma visão materialista do mundo e foram influenciados pela epistemologia idealista do filósofo alemão, Immanuel Kant (1724-1804), que originou idéias conhecidas como a Naturphilosophie. Esta denominação foi introduzida pelo filósofo Friedrich Schelling (1775-1854) sob influência do "movimento romântico", na defesa de uma visão organicista e unificada da natureza.47

Os energeticistas contestavam o uso de hipóteses especulativas na ciência, assim como a possibilidade da existência de forças não comprovadas empiricamente. Um outro aspecto era a valorização da energia, capaz de ser mensurada nos processos naturais. Embora o energeticismo apresentasse características progressistas, assumindo uma perspectiva antimecanicista da natureza, paradoxalmente, possuía certas características conservadoras, não aceitando a desafiadora hipótese atômica.

Ostwald foi um importante representante do energeticismo na Alemanha, estudioso e pesquisador em Físico-Química, tendo recebido Prêmio Nobel em 1909. Durante a sua vida interessou-se pela Naturphilosophie, que exerceu influência sobre suas idéias.

O pensamento idealista defendia a unidade das forças da natureza e exaltava a "força viva" confrontando-se com a visão mecanicista da natureza e com o atomismo materialista. Na Alemanha, onde existiam muitos adeptos da Naturphilosophie, o atomismo físico enfrentava criticas por sua ênfase no materialismo, embora o atomismo químico fosse bem aceito.

A perspectiva antimecanicista de natureza considerava que os fenômenos naturais estavam interligados e poderiam ser correlacionados por uma lei fundamental, a ser descoberta pelo "intelecto". O conceito de energia poderia articular vários fenômenos e justificar tudo o que antes era explicado por conceitos como o de matéria e força.

"Só a energia se encontra sem exceção em todos os fenômenos naturais conhecidos ou, em outras palavras, todos os fenômenos naturais podem classificar-se no conceito de energia. Assim, este conceito é adequado, sobretudo, para constituir a solução completa do problema encerrado no conceito de substância e não completamente resolvido pelo conceito de matéria".48

O grande interesse de Ostwald era aplicar a termodinâmica à Química e reinterpretá-la, tomando como base o conceito de energia. Segundo Holt,49 "para Ostwald, moléculas, átomos e íons eram somente ficções matemáticas para explicar as operações de energia". Suas idéias deram sustentação ao debate entre energeticistas e atomistas, que incluía também questões epistemológicas. A divergência decorria das diferentes interpretações sobre o papel de uma teoria física e da própria ciência, evidenciando a importância dos argumentos epistemológicos e ontológicos usados pelos energeticistas.

Wilhelm Ostwald (1853-1932), Georg Helm (1851-1923) e o francês Pierre Duhem (1861-1916), defensores do energeticismo, consideravam que cabia à ciência a descrição dos fatos e do que era sensorialmente observado. Para atomistas como o austríaco Ludwig Boltzmann (1844-1906) e o francês Jean B. Perrin (1870-1942), o principal era conseguir ultrapassar a aparência, a observação direta, fazendo uso do pensamento teórico, "explicar o visível complicado pelo invisível simples".50

Em 1887, Ostwald publicou as principais idéias sobre o energeticismo na forma de artigos.51 A apresentação pública dessas idéias aconteceu no encontro anual da Sociedade Alemã de Cientistas e Médicos (German Society of Scientists and Physicians). Os energeticistas defendiam a supremacia da energia, possível de ser mensurada, em lugar de uma interpretação mecânica e corpuscular da natureza sujeita a hipóteses especulativas, criticando conceitos como: massa, matéria, força e irreversibilidade. Em 1904, numa conferência em Londres (Faraday Lecture), Ostwald defendeu o seu ponto de vista:

"É possível deduzir a partir dos princípios da dinâmica química todas as leis estequiométricas. [...]. O que nós chamamos matéria é apenas um complexo de energias que nós encontramos juntas no mesmo lugar. Nós estamos ainda perfeitamente livres, se nós quisermos, supor ou que a energia preenche o espaço homogeneamente, ou de uma forma periódica ou granulada; a última suposição seria substituída pela hipótese atômica. A decisão entre estas possibilidades é uma questão puramente experimental. Evidentemente existe um grande número de fatos - e eu incluo os fatos químicos entre eles - que podem ser completamente descritos por uma distribuição homogênea ou não periódica de energia no espaço. Se existem fatos que não podem ser descritos sem a suposição periódica, eu não ouso decidir pelo desejo do conhecimento; eu apenas me limito a dizer que não conheço nenhum".52

A idéia de conceitos unificadores também estava relacionada com a influência do positivismo comtiano sobre alguns energeticistas. Esta corrente filosófica defendia a importância de uma ciência unificada e uma metodologia empírica para alcançar o verdadeiro conhecimento científico. As críticas ao atomismo consideravam que os átomos não eram capazes de se constituir em um tema unificador, ao passo que a energia era um conceito comum a todos os fenômenos.

