Open-access A missão Niemeyer

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A missão Niemeyer *

Marcelo de Paiva Abreu

Estudante graduado de Clare Hall na Faculdade de Economia e Política da Universidade de Cambridge e membro do quadro técnico do Instituto de Planejamento Econômico e Social, Rio de Janeiro

O objetivo deste artigo é o estudo das origens, atividades e recomendações da missão financeira de Sir Otto Niemeyer no Brasil, em 1931. Esta missão foi importante tanto pela suposta influência de suas recomendações sobre as decisões de política econômico-financeira durante os anos iniciais do regime Vargas, quanto como marco das relações financeiras anglo-brasileiras. Especial atenção será dedicada ao estudo da relação entre as recomendações da missão e as políticas realmente seguidas pelo governo brasileiro, pois a maioria das contribuições ao estudo da história econômica do período, publicadas recentemente, sugere que as políticas adotadas pelo Governo Provisório foram "ortodoxas", contrariando, portanto, as conclusão da análise tradicional.

Este artigo está dividido em quatro partes. A primeira trata de algumas das características mais relevantes da economia brasileira antes de 1929 e das atividades das missões precursoras de Montagu (1924) e D'Àbernon (1929). Na segunda parte é considerado o impacto da depressão sobre a economia brasileira. Na terceira, a análise concentra-se no exame das atividades e recomendações da Missão Niemeyer, e na parte final discute-se em que medida as recomendações da missão influenciaram as decisões relativas à política fiscal do Governo Provisório. Essa parte inclui uma crítica aos argumentos revisionistas referentes à "ortodoxia" da política fiscal sob o governo Vargas - que seria responsável pelo desempenho insatisfatório da economia nos primeiros anos da década de 30 - e à ausência de um viés pró-industrial na política econômica antes de 1934.

O uso de fontes primárias oficiais limitou-se aos documentos do Foreign Office, depositados no Public Record Office em Londres. A destruição dos arquivos anteriores a 1939 da Corporation of Foreign Bondholders e. a política restritiva adotada por N.M. Rothschild & Sons, em relação ao acesso a seus arquivos, impediram o uso de documentação relevante. Não foram utilizados materiais provenientes de arquivos brasileiros ou norte-americanos. O uso quase exclusivo de fontes britânicas teve como resultado a ênfase no estudo das relações econômico-financeiras anglo-brasileiras.1

1. ALGUMAS CARACTERÍSTICAS DA ECONOMIA BRASILEIRA DURANTE A DÉCADA DE 202

Uma característica marcante da economia brasileira antes da depressão era a sua dependência de substancial entrada de divisas associada à emissão de empréstimos públicos no mercado financeiro internacional.3 Entretanto, como pode ser visto na tabela 1, a entrada líquida desses capitais foi positiva apenas durante a primeira década do século e no período imediatamente anterior à depressão.

As "disponibilidades cambiais" resultado da soma dos saldos da balança comercial e da entrada líquida de capitais relativa à dívida pública, deveriam - se adicionadas à entrada de capitais estrangeiros investidos diretamente no Brasil4 - corresponder, grosso modo, à contrapartida dos pagamentos relativos à remessa de lucros e dividendos, remessas de imigrantes, etc. Os saldos da balança comercial, entretanto, não apenas não aumentaram desde o início do século, mas decresceram sensivelmente depois de 1925, implicando modificação da composição das "disponibilidades cambiais". A tendência decrescente dos saldos da balança comercial foi compensada por considerável aumento da emissão líquida (de comissões e outras despesas) de empréstimos público entre 1926 e 1928.

O exame dos dados relevantes sugere que o próprio pagamento da dívida pública externa já existente constituía razão suficiente para a emissão de novos empréstimos, em vista da incapacidade demonstrada pela economia em gerar excedentes apropriados da balança comercial. Essa situação agravou-se no final da década com o reinício do pagamento em 1927 do serviço dos empréstimos incluídos no funding loan de 1914, implicando pressões adicionais para o aumento do influxo de divisas associado à emissão de empréstimos públicos no exterior.

Os sucessivos esquemas de "valorização" do café, em geral, dependiam também da emissão de empréstimos públicos brasileiros no exterior, cujo serviço era assegurado pela arrecadação de imposto-ouro sobre as exportações, que se supunha incidir basicamente sobre os consumidores, em vista da baixa elasticidade-preço da demanda por café. A solução temporária das dífículdades causadas pela retenção da grande safra cafeeira de 1927-28, pela emissão de um empréstimos internacional, constitui um exemplo típico da importância do mercado financeiro internacional para assegurar a implementação satisfatória da política cafeeira adotada pelo governo brasileiro. A estreita dependência entre o sucesso da política de valorização e a conjuntura financeira internacional foi encoberta até 1928 pela superabundância de capitais em busca de aplicação nos principais centros financeiros.

Em vista da importância da entrada de capitais estrangeiros, sob a forma tanto de empréstimos públicos como de capital de "risco", para o runcíonamento satisfatório da economia brasileira antes da depressão, torna-se necessário o exame mais detalhado das características fundamentais desses movimentos de capitais.

O investimento total britânico no Brasil aumentou modestamente entre 1914 e 1930 - cerca de £ 27 milhões - enquanto o investimento norte-americano - que era de apenas £ 10,3 milhões em 1914 - aumentou cerca de £110 milhões durante o mesmo período. Na verdade, pode-se dizer que o aumento do investimento estrangeiro total durante o período em questão foi conseqüência do notável aumento da entrada de capitais norte-americanos, enquanto que o investimento total europeu decrescia ligeiramente e caracterizava-se por importantes modificações estruturais. Em 1930, entretanto, o investimento britânico total no Brasil ainda correspondia a mais que o dobro do investimento total norte-americano.

