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Avaliação da estabilidade oxidativa do óleo bruto de açaí (Euterpe oleracea) na presença de compostos fenólicos puros ou de extratos vegetais amazônicos

Evaluation of oxidative stability of crude açai (Euterpe oleracea) oil in the presence of pure phenolic compounds or Amazonian plant extracts

Resumo

A final 241 µM of ascorbyl palmitate and 555 µM of the following antioxidants separately: BHA, myricetin and quercetin standards, and extracts of Byrsonima crassifolia, Inga edulis or Euterpe oleracea, were added to crude açai oil and submitted to the oxidation process at 60 ºC for 11 days. Among the antioxidants used, only the myricetin standard showed the ability to defer the oxidation process until the third day of treatment. B. crassifolia, I. edulis and E. oleracea extracts showed no preventive capacity against the oxidation process, despite their high concentration phenolic compounds and antioxidant activities.

Euterpe oleracea; açai oil; oxidative stability


Euterpe oleracea; açai oil; oxidative stability

ARTIGO

Avaliação da estabilidade oxidativa do óleo bruto de açaí (Euterpe oleracea) na presença de compostos fenólicos puros ou de extratos vegetais amazônicos

Evaluation of oxidative stability of crude açai (Euterpe oleracea) oil in the presence of pure phenolic compounds or Amazonian plant extracts

Jonas Joaquim Mangabeira da Silva; Hervé Rogez* * e-mail: frutas@ufpa.br

Faculdade de Engenharia de Alimentos, Instituto de Tecnologia, Universidade Federal do Pará e Centro de Valorização Agroalimentar e de Compostos Bioativos da Amazônia, Av. Perimetral, s/n, 66095-780 Belém – PA, Brasil

ABSTRACT

A final 241 µM of ascorbyl palmitate and 555 µM of the following antioxidants separately: BHA, myricetin and quercetin standards, and extracts of Byrsonima crassifolia, Inga edulis or Euterpe oleracea, were added to crude açai oil and submitted to the oxidation process at 60 ºC for 11 days. Among the antioxidants used, only the myricetin standard showed the ability to defer the oxidation process until the third day of treatment. B. crassifolia, I. edulis and E. oleracea extracts showed no preventive capacity against the oxidation process, despite their high concentration phenolic compounds and antioxidant activities.

Keywords:Euterpe oleracea; açai oil; oxidative stability.

INTRODUÇÃO

O óleo fixo contido nos frutos do açaizeiro (Euterpe oleracea) representa aproximadamente 50% da matéria seca total da polpa e apresenta um perfil lipídico rico em ácidos graxos mono e poli-insaturados, característica que o assemelha ao azeite de oliva. O óleo do açaí apresenta-se como um subproduto valioso dadas as suas propriedades sensoriais únicas e os seus potenciais benefícios à saúde.1

A oxidação lipídica é um processo de deterioração responsável por provocar alterações que afetam as qualidades sensoriais e nutricionais dos óleos alimentícios, devido à degradação das vitaminas lipossolúveis e dos ácidos graxos essenciais, comprometendo a integridade e segurança deste alimento, através da formação de compostos potencialmente tóxicos. A estabilidade oxidativa de óleos alimentícios depende de fatores como estrutura química dos ácidos graxos, teor e tipo de compostos pró-oxidantes e/ou antioxidantes, condições e tempo de prateleira. Tais fatores em conjunto afetam a oxidação de óleos, sendo complexo identificar seus efeitos individuais.2

Em termos gerais, os antioxidantes são compostos presentes em baixas concentrações quando comparadas ao substrato oxidável, que apresentam a capacidade de adiar ou impedir as reações em cadeia envolvidas nos processos oxidativos. Nos alimentos, os antioxidantes podem ocorrer como constituintes naturais, ou ser intencionalmente adicionados aos produtos, ou formados durante o processamento, apresentando como principais funções a manutenção da qualidade, o aumento da vida de prateleira e a redução da toxicidade causada por produtos de oxidação.3