"É necessário dizer que a ausência de hipótese fornece à energética uma unidade do método desconhecida, até o presente: unidade que não é menos importante para o ensino e a inteligência da ciência do que ela é do ponto de vista filosófico. Para dar um só exemplo, todas as equações que ligam um ao outro, dois ou vários fenômenos de espécies diferentes, são, necessariamente, equações entre quantidades de energia; não poderia haver outras porque, fora o tempo e o espaço, a energia é única grandeza comum a todas as ordens de fenômenos".53

Os energeticistas defendiam a superioridade da termodinâmica em função da sua fundamentação empírica manifestada nas medidas de perda e ganho de calor. Considerava-se que medidas do calor envolvido nas reações davam uma idéia mais clara da estabilidade química do que representações pictóricas de moléculas em interações químicas. Anti-atomistas como Ostwald e Berthelot reconheciam a "termodinâmica empírica ou fenomenológica" como um instrumento promissor para o desenvolvimento de leis fundamentais da dinâmica química, tornando desnecessárias explicações baseadas no atomismo. Considerava-se que a opção por métodos físico-matemáticos livraria a ciência de imagens e hipóteses, evitando a sua decadência.54

ENERGETICISTAS X ATOMISTAS: DEBATENDO O ATOMISMO

Um importante debate entre atomistas e energeticistas aconteceu no Encontro de Lübeck em 1895, com críticas feitas pelo atomista Boltzmann ao anti-atomista Ostwald, considerado dogmático na defesa da energia como categoria fundamental e definitiva. Para fundamentar suas críticas, Boltzmann apoiava-se em dois argumentos: a defesa da mecânica como uma ciência que não tinha a pretensão de "desencantar" a natureza e o caráter provisório das teorias científicas e da visão de mundo subjacente a elas.55

O grande interesse de Boltzmann era explicar a homogeneidade da matéria percebida a nível macroscópico e sua descontinuidade a nível microscópico. Seus estudos sobre teoria cinética e termodinâmica foram fundamentais para ajudá-lo na compreensão destas questões, na defesa das teorias científicas como fomentadoras de imagens da realidade.

As pesquisas de Boltzmann levaram-no a propor explicações para os fenômenos macroscópicos relacionados ao calor, tomando como base leis mecânicas aplicadas ao domínio microscópico. Outra importante contribuição foi à descrição mecânica do segundo princípio da termodinâmica. Ele introduziu uma explicação probabilística da entropia, tentando conciliar a segunda lei da termodinâmica com a reversibilidade das leis da mecânica. O trabalho de Boltzmann teria reconduzido a termodinâmica à mecânica, compatibilizando processos mecânicos reversíveis e processos termodinâmicos irreversíveis através da relação entre a entropia de um sistema e seu estado de probabilidade.

Os estudos de Boltzmann destacaram-se pela originalidade do tratamento mecânico apresentado, contribuindo para o aparecimento de uma nova tradição de pesquisa, a mecânica estatística. Este novo campo tem a mecânica como teoria fundamental, apoiando-se na hipótese atômico/molecular, apesar da grande oposição a esta hipótese manifestada pela comunidade dos físicos naquele período. A introdução de explicações estatísticas na Física gerou problemas; a possibilidade de trabalhar no campo das probabilidades parecia ser um fato ameaçador que causava espanto a muitos contemporâneos de Boltzmann.56

O atomismo inspirou a grande criatividade de Boltzmann, ajudando-o metodologicamente e fundamentando hipóteses úteis para a construção de novas teorias e conceitos. Ele considerava as teorias científicas como imagens da realidade, discordando da possibilidade de se construir as ciências sem apelo às imagens.

O papel das imagens na construção do conhecimento científico foi um ponto polêmico entre Boltzmann e Mach. Este último considerava a teoria como uma tradução da experiência e revelando-se fortemente empirista não aceitava a hipótese atômica. Boltzmann, ao contrário, defendia uma maior liberdade de pensamento e o uso da criatividade, alimentadora da capacidade heurística da atividade científica. Apesar dos argumentos de Boltzmann, fundamentados na mecânica estatística, a hipótese atômica ainda não tinha encontrado a unanimidade desejada.

