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A Relevância do Título, do Resumo e de Palavras-chave para a Escrita de Artigos Científicos

Inicialmente, gostaríamos de agradecer à equipe editorial da Revista de Administração Contemporânea (RAC), em especial ao Professor Wesley Mendes-Da-Silva, editor desse veículo, pela confiança e pelo convite a nós endereçado. A proposta deste editorial é abordar uma questão relevante para os pesquisadores de modo geral e, mais especificamente para os que se dedicam à área de negócios, como também para as revistas científicas, autores e leitores. Trata-se da importância da escolha de títulos, da redação de resumos e da escolha das palavras-chave que indexam os artigos que publicamos. Por ser o primeiro contato do leitor com o texto, esses componentes iniciais de toda e qualquer publicação científica constituem ferramentas fundamentais na determinação da visibilidade de um trabalho entre os leitores.

A discussão de comentários que envolvem a escrita científica é algo que nos desperta grande interesse, não só pela experiência acumulada durante nossa atuação no meio acadêmico – marcada pela elaboração de projetos e relatórios de pesquisa desde a iniciação científica até o pós-doutorado, pela produção de artigos acadêmicos e sua submissão a periódicos nacionais e internacionais - mas também pelo conhecimento acumulado como pareceristas e revisores de produção textual. Os sucessos e as dificuldades com as quais nos deparamos nos diferentes estágios da escrita acadêmica e a observação como avaliadores de alguns aspectos recorrentes que dificultam a submissão de certos artigos científicos têm nos despertado o desejo de compartilhar tal conhecimento com aqueles que se dedicam à pesquisa de modo a subsidiá-los com sugestões e recomendações que visam melhorar a qualidade de apresentação de seus trabalhos e, como consequência, aumentar a capilaridade de disseminação dos resultados de pesquisa.

Escrita efetiva de artigos científicos tem se tornado um tema de grande relevância. A própria RAC, ao dedicar o espaço de seus editoriais mais recentes para abordar questões pertinentes à pesquisa em negócios, também compartilha do interesse em levar a seus autores e leitores mais informação de modo a auxiliá-los na compreensão das novas demandas da ciência na atualidade e como isso se reflete na produção e na divulgação da pesquisa.

Essa preocupação pode ser explicada, em parte, pela exigência cada vez maior das instituições de ensino e pesquisa, e até de algumas empresas, para que seus pesquisadores divulguem seus trabalhos em periódicos. De acordo com o relatório Research in Brazil, produzido pela Clarivate Analytics para a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), o Brasil ocupa o 13º lugar de maior produtor de publicações de pesquisas em nível mundial e seus resultados crescem anualmente (Cross, Thomson, & Sibclair, 2017). Só no ano de 2016, aproximadamente 2,3 milhões de trabalhos científicos envolvendo todas as áreas do conhecimento foram publicados em revistas de boa reputação classificadas na base de dados Scopus (Pierro, 2019)Pierro, B. (2019). Comunicação científica sem barreiras: Comissão europeia e agências de apoio à pesquisa buscam aliados para implantar iniciativa de acesso aberto de alcance mundial. Revista Pesquisa Fapesp, Ano 20, (276), 18-25. Recuperado de http://revistapesquisa.fapesp.br/2019/02/08/comunicacao-cientifica-sem-barreiras/
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.

O grande volume de publicações submetido às revistas de alto impacto também corrobora a atenção dada à comunicação efetiva dos trabalhos científicos. As avaliações mais rigorosas dos editores e revisores desses veículos demandam maior cuidado dos autores não só em relação ao conteúdo dos textos, mas também à forma como são escritos.

Além disso, pesquisas que fomentam o compartilhamento de informações e dados entre diversos campos de conhecimento com o objetivo de solucionar problemas complexos (Mendes-Da-Silva, 2019a, 2019b), tão comuns à área de gestão, demandam que a comunicação entre os diferentes atores envolvidos no projeto seja simples e objetiva. Embora siga o rigor que define o gênero, a escrita científica precisa ser compreensível para os diferentes interessados de modo a contribuir para a produção de resultados que impactem positivamente a qualidade de vida dos cidadãos.