Apesar de o investimento total britânico haver aumentado entre 1914 e 1930, o investimento direto britânico declinou cerca de £ 7 milhões durante esse período. O investimento privado norte-americano - que aumentou cerca de £ 34 milhões - conseqüentemente correspondia, em 1930, a aproximadamente 20% do investimento estrangeiro direto no Brasil comparado a menos de 5% em 1914. O investimento privado britânico concentrava-se, em 1930, em estradas de ferro e serviços públicos; o capital norteamericano, por sua vez era relativamente mais importante em novos campos de atividade, tais como indústria manufatureira, derivados de petróleo e comércio, além de serviços públicos.5

É evidente, entretanto, que a entrada de capitais tanto britânicos quanto norte-americanos, durante o período 1914-1930, resultou fundamentalmente de movimentos de capitais públicos que corresponderam a mais de 80% da entrada total de capital dessas duas origens durante o período em estudo.

O fato de em 1930 o investimento britânico ainda corresponder a mais do dobro do investimento norte-americano é de importância crucial para a compreensão da rivalidade anglo-americana no Brasil durante a década dos 30. Enquanto os norte-americanos tenderam a adotar uma política relativamente conciliatória em suas negociações financeiras com o Brasil, e a enrijecer sua posição quando se tratava de negociações comerciais, a Grã-Bretanha pareceu convencer-se da inevitabilidade do declínio de sua importância comercial no mercado brasileiro - linha consistente com os acordos de preferência comercial em vigor a partir da conferência de Ottawa em 1932 - tentando maximizar as transferências financeiras originárias do Brasil.6

Entre meados do século XI X e 1907, se alguns empréstimos não-federais de menor importância forem excetuados, a Casa Rothschild monopolizou a emissão de empréstimos públicos brasileiros no mercado financeiro internacional. Suas dúvidas iniciais a respeito do sucesso do esquema de valorização em 1907 permitirem que banqueiros, operando fora de Londres, participassem do lançamento de importantes empréstimos brasileiros.7

A posição de dominância da Grã-Bretanha nesse terreno, entretanto, não foi ameaçada antes do término da guerra de 1914-1918. Entre 1918 e 1930 a emissão de empréstimos brasileiros federais relacionados à valorização do café em Londres somou £ 32,5 milhões, enquanto que empréstimos das mesmas categorias colocados em Nova York somaram £ 43,5 milhões. A deterioração relativa da posição britânica no caso de empréstimos estaduais e municipais foi ainda mais notável, pois as emissões em Londres foram de £ 21,8 milhões comparadas a £ 43 milhões em Nova York.8

De um ponto de vista muito especial, entretanto, a contribuição financeira britânica foi decisiva, pois em várias ocasiões os esforços brasileiros para captar recursos em Nova York, para financiar a acumulação de estoques de café, foram frustrados pela interferência do governo americano com base no argumento de que a "valorização do café feria a legislação antitruste norte-americana e a única alternativa aberta ao governo brasileiro havia sido lançar empréstimos em Londres.9 A contribuição britânica ao financiamento da retenção de café foi, de fato, consideravelmente maior do que a norte-americana, £ 23,8 milhões comparados a £ 7,2 milhões.

Em 1930 o total do investimento público estrangeiro no Brasil era de £ 252,9 milhões: 103 milhões correspondendo a empréstimos em libras, 76,6 milhões a empréstimos em dólares e c resíduo, quase integralmente, a empréstimos em francos franceses. Se os empréstimos relacionados ao café são excluídos, o influxo de capital público estrangeiro entre o fim da guerra de 1914-1918 e 1930 concentrou-se em aplicações não-geradoras de divisas. Os empréstimos relacionados à valorização do café, pode-se argumentar, contribuíram para um aumento do valor das exportações na medida em que permitiram a manutenção dos preços de café a níveis relativamente altos.

O período entre 1914 e o início da depressão marcou também uma mudança decisiva na importância relativa da Grã-Bretanha e dos Estados Unidos no comércio com o Brasil. As condições que caracterizaram o período de guerra e reconstrução possibilitaram um rápido crescimento da participação dos Estados Unidos no mercado brasileiro, às expensas dos tradicionais fornecedores europeus.10

A Grã-Bretanha, apesar do declínio de sua importância como fornecedora do mercado brasileiro, aumentou consideravelmente seu tradicional saldo na balança comercial com o Brasil, pois a queda no valor de suas exportações para o Brasil foi mais do que compensada pela queda no valor de suas importações do Brasil. O aumento substancial das exportações dos Estados Unidos para o Brasil somado à relativa estabilidade das exportações brasileiras para esse país, implicaram considerável redução db saldo na balança comercial que o Brasil mantinha tradicionalmente com o primeiro. O padrão triangular que caracterizava as relações comerciais do Brasil sofreu, .portanto, modificações sensíveis - não, porém, fundamentais - com a emergência dessas novas tendências após a eclosão da guerra de 1914-1918.11

Antes da guerra, pagamentos relacionados ao serviço de capitais estrangeiros investidos no Brasil, bem como de serviços tais como fretes e seguros, fluíam praticamente apenas entre o Brasil e a Grã-Bretanha em vista do amplo predomínio britânico em relação ao suprimento de capitais e transporte marítimo no mercado brasileiro. Enquanto o fluxo de pagamentos de fretes e seguros era no sentido Brasil - Grã-Bretanha, o fluxo financeiro líquido relativo a empréstimos públicos era favorável ao Brasil.

