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Metodologias gerais empregadas no isolamento e identificação estrutural de feromônios de insetos

General methodologies employed on the isolation and structural identification of insects pheromones

Resumo

A selection of common procedures which are used for the identification and analysis of volatile biologically active compounds from insects are described.

pheromones; GC-FTIR; microderivatizations


pheromones; GC-FTIR; microderivatizations

DIVULGAÇÃO

Metodologias gerais empregadas no isolamento e identificação estrutural de feromônios de insetos

Paulo H. G. Zarbin* * e-mail: pzarbin@quimica.ufpr.br † In Memorian

Departamento de Química - Universidade Federal do Paraná - CP 19081 - 81531-990 - Curitiba - PR

J. Tércio B. Ferreira † * e-mail: pzarbin@quimica.ufpr.br † In Memorian

Departamento de Química - Universidade Federal de São Carlos - São Carlos - SP

Walter S. Leal

National Institute of Sericultural and Entomological Science - Tsukuba - Ibaraki - 305 - Japan

Recebido em 24/11/97; aceito em 25/6/98

General methodologies employed on the isolation and structural identification of insects pheromones.A selection of common procedures which are used for the identification and analysis of volatile biologically active compounds from insects are described.

Keywords: pheromones; GC-FTIR; microderivatizations.

INTRODUÇÃO

Desde as primeiras observações sobre o comportamento sexual dos insetos, datadas do começo do século, a atração em geral exercida pelas fêmeas sobre machos da mesma espécie, tem despertado a curiosidade dos cientistas para este intrigante comportamento.

Fabré1, em seus experimentos de atratividade de machos por fêmeas, ficou tão impressionado com a distância na qual estas atrações poderiam ocorrer, que descartou a possibilidade desta resposta ser mediada por odores químicos, uma vez que ele mesmo não era capaz de detectar tais substâncias.

Muitos estudos foram necessários para se concluir que tal suposição era incorreta, e hoje, o nosso conhecimento sobre o assunto, atingiu um grau muito mais elevado do que poderiam imaginar Fabré e seus contemporâneos.

A comunicação química é o modo primário utilizado pelos insetos para a transferência de informações2. Os então chamados "atraentes sexuais", ou como são conhecidos hoje "feromônios sexuais"3, são substâncias químicas, específicas para cada espécie, utilizadas para atrair os membros do sexo oposto. Ao serem emitidas, e posteriomente detectadas, as atividades pré-copulatórias seriam iniciadas.

A primeira identificação química de um feromônio sexual, utilizado pela mariposa Bombyx mori (bicho da seda), foi resultado de mais de vinte anos de pesquisa4. Este trabalho despertou grande interesse, não apenas pelo pioneirismo, mas também pela simplicidade da estrutura química atribuída ao feromônio. Os trabalhos subsequentes, como os referentes às espécies Trichoplusia ni5 e Argyrotaenia velutinana6, tornavam aparente que a maioria dos feromônios sexuais teriam estruturas moleculares igualmente simples.

A demonstração feita por Shorey e colaboradores7 de que esses compostos poderiam ser utilizados para o controle de populações de insetos através da confusão causada na comunicação sexual, demonstração esta concomitante à necessidade emergente de descobrir métodos atóxicos para o controle de insetos8, causou uma "explosão" no interesse em se entender todos os aspectos envolvidos na comunicação química, desde a natureza química dos compostos aos caminhos biossintéticos seguidos para a produção do feromônio.

Por contemplar muitos aspectos diversos, as pesquisas neste campo se caracterizam por serem interdisciplinares, uma vez que envolvem a participação de químicos, biólogos, entomólogos e agrônomos, entre outros.

O maior problema encontrado para a identificação de feromônios está no fato desses materiais biologicamente ativos serem produzidos pelos organismos em quantidades extremamente baixas, no meio de uma grande quantidade de compostos inativos, porém quimicamente semelhantes.

Com isso, o processo de identificação requer técnicas gerais e procedimentos que permitam a obtenção de materias naturais puros, em escala de nanogramas. O sucesso no isolamento e identificação do(s) composto(s) biologicamente ativo(s) sempre estará relacionado 'a escolha correta dos procedimentos analíticos envolvidos.

A seguir, serão descritos alguns dos procedimentos comumente utilizados neste processo9.