A publicação de artigos científicos move a ciência, na medida em que novas investigações evoluem a partir das precedentes, ou seja, pautam-se em pesquisas anteriores para reafirmá-las, questioná-las ou refutá-las. A consulta a saberes socialmente construídos permite apreender descobertas realizadas acerca de um determinado fenômeno, determinar as lacunas existentes e/ou desenvolver, a partir de tais conhecimentos, ferramentas que atendam as demandas da sociedade de modo geral.

Por outro lado, as mesmas publicações promovem o mundo científico. Artigos legitimados perante a sociedade garantem reconhecimento social e profissional de seus autores, o que pode lhes render maiores chances de ascensão profissional e acadêmica. Já a instituição que incentiva a pesquisa também compartilha os créditos desse mérito. O prestígio social, reflexo de suas produções acadêmicas bem-sucedidas, aumenta a probabilidade de receber verbas e recursos para a execução de novos projetos (Aguinis, Suárez-González, Lannelongue, & Joo, 2012).

Entretanto, não basta apenas publicar, qualquer pesquisa só atinge sua completude no momento em que é compartilhada, ou seja, quando o autor consegue comunicar suas ideias a outros sujeitos. Hoje, é possível saber quais textos despertam mais interesse nos leitores por aplicativos que mensuram a quantidade de visualizações de um artigo. Por outro lado, a validação da pesquisa, sua legitimação e reconhecimento, depende de um processo de sanção do leitor em relação ao texto lido, que também pode ser medido pelos altos índices de compartilhamento e, sobretudo, por sua citação em outros trabalhos.

Em face dos benefícios da comunicação científica eficiente, do volume crescente de publicações em revistas e da tendência em disponibilizá-las livremente nos meios digitais1 1 O Plan S, por exemplo, é uma iniciativa da União Europeia e agências de fomento à pesquisa de 14 países que “estabelece a partir de 2020 a publicação imediata em acesso aberto dos artigos que receberam financiamento público” (Marques, F. (2019). Como sobreviver sem assinar revistas científicas: Ferramentas digitais e redes sociais ajudam estudantes e pesquisadores a encontrar artigos na internet (p. 35). Revista Pesquisa Fapesp, Ano 20, (278), 34-37. Recuperado em 14 de abril, 2019, de http://revistapesquisa.fapesp.br/2019/04/15/folheie-a-edicao-278/ , como fazer com que os artigos científicos atinjam o maior número de leitores? Entre diversos fatores que contribuem para a busca de artigos, destaca-se a necessidade desse documento ser encontrado facilmente nas bases de dados, tanto de textos impressos, como daqueles inseridos em plataformas digitais. A elaboração cuidadosa do título e do resumo bem como a seleção ponderada das palavras-chave são fundamentais para que os textos sejam capturados pelos mecanismos de busca e para que finalmente alcancem seus possíveis leitores. Conhecer as expressões de busca de artigos científicos é importante para a visibilidade de um texto (Garcia, Gattaz, & Cruvinel, 2019; Rossetto, Bernardes, Borini, & Gattaz, 2018). Conhecer as características relacionadas ao alto índice de citação de um artigo é importante tanto para autores como para os periódicos de alto impacto, pois “isso pode melhorar a credibilidade, a relevância e a independência financeira da revista” (Paiva, Lima, & Paiva, 2012, p. 509 - tradução nossa).

Plataformas digitais como a Web of Science, Scopus, Google Scholar utilizam palavras ou frases de buscas para iniciar a seleção dos documentos. A maioria dos sistemas de recuperação de informação utilizam a contagem de palavras para a seleção dos documentos em relação a uma dada expressão de busca. Além disso, os resultados aparecem em ordem de classificação dos artigos e autores mais visualizados e citados, considerando o número de referências ligado a eles e sua relevância para a literatura acerca da temática tratada.