Entre o final da guerra e a depressão, os pagamentos financeiros entre o Brasil e os Estados Unidos adquiriram importância crescente e tenderam a somar-se ao saldo da balança comercial brasileira com os Estados Unidos em vista da rápida expansão dos investimentos norte-americanos no Brasil, enquanto o saldo líquido relativo a empréstimos públicos contraídos em libras tornou-se possivelmente favorável à Grã-Bretanha. A relação triangular (incluindo pagamentos comerciais e financeiros) entre o Brasil, os Estados Unidos e a Grã-Bretanha, que caracterizava as relações econômicas internacionais do Brasil no período anterior à guerra, apresentava-se assim, durante a década de 20, de forma ainda mais pronunciada.12

A dependência crescente do Brasil de uma entrada considerável de capitais públicos estrangeiros aumentava a vulnerabilidade do governo brasileiro a pressões políticas por parte de interesses envolvidos na emissão de novos empréstimos. Essa vulnerabilidade era especialmente evidente no caso dos empréstimos requeridos para as operações de "valorização" cafeeira. Â posição de barganha do Brasil que era, de qualquer maneira, fraca no caso dos Estados Unidos - em vista do volume das importações americanas de café - e poderia ser razoável no caso da Grã-Bretanha - em vista do saldo favorável do comércio britânico com o Brasil - enfraqueceu-se ainda mais, em particular, na segunda metade da década de 20.

Tabela 3

As nações credoras, na verdade, não hesitaram em tentar obter concessões quando se tratava de considerar a possibilidade de conceder empréstimos* ao Brasil. A evidência disponível confirma que chantagem política era algo que ocorria tanto em Londres quanto em outros mercados financeiros.13 Em 1926, por exemplo, quando o governo brasileiro tentou obter um empréstimo em Londres, as negociações fracassaram em vista da oposição do Foreign Office. Esta oposição devia-se à condenação britânica da posição adotada pelo Brasil na Liga das Nações em relação à admissão da Alemanha, com direito a assento permanente no Conselho, privilégio pleiteado em vão pelo Brasil desde a fundação da Liga. A crise havia resultado na saída do Brasil da Liga das Nações.14

A posição adotada por Sir Austen Chamberlain, Secretário de Estado no Foreign Office, consistia em que "não gostaria de aparecer como responsável pelo bloqueio da concessão do empréstimo, mas não ficaria satisfeito se o Brasil obtivesse algo da City neste momento".15 A Casa Rothschild, informada de que sua colaboração no lançamento de um empréstimo brasileiro não seria vista com bons olhos pelo Foreign Office, insistiu em que a posição deveria ser reconsiderada, pois era provável que seus associados norte-americanos concedessem o empréstimo sozinhos, o que seria prejudicial aos interesses britânicos no Brasil.16

A recusa de Sir Austen Chamberlain foi enfática: "... é somente em casos excepcionais que o Foreign Office intervém próprio motu em casos como esse e eu não pensei que esse caso requeresse minha intervenção voluntária: já que a Casa Rothschild pede a minha opinião, sou obrigado a dizer que a atuação do Brasil em Genebra não foi conducente à promoção da paz, que penso ser o interesse primordial (da política externa) britânica e, especialmente, o interesse primordial da City de Londres; que, no momento, não há indicações que o Brasil modificará sua atitude...; .. . a emissão de um empréstimo no momento seria considerada como perdão ou mesmo aprovação da atitude brasileira e .. . não posso encorajá-la. Isso deve ser comunicado oralmente, e não por escrito, à Casa Rothschild. Pode acrescentar-se que, em vista do fato de que as condições oferecidas por Londres são sempre .. . mais favoráveis do que as oferecidas em Nova York, penso que o Brasil voltará de bom grado a servir-se do mercado de Londres quando o mercado de Londres estiver disposto a atender suas necessidades financeiras".17

Alfred de Rothschild, sabendo do veto de Chamberlain, prometeu "respeitar seus desejos lealmente" e que ao comunicar a decisão ao governo brasileiro, a Casa Rothschild teria o cuidado de encontrar uma fórmula que evitasse qualquer referência ao Foreign Office.18

Este exemplo não é um caso isolado de pressões politicas relacionadas à negociação de empréstimos brasileiros em Londres. Em 1924, o embaixador britânico no Brasil propunha que "antes que consintamos em conceder o empréstimo de que o Brasil obviamente necessita... (o governo brasileiro) deverá reconhecer as vantagens que sempre obteve, relacionadas à nossa ajuda (sic)", tratando de maneira adequada o capital (privado) britânico investido no país.19

No final da década, entretanto, mesmo os radicais do Foreign Office reconheciam que "era cada vez mais óbvio... que o mercado financeiro de Wall Street estava sempre preparado a emprestar... e que o velho argumento no qual tantas representações se haviam baseado no passado, isto é, que capital britânico não seria investido a menos que algum problema específico fosse solucionado, estava perdendo gradualmente sua força".20

O fato de o Brasil depender de um fluxo contínuo de capitais estrangeiros oferecia justificativa convincente para a visita de missões com o objetivo - raramente explícito - de avaliar a capacidade de pagamento do país e recomendar a implementação de políticas que assegurassem o pagamento regular do serviço da dívida externa. É importante enfatizar que esse era em geral o objetivo real de tais missões, e não, como era comumente alegado pelo governo brasileiro e pelas casas bancárias interessadas, a recomendação de politicas que visavam a aceleração do desenvolvimento econômico do país. As missões financeiras mais importantes que visitaram o Brasil antes da guerra de 1939-1945 eram geralmente originárias de Londres. Os Estados Unidos não recorreram tão intensamente a esse instrumento clássico de controle financeiro, possivelmente devido à relativa irresponsabilidade de Wall Street durante a década de 20, bem como porque apenas durante essa década os seus interesses financeiros no Brasil haviam aumentado consideravelmente.21