Os compostos fenólicos são substâncias sintetizadas a partir do metabolismo secundário dos vegetais, constituindo um grupo com dezenas de milhares de compostos descritos, encontrados nas folhas, frutas, cascas, raízes, caules e flores, exibindo um amplo espectro de efeitos biológicos, incluindo a ação antioxidante.4 A atividade antioxidante dos compostos fenólicos é quimicamente atribuída à capacidade de sequestro dos radicais livres através da doação de elétron(s) com ou sem átomo de hidrogênio, pela ação de quelar íons metálicos, ou pela inibição de enzimas oxidativas. A estrutura química destes compostos é o fator predominante na diferenciação destas atividades. A miricetina, por exemplo, demonstrou ser eficiente na preservação do óleo de linhaça.5

A biodiversidade amazônica apresenta uma grande fonte de plantas ricas em compostos bioativos, cuja exploração racional contribui para o desenvolvimento sustentável da região. Neste contexto diversas espécies vegetais tornaram-se alvo de estudos em virtude do alto teor em compostos fenólicos, entre elas destacam-se Byrsonima crassifolia, Inga edulis e Euterpe oleracea.1,6

Deste modo, o objetivo deste trabalho foi avaliar a estabilidade oxidativa do óleo bruto de açaí (OBA) submetido a 60 ºC, na presença de compostos fenólicos puros ou de extratos vegetais amazônicos ricos nestes compostos.

PARTE EXPERIMENTAL

Matéria-prima

O óleo bruto de açaí (OBA) foi obtido a partir da polpa, produzida através do despolpamento, dos frutos de E. oleracea, conforme segue: os frutos foram coletados na Ilha do Cumbu (Belém-PA) e transportados para o laboratório. Em seguida, foram selecionados, limpos, imersos em água a 45 ºC por 60 min e processados com auxílio de despolpadeira mecânica de inox. A bebida produzida, o açaí, foi congelada a -30 ºC e posteriormente liofilizada. A polpa liofilizada teve sua fração lipídica extraída de acordo com metodologia oficial AOCS Bd 3-52,7 utilizando como solvente éter de petróleo. O OBA produzido foi filtrado com papel filtro qualitativo para remoção das possíveis partículas sólidas e, em seguida, acondicionado em frascos âmbar, sob atmosfera de N2(g) a -30 ºC.

Caracterização físico-química do óleo de açaí

Os parâmetros físico-químicos de qualidade do OBA foram determinados através das análises descritas a seguir:

Parâmetros físicos

O índice de refração e a densidade foram medidos de acordo com as metodologias oficiais AOCS Cc 7-25 e Cc 10a-25,7 respectivamente; a viscosidade cinemática do óleo foi determinada eletronicamente utilizando-se um viscosímetro Cannon-Fenske Ken Kyoto Eletronics (Kyoto, Japão) modelo DA 130N;8 e a cor foi determinada eletronicamente através de colorimetria tristímulus conforme proposto por Mc Carthy et al.,9 utilizando um colorímetro Minolta modelo CR 300 (Tókio, Japão).

Parâmetros químicos

Os índices de acidez, saponificação e peróxido foram mensurados de acordo com as metodologias oficiais AOCS Cd 3d-63, Cd 3-25 e Cd 8-53,7 respectivamente; e a capacidade antioxidante do OBA foi determinada através da redução do radical 2,2-difenil-1-picril-hidrazil (DPPH•), conforme segue: a mistura reacional foi composta pela adição de 5000 mL da solução de DPPH• Sigma (Steinhein, Alemanha) na concentração de 5 mM em iso-octano Synth (São Paulo, Brasil) e 56 mL da amostra de OBA. A absorbância da mistura reacional foi medida a 508 nm após 30 min e os resultados foram expressos em micromolar de equivalente butil-hidroxi-anisol por quilograma de OBA (µM E BHA kg-1 OBA).10

Perfil dos ácidos graxos

O perfil dos ácidos graxos do OBA foi verificado de acordo com a metodologia descrita por Meurens et al.11 e Michotte et al.,5 com as seguintes adaptações:

Preparo das amostras

Quinhentos mg de cada amostra foram solubilizados em 10 mL de KOH Synth (São Paulo, Brasil) a 0,1 M em metanol Tedia (Fairfield, OH) e colocados em banho termostático Quimis (São Paulo, Brasil) durante 1 h a 70 ºC. Posteriormente, 4 mL de HCl Tedia a 1,2 M em metanol foram adicionados e a mistura foi mantida a 70 ºC por 20 min. Os ácidos graxos metilados e esterificados foram separados com a adição de 20 mL de hexano Tedia e 10 mL de água ultrapura. A fase orgânica foi adicionada de um padrão interno de ácido heptadecanoico (C17:0) Nu-Check Prep (Minnesota, EUA), filtrada em filtros de 0,45 µm, colocada sob atmosfera de N2(g) e sob refrigeração.

Análise cromatográfica

O cromatógrafo gasoso usado foi um Shimadzu (Kyoto, Japão) modelo GC 2010 equipado com coluna ZB-WAS plus Phenomenex (60 m x 0,25 mm x 0,25 µm) (Torrance, CA) e detector de ionização de chama. A evolução da temperatura da coluna foi programada da seguinte forma: de 180 a 240 ºC com taxa de 10 ºC min-1 durante os primeiros 5 min de análise, mantendo-se a temperatura ao longo dos 31 min restantes, sendo que as temperaturas do injetor e detector foram programadas para 220 e 250 ºC, respectivamente.

As concentrações de cada ácido graxo foram calculadas através das curvas de calibração a partir da mistura de padrões comerciais de ésteres metílicos de ácidos graxos com cadeia carbônica de C14:0 a C24:1 Nu-Check Prep (Elysian, MN), adicionadas do padrão interno de ácido heptadecanoico (C17:0), conforme dados apresentados na Tabela 1.

Caracterização dos extratos vegetais

Os extratos vegetais ricos em compostos fenólicos e liofilizados de B. crassifolia (folhas), I. edulis (folhas) e E. oleracea (frutos) foram gentilmente cedidos pela Amazon Dreams (Belém-PA, Brasil), os quais foram aplicados no OBA.

A concentração dos compostos fenólicos totais foi determinada através do método colorimétrico de Folin-Ciocalteu e os resultados foram expressos em mg de equivalentes de catequina Sigma (Steinhein, Alemanha) por g de extrato seco (mg Eq CAT g-1 ES);6 os flavonóis totais foram determinados através do método colorimétrico baseado na reação com cloreto de alumínio e os resultados foram expressos em mg de equivalentes de rutina Sigma (Steinhein, Alemanha) por g de extrato seco (mg Eq RUT g-1 ES);12 os flavanóis totais foram determinados através do método colorimétrico utilizando o reagente p-dimetilaminocinamaldeido (DMACA) e os resultados foram expressos em mg de equivalentes de catequina por g de extrato seco (mg Eq CAT g-1 ES).12

A capacidade antioxidante dos extratos vegetais foi determinada através do ensaio Oxygen Radical Absorbance Capacity (ORAC), utilizando fluoresceína como substrato fluorescente e quantificada através do cálculo da área sob a curva (AUC) de decaimento da fluorescência. Os resultados foram expressos em µM de equivalente de Trolox por g de extrato seco (µM Eq Trolox g-1 ES).6

Quantificação dos compostos fenólicos majoritários por CLAE-DAD

A identificação e quantificação dos compostos fenólicos dos extratos vegetais foram realizadas por um sistema de cromatografia líquida de alta eficiência acoplado a detector de arranjo de diodos (CLAE-DAD) de acordo com Souza et al.,13 com adaptações.

A partir dos extratos liofilizados, foram feitas soluções com concentração de 10 mg mL-1 em água acidificada a 1% com ácido fórmico Tedia (Fairfield, OH), filtradas com filtro de 0,22 µm de porosidade, acondicionadas ao abrigo da luz, sob atmosfera de N2(g) e conservadas a -30 ºC.