COLETA DE MATERIAL

Para a identificação do feromônio sexual de Bombyx mori, mais de 500 mil insetos foram utilizados no processo de extração10. Logicamente isso se fez necessário, em função dos baixos recursos tecnológicos existentes na época, que impossibilitavam a análise de pequenas quantidades de material.

Com o avanço das técnicas físico-químicas de análise, principalmente da espectroscopia de massa e da cromatografia gasosa, e o alto grau de sensibilidade e resolução que estes equipamentos oferecem, isso deixou de ser necessário, sendo que hoje, normalmente, a extração de um pequeno número de insetos já é suficiente, para que se possa adquirir os primeiros dados espectrais da molécula.

Os métodos utilizados para a coleta de feromônios são basicamente dois:

1) Aeração (coleta de voláteis);

2) Extração por solvente (extração direta da glândula);

Leal e colaboradores11 utilizaram ambos os métodos para a extração do feromônio de Heptophylla picea, e relataram diferenças significativas entre os processos. Do mesmo modo, Silk e colaboradores12, trabalhando na identificação do feromônio de Choristoneura fumiferana, mostraram que as quantidades de material obtidas através das duas técnicas mencionadas, não são necessariamente as mesmas.

Aeração

Através do processo de aeração, todos os voláteis emitidos pelos insetos, o que inclui os feromônios, são coletados.

Os compostos são adsorvidos em polímeros especiais [Porapak Q (etilvinilbenzeno-divinilbenzeno; Supelco), Tenax (óxido de 2,6-difenil-p-fenileno; Supelco), etc.] e a dessorção é realizada utilizando-se solventes como diclorometano, hexano e éter, com um alto grau de pureza. A preferência por tais solventes se deve à volatilidade dos mesmos, o que possibilita a evaporação sem que os materiais coletados sejam expostos a altas temperaturas. Ainda assim, perdas de material por arraste poderão ser observadas.

Por não se saber, a princípio, qual a faixa do dia em que a produção de feromônios é mais efetiva, a coleta é sempre realizada durante um período de 24 horas.

Os sistemas de aeração utilizados geralmente são de vidro e podem ser esquematizados como mostrado na Figura 1.


Na entrada do sistema, é adaptada uma coluna contendo carvão ativado, para que o ar seja pré-filtrado. A um fluxo de 1 L/min, os voláteis são arrastados até a extremidade oposta e, então, adsorvidos no polímero. Cabe ressaltar que este processo não irá, necessariamente, garantir uma total adsorção dos compostos e de todos os componentes. A utilização inicial de diferentes polímeros é recomendada, sendo que uma comparação posterior dos resultados alcançados, indicaria o melhor sistema a ser empregado. Após o tempo adequado (24 h), interrompe-o vácuo e a coluna contendo os compostos adsorvidos é desconectada do sistema.

O processo de dessorção dos voláteis deve ser feito utilizando-se uma pequena quantidade de solvente (~ 2,5 mL), de modo a diminuir o grau de impurezas, visto que o volume final do extrato será extremamente reduzido (seção - Concentrando os extratos).

Extração por solvente

A extração por solvente é, sem dúvida, a metodologia mais utilizada para a coleta de feromônios, pois, além da praticidade do método, esta requer um tempo muito menor para a obtenção do material, do que a aeração. No entanto, utilizando-se deste processo, o material coletado sempre irá apresentar uma quantidade muito maior de impurezas, como hidrocarbonetos, ácidos graxos e outros, visto que todo o inseto está sendo extraído, incluindo gorduras e cutículas.

O método se torna extremamente vantajoso, quando se sabe em qual parte do inseto é que está localizada a glândula produtora do feromônio, pois, desta forma, a extração pode ser feita apenas nesta região específica, diminuindo consideravelmente as impurezas e, consequentemente, facilitando as futuras análises.

Em um típico procedimento, os insetos são imersos em solvente (quantidade suficiente para cobrí-los) e mantidos por cinco minutos. O extrato é então filtrado em uma pipeta de Pasteur contendo Na2SO4 anidro, e subsequentemente concentrado.

Ressalta-se que as quantidades de material obtidos através dos dois processos citados de extração não serão necessariamente as mesmas. Novamente uma comparação dos resultados deve ser feita, para se determinar qual o melhor caminho a ser seguido.