Com o fim de analisar as atividades da missão financeira de 1931, não como um fato isolado nas relações anglo-brasileiras, mas como episódio de uma série contínua de tentativas britânicas no sentido de influenciar a formulação de política econômica, é importante examinar rapidamente as atividades das missões que precederam a Missão Niemeyer: a Missão Montagu em 1923-1924, e a Missão D'Abernon em 1929.

A Missão Montagu, tal como a Missão Niemeyer, tinha como objetivo avaliar a capacidade de pagamento do Brasil e a situação financeira do país. Ambas foram convidadas a visitar o país como resultado de pressões dos Rothschild, depois de o governo brasileiro haver manifestado sua intenção de contrair novos empréstimos internacionais. A Missão D'Abernon, por outro lado, tinha objetivo distinto. A preocupação básica, nesse caso, era com problemas de natureza comercial e não com a capacidade de pagamento da economia. Além disso, seu interesse por problemas brasileiros parece haver sido secundário em relação às importantes negociações comerciais com a Argentina.

A Missão Montagu foi organizada devido à relutância dos Rothschild em envolver-se no lançamento de um empréstimo de £ 25 milhões ao governo federal, sem informações adicionais sobre a situação financeira do país.22 A Casa Rothschild a pedido do governo brasileiro providenciou a publicação de um estranho comunicado na imprensa britânica explicando os motivos da visita da missão: "O governo brasileiro, desejando implementar... um plano geral de restauração financeira... organizou a visita ao Brasil de pessoas eminentes da indústria, das finanças, da economia e da literatura (britânica), tendo em vista que o conhecimento do país (Brasil) por eles... resulte em aplicação mais livre do capital inglês e conseqüentemente prosperidade da república".23 Os termos de referência fornecidos à missão foram mais explícitos: "Com a finalidade de acalmar a opinião pública no Brasil, o governo anunciará oficialmente que convidou uma missão... para elaborar um estudo confidencial das condições econômicas e financeiras do país, possibilitando a elaboração de um plano detalhado do investimento de capitais ingleses na exploração das riquezas do país... O propósito real da missão é fornecer informações que permitam aos banqueiros .. . decidir se será possível colaborar com o governo brasileiro".24

A opinião do Foreign Office era a de que as atividades da missão no Brasil não deviam restringir-se aos termos de referência. A visita da missão era considerada como mais uma oportunidade para pressionar o governo brasileiro para que tomasse providências no sentido de solucionar problemas relativos ao tratamento supostamente inadequado de diversos interesses britânicos no Brasü. Montagu - ao contrário de Niemeyer em 1931 - recusou-se a "lutar em favor de qualquer companhia específica", alegando que tais gestões militariam com a sua posição de técnico de problemas financeiros.25

As principais recomendações do relatório da missão, incluídas na versão para consumo público, foram:

a) o orçamento deveria ser equilibrado e, para atingir-se esse objetivo, a administração orçamentária deveria ser aperfeiçoada; o número de funcionários públicos deveria ser reduzido e os salários aumentados para evitar-se corrução;

b) o governo deveria vender algumas de suas propriedades tais como ferrovias, empresas de navegação e o Banco do Brasü, com o fim de reduzir os seus encargos financeiros; a solução considerada ideal, do ponto de vista da aplicação de capitais britânicos no Brasü, se faria em colaboração com capitais públicos e privados brasileiros;

c) não deveria ser permitido que qualquer preconceito resultasse em discriminação contra o capital estrangeiro em vista de sua importância para o desenvolvimento econômico do país;

d) deveria ser organizada uma comissão mista (pública e privada) para estabelecer o nível das tarifas ferroviárias - possibilitando, assim, a solução de problemas que constituíam fonte de freqüentes atritos entre interesses brasileiros e britânicos;

e) criticava-se a política governamental relativa à "valorização" do café e ao minério de ferro.26

As reações à visita da missão foram contraditórias. O embaixador britânico pensava que "uma prova da natural simpatia brasileira em relação à Inglaterra é a relativa satisfação com a qual a missão financeira britânica foi recebida; é difícil acreditar que tal ocorresse em qualquer outro país".27 De outro lado, a proclamação dos "revolucionários" paulistas em julho de 1924 fazia referência explícita ao fato de que o governo federal havia aceito intrusão vergonhosa de estrangeiros nos assuntos internos do país e publicado um relatório contendo insinuações a respeito da honestidade brasileira como documento oficial.28

As considerações de Montagu sobre a capacidade de pagamento do Brasil impediram que os Rothschild concedessem novo empréstimo ao Brasü. As razões são, contudo, desconhecidas, pois foram incluídas apenas no relatório privado que Montagu preparou para os banqueiros.

