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Introdução de novas técnicas de ensino: a experiência do Cepade

ARTIGOS

Introdução de novas técnicas de ensino: a experiência do Cepade

Nestor Mario Carola

Professor do Centro de Perfeccionamiento en Administración de Empresas (Cepade), da Universidade Católica de Córdoba, Argentina

Este trabalho tem a intenção de relatar nossa experiencia na introdução de novas metodologias de ensino no trabalho educativo e comentar, num enfoque aberto, nossas dúvidas e interrogações.

Talvez seja necessário, previamente, descrever o local em que foi realizada esta experiência. Cepade é o Centro de Perfeccionamiento en Administración de Empresas (Centro de Aperfeiçoamento em Administração de Empresas) da Universidade Católica de Córdoba, Argentina. Localizado em um pólo de desenvolvimento regional, projeta sua ação a nível fundamentalmente nacional, mas também internacional. Suas atividades abrangem as áreas de pesquisa, formação e assistência técnica.

Seus projetos de pesquisa buscam um avanço nos conhecimentos acessíveis à pequena e média empresas. Preparam-se novos modelos ou verifica-se a conveniência de adaptação de métodos e técnicas avançadas a particularidades do meio.

As atividades docentes se desenvolvem em dois planos: por um lado, na formação de empresários, orientada de modo a completar a experiência das pessoas que ocupam postos de responsabilidade nas empresas, tornando-as mais aptas em seus cargos; por outro lado, nas atividades de pós-graduação, que desenvolvem programas sobre temas de administração para graduados.

A assistência técnica é uma atividade planejada para permitir uma transferência mais rápida de conhecimento às organizações que assim o requeiram, e, além disso, completar a formação do profissional do Centro, estabelecendo conexão entre ele e os problemas do meio empresarial.

Nossa experiência na introdução de novas técnicas teve lugar no Programa de Formação Gerencial, tomado como objeto de experimentação, à qual nos referiremos adiante.

Este programa, de dois anos de duração, visa o aperfeiçoamento de administradores de empresas, transmitindo informações, mas acentuando principalmente o desenvolvimento de habilidades e de atitudes que capacitem, de maneira definitiva, à ágil e racional tomada de decisões num mundo em transformação e de rápida evolução. No primeiro ano, contamos com 104 participantes, 25% provenientes de grandes empresas, 35% de empresas médias e 40% de empresas pequenas. No que diz respeito a estudos anteriores, 46% possuem curso secundário completo, 28% universitário incompleto e os 26% restantes possuem título universitário.

O programa tem seis anos de funcionamento. Desde o princípio até o presente, temos mudado muitas coisas, inclusive os métodos de ensino, mas como parte de uma preocupação permanente e mais geral, a avaliação de nosso sistema de ensino-aprendizagem. Entendemos por avaliação não simplesmente a classificação do aluno, mas também a avaliação dos professores, dos métodos empregados, dos planos em vigência, da organização com que contamos, em função dos objetivos propostos.

Uma espécie de lema tende a nos servir de guia: "Devemos avaliar tudo e sempre", até nossos métodos de avaliação.

Nossos esforços de aperfeiçoamento por meio da avaliação compreendem neste programa as seguintes etapas:

1. Revisar seus objetivos:

• em função do nível e das expectativas dos alunos que estão fazendo o curso;

• em função das características das empresas do ramo e das expectativas de seus dirigentes em relação aos resultados que os participantes que nos mandam devem obter;

• em função dos resultados .anteriores, ou seja, do estudo das mudanças produzidas nas pessoas que terminam o curso, mediante uma comparação de atitudes, anteriores e posteriores ao curso, e da consulta de suas opiniões ao regressarem a seus postos de trabalho e ganharem distância do programa.

Revisar os objetivos supõe também um esforço cada vez maior, e que ainda não nos satisfaz, de formulá-los de forma realmente operativa, em termos de condutas esperadas, mensuráveis e quantificáveis. Por ora, isto se nos apresenta como matéria de sucessivas aproximações, estando, todavia, distante a meta a alcançar.

2. Revisar nossos sistemas de classificação, de avaliação da aprendizagem; aqui, o problema é saber se exames orais, exames escritos, provas objetivas, resolução de casos, apresentação de trabalhos e monografias realmente atingem aquilo que nos propusemos a medir quando formulamos os objetivos.

3. Estar atentos à reação, entendendo-se como tal o grau em que os participantes aceitam determinado programa de treinamento. A resposta dos assistentes não inclui a avaliação do que a pessoa aprende, mas a forma pela qual reage e julga o quê e o como daquilo que lhe é apresentado.

Esta avaliação da reação é produzida ao se aproximar a metade ou o fim de cada matéria ou período, e é rapidamente discutida com o professor, a fim de informá-lo sobre as mudanças que se fizerem necessárias.

4. Desta forma, chegamos à nossa preocupação pela metodologia. Tradicionalmente, havíamos acompanhado o método clássico de exposição, o método de projetos e o método de trabalho com casos.