Concentrando os extratos

A remoção do solvente é uma das partes mais críticas deste processo. A volatilidade dos compostos, associada às pequenas quantidades, faz com que as perdas de material sejam frequentes, diminuindo o rendimento da extração. Para que tais perdas sejam minimizadas, os extratos obtidos na dessorção ou pela extração por solventes devem ser armazenados em pequenos tubos cônicos, que irão facilitar a evaporação. Uma vez armazenados, um leve fluxo de nitrogênio ou argônio, deverá ser suavemente passado sobre a superfície do solvente, até que seja atingida a concentração desejada.

Para que se possa determinar comparativamente o volume a ser atingido, um frasco de iguais dimensões contendo um volume conhecido de solvente, deve ser usado como referência, como ilustrado na Figura 2.


A concentração ideal irá depender de cada caso em particular e envolve fatores como a quantidade de feromônio produzida pelo inseto. No entanto, em um primeiro estágio, as amostras podem ser concentradas para "insetos equivalentes" (IE), ou seja, supondo-se que a coleta de feromônio foi realizada com 10 insetos (independente do método utilizado), os extratos seriam concentrados para 10 mL.

Desta maneira, ao se injetar 1 mL no cromatógrafo, estar-se-ia, a princípio, analisando todos os compostos, com suas respectivas proporções, que foram obtidos de um único indivíduo. A partir deste dado inicial, as devidas correções de concentração podem ser feitas, caso seja necessário.

ANÁLISES INICIAIS

O maior problema a ser enfrentado, após se ter obtido os primeiros dados cromatográficos dos extratos, é determinar quais compostos, dentre os vários presentes, são biologicamente ativos.

Uma maneira rápida e prática de se fazê-lo, é através da comparação dos cromatogramas obtidos pela análise dos extratos de machos e fêmeas. Uma vez que os feromônios são produzidos especificamente pelos membros de um único sexo, caso sejam encontradas substâncias que estejam presentes apenas em um dos substratos analisados, isto seria um bom indicativo de serem estes, ou algum destes, os compostos ativos.

Esta metodologia pode ser claramente visualizada na Figura 3. O caso específico retrata a análise dos extratos de Anomala cuprea, praga de vários tipos de culturas no Japão13. Observa-se que ambos os cromatogramas são extremamente semelhantes; porém, os compostos assinalados estão presentes apenas no extrato das fêmeas da espécie. Esta especificidade foi um fator determinante para a elucidação estrutural do feromônio desta praga, pois concluiu-se posteriormente, em definitivo, que os dois compostos assinalados eram as substâncias utilizadas por estes insetos para a atração sexual14.


Porém, infelizmente, este tipo de comparação não é suficiente, e também não apresenta eficácia para a grande maioria dos casos, o que faz com que seja necessária, a utilização de técnicas mais elaboradas, que permitam uma correta atribuição dos compostos ativos.

A seguir, será discutida a principal e mais eficiente técnica empregada para esta finalidade.

Cromatografia gasosa acoplada a um detector eletroantenográfico (CG-EAD)

A principal característica dos insetos no que diz respeito a comunicação química é a sensibilidade e especificidade com que suas antenas atuam, para a percepção do(s) componente(s) correto(s) de seus feromônios15,16 .

Estudando o comportamento eletrofisiológico no sistema olfativo de Bombyx mori, Schneider17 revelou que o potencial de recepção do inseto ao seu feromônio poderia ser registrado utilizando-se uma antena isolada, posicionada entre dois microeletrodos capilares, que estariam conectados a um amplificador e a um registrador.

O então chamado sistema EAD ("electroantennographic detector"), em que a antena do inseto é utilizada como elemento sensitivo (detector biológico), passou a ser amplamente utilizado para a realização de ensaios biológicos.

No entanto, quando utilizada isoladamente, tal técnica não apresenta grandes vantagens em relação aos ensaios convencionais, uma vez que não se pode especificar quais são os componentes que estão afetando o comportamento biológico dos insetos.

Quando em 1969, Moorhouse e colaboradores18 relataram o acoplamento do sistema EAD a um cromatógrafo a gás, utilizando-se de uma divisão do fluxo da coluna, surgiu um método extremamente eficaz para a detecção de feromônios, uma vez que estariam sendo aliados a enorme capacidade analítica e de separação do cromatógrafo à especificidade e sensibilidade do EAD.

Utilizando-se desta nova metodologia, através de uma simples análise do extrato bruto, pode-se determinar, com total precisão, qual composto é o feromônio.