A preocupação fundamental da Missão D'Abernon em 1929 era estabelecer negociações comerciais com o governo brasüeiro, tendo como objetivo conter o sensível declínio do comércio anglo-brasileiro. D'Abernon chegou a um acordo verbal com o governo brasüeiro segundo o qual, em troca de algumas concessões, o governo britânico consideraria a possibilidade de revisão do nível da tarifa que incidia sobre o café. As concessões brasileiras seriam: a) o Lloyd Brasileiro encomendaria navios a estaleiros britânicos no valor de £ 3 mühões e, no futuro, seria concedida prioridade - a preços iguais - à indústria britânica de construção naval; b) reembolso de tarifas pagas com relação a carvão utilizado pelas companhias de navegação e isenção de certas taxas portuárias; c) ratificação do contrato de 1926 com a Rio Improvements Company, o qual implicaria encomendas à indústria britânica no valor de £ 750 000;

d) modificações na legislação brasileira com a finalidade de evitar a ocorrência de falências fraudulentas.29

Washington Luís assinou um decreto aumentando a subvenção federal ao Lloyd Brasileiro, removendo assim um dos obstáculos principais à encomenda de navios, mas recusou-se a fazer qualquer outra concessão a menos que o governo britânico se comprometesse, em termos mais explícitos, a eliminar a taxação sobre o café.30 O Foreign Office pressionou para que alguma decisão fosse tomada, mas as autoridades financeiras recusaram-se a ir além da insistência no fato de que havia alguma possibilidade de se eliminarem, em futuro próximo, todas as tarifas sobre produtos alimentares. Na verdade, a tarifa sobre café não foi alterada pelo orçamento de 1930, o que levou o governo brasileiro a acreditar que havia sido deliberadamente enganado por D'Abernon.31 Isso tende a confirmar que a Grã-Bretanha atribuía prioridade relativamente baixa à recuperação de sua posição no comércio brasileiro, se comparada a outros objetivos - especialmente os de natureza financeira - de sua política global em relação ao Brasil.

2. AS CRISES DO CAFÉ E DE WALL STREET E A ECONOMIA BRASILEIRA

A política econômica brasileira antes de 1930 limitava-se, quase exclusivamente, à "valorização" do café e à estabilização da taxa cambial. Tanto objetivos quanto instrumentos de política econômica permaneceram inalterados a partir da primeira década do século, como resultado do contínuo quase-monopólio do poder político por parte da oligarquia cafeeira. Enquanto a política de "valorização" assegurava a manutenção dos preços internacionais do café a níveis considerados "remuneradores", a estabilização da taxa cambial - a níveis depreciados em relação aos vigentes no mercado cambial antes da estabilização - impedia o declínio da renda em moeda nacional dos cafeicultores que resultaria da valorização do mil-réis em relação à libra esterlina. Como foi notado anteriormente, os recursos necessários à operação do esquema de controle de preços de café eram geralmente supridos pela emissão de empréstimos no mercado financeiro internacional.

Apesar das dificuldades relacionadas à retenção da safra del927-28, as autoridades encarregadas da "valorização" obtiveram novo financiamento no mercado internacional, sendo sua tarefa facilitada, no ano seguinte, pela grande redução no volume da safra de 1928-29, causada pelo natural esgotamento das plantações. No final da década de 20, o setor cafeeiro gozava de grande prosperidade, cuja continuidade parecia ser assegurada pela política de "valorização".32

As autoridades encarregadas da retenção de estoques de café, entretanto, além da sua incapacidade de exercer controle eficiente sobre a área cultivada, cometeram um erro grave em relação aos métodos adotados para o financiamento da grande safra de 1927-28. Ao invés de se financiar a produção à base dos recursos requeridos pelos produtores para custear seus gastos correntes, decidiu-se que os adiantamentos aos produtores seriam baseados no valor comercial oferecido como garantia. Essa decisão resultou em expansão substancial da área cultivada e no desenvolvimento especulativo das atividades comerciais induzido pelo brusco aumento da liquidez do sistema. O resultado dessa expansão da área cultivada só se fez, sentir depois de 1932, mas implicou considerável agravamento das dificuldades causadas pelos excedentes de produção durante a década de 30.33

A floração da safra de 1929-30, em setembro de 1928, indicou que, ao contrário do que se antecipava, a safra seria ainda maior do que a safra de 1927-28 e que apenas uma severa geada - similar à de 1918 - impediria o colapso do esquema de retenção de estoques de café, pois era duvidoso que o governo de São Paulo conseguisse obter empréstimos no mercado internacional suficientes para absorver a produção excedente.

A geada não ocorreu e a safra de 1929-30 foi a maior da história cafeeira do Brasil. O Instituto do Café de São Paulo foi incapaz de obter recursos suficientes para retirar a produção do mercado, seja no país seja no exterior. Os mercados financeiros internacionais estavam desorganizados, pois os recursos existentes eram atraídos pelo boom em Wall Street e a política de Montagu Norman de bloquear a emissão de empréstimos em Londres através de moral suasion ainda operava.34 Washington Luís recusouse a empenhar recursos federais, provavelmente avaliando incorretamente a gravidade da situação. O preço do café começou a cair quando "na sessão da manhã do dia 11 de outubro, na Bolsa de Santos, o corretor... do Instituto sentouse em seu lugar e não fez nenhum lance".35 No final do ano o preço estava abaixo de 15 centavos de dólar a libra-peso (Santos 4) comparado a 22,5 centavos antes da crise.

O ponto importante a assinalar é que o colapso dos esforços de defesa do preço do café não foi uma conseqüência direta da crise de Wall Street. A queda do preço do café coincidiu com os primeiros dias de pânico no mercado nova-iorquino - na verdade, o dia 11 de outubro precedeu de duas semanas a "quintafeira negra". O colapso da política de "valorização", contudo, não resultou da crise financeira de 1929, mas de ocorrência contemporânea de uma safra recorde - cujo volume já era previsível ao final de 1928 - e da impossibilidade de obter financiamentos internacionais, que era conseqüência do boom, e não da crise de Wall Street. Depois do final de outubro, essas origens, independentes da crise do café, foram obscurecidas pelas conseqüências da crise financeira norte-americana no mercado de matérias-primas.