No fim do século XIX a posição de Ostwald sobre o atomismo foi considerada "ultrapassada" pela maioria dos físicos e químicos que não aceitavam o conceito de matéria subordinado ao conceito de energia. Entretanto, dois aspectos defendidos por Ostwald têm resistido ao tempo, constituindo-se em importante legado à ciência: a sua formulação da segunda lei da Termodinâmica como a impossibilidade de "moto perpétuo" do segundo tipo, e a insistência sobre a necessidade de se empregar a energia livre (função de Gibbs e Helmholtz), em vez do calor de reação, como um critério para a previsibilidade da espontaneidade química e medida da posição de equilíbrio de reações químicas.57

A CONSTANTE DE AVOGADRO: ARTICULANDO AS DIMENSÕES MACROSCÓPICA E MICROSCÓPICA

Durante todo o século XIX, a realidade atômica foi muito debatida; em parte, a resistência à consideração dos átomos e moléculas como reais estava relacionada com a impossibilidade de observação direta ou inexistência de meios adequados à observação.

A representação espacial de átomos e moléculas tornou-se cada vez mais importante com o desenvolvimento da química orgânica.58 O uso de diferentes teorias e conceitos, como radicais, tipos, substituição, levaram à teoria da valência e à representação gráfica das ligações químicas. Representações bidimensionais foram propostas para explicar compostos orgânicos alifáticos e aromáticos; outras representações mais sofisticadas em três dimensões passaram a ser usadas para justificar certos fenômenos, como a isomeria óptica. Entretanto, todos estes avanços não eram considerados provas suficientes da hipótese atômica, que continuava sendo debatida nos encontros científicos.

O consenso sobre os átomos aconteceu, principalmente, a partir de duas contribuições decisivas: os trabalhos feitos no início do século XX por Jean Perrin, que levaram à determinação mais precisa da constante de Avogadro (NA), e os estudos envolvendo a ionização de gases em tubos de descargas realizados por Joseph J. Thomson (1856-1940), que culminaram com a descoberta do elétron e a possibilidade de um átomo divisível.59

No primeiro caso, os estudos teóricos e empíricos envolvendo a teoria cinético/molecular e o movimento browniano foram fundamentais. No segundo caso, a revolução industrial, os avanços tecnológicos e os novos instrumentos desenvolvidos (espectrômetros, tubos de descarga de gases) contribuíram para que experimentos cruciais permitissem o aprofundamento das investigações.

No século XX, a maior aproximação da ciência e da técnica e um aumento na sofisticação dos instrumentos tecnológicos possibilitaram o desenvolvimento de três importantes técnicas de microscopia capazes de fornecer resolução em escala atômica: a microscopia iônica de campo, a microscopia eletrônica de alta resolução e a microscopia de tunelamento e varredura. As imagens obtidas através destas técnicas evidenciam a presença de átomos, individualmente, legitimando a frase que é hoje comumente formulada no meio científico ou jornalístico especializado, de que "é possível 'ver' os átomos".60

O TRABALHO DE JEAN PERRIN E A ACEITAÇÃO DA REALIDADE ATÔMICA

Jean Perrin foi um importante professor de Físico-Química na Faculdade de Ciências da Universidade de Paris que percebeu a importância de se encontrar evidências experimentais que fornecessem credibilidade à realidade atômica nos meios científicos. Ele assumiu como principal objetivo definir, usando procedimento empírico confiável, o valor de NA (constante de Avogadro) que aparecia em vários estudos cinéticos, mas que não possuía um valor consensualmente aceito. Propostas para o valor desta grandeza já haviam sido feitas por Joseph Loschmidt (1821-1895), Rudolf Clausius (1822-1888) e Johannes Diderick van der Waals (1837-1923) que obtiveram resultados diferentes, embora próximos, através de estudos envolvendo a teoria cinética dos gases.

A investigação do movimento browniano foi o ponto de partida para o esclarecimento desta questão. O movimento de partículas coloidais, na forma de suspensões grosseiras em um líquido era um tema de grande interesse naquele período, principalmente após a descoberta do microscópio óptico. A idéia que este movimento fosse ocasionado por colisões moleculares não encontrava provas experimentais e teóricas até o início do século XX. Entre 1905 e 1910 surgiram vários estudos sobre o assunto; o principal objetivo era elaborar modelos teóricos que pudessem ser submetidos a testes empíricos. Neste contexto apareceu o trabalho de Perrin, que testou um modelo teórico para este tipo de movimento com o intuito de explicar os resultados experimentais.