Análise cromatográfica por CLAE-DAD

A análise dos compostos fenólicos foi realizada em fase reversa usando-se um cromatógrafo líquido Shimadzu (Tokyo, Japão) modelo LC10Avp, pré-coluna C18 Phenomenex (Torrance, CA) (3 x 4 mm), coluna cromatográfica Kinetex C18 (100 x 4,6 mm x 2,6 µm) Phenomenex (Torrance, CA), detector UV/Visível Shimadzu PDA 10AV.

A fase móvel foi composta por água (solução A) e acetonitrila Tedia (Fairfield, OH) (solução B), ambas acidificadas a 1% com ácido fórmico Tedia, e filtradas em membrana de nylon com 0,22 µm de porosidade.

O gradiente de eluição foi de 9% de B por 1 min, 9-28% de B por 19 min, 28-9% de B por 1 min e 9% de B por 3 min. O volume de amostra injetado foi de 20 µL, o fluxo de eluição de 1 mL min-1 e temperatura da coluna de 30 ºC.

A identificação e a quantificação foram realizadas por comparação dos tempos de retenção e por coinjeção dos padrões comerciais dos compostos fenólicos. Os resultados foram obtidos por integração da área dos picos e utilizando a curva de calibração de cada padrão comercial de composto fenólico (Tabela 2), sendo expressos em mg de compostos fenólicos por g de extrato seco (mg g-1 ES).13

Cinética de oxidação do óleo bruto de açaí

A cinética de oxidação do óleo bruto de açaí foi realizada conforme metodologia oficial AOCS Cg 5-97,7 com adaptações. Alíquotas de 20 g do OBA foram adicionadas de 241 µM de palmitato de ascorbila e de 555 µM dos seguintes antioxidantes separadamente: BHA Sigma, miricetina Extrasynthèse (Genay, França), quercetina Sigma e extratos vegetais ricos em compostos fenólicos de B. crassifolia, I. edulis ou E. oleracea; também foi criado um grupo controle, amostras de OBA que não sofreram adição de nenhum antioxidante e/ou extratos. Em seguida, todas as amostras foram submetidas ao processo oxidativos a 60 ºC. As concentrações de palmitato de ascorbila e de cada antioxidante equivalem cada uma a 100 ppm de BHA.

O período de exposição ao processo oxidativo foi de 11 dias, com quatro tempos de coleta (0, 3, 7 e 11 dias). A qualidade do OBA foi verificada através da avaliação do índice de peróxido, capacidade antioxidante pelo método DPPH e de perfil dos ácidos graxos.

Tratamento estatístico

Os resultados foram tratados através de análise de variância (ANOVA) e do teste de Tukey HDS, utilizando o software STATISTIC 7.1. Somente as variáveis com valor de p < 0,05 foram consideradas significativas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Caracterização físico-química do óleo de açaí

Os resultados de caracterização do OBA estão relatados na Tabela 3. Os valores encontrados para os índices de refração e de densidade foram de 1,481 e 0,893 g cm-3, respectivamente; resultados diferentes daqueles encontrados por Pacheco-Palencia et al.;1 no entanto, a cor verde-escuro está de acordo com a descrição qualitativa feita pelos mesmos autores, sendo que as coordenadas L*, a* e b* foram determinadas pela primeira vez neste trabalho. A acidez do OBA apresentou valores inferiores a 1 mg KOH g-1, indicando uma baixa deterioração do referido óleo. A concentração dos produtos de oxidação primária apresentou valor inferior ao máximo permitido pelo Codex Alimentarius, 10 meq H2O2 kg-1 de óleo comestível.14 Ambos os resultados indicam que este óleo vegetal apresentou baixos índices de oxidação.

A capacidade antioxidante do OBA, determinada pelo método DPPH, sugere a presença de compostos antioxidantes naturais. Foi relatada a presença de alfa tocoferol (90 mg 100 g-1 de OBA) e de diversos compostos fenólicos,1 fatos que podem justificar a redução do radical DPPH pelo OBA. A análise do perfil de ácidos graxos por cromatografia gasosa indicou a presença dos seguintes ácidos graxos: palmítico (20,4%), palmitoleico (3,4%), esteárico (1,3%), oleico (63,9%), linoleico (10,3%), linolênico (0,5%) e araquídico (0,05%), resultados semelhantes aos descritos na literatura.1,15

Caracterização dos extratos vegetais

Os extratos enriquecidos de B. crassifolia, E. oleracea e I. edulis adicionados ao OBA foram analisados quanto ao teor, classe dos compostos fenólicos e capacidade antioxidante pelo método ORAC (Tabela 4).