O esquema de um cromatógrafo a gás acoplado a um detector eletroantenográfico (GC-EAD), está representado na Figura 4. A amostra ao ser injetada, irá percorrer toda a coluna para que haja a separação dos compostos. Ao final da corrida, o fluxo que está saindo da coluna é dividido em dois, sendo que uma parte vai para o FID ("Flame Ionization Detector") e, consequentemente, o cromatograma é traçado, e a outra parte vai para o EAD, onde a resposta da antena é amplificada. Em função de ambas as detecções serem simultâneas, é possível saber se o composto registrado pelo FID é ou não ativo.


Atualmente, são raros os trabalhos de elucidação estrutural, em que este recurso não é empregado. Millar e colaboradores19 ressaltaram a importância da técnica, na identificação do feromônio de A. nuxvorella. Recentemente, o feromônio sexual de P. diversa foi identificado20, utilizando-se também de CG-EAD, como mostrado na Figura 5. O exemplo demonstra nitidamente a eficiência do sistema.


Observa-se que o componente ativo, registrado pelo EAD, está presente em quantidade extremamente baixa, não sendo sequer detectado pelo FID do cromatógrafo. A detecção de tal composto por outro método de análise seria impossível.

Cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas (CG-EM)

A etapa de elucidação estrutural começa após se saber qual composto deverá ser estudado. Dessa forma o primeiro espectro a ser realizado é, normalmente, o espectro de massas. Apenas uma pequena quantidade de material é requerida para a análise, sendo que as informações obtidas são fundamentais para a determinação estrutural da molécula.

O fato de o equipamento utilizado estar acoplado a um cromatógrafo a gás (CG-EM), faz com que os espectros adquiridos, sejam referentes a compostos quimicamente puros.

Na identificação de feromônios, os métodos comumente empregados para ionizar e fragmentar os compostos são o da ionização química (CI) e o de impacto de elétrons (EI).

Essa combinação de técnicas se mostra extremamente eficiente pois, se para um determinado espectro o pico molecular não for registrado ou for de baixa intensidade quando adquirido através de EI, a CI é empregada para a determinação do peso molecular correto do composto, ao passo que a EI, fornece muito mais informações a respeito da estrutura, em função de apresentar um número maior de fragmentações.

Bjostad e colaboradores21 relataram recentemente, a identificação do feromônio sexual de Hesperophylax occidentalis, em que ambas as técnicas de fragmentação foram utilizadas.

Os dados obtidos por CG-EM (EI) do composto, indicaram uma massa relativa aparente de 156 e, através das análises dos fragmentos e comparação destes com padrões, sugeriu-se a estrutura de uma alcan-3-ona (Figura 6A). O pico base m/z 174 (M+18), obtido por CG-EM (CI-NH3), confirmou a massa molecular 156 para o composto em questão (Figura 6B).


O tempo de retenção observado para o feromônio se mostrou inferior ao da decan-3-ona e superior ao da nonan-3-ona, utilizadas como padrões sintéticos. Isso sugeria o composto como sendo a nonan-3-ona, porém com uma ramificação metílica.

No intuito de determinar qual seria a posição trissubstituída na molécula, o esqueleto (hidrocarboneto) da estrutura foi preparado, a partir de derivatizações químicas realizadas no produto natural (descritos na seção: Micro-derivatizações), visto que os espectros de massas de todos os monometil nonanos estão descritos na literatura22 e diferem significativamente entre si.

Através de comparações, atribuiu-se o hidrocarboneto obtido, como sendo o 4-metil nonano, o que indicava, mediante os dados anteriores, duas possibilidades estruturais para o feromônio; a 4-metil-nonan-3-ona ou a 6-metil-nonan-3-ona (Figura 7).


Para se atribuir em definitivo a estrutura química da molécula, uma análise minuciosa do espectro de massas se fez necessário. A presença dos fragmentos m/z 72 e m/z 84, indicavam, indubitavelmente, que tal composto era a 6-metil-nonan-3-ona (Figura 8).


As mesmas fragmentações, quando realizadas com a 4-metil-nonan-3-ona, deveriam apresentar fragmentos m/z 70 e m/z 86 (Figura 9), os quais não estão presentes no espectro do produto natural (Figura 6).


Cromatografia gasosa acoplada ao infra-vermelho (CG-FTIR)

As frequências de absorções no infravermelho se extendem de 200 a 5000 cm-1. No entanto, na identificação de feromônios (e da grande maioria das substâncias orgânicas), a região entre 600 a 4000 cm-1 é a que apresenta maior interesse.