De 1905 até 1912 Perrin investigou suspensões coloidais (emulsões) de partículas visíveis ao microscópio na forma de grãos (goma-guta e almécega) em líquidos. Estudou três fenômenos: a distribuição vertical de partículas coloidais depois que elas alcançavam o equilíbrio, o deslocamento translacional das partículas e a rotação das partículas. Os procedimentos eram complicados e foram realizados com precisão, separando partículas com raios semelhantes por centrifugação fracionada, técnica desenvolvida por ele para esta investigação. Perrin determinou as densidades, os volumes e os raios das partículas e estudou o movimento de rotação destas partículas, realizando muitas fotografias durante os experimentos.61

Um dos principais objetivos de Perrin era determinar o valor da constante de Avogadro (NA) utilizando equações da teoria cinética dos gases e medidas obtidas para as grandezas: densidade e massa dos grãos; quantidade de grãos por unidade de volume de água; a pressão exercida por um grão numa certa temperatura. Seus experimentos com as emulsões conseguiram conjugar a teoria do movimento browniano (Einstein e Smoluchowski) e o modelo osmótico de Van't Hoff, que aplicou as leis dos gases a soluções diluídas. Os experimentos realizados variando a natureza do líquido usado na preparação da suspensão de grãos, o volume dos grãos e a temperatura conduziram a valores convergentes de NA.

A equação de distribuição de grãos dava condições de determinar o número de Avogadro, desde que fosse estudado um número suficiente de grãos. A principal meta de Perrin era concretizar a ligação necessária entre massas macroscópicas e massas moleculares.

Foram determinados 13 valores do número de Avogadro (N) compreendidos entre 6,0 x 1023 e 7,5 x 1023. Cada um dos valores foi obtido através de diferentes procedimentos empíricos envolvendo fenômenos como: viscosidade de gases, deslocamento de íons em água, brilho do azul do céu, energia do infravermelho da radiação do corpo negro, medidas direta da carga de um íon em meio gasoso e de cargas de corpos radioativos. Segundo Chagas,62 o ápice do trabalho de Perrin foi a convergência de números obtidos através de 13 equações relativas aos diferentes fenômenos estudados, legitimando a realidade molecular através da invariância da constante de Avogadro (NA).

Comentando sobre os resultados obtidos, Perrin se colocou brilhantemente em seu livro "Les Atomes" na defesa da realidade atômica:

"Penso, ele diz, que é impossível a um espírito livre de todo preconceito, de refletir sobre a extrema diversidade dos fenômenos que convergem dessa maneira para o mesmo resultado, sem ficar impressionado, e acho que, por conseqüência, será difícil defender com argumentos racionais, uma posição hostil em relação às hipóteses moleculares".63

Grande parte de suas idéias ficaram registradas na obra "Les Atomes", importante livro publicado em 1913 e dirigido a um público não especializado.64 O seu trabalho empírico foi detalhadamente apresentado levando em conta, também, estudos teóricos existentes sobre o movimento browniano.

Em 1905, utilizando raciocínio estatístico, Einstein havia explicado qualitativamente a dependência do valor do deslocamento de uma partícula macroscópica suspensa em um líquido em um certo período de tempo. Esse deslocamento resultava do movimento browniano e considerava a ocorrência de colisão caótica de moléculas do líquido com as macropartículas. Esta teoria ficou conhecida como "Teoria da flutuação" e foi desenvolvida depois por Marian Smoluchowski (1872-1917), pesquisador polonês que derivou uma fórmula para explicar o movimento browniano.65

O trabalho de Perrin contribuiu para solucionar a interminável controvérsia sobre o atomismo que marcou o século XIX. Em reconhecimento a seu trabalho foi-lhe concedido o Prêmio Nobel de Física em 1926. Adotando uma postura realista, Perrin possibilitou a percepção do átomo como uma 'entidade' que possuía uma subestrutura que caberia ser investigada. No campo empírico instrumentos, como tubos de vácuo e o ultramicroscópico, aliados a novas descobertas, como a espectroscopia e a radioatividade, revigoraram o programa atomista.