Buscas bem elaboradas são muito profícuas para os autores de revisões sistemáticas, tema abordado na edição anterior da Revista RAC, referente ao segundo número do volume 23. Por conta disso, elas dependem da seleção adequada de palavras-chave de modo a oferecer o Estado da Arte.

Após encontrar o documento, o usuário geralmente tem acesso ao título e ao resumo. São eles que determinam a decisão do leitor em acessar ou não o texto completo. Percebe-se que os três componentes iniciais de um artigo científico atuam como importantes ferramentas de venda das ideias dos autores, ao determinarem a aceitação ou não daquele produto em função da forma como são apresentados ao leitor. Embora muitos parâmetros sejam avaliados pelos leitores no processo de reconhecimento e citação de um trabalho, não se deve esquecer que tudo se inicia, entre outros fatores, na localização do documento, na triagem de um título atraente e compreensível e de um resumo claro e conciso que, de alguma forma, capture o leitor e desperte seu interesse em buscar detalhes no texto integral.

Pode-se imaginar as publicações científicas disponíveis como um grande iceberg em que no topo estariam localizadas aquelas mais visualizadas, citadas e recomendadas. Sem menosprezar o mérito dessas publicações, pode-se inferir que muitos artigos com boas ideias, localizados na grande base submersa, sejam resultado da negligência ou da subutilização dos pesquisadores em relação aos benefícios que esses três elementos podem oferecer para a comunicação efetiva da pesquisa.

É mister resgatar e comentar algumas estratégias bem-sucedidas para a elaboração do título, do resumo e das palavras-chave, de modo a tornar os artigos mais atraentes para os leitores e, com isso, aumentar as chances de serem citados em outros trabalhos técnico-científicos.

Título

O título é geralmente a primeira e, em muitos casos, a única informação que o leitor tem durante seu levantamento bibliográfico acerca de um determinado assunto, que, se mal apresentado, pode afastar o público leitor.

Para atrair e reter a atenção do leitor, o título deve ter basicamente algumas características como: ser compreensível e atraente com o propósito de chamar a atenção do leitor ao fazer uma rápida varredura nos bancos de dados; ser curto, porém informativo; deve anunciar de forma clara, breve e objetiva o conteúdo que será tratado ao longo do texto (Hairston & Keene, 2003Hairston, M., Keene, M. (2003). Successful writing (5th ed.). New York: Norton.; González Aguilar, 2017)González Aguilar, H. (2017). La redacción del título en artículos científicos – The writing of the title in scientific articles. Revista Electronica de Veterinaria,18(7). 1-9. Retrieved from http://www.veterinaria.org/revistas/redvet/n070717/071708.pdf
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; deve-se veicular a informação de forma precisa, sem ambiguidades, de modo a evitar múltiplas interpretações ou confusões por parte do leitor. Diante de inúmeras opções de leitura, aquelas que já se apresentam de forma desorganizada e confusa serão facilmente descartadas pelo leitor.

Pelo mesmo motivo acima, estudiosos como López Hernández, Torres, Brito e López (2014) sugerem que os autores evitem abreviações e detalhes técnicos no título. As abreviações, principalmente as pouco conhecidas, podem distrair ou confundir o leitor, dificultando a comunicação. A linguagem muito técnica e hermética, por sua vez, restringe a comunicação aos membros que compartilham de sua utilização. É importante mencionar que se deve evitar termos científicos, bem como nomes de cidades nos títulos.