A técnica é empregada no intuito de se obter informações sobre a presença ou não de determinados grupos funcionais na molécula, como hidroxilas, carbonilas, carboxilas etc., em função destes apresentarem absorções bastante características no espectro23. Este novo conjunto de dados, quando aliado aos previamente obtidos, auxilia na elucidação estrutural.

A aquisição de um espectro no infra-vermelho de um feromônio não é um processo simples. A utilização de microcelas especiais, normalmente se faz necessário24, sendo que o composto a ser analisado deve sempre apresentar um alto grau de pureza, para que se evite falsas atribuições. Mesmo tomando-se todas essas precauções, os espectros obtidos nem sempre são satisfatórios.

Uma maneira prática e eficiente de se obter bons espectros, tendo-se pequena quantidade de material e sem haver a necessidade de uma prévia purificação, é a utilização de um espectrômetro de infravermelho (com transformada de Fourier), acoplado a um cromatógrafo a gás (CG-FTIR). O sistema foi introduzido inicialmente, em 1967, por Low e colaboradores25, porém somente com as modificações realizadas por Bourne e colaboradores26 é que este passou a ser frequentemente utilizado para a análise de substâncias voláteis ou volatilizáveis.

O fato de os compostos estarem presentes em fase gasosa, faz com que as frequências de absorções observadas não sejam, necessariamente, coincidentes com aquelas detectadas, quando da aquisição do espectro em fase condensada. Os valores destas frequências, para diversos grupos funcionais estão descritos em literatura27.

Na identificação do feromônio de H. picea11, os dados obtidos pelo espectro de infra-vermelho foram decisivos para a correta atribuição estrutural (Figura 10A). Análises preliminares indicavam a possibilidade da estrutura ser uma g-lactona, tendo esta uma cadeia lateral com duas duplas ligações. O espectro de infra-vermelho tornava clara a existência do sistema oxaciclopentan-2-ona (1772 cm-1) e ainda sugeria que uma das duplas ligações seria terminal (3073 e 1641 cm-1), e a outra apresentaria configuração cis (3002 cm-1). Estes dados permitiram atribuir a estrutura da (Z)-7,15-hexadecadien-4-olida para este feromônio (Figura 10B).


PURIFICAÇÃO

A obtenção de amostras puras dos feromônios é fundamental para se dar continuidade ao processo de identificação, pois caso seja necessária a realização de derivatizações, um correto monitoramento dos produtos formados só é possível se estas forem realizadas a partir de um único componente. Um outro fator, é que os bioensaios devem ser realizados utilizando-se compostos puros, uma vez que as impurezas químicas, normalmente, afetam a atividade biológica do produto natural24.

Várias são as técnicas empregadas para a separação dos componentes ativos de uma mistura, e a escolha entre elas é feita, basicamente, em função da quantidade de material disponível e do grau de resolução desejado24.

A cromatografia em coluna é uma metodologia bastante eficiente, amplamente utilizada, e oferece certas vantagens em relação às demais; apresenta baixo custo, é prática e o material utilizado pode ser descartado após o uso, evitando possíveis contaminações. Diferentes tamanhos e diâmetros de colunas podem ser utilizados, em função da quantidade de material a ser separado. As colunas, quando empacotadas com sílica gel, são eluídas com diferentes combinações de solventes, aumentando-se gradativamente a polaridade. Em um procedimento básico, a eluição é iniciada utilizando-se hexano, seguido de misturas de hexano:éter etílico/ 95:5, 90:10, 75:25, 50:50, 25:75 e, então, éter etílico.

Bioensaios são conduzidos, no intuito de se determinar qual a fração que contém o feromônio. Este monitoramento também pode ser feito, através do sistema EAD. Sabendo-se em qual gradiente de solvente que o feromônio foi eluído, pode-se ter uma idéia sobre a polaridade do composto, e fazer suposições a respeito do grau de funcionalização que este apresenta.

Uma vez determinada a fração ativa, a pureza do feromônio é checada por cromatografia gasosa. Se o grau de pureza obtido não for considerado satisfatório, o processo é repetido até que seja atingida a pureza desejada (Figura 11). Um novo sistema de solventes pode ser empregado, sendo que, normalmente, vários ciclos de fracionamento são necessários, para que se consiga uma amostra de feromônio com alto grau de pureza.