No começo deste ano, nossa própria avaliação nos dizia que, sem desdenhar o método tradicional de preleção, giz e quadro-negro, esse, em geral, já não correspondia às expectativas dinâmicas geradas pelos processos de mudança com que vêm atualmente os participantes aos cursos para adultos. Este método tampouco era útil para conseguir mudanças de atitudes, fixadas como objetivos.

Além disso, o método tradicional de exposição está ligado a uma concepção de ensino em que ensinar é explicar, transmitir dados, fórmulas ou teorias, e aprender é ser capaz de recordar e repetir.

Achamos que ensinar é guiar o aluno para que ele adquira hábitos intelectuais e para que exercite sua capacidade de procurar e encontrar as informações e os dados necessários. Aprender é adquirir habilidades e capacidade de aplicar princípios na resolução de problemas concretos. É também o hábito de utilizar praticamente as informações, ter capacidade de atualizar-se e de continuar aprendendo sozinho. Entendemos, enfim, que o principal protagonista do ensinar-aprender é o aluno. O professor levanta o problema em consonância com o problema do aluno, porém, quem deve buscar ativamente sua solução é sem dúvida aquele que deve resolvê-lo no curso e na vida. Tudo isto não se materializa - essa filosofia pedagógica não se concretiza - sem a participação ativa do aluno.

Conseguir essa participação ativa e essa atualização em técnicas de ensino foram as inquietações que nos levaram a organizar um Seminário de Técnicas Modernas de Aprendizagem em abril deste ano. O objetivo do seminário, com período integral durante cinco dias e do qual participaram quase todos os professores do programa, teve por objetivo realizar uma pesquisa sobre metodologias a serem implantadas no ano, contando com a colaboração de destacados pedagogos do ramo.

A partir de um autodiagnóstico crítico de técnicas e métodos utilizados e de um levantamento das expectativas dos participantes, entrou-se no estudo de técnicas de aplicação para superar os fatores negativos detectados.

As técnicas foram vividas e experimentadas pelos professores, no próprio seminário, alcançando-se um alto grau de sensibilização e participação.

Daí em diante, elaborou-se uma estratégia de implantação paulatina e gradativa das técnicas que foram utilizadas, onde o trabalho com pequenos grupos, em muitas de suas variantes, foi fundamentalmente importante. Somente a título de informação, enumeraremos as técnicas utilizadas:

leituras dirigidas;

• reflexão em pequenos grupos;

• brainstorming:

• exposição;

• exercícios acumulativos;

• rotação;

• grupos grandes com coordenação participante;

• uso de tela para projeção de slides;

• reflexão pessoal com questionários; tabulação dè opiniões;

• confrontação com mudanças de papéis;

• trios: apresentação; objeções à apresentação; crítica;

• grupos operativos;

• jogos de reflexão (colaboração-competência);

• rotação para informação e retorno;

• seminário intensivo;

• casos;

• recursos dramáticos;

• meios audiovisuais: criação, produção, intervenção pedagógica;

• instrução programada;

• role-playing.

Terminado o seminário, restaram os problemas de como implantar adequadamente as novas técnicas e fazer pesquisas a respeito de seus resultados.

Em dezembro estão previstas reuniões de professores para se discutir em profundidade resultados alcançados e dificuldades encontradas. O que aqui se exporá serão, desta forma, conclusões pessoais, antecipações, com certa margem de segurança, sobre o que será discutido nessas reuniões.

1. RESULTADOS OBTIDOS

Acreditamos que o principal resultado obtido é o compromisso da quase totalidade dos professores com esse processo. Implantar novas técnicas é um problema assumido pelo grupo, uma orientação definida na metodologia de ensino, pelo menos no Programa de Formação Gerencial.

Estimamos que essa vivificadora preocupação pela metodologia foi conseguida pela ação dos seguintes fatores:

• A antiga preocupação do Centro pela avaliação permanente de toda a sua atividade docente.

• A flexibilidade de suas estruturas e de seus programas, que permitem a seus professores um clima de liberdade para a inovação.

• Não ter sido levado o problema a um perito, mas ao grupo. Os peritos (pedagogos) estiveram presentes, acompanhando como em surdina a ação grupai e colocando seus recursos a serviço do grupo quando este os requeria.

• O grupo relativamente pequeno de professores - aproximadamente quinze - eleito como via de entrada, revisando, em conjunto, um programa determinado.

• A metodologia do seminário, buscando fundamentalmente sensibilização e participação.

• A resposta positiva, em termos gerais, dos alunos. Como efeito deste clima, constatamos que, quase insensivelmente, passamos de perguntas a respeito de como ensinar - o problema das técnicas - a perguntas mais gerais, tais como o que é ensinar e o que é necessário ensinar. E tudo isso em um Centro de Aperfeiçoamento em Administração, não de peritos em ensino. Como concretização desse clima, observamos:

• maior preocupação em definir em termos operacionais os objetivos do programa, de cada matéria e ainda de cada áula;

• maior atenção às expectativas grupais dos alunos;

• maior segurança dos professores que já estavam empregando técnicas ativas, mas que agora encontram maior legitimidade em seus intentos.