As idéias de Perrin promoveram a aceitação do atomismo inclusive por Ostwald. Em 1909, ele reconheceu publicamente que os argumentos em favor da hipótese atômica não podiam mais ser ignorados, reconhecendo o mérito desta hipótese e a necessidade de que fosse restabelecida a confiança na representação atômica e corpuscular da matéria. Percebendo a importância do seu trabalho, Perrin se colocou no trecho a seguir, ratificando a importância da teoria atômica: "Esse resultado confere à realidade molecular uma probabilidade próxima da certeza[...]. A teoria atômica triunfou".66

De acordo com Nye,67 para a maior parte da comunidade científica os debates sobre o atomismo começaram a ser resolvidos em 1911, o ano da primeira "Conferência Solvay" e abriu um amplo programa de pesquisa, a Teoria Quântica, que tem sido frutífero até a atualidade, colocando novos problemas e fomentando novas investigações. Neste contexto a termodinâmica clássica foi transformada por uma nova teoria da descontinuidade da energia: a Teoria Quântica. Estas idéias transformaram tanto a Física quanto a Química clássicas. O caráter estatístico e probabilístico das novas teorias foi reconhecido como revolucionário.

Após este encontro, alguns problemas da Física e da Química passaram a ser pensados e resolvidos de uma mesma forma. O átomo não era apenas um princípio de unificação, mas passava a ter uma ampla aceitação como uma entidade científica. O diâmetro de um átomo e o número de partículas em um dado volume de matéria já podiam ser determinados. Perrin possibilitou a determinação do número absoluto de átomos contidos num dado peso de substância e o cálculo da "massa atômica absoluta".

Para ajudar no convencimento dos energeticistas sobre a realidade molecular, Perrin busca a conciliação, louvando a importância dos dois campos: "Não se tratará, é claro, de opor uma a outra essas duas grandes disciplinas, assim a união da atomística à energética consagrará o duplo triunfo das duas". 68

CONCLUSÃO

A formulação da teoria atômica de Dalton veio dar legitimidade a uma nova maneira de praticar a Química. As explicações introduzidas por Dalton tiveram um papel inovador e possibilitaram a emergência de um novo paradigma. Embora suas idéias tenham enfrentado dificuldades para se impor no meio acadêmico, sua teoria permitia a compreensão da diferença entre conceitos como mistura e composto.

Os pesos atômicos determinados por Dalton conferiram à Química o status de "ciência exata", ratificando o seu caráter quantitativo. A aplicação à Química de conceitos tradicionalmente usados na Física e nos estudos de meteorologia introduziu profundas mudanças na interpretação dos fenômenos químicos. O principal mérito de Dalton foi retomar conceitos antigos, reelaborando-os à luz de uma nova racionalidade; novas questões foram formuladas e novas conclusões apresentadas.

As controvérsias científicas sobre o atomismo no século XIX ficaram registradas nos debates travados em reuniões científicas, artigos e livros, revelando a existência de dois tipos de atomismo: o primeiro, o atomismo químico, que se constituiu na base conceitual que justificava a atribuição dos pesos relativos dos elementos e fórmulas moleculares, tornando-se gradativamente aceito pela comunidade química daquele século; o segundo tipo, o atomismo físico, revelou-se muito controvertido em função de defender a natureza mecanicista e particulada da matéria e do Universo. Os dois tipos de atomismo estavam intimamente relacionados e o próprio Dalton defendeu idéias que se enquadravam nos dois tipos de atomismo, embora não fosse este o comportamento da maior parte dos químicos.

Na segunda metade do século XIX, a identidade destes dois pontos de vista foi se tornando cada vez mais clara e a unificação dos dois tipos de atomismo aconteceu no início de século XX, ao tempo em que os físicos começaram a admitir um átomo estruturado, iniciando a exploração da sua estrutura.

Novas propriedades detectadas empiricamente através de instrumentos apontavam para uma subestrutura eletrificada do átomo e direcionaram físicos e químicos para uma nova teoria atômica. A unificação de uma grande variedade de fenômenos químicos foi possível graças à idéia de átomo estruturado e do reconhecimento da complexidade molecular.

O átomo maciço e indivisível deu lugar a um novo átomo vazio e estruturado. Os modelos de átomo de J. J Thomson e Ernest Rutherford (1871-1937) tornaram-se o princípio de unificação da Física e da Química e levaram, naquele contexto, à rejeição do conceito de textura contínua da matéria.69

O novo programa atomista superou o energeticismo como importante alternativa de pesquisa e incorporou não somente a teoria atômica clássica, mas também, muitas idéias e propostas de anti-atomistas do século XIX. O átomo não poderia ficar restrito aos fundamentos científicos e epistemológicos da mecânica clássica. Nesta situação não era mais possível aceitá-lo apenas como uma partícula material maciça e indivisível.