A extensão ideal de um título é um tema bastante debatido e polêmico. Alguns pesquisadores como Jamali e Nikzad (2011)Jamali, H. R., Nikzad, M. (2011). Article title type and its relation with the number of downloads and citations. Scientometrics, 88(2), 653-661. https://doi.org/10.1007/s11192-011-0412-z
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, Paiva, Lima e Paiva (2012), Subotic e Mukherjee (2014)Subotic, S., Mukherjee, B. (2014). Short and amusing: The relationship between title characteristics, downloads, and citations in psychology articles. Journal of Information Science, 40(1), 115-124. https://doi.org/10.1177/0165551513511393
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consideram que os títulos mais curtos tendem a ter vantagem no número de downloads e citações em relação aos mais longos. Por outro lado, pesquisa como a de Habibzadeh e Yadollahie (2010)Habibzadeh, F., Yadollahie, M. (2010). Are shorter titles more attractive for citations? Cross-sectional study of 22 scientific journals. Croation Medical Journal, 51(2), 165-170. https://doi.org/10.3325/cmj.2010.51.165
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e Jacques e Sebire (2010)Jacques, T. S., Sebire, N. J. (2010). The impact of article titles on citation hits: an analysis of general and specialist medical journals. Journal of the Royal Society of Medicine Short Reports, 1(2), 1-5. Retrieved from https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2984326/pdf/SHORTS-09-0020.pdf
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afirmam uma relação positiva entre o comprimento do título de um artigo e as taxas de citação. Jacques e Seribe (2010) destacam que os títulos com taxas de citação mais altas têm mais que o dobro de palavras comparados aos títulos de artigos com menor número de citações. Eles explicam que títulos mais longos tendem a ser mais abrangentes, aumentando a probabilidade de serem identificados por sistemas de busca eletrônicos. Acrescentam ainda que se o título for capaz de fornecer uma descrição mais clara do estudo e de suas descobertas, provavelmente ele será considerado mais relevante no processo inicial de seleção bibliográfica.

Diante desse impasse, é importante destacar que a qualidade de um título não é medida pelo número de palavras ou caracteres que o compõe, mas pela sua capacidade de explicitar o tema ou conteúdo do trabalho divulgado (Bavdekar, 2016Bavdekar, S. B. (2016). Formulating the right title for a research article. Journal of the Association of Physicians of India, 64, 53-56. Retrieved from http://www.japi.org/february_2016/08_aow_formulating_the_right.pdf
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). Como muitas revistas limitam a extensão dos títulos, reitera-se o conselho de ler atentamente a seção das revistas e periódicos que orientam os autores quanto às regras a serem seguidas para o processo de submissão de seus trabalhos. A esse respeito a RAC acrescenta que trabalhos de ordem empírica devem ter títulos sugestivos do principal resultado do estudo publicado.

Alguns autores defendem a elaboração de títulos provocativos que sejam capazes de capturarem o interesse do leitor. No entanto, Hartley (2012)Hartley, J. (2012). New ways of making academic articles easier to read. International Journal of Clinical and Health Psychology, 12(1), 143-160. recomenda cautela em relação ao uso de trocadilhos, tons humorísticos ou irônicos nos títulos, alegando que tais recursos podem não ser bem aceitos por áreas do conhecimento que exigem mais seriedade em seus escritos. Além disso, essa estratégia tende a reduzir o alcance do artigo, na medida em que pode ser descartado tanto pelos leitores não-nativos como pelas ferramentas de busca por conta de complicações no entendimento desse tipo de enunciado.

Pensar diferentes títulos para um mesmo trabalho pode ser bastante profícuo, na medida em que possibilita que se observe os melhores aspectos de cada versão, reunindo-os em um título mais elaborado e efetivo.