De qualquer modo, é difícil acreditar que, mesmo se a conjuntura financeira internacional não se houvesse modificado desfavoravelmente, o rápido aumento dos estoques de café não se houvesse refletido em crescente relutância por parte dos banqueiros estrangeiros em continuar a financiar as atividades relacionadas à defesa do café.

O governo de São Paulo conseguiu obter em abril de 1930 um empréstimo de £ 20 milhões em Londres e Nova York - o único empréstimo estrangeiro lançado em Londres em 1930. O resultado líquido desse empréstimo foi, entretanto, de apenas £ 8,5 milhões, pois o estado tinha inúmeros débitos de curto prazo a liquidar. Esse montante, evidentemente, não era suficiente para resolver o impasse uma vez que podia custear a estocagem de apenas 8,5 milhões de sacas de café.36

A brusca queda nos preços do café somada a decisão de Washington Luís em manter a paridade cambial do mil-réis, e à interrupção quase completa da entrada de capital estrangeiro ocasionou rápida erosão das reservas brasileiras de ouro e divisas. Vargas acusou o governo deposto de haver malbaratado £ 26,5 milhões para manter a taxa de câmbio. A embaixada britânica estimava que £ 20 milhões haviam sido remetidas em 1930. Em qualquer caso, as reservas que somavam £ 31,1 milhões em setembro de 1929 caíram a 14,1 milhões em agosto de 1930 e desapareceram totalmente no início de 1931.37 A gravidade da crise econômica foi, obviamente, uma razão importante para a queda de Washington Luís em outubro de 1930. O golpe foi entretanto, uma surpresa completa para os Estados Unidos e não era previsto pelos interesses britânicos.38 A evasão de ouro e divisas que caracterizou o último ano do governo de Washington Luís continuou sob Vargas. O Governo Provisório foi obrigado a remeter £ 7,6 milhões adicionais e o Banco do Brasil, que já estava com um descoberto de £ 6,5 milhões no começo de 1931, foi forçado a obter um empréstimo a curto prazo dos Rothschild com a garantia do governo federal.

O esgotamento das reservas indicava que o Brasil não conseguiria saldar seus compromissos internacionais a menos que fosse obtido novo empréstimo externo.39 O exame dos dados referentes ao balanço de pagamentos (ver tabela 1) sugere a inevitabilidade de uma moratória, especialmente se for lembrado que a crise havia interrompido a entrada de capitais privados estrangeiros.

3. A MISSÃO NIEMEYER

Tal como em 1924, a Casa Rothschild adotou como política condicionar a concessão de qualquer assistência financeira ao Brasil à visita de perito financeiro britânico com o fim de estudar localmente a conjuntura econômica, bem como à adoção de suas recomendações relativas à política de estabilização cambial e à criação de um banco central. Washington Luís tinha plena consciência da importância da questão da organização do banco central como précondição para a possível concessão de um empréstimo ao Brasil.40 Quando Júlio Prestes, já eleito Presidente da República, visitou o Banco da Inglaterra em julho de 1930, foi informado de que o Banco enviaria um perito ao Brasil se fosse convidado a fazê-lo. Na mesma época, mencionava-se no Brasil como possível alternativa o nome do Dr. Kammerer, perito norteamericano com considerável experiência latinoamericana.41 É importante deixar claro que, ao contrário do que geralmente se supõe, as "negociações" relativas à visita da missão financeira foram iniciadas antes do governo Vargas.42 Montagu Norman, concordou em pedir que Sir Otto Niemeyer visitasse o Brasil desde que o convite fosse "redigido de tal maneira que implicasse na aceitação de qualquer sugestões que fossem sugeridas".43 Norman pensava que a organização do banco central era possivelmente a mais importante das questões incluídas na agenda da missão, o que é coerente com os seus contínuos esforços na década de 20 no sentido de que fossem criados bancos centrais independentes de interferência governamental, inicialmente na Europa e posteriormente em alguns dos países periféricos.44

A intenção inicial do governo brasileiro era indicar uma comissão de peritos composta de representantes dos Estados Unidos, Grã-Bretanha e França. Entretanto, em vista do estado insatisfatório das relações entre o Brasil e os Estados Unidos imediatamente após a ascensão de Vargas, a idéia de incluir um representante norte-americano foi abandonada. Isso impossibilitou a inclusão de um representante francês, pois não seria conveniente explicitar as divergências com os Estados Unidos e resultou na indicação de Niemeyer.45 Essa decisão satisfez o Foreign Office, uma vez que as relações comerciais da Grã-Bretanha com o Brasil "não seriam expostas à mercê de um estrangeiro - o ubíquo Prof. Kammerer, por exemplo, nas pegadas de quem, em qualquer país da América do Sul, pode-se geralmente encontrar um representante de Messrs. Hallgarten ou qualquer outro dos comerciantes em títulos de segunda classe de Nova York".46

Esse engano do Foreign Office, confundindo relações financeiras e comerciais, permite uma compreensão mais clara das verdadeiras intenções da visita de Niemeyer ao Brasil do que a sugerida pela imprensa ou por comunicados oficiais. Niemeyer, na verdade, não se limitou a recomendar políticas econômico-financeiras ao governo brasileiro, mas esteve também envolvido na negociação de questões cuja solução beneficiaria interesses britânicos específicos.47

De acordo com os seus termos de referência, a Missão Niemeyer deveria recomendar ao governo brasileiro as reformas financeiras necessárias para que "se assegurasse a manutenção do equilíbrio orçamentário; a estabilização cambial e a reforma monetária; a reconstrução do Banco do Brasil como um banco central operando independentemente (de interferência governamental); e a limitação do endividamento direto e indireto do governo federal e dos estados".48 Os termos de referência deixam claro que a missão não trataria de selecionar uma entre várias políticas econômicas alternativas, mas limitar-se-ia a considerar as medidas específicas que deveriam ser adotadas para assegurar o sucesso da política econômica considerada aceitável pelos interesses britânicos.