Comentando sobre o átomo da Física Moderna, Bachelard70 lembra a importância de se evocar a história das suas imagens, segundo ele "[...]o átomo é exatamente a soma das críticas a que se submete a sua imagem primeira".

Nos debates sobre o atomismo é possível perceber-se a importância da articulação de critérios empíricos, bem como de outra natureza, inclusive metafísicos nas investigações científicas. A aceitação da hipótese atômica por atomistas e antiatomistas, no decorrer do século XX, revela o consenso da comunidade científica, inclusive em relação a sua importância na ciência. A velha hipótese atômica foi revigorada levando à credibilidade na representação de um único modelo de átomo aceito por físicos e químicos.

O pensamento de Perrin neste debate antecipou idéias posteriormente desenvolvidas por epistemólogos como Gaston Bachelard, defensores da necessidade de se ultrapassar as aparências e o observável de imediato, as impressões primeiras, no processo de construção do "real científico". Comentando sobre a complexidade da filosofia química Bachelard escreveu:

"Assim, sobre esta noção de peso atômico, podemos seguir uma evolução de filosofia química, filosofia que acede lentamente ao realismo preciso graças à organização racional de uma experiência comparativa essencialmente complexa. Basta acompanhar esta evolução que conduz a um realismo científico para ver como eram inertes as teses de um realismo imediato sempre pronto a alinhar todo o seu saber a partir de uma experiência particular. Através das suas múltiplas técnicas e das suas teorias cada vez mais racionais a química contemporânea determina um verdadeiro "espectro filosófico", que apresenta os diversos matizes de uma filosofia primitivamente tão simples como o realismo".71

O caráter provisório do conhecimento científico é visível no estudo de episódios de controvérsias científicas, assim como a necessidade de articulação entre os cientistas para que teorias consensuais fossem adotadas.

O conceito de realidade também esteve envolvido nesta disputa. De acordo com Videira72 "no caso do átomo, falar da sua realidade somente é possível, se a realidade é compreendida como objetividade, aqui usada na acepção de algo que pode fazer parte de uma teoria física matematizada e testável empiricamente".

Percebe-se na complexidade que caracteriza a história do atomismo no século XIX que os argumentos usados por anti-atomistas eram não somente científicos, mas epistemológicos e ontológicos. Uma grande preocupação era definir o papel das teorias científicas na ciência, bem como o papel que a matemática e as hipóteses desempenhavam na construção das teorias. Estas questões estão presentes nos debates travados entre personagens que defendiam vários pontos de vista a exemplo de: fenomenistas ou fenomenólogos, convencionalistas, positivistas, realistas, entre outros.

12. Até a segunda metade do século XIX, coexistiam duas teorias sobre a natureza do calor: a do calórico, e a idéia de calor como movimento das partículas constituintes da matéria. Dalton demonstrava conhecer as duas teorias.

14. A independência das pressões dos componentes de uma mistura gasosa foi posteriormente generalizada, constituindo a lei das pressões parciais de Dalton: a pressão total de uma mistura gasosa é igual à soma das pressões parciais dos seus constituintes.

15. Ref. 10, p. 35.

17. A sociedade de Arcueil era um grupo radicado na França, constituído de cientistas de diferentes formações: matemáticos, físicos, químicos; incluindo importantes representantes como Laplace e Berthollet.

21. O termo "molécula constituinte" foi usado por Avogadro para se referir às moléculas de substâncias elementares (simples) e "molécula integral" referia-se à molécula de uma substância composta. O termo "molécula elementar" era empregado para o átomo.

22. Ref. 20, p. 234.

28. Hoje, sabemos que estas espécies químicas são poliatômicas: P4, S8, Hg(n).

34. Ref. 33, p. 45.

37. Ref. 11, p. 177.

38. Ref. 11, p. 194.

42. Ref. 39, p. 65.

43. Ref. 5, p. 299.

44. Ref. 40, p. 47.

45. Ref. 40, p. 152.

47. Ref. 5, p. 127.

51. Ref. 49, p. 387.

64. Ref. 1, p. 267.

67. Ref. 1, p. 268.

69. Ref. 1, p. 267.

Recebido em 11/12/07; aceito em 12/8/08; publicado na web em 2/2/09

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Jun 2009
    • Data do Fascículo
      2009

    Histórico

    • Aceito
      12 Ago 2008
    • Recebido
      11 Dez 2007
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