Resumo

Após o título, o resumo é a uma das partes mais lidas de um artigo científico. Nele, o leitor almeja encontrar um texto com aproximadamente 100 a 250 palavras cuja finalidade é fazer uma síntese das partes principais de um artigo. Há dois tipos de resumos, os informativos e os indicativos (Pereira, 2011Pereira, M. G. (2011). Artigos científicos: Como redigir, publicar e avaliar. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan.). Os primeiros contemplam todas as partes de um trabalho, muito utilizados em relatos de pesquisas originais e revisões sistemáticas. Ele deve ser escrito de modo a levar o leitor a buscar no trabalho completo informações mais circunstanciadas. Já os resumos indicativos são mais simples e usados para emitir opiniões ou para debater algum fato. Geralmente, abordam o conteúdo do texto.

Do ponto de vista formal, os resumos podem ser estruturados ou não estruturados. Esses últimos são mais tradicionais, ou seja, apresentam as principais informações do artigo em texto corrido geralmente composto por um único parágrafo. Já nos resumos estruturados, as revistas determinam as partes que devem ser contempladas e essas são preenchidas pelo autor, como é possível observar no resumo do artigo “Competitiveness: business model reconfiguration for innovation and internationalization”:

Purpose

- The purpose of this paper is to reflect on competitiveness by using the business model concept and to understand the need to adapt business models to changes in the environment.

Design/methodology/approach

-Using Catalonia as a context, the paper derives recommendations by presenting and analyzing examples of companies, referred to as “new generation companies,” that have innovated in their business models. The case studies illustrate the contributions of the business model notion to the competitiveness debate.

Findings

-Reviewing the history and contemporary practice of Catalan firms, examples of “new generation” companies are analyzed to derive recommendations for managers seeking to reconfigure their business models to support innovation and internationalization. Since business models sit at the core of competitiveness, they must be the focus of managers aiming to create efficient firms that foster sustained competitive advantage.

Research limitations/implications

The analysis is based on a small number of case studies.

Originality/value

-The business model approach described in this paper enriches the current debate on competitiveness by focusing the analysis at the level of the firm (Casadesus-Masanell & Ricart, 2010Casadesus‐Masanell, R., Ricart, J. E. (2010). Competitiveness: Business model reconfiguration for innovation and internationalization. Management Research: Journal of the Iberoamerican Academy of Management, 8(2),123-149. https://doi.org/10.1108/1536-541011066470
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, p. 123).

De acordo com Hartley (2008Hartley, J. (2008). Academic writing and publishing: A practical handbook. London: Routledge, 2012Hartley, J. (2012). New ways of making academic articles easier to read. International Journal of Clinical and Health Psychology, 12(1), 143-160.), há um movimento bastante forte para o uso desse tipo de resumo em periódicos das áreas de medicina e psicologia por conta de alguns benefícios decorrentes desse formato. Ele tem grande aceitação pelos leitores, editores e revisores devido à facilidade de leitura e de consulta. Além disso, contém mais informações que os resumos tradicionais. No entanto, conforme assegura Hesson (2013)Hesson, J. (2013). English for research paper: A handbook for Brazilian authors. Retrieved from https://www.amazon.com/English-Research-Papers-Handbook-Brazilian-ebook/dp/B00GPT0FXW
https://www.amazon.com/English-Research-...
, essa estrutura mais rígida pode dificultar a comunicação em resumos relativos a pesquisas qualitativas e conceituais. A distinção entre esses dois tipos de resumo não é uma opção do leitor, mas da política editorial adotada por revistas.

Sintetizar o conteúdo de um documento pode ser ação complexa para muitas pessoas. As descobertas de Bhatia (1993)Bhatia, V. K. (1993). Analysing genre: Language use in professional settings. New York: Longman. acerca dos movimentos retóricos presentes na maioria dos resumos acadêmicos podem subsidiar os autores no processo de organização da escrita de resumos. Segundo o pesquisador, quatro movimentos são contemplados nesse tipo de texto e cada um deles deve responder a uma pergunta específica, conforme pode ser observado adiante:

  1. Introdução aos propósitos (O que o pesquisador fez?): O autor indica a intenção de pesquisa, tese e hipóteses. É possível encontrar também os objetivos de pesquisa e os problemas que o autor deseja abordar.