Um comunicado oficial publicado em 10 de janeiro de 1931 anunciava a visita de Sir Otto ao Brasil. A visita foi apresentada à opinião pública como resultado de convite voluntário do governo brasileiro e, naturalmente, não como pré-condição à eventual concessão de empréstimo britânico ao governo federal. Alguns observadores mais atentos foram, entretanto, capazes de sugerir os motivos reais da visita da missão: The New York Times denunciou a missão como não tendo sido convidada pelo governo brasileiro e enviada ao Brasil para defender o interesse dos Rothschild. Roberto Simonsen, por outro lado, sugeriu que o objetivo fundamental da missão seria a reorganização do sistema fiscal de tal forma que fosse possível a continuação das remessas relativas ao serviço da dívida externa.49

Antes da chegada da missão ao Brasil, tornouse evidente a existência de contradições entre representantes de interesses financeiros e comerciais britânicos no Brasil. Enquanto Stephany, representante dos Rothschild no Rio de Janeiro, aprovava a política de redução de importações através do aumento de tarifas, sistema de licenciamento prévio ou uso compulsório de matérias-primas produzidas no país - que tenderia a facilitar os pagamentos relativos à dívida externa - a Câmara Britânica de Comércio propunha que a concessão de qualquer empréstimo ao Brasil fosse condicionada à revogação de tarifas consideradas proibitivas.50

Niemeyer verificou ser impossível obter no Brasil estatísticas fidedignas referentes às contas públicas, sendo obrigado a aceitar "estatísticas que considerava falsificadas ou baseadas em conceitos vagos". O Banco do Brasil foi considerado "inútil enquanto banco central, mal organizado, mal administrado e sujeito a mudanças radicais de política a cada mudança de governo". Em compensação, o Ministro da Fazenda, Whitaker, "que a princípio estava muito assustado e não é um homem (de personalidade) forte, embora razoável e maleável... com Niemeyer segurando a sua mão... parece haver ganho coragem e não ficar paralizado de pavor a cada variação da taxa cambial".51

O relatório da missão, que foi publicado simultaneamente em Nova York, Paris, Londres e Rio de Janeiro em 25 de julho de 1931, propunha basicamente dois grupos de medidas, pois, de acordo com Niemeyer, "a reconstrução financeira do Brasil, como em outros países, requer tíuas bases: a) a manutenção do equilíbrio orçamentário por parte de todas as autoridades públicas... b) a estabilização da moeda.. .".52

O primeiro conjunto de recomendações considerava, portanto, as medidas a adotar para assegurar o equilíbrio orçamentário que era "uma questão fundamental da qual tudo dependia... pois a menos que (o equilibrío) possa ser alcançado e mantido será impossível evitar pressões inflacionárias adicionais com conseqüências imprevisíveis sobre os custos internos e a taxa cambial".53 Essa ênfase na necessidade de equilibrar os orçamentos das entidades públicas foi também uma característica fundamental das recomendações de Niemeyer ao governo australiano em 1930, quando visitou o país como enviado do Banco da Inglaterra. Também nesse caso, a colaboração financeira de Londres foi condicionada à adoção de uma política orçamentária "ortodoxa".54

As principais recomendações do relatório referentes ao orçamento foram:

a) evitar a emissão de títulos públicos em pagamento de dívidas de entidades públicas;

b) reorganizar os serviços postais, telegráficos e ferroviários com o objetivo de torná-los autofinanciáveis;

c) aumentar a taxação direta e, oportunamente, reduzir o imposto de importação;

d) abolir as taxas de exportação incidentes sobre o comércio interestadual e estabilizar as taxas de exportação para outros países;

e) manter a unidade do orçamento evitando a criação de fundos vinculados;

f) estabelecer novos sistemas de contabilidade e auditoria pública.55

Niemeyer opunha-se ao aumento do imposto de importação, mas tinha consciência de que seria difícil convencer o governo brasileiro a reduzi-lo, apoiando, portanto, de forma cautelosa, os interesses financeiros britânicos em detrimento dos interesses comerciais.56 Niemeyer supunha erroneamente que havia convencido as autoridades brasileiras a não aumentar a parcela do imposto de importação cobrável em ouro que redundaria, como resultado da depreciação do mil-réis, em redução da proteção tarifária.57 Essa medida foi eventualmente adotada pelo Governo Provisório em setembro de 1931.

O segundo conjunto de recomendações referia-se "ao estabelecimento de um banco central em base ortodoxas" bem como à estabilização do mü-réis e à questão da dívida externa. Essa parte do relatório é importante para a compreensão correta da política britânica com relação ao Brasil no início da década de 30 e tem sido negligenciada pelos historiadores econômicos interessados no estudo do período.