Mudar significa muitas vezes esquecer a comodidade de uma aula já preparada, no estilo de uma boa fita gravada que já deu bons resultados antes, mas que hoje não tem mais a mesma eficiência.

Não menos importante, como geradora de resistência, é a afirmação implícita nas novas técnicas de que também o aluno pode ensinar o professor e levantar problemas em que este não havia pensado.

O último e não menos importante fator é o grande emprego que esses métodos exigem de um recurso geralmente escasso na bagagem do professor: o tempo. As técnicas ativas parecem diminuir a tendência de acentuar a importância do professor no momento da aula, colocando-a na preparação prévia, e nem todos os professores, especialmente os contratados pelo Centro, dispõem do tempo que esse esforço exige.

• o custo econômico: algumas técnicas ativas requerem o uso de aparelhos projetores, gravadores, equipamentos, filmes, cujo custo, às vezes, torna impossível sua utilização. As instalações, igualmente - salas de aulas e salões de cursos - não são adequadas ao uso de meios técnicos audiovisuais ou discussão em grupos;

• a dificuldade de identificar as técnicas mais valiosas de acordo com o objetivo da aula ou da matéria.

• Sabemos que a escolha da técnica deve responder aos seguintes fatores:

• os objetivos da aula;

• os conteúdos específicos;

• as necessidades do grupo de aprendizagem;

• a personalidade do professor;

• a inter-relação com as técnicas utilizadas em outras disciplinas;

• os valores pedagógicos aceitos.

Porém, continuamos ainda indecisos quanto aos instrumentos de diagnóstico para detectar, por exemplo, as necessidades do grupo de aprendizagem e os elementos que cada técnica implica para conseguir os objetivos da aula, além da dificuldade de explicitá-los no nível de detalhe requerido e em sua relação com os aspectos mais gerais da matéria e do curso.

Pressupomos que um dos fatores que fazem com que um professor possa satisfazer as inquietudes de um grupo de aprendizagem está relacionado com a riqueza de sua bagagem instrumental, isto é, com a quantidade de técnicas que ele conhece e está disposto a utilizar. Porém, não estamos bastante seguros para responder quando alguém nos pede indicação sobre que técnica utilizar para tal situação, ou para alcançar tal objetivo.

2. DIFICULDADES DE AVALIAÇÃO

Nossas dificuldades para avaliar os resultados da aplicação de novas técnicas provêm do fato de que estas se englobam num sistema pedagógico total e de que a individualização dos efeitos da aplicação de uma técnica particular apresenta-se por ora como um obstáculo difícil de superar.

Podemos, assim, medir a reação dos participantes ante o emprego de uma técnica, que é uma medida importante, mas não a única necessária, pois nos escapam aqui seus efeitos sobre a aprendizagem e sobre as mudanças de atitudes.

Necessitamos, e entre outras coisas, viemos buscar neste seminário, métodos mais simples, de baixo custo, que nos permitam avaliar os efeitos da aplicação de uma técnica. Nossos esforços se concentraram no sentido de trabalhar com grupos-piloto, mas nem sempre podíamos controlar todas as variáveis que se fizeram necessárias. Outros esforços tentados implicavam demasiadas exigências de tempo e dedicação por parte dos professores, que, por pesquisarem em outros campos, se mostraram resistentes à idéia de pesquisar os resultados de sua ação educativa.

Acreditamos que esses métodos de baixo custo - pelo menos medidos em termos de esforço - não serão de tão baixo custo. Porém, queríamos encontrá-los, ou idealizá-los, simples e práticos. Agradeceremos sugestões a respeito.

3. A TÍTULO DE CONCLUSÃO GERAL

Cremos ter progredido muito; estamos implantando novas metodologias, que respondem aos novos valores pedagógicos. Contudo, buscamos agora, como orientação, a validação por meio da pesquisa. Cremos que este é o caminho pelo qual ganharemos adeptos para a metodologia ativa. Gostaríamos de poder apresentar nossa experiência, não em termos de relato, mas já em termos de resultados, quantificáveis, mensuráveis, verificáveis.

Porém, no momento, nossos esforços apontam para esta direção: pesquisar o que estamos conseguindo, para inclusive convencermos a nós mesmos - entusiastas desta metodologia - que estamos no caminho certo.

4. DIFICULDADES DE IMPLANTAÇÃO

• A resistência dos alunos, especialmente daqueles que ainda se baseiam no princípio de que o professor ensina, o aluno aprende. Em certos casos, isso é uma forma de "racionalizar" a impossibilidade de tolerar situações pouco estruturadas, que está na base de muitos exercícios grupais. Além disso, a excessiva participação pode parecer causa de perda de tempo e esforço e há dúvida quanto ao que se pode aprender com os colegas, aspecto enfatizado nessas técnicas.

• A resistência mais ou menos encoberta dos professores, que, em sua maioria, foram alunos sob o regime tradicional, no qual obtiveram suas primeiras armas docentes. Mudar significa problematizar o papel tradicional do professor e, em conseqüência, muitas de suas convicções são abaladas. O clima de sensibilização conseguido permite pensar que a mudança é possível, embora não seja fácil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Ago 2013
  • Data do Fascículo
    Jun 1977
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