  2. Descrição da metodologia (Como o pesquisador realizou a pesquisa?): apresentação breve dos procedimentos, metodologias e dados usados na pesquisa.

  3. Sumarização dos resultados (O que o pesquisador descobriu?): um dos movimentos mais importantes do resumo, na medida em que apresenta conclusões, descobertas e soluções para os problemas inicialmente apontados.

  4. Apresentação das conclusões (O que o pesquisador concluiu?): interpretação dos resultados e as implicações e/ou aplicações das descobertas.

É importante que os autores verifiquem se objetivos e problemas enumerados no movimento 1 são contemplados no movimento 3, ou seja, nos resultados, pois:

Não há nada mais estranho do que encontrar um manuscrito em que objetivo e conclusão estejam em desacordo. Habitualmente, a providência inicial de um avaliador é verificar se objetivo e conclusão fazem sentido. Se não combinam, ele fica mal impressionado e tende a recomendar sua rejeição (Pereira, 2013Pereira, M. G. (2013). O resumo de um artigo científicos. Epidemiol. Serv. Saúde, 22(4):707-708. Recuperado de http://scielo.iec.gov.br/pdf/ess/v22n4/v22n4a17.pdf. https://doi.org/10.5123/S1679-49742013000400017
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, p. 707).

Além de apresentar um esboço conciso do artigo, é responsabilidade do autor ficar atento a algumas sugestões. A primeira delas é evitar o uso de abreviações, a não ser que um termo muito extenso seja utilizado reiteradamente no resumo. Caso o autor insista em utilizá-las, ele deve estar ciente de que em sua primeira ocorrência, as abreviações devem aparecer entre parênteses, precedidas pelo termo escrito na forma extensa. Isso garante que o leitor foi informado sobre o significado.

As citações e referências não devem ser inseridas no resumo, já que essas questões devem ser contempladas de forma mais detalhada em outras seções do artigo.

Palavras-chave

Como visto anteriormente, a seleção de palavras-chave visa facilitar a recuperação eficiente do conteúdo de um texto para os leitores. Além disso, por serem ferramentas fundamentais para a indexação nas bases de dados, elas atuam como porta de acesso ao texto. Mesmo diante de todas as funcionalidades das palavras-chave, muitos autores subestimam essa etapa da escrita científica. Não fazem, por exemplo, uma reflexão mais acurada das melhores opções, reduzindo significativamente a possibilidade de seus documentos serem localizados. Essa conduta acarreta na sedimentação de seus textos na grande base submersa do iceberg das publicações. Para que isso não aconteça, o autor deve fazer inicialmente um exercício de identificação e listagem de palavras e conceitos utilizados em seu artigo, destacando o tópico principal, as técnicas e metodologias utilizadas. Em seguida, é importante considerar quais termos seriam utilizados pelos potenciais leitores durante a seleção dos documentos, uma vez que grupos de leitores diferentes podem utilizar termos diferenciados para uma mesma pesquisa.

Russel (2004)Russel, A. A. (2004). Calibrated peer review TM: A writing and critical-thinking instructional tool. In S. Cunningham & Y. S. George (Eds.), The Impact and Invention Proceedings - Invention and impact: Building excellence in undergraduate science, technology, engineering and mathematics (STEM) education (pp. 67-71). Washington: American Association for the Advancement of Science. ainda recomenda aos autores que realizem uma pesquisa prévia em outros bons trabalhos que abordem tema semelhante. Essa técnica possibilita observar quais termos são considerados mais eficientes para representar tais estudos. Além disso, subsidia a inserção do artigo em uma dada linha de pesquisa.