Os valores de compostos fenólicos totais para o extrato de B. crassifolia foram aproximadamente o dobro encontrado para os extratos de E. oleracea e I. edulis. Silva et al.6 estudaram o conteúdo em compostos fenólicos de 15 plantas da flora amazônica, entre elas B. crassifolia e I. edulis, e verificaram que o extrato de folhas de B. crassifolia apresentava os maiores valores em compostos fenólicos totais.

Os teores de flavanóis totais encontrados para os extratos apresentaram um comportamento semelhante ao encontrado para o ensaio de compostos fenólicos totais; o extrato de B. crassifolia possui em média 83,7 mg Eq CAT g-1 ES, valor nitidamente superior ao encontrado para os demais extratos, que possuíam em média 32 mg Eq CAT g-1 ES. A concentração média de flavonóis totais do extrato de I. edulis foi de 147 mg Eq RUT g-1 ES, valor bem superior ao verificado para os extratos de B. crassifolia e E. oleracea, que foram de 24,7 e 15,5 mg Eq RUT g-1 ES, respectivamente. Quando comparados os valores encontrados para os extratos de B. crassifolia e I. edulis, foi possível verificar que o extrato de B. crassifolia apresentou valores superiores de flavanóis e inferiores para flavonóis; enquanto o extrato de I. edulis possui perfil contrário quanto a essas duas classes de flavonóides.13

Correlacionando-se os resultados de flavonóis totais e de capacidade antioxidante pelo método ORAC, foi possível observar que quanto maior a concentração de compostos fenólicos da classe dos flavonóis, maior foi a capacidade antioxidante apresentada pelos extratos. A alta atividade antioxidante dos flavonóis deve-se as suas características químicas estruturais.16 A capacidade antioxidante quantificada pelo ORAC demonstrou valores médios maiores quando comparados com extratos de outras plantas da flora amazônica, tais como, Brownea rosademonte (289,4 µM Eq Trolox g-1 ES), Piper putumayoense (359,1 µM Eq Trolox g-1 ES) e Senna reticulata (222,6 µM Eq Trolox g-1 ES), confirmando que os extratos utilizados são ricos em compostos antioxidantes.17

Os resultados de CLAE-DAD dos extratos vegetais (Tabela 5) indicam a presença de três compostos fenólicos majoritários para os extratos de B. crassifolia e I. edulis, e cinco compostos para E. oleracea; todos os compostos identificados estavam de acordo com dados descritos na literatura.6,18 A presença de grande quantidade de ácido gálico nos três extratos deve ser destacada, pois esse ácido hidroxibenzoico apresenta característica polar, o que pode interferir na sua solubilidade e ação antioxidante em meio lipofílico. As formas glicosiladas dos flavonoides também apresenta baixa solubilidade na ausência de emulsificantes. Deve ser destacada alta concentração de miricetina-3-O-α-L-raminopiranosídeo no extrato de I. edulis, pois esse composto representa 25% dos sólidos totais do referido extrato e apresenta aplicações farmacológicas e alimentares interessantes.19

Cinética de oxidação do óleo bruto de açaí

A Figura 1a apresenta a evolução dos peróxidos no OBA, na presença de diferentes compostos fenólicos a 60 ºC durante 11 dias. Comparando os antioxidantes, verificou-se que o padrão de miricetina apresentou a capacidade de retardar o processo oxidativo até o 3º dia de ensaio, pois o índice de peróxido se manteve inferior ao máximo permitido pela legislação internacional,14 10 meq H2O2 kg-1 de óleo. Michotte et al.5 também apontaram a capacidade protetora da miricetina frente ao processo de oxidação do óleo de linhaça, confirmando a ação preventiva deste flavonol frente ao processo de oxidação de óleos alimentícios.