MICRO-DERIVATIZAÇÕES

As micro-derivatizações são realizadas no produto natural, quando o conjunto de dados espectroscópicos obtido não foi suficiente para se atribuir corretamente a estrutura molecular do feromônio, mas sugere que isto seja possível através da análise dos produtos de degradação da molécula. Beroza28 discute vários tipos de reações possíveis de serem realizadas e os principais cuidados a serem tomados, tendo-se pequenas quantidades de material. Os maiores problemas enfrentados estão normalmente relacionados às perdas de material ao término da reação.

A necessidade constante em se determinar o correto número de duplas ligações e a posição em que estas se encontram na molécula, principalmente para feromônios de Lepidópteras (classe de insetos amplamente estudada), fez com que fossem feitas várias adaptações experimentais para micro escala de métodos já conhecidos, sendo que os mais comuns são hidrogenação catalítica29, epoxidação30, micro-ozonólise31 e derivatização com DMDS32.

As derivatizações realizadas por Bjostad e colaboradores21 na identificação do feromônio de H. occidentalis (vide seção: 3.1-CG-EM) são pouco comuns em se tratando de química de feromônios, visto que há três etapas lineares envolvendo procedimentos relativamente complexos de serem realizados em pequena escala (a nível de nanogramas !). Em função disso, tais etapas serão discutidas em maiores detalhes. Nas condições em que as análises de CG-EM foram realizadas21, o feromônio apresentou um tempo de retenção de 7,05 min e uma massa molecular de 156. Após purificação e isolamento, este foi tratado com LiAlH4 em éter, e o produto da reação apresentou um tempo de retenção ligeiramente superior (7,20 min) e uma massa de 158. Isso confirmava que o feromônio era uma cetona, e as análises do espectro de massa (EI) do produto de derivatização, sugeriam a possibilidade deste ser um alcan-3-ol. O álcool obtido foi tratado com dibromo trifenilfosfina, produzindo um composto com tempo de retenção superior (8,49 min), e EM (EI) coerente com o de um monometil bromononano. O hidrocarboneto derivado do feromônio foi preparado, a partir da reação do brometo acima mencionado com borohidreto de sódio em DMSO (Figura 12). O tempo de retenção observado para o produto final foi de 4,22 min e o espectro de massa (EI) obtido, indicava ser este um 4-metil nonano.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como foi discutido nos tópicos anteriores, vários são os caminhos e técnicas empregados no processo de elucidação estrutural. Porém, a única maneira possível de se atribuir indubitavelmente a estrutura química a um feromônio é através da síntese desta provável estrutura, e posterior comparação dos dados obtidos com os do produto natural.

Um outro fator importante é que, quando tais compostos apresentam centros estereogênicos, estes são encontrados, normalmente, em estados enantiomericamente puros, uma vez que está bem estabelecida a estereoespecificidade que a maioria dos insetos possui, com relação as substâncias utilizadas na comunicação química33. Para esses casos, a síntese assimétrica se torna extremamente importante, pois fornece de maneira independente (ou altamente seletiva) cada um dos vários estereoisômeros possíveis para cada molécula, o que possibilita estabelecer a relação estereoquímica-atividade biológica e, consequentemente, a configuração absoluta do produto natural. Os produtos sintéticos obtidos poderiam ainda ser comparados com o feromônio natural através de cromatografia gasosa em colunas quirais, sendo esta a metodologia mais eficiente empregada para a determinação da estereoquímica absoluta do produto natural13,34.

Os testes comportamentais, ou bioensaios, são também fundamentais para que se possa identificar qual o tipo de resposta que os insetos apresentam diante do feromônio sintético, ou seja, qual seria a função da estrutura química no processo de comunicação dos insetos (alarme, agregação, sexual, etc.).

AGRADECIMENTOS

À FAPESP e ao CNPq (sanduíche) pelas bolsas de P. H. G. Z. Ao Prof. Romeu C. Rocha-Filho pelas sugestões e revisão do manuscrito.

REFERÊNCIAS

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    In Memorian
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Maio 2000
    • Data do Fascículo
      Abr 1999

    Histórico

    • Aceito
      25 Jun 1998
    • Recebido
      24 Nov 1997
  • Sociedade Brasileira de Química Secretaria Executiva, Av. Prof. Lineu Prestes, 748 - bloco 3 - Superior, 05508-000 São Paulo SP - Brazil, C.P. 26.037 - 05599-970, Tel.: +55 11 3032.2299, Fax: +55 11 3814.3602 - São Paulo - SP - Brazil
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