Lebrun (2007)Lebrun, J.-L. (2007). Scientific writing: A reader and a writer’s guide. Boston, MA: World Scientific. classifica as palavras-chave em três categorias: gerais, intermediárias e específicas. Pesquisadores que procuram por artigos que abordem aspectos e fenômenos semelhantes à sua pesquisa, farão uso de palavras-chave mais específicas, ao passo que aqueles pertencentes à mesma área, mas que não têm familiaridade com um tema, provavelmente utilizarão termos intermediários. Por outro lado, as palavras-chave mais gerais são empregadas, por exemplo, entre leitores que têm interesse no tema, mas que pertencem a outras áreas. Por isso, é responsabilidade do autor definir as palavras-chave essenciais para o artigo e considerar o público que deseja atingir. Se o interesse é ampliar os tipos de leitores, é recomendável mesclar os diferentes tipos de palavras-chave.

O artigo mais citado da RAC, escrito por Maria Tereza Leme Fleury e Afonso Fleury, intitulado “Construindo o conceito de competência” (2001), utiliza duas palavras-chave. A primeira, competência, constitui um tema amplo, associado, conforme destacam os autores, “a diferentes instâncias de compreensão” (p. 183). Por outro lado, o segundo termo, gestão de pessoas, determina o enfoque dado pelo artigo, ou seja, relacionar a noção de competência à estratégia e aos processos de aprendizagem organizacional. A opção por esses termos garante maior abrangência em relação ao público leitor.

Outras questões devem ser ponderadas durante à elaboração das palavras-chave. Uma delas é evitar o uso de terminologia recém-criada para uma técnica, abreviações incomuns, gírias, por serem termos que dificultam a seleção de um artigo.

Com relação à delimitação das palavras-chave, alguns veículos seguem certas normas. Por isso, ler previamente as instruções das revistas para os quais o artigo será submetido é imprescindível. Em medicina, por exemplo, a maioria das revistas recomenda o uso de uma lista de termos, a Medical Subject Headings (MeSH), elaborada pela U.S. National Library of Medicine. Esse procedimento garante o uso de vocabulário comum para indexar o conteúdo de um documento e, ao mesmo tempo, simplifica as pesquisas bibliográficas. A Revista RAC, nesse sentido, passou a utilizar JEL Codes para facilitar a busca dos artigos.

Há, por outro lado, periódicos que proíbem o uso de palavras-chave já incluídas no título, justificando que a escolha de outras palavras similares que apareçam com frequência nos estudos de mesma linha complemente o conteúdo do artigo e amplie as chances de sua futura recuperação.

A escolha estratégica e cuidadosa das palavras-chave deve considerar as sinonímias do conteúdo do texto, pois utilizar palavras para indexar o artigo que já estão no corpo do texto não faz sentido, tornando-se uma repetição do que já existe.

Considerações Finais

Na sociedade da informação, o compartilhamento de saberes é essencial para o desenvolvimento de todas as áreas. Nas empresas, a busca por conhecimento gera inovações em produtos e serviços tão essenciais para a sobrevivência dessas instituições no mercado cada vez mais globalizado e competitivo. No meio acadêmico, a disseminação das pesquisas por meio da publicação de artigos impulsiona o progresso da ciência, garantindo o desenvolvimento de novas investigações, tanto pelo subsídio dos conhecimentos previamente construídos, como pelos investimentos financeiros que tornam possível a execução de novos projetos.

Tais benefícios são alcançados por meio da visibilidade, da apreciação e legitimação dos trabalhos científicos, medidos na atualidade pelo número de visualizações, downloads, compartilhamentos e citações em outras pesquisas. Entre os diferentes fatores envolvidos no processo de reconhecimento positivo de uma pesquisa, destacamos a importância das palavras-chave, dos títulos e dos resumos. Por serem os primeiros componentes de um artigo com quais os leitores entram em contato, são eles que atuam no processo de decisão do leitor em ler ou descartar um texto. Portanto, a dedicação à escrita de cada um desses elementos é tão importante quanto a elaboração das demais seções do artigo.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Jun 2019
  • Data do Fascículo
    May-Jun 2019
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