A adição de 100 ppm de BHA ou de equivalentes compostos fenólicos na forma de extratos enriquecidos de B. crassifolia, I. edulis ou E. oleracea não auxiliou numa redução do índice de peróxido após 3 ou 7 dias, quando comparados com o controle. Os padrões de miricetina e quercetina apresentaram as menores taxas de formação de peróxido ao longo do estudo, mas a quercetina, apesar da sua alta atividade antioxidante, não foi capaz de retardar o processo oxidativo dos óleos em estudo.

O tempo foi um fator determinante para a redução da capacidade antioxidante apresentada pelas amostras de OBA. Comparando a capacidade antioxidante pelo método DPPH do OBA adicionados de diferentes antioxidantes (Figura 1b) foi possível observar que as amostras com os extratos de E. oleracea e I. edulis apresentaram comportamento de redução de capacidade antioxidante estatisticamente semelhante; as amostras contendo o extrato de B. crassifolia apresentaram diminuição da capacidade antioxidante semelhante à da amostra controle e o OBA adicionado com padrão de miricetina foi o que demonstrou a menor redução da sua capacidade antioxidante.

Os resultados da capacidade antioxidante pelo método DPPH se correlacionam com os resultados de formação dos peróxidos (coeficiente de correlação = -0,9491%, n = 66 e p < 0,005), visto que quanto maior a redução da capacidade antioxidante apresentada pelas amostras com e sem adição de antioxidantes, maior foi a formação dos peróxidos. As amostras que foram adicionadas com padrões ou extratos não apresentaram diferença significativa quanto a sua capacidade antioxidante no tempo zero.

Observando os resultados de porcentagens médias de cada ácido graxo do óleo bruto de açaí (Tabela 6), foi possível verificar que os ácidos graxos poli-insaturados foram os que apresentaram redução significativa ao longo da cinética de oxidação, exceto para as amostras adicionadas de padrão de quercetina.

Os extratos das espécies vegetais amazônicas utilizadas, apesar dos seus elevados valores de capacidade antioxidante, não apresentaram ação preventiva contra o processo de oxidação do OBA, comportamento que pode ser justificado por dois fatores: a presença dos carboidratos na estrutura química dos compostos fenólicos constituintes dos extratos vegetais e a elevada concentração de ácido gálico nos três extratos, visto que se trata de um composto com característica polar de solubilidade. Os resultados encontrados na cinética de oxidação confirmam que fatores como o número e as posições dos grupos hidroxila e de outros substituintes, em particular de carboidratos, interferem decisivamente na ação dos compostos fenólicos.4,16,20

CONCLUSÕES

O óleo bruto de açaí estava de acordo com os dados descritos pela literatura. Os extratos de B. crassifolia, E. oleracea e I. edulis apresentaram um elevado teor de compostos fenólicos e de capacidade antioxidante pelo método ORAC. Quanto ao perfil dos compostos fenólicos, todos os extratos apresentaram alta concentração em ácido gálico e compostos fenólicos glicosilados, como miricetina-3-O-α-L-raminopiranosídeo e quercetina-3-O-α-L-glicosídeo. Comparando os antioxidantes utilizados durante a cinética de oxidação do OBA, verificou-se que apenas o padrão de miricetina apresentou a capacidade de retardar o processo oxidativo. Os extratos de B. crassifolia, I. edulis e E. oleracea, apesar do seu promissor perfil de compostos fenólicos totais e capacidade antioxidante, não apresentaram capacidade preventiva contra a oxidação. Os resultados obtidos durante a cinética de oxidação a 60 ºC do OBA indicam que a estrutura química e o meio no qual os compostos fenólicos estão inseridos são fatores determinantes para atividade antioxidante destas substâncias.

AGRADECIMENTOS

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Pará (FAPESPA) pelo suporte financeiro para a realização deste trabalho de pesquisa.

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Recebido em 10/5/12; aceito em 13/10/12; publicado na web em 20/2/13

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Abr 2013
    • Data do Fascículo
      2013

    Histórico

    • Recebido
      10 Maio 2012
    • Aceito
      13 Out 2012
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