De acordo com o relatório, a "confiança no futuro do Brasil dependerá basicamente da confiança, interna e externa, na estabilidade e eficiência do sistema monetário. É para criar e alimentar tal confiança que praticamente todos os países mais importantes estabeleceram um sistema baseado em um banco central de reservas. Não é suficiente que um país organize um banco central. Deve ser um banco central autêntico operando exclusivamente como banco central... e não fundamentalmente como um banco comercial cumprindo apenas algumas funções de uma banco central".58

"Qualquer proposta para a organização de um banco central no Brasil deve imediatamente considerar duas alternativas: a) a conversão do atual Banco do Brasil em um banco central ortodoxo; b) a organização de uma instituição completamente nova que gozará do monopólio de emissões e cumprirá as demais funções de um banco de reservas. O atual Banco do Brasil é fundamentalmente um banque d'affaires envolvendo-se em negócios comerciais que não são parte das funções de um banco central. Essa linha de atividades cumpre papel tão importante... que obviamente não pode ser abolida... sendo difícil imaginar de que maneira poderia ser transferida para qualquer outro banco comercial atualmente em operação... será, portanto, mais factível transferir as funções de banco central que o Banco do Brasil vem desempenhando nos últimos anos para uma instituição especialmente organizada para esse fim".59

Niemeyer apresentou uma proposta de estatutos do novo banco central como um anexo ao seu relatório. As principais sugestões incluídas nas proposta de estatutos foram as seguintes:

a) a emissão fiduciária deveria ser unificada60 e confiada ao banco, sendo conversível à opção do banco em ouro ou divisas; o banco manteria uma reserva em ouro ou divisas correspondendo a pelo menos 30% do seu passivo incluindo o papel-moeda em circulação e "sua obrigação fundamental será manter estável o valor do papel-moeda em termos de ouro".61 A despeito da adoção do padrão-ouro "não é necessário ou mesmo desejável que o banco mantenha reservas em ouro... pois a troca de notas por drafts sobre praças que operem com ouro no exterior... é para todos os efeitos equivalente à troca por ouro";62

b) "apesar da necessidade de prover o banco com capital adequado, o montante... não deve ser excessivo (pois) um capital excessivo requer lucros maiores para distribuição como dividendos e tende a criar a tentação de utilizar os fundos disponíveis de forma inapropriada... 60 000 contos de réis (aproximadamente £ 1,1 milhões à taxa de 4,5 dinheiros por mil-réis) seria um montante adequado para o capital inicial do banco de reservas".63 O capital seria dividido em 300 000 ações de 200 mil-réis cada uma, de modo "a colocar a subscrição do alcance de quase todos os brasileiros".64 As ações seriam subscritas em partes iguais pelo público (acionistas A) e pelos bancos comerciais nacionais e estrangeiros (acionistas B). Os bancos comerciais subscreveriam na proporção de seu capital, mas nenhum banco deveria subscrever mais do que 3,3% do capital do banco de reservas ou 8% do seu próprio capital;65

c) a diretoria do banco seria constituída de presidente, vice-presidente e cinco outros diretores. O presidente e o vice-presidente seriam eleitos em assembléia geral de acionistas e teriam sua indicação confirmada pelo Presidente da República. Os acionistas A elegeriam três diretores enquanto os acionistas B elegeriam dois que deveriam ser banqueiros e não necessariamente brasileiros. Nenhum diretor poderia ser membro do Congresso Nacional, Assembléias Estaduais ou Câmaras de vereadores, pois "o perigo de controle ou interferência estatal com as funções do banco central foi amplamente demonstrado no último quarto de século";66

d) o banco responsabilizar-se-ia por todas as transações bancárias e depósitos de entidades públicas;

e) a maior parcela dos depósitos do banco corresponderia ao depósito compulsório de 10% do passivo, a menos de 30 dias dos bancos comerciais; o banco não pagaria juros sobre quaisquer depósitos e dedicar-se-ia à compra, venda, desconto e redesconto de letras e duplicatas de venda referentes a transações comerciais a, no máximo, 90 dias (120 dias, se relacionadas a atividades agrícolas);67 o banco poderia adiantar fundos até 90 dias a uma taxa de juros pelo menos 2% superior à taxa oficial de desconto, se as operações fossem garantidas com ouro, títulos federais negociáveis, letras de câmbio ou duplicatas; operaria em câmbio, administraria um sistema de compensação; realizaria operações de open market, utilizando títulos federais transferidos ao banco como pagamento parcial da dívida do governo relativa à transferência da responsabilidade pela emissão fiduciária do Tesouro Nacional;

f) "Em vista da natureza inovadora e delicada das funções (do novo banco ) e da conveniência de manter-se um contato estreito com outros bancos centrais, o banco de reservas deveria... utilizar, durante o seu primeiro ano de existência, os serviços de um conselheiro experimentado em atividades de bancos centrais em outras regiões do mundo";68

g) "Antes que o novo banco possa cumprir as funções de um banco central ortodoxo, o peso em ouro do mil-réis deverá ser estabelecido por lei" e a "convertibilidade posta em prática o mais cedo possível";69 se a reserva mínima caísse abaixo de 30%, mas ainda estiver acima de 28%, o banco pagaria ao Tesouro 4% ao ano sobre a deficiência; se a reserva caísse abaixo de 28%, o banco pagaria mais 29% sobre a deficiência a cada 2% ou parte da diminuição da reserva; no caso da reserva cair a menos de 30%, o banco também aumentaria sua taxa mínima de desconto pelo menos da percentagem que deveria incidir sobre a deficiência de reservas, tal como definida anteriormente; todas as restrições sobre operações cambiais ainda em vigor quando a convertibilidade total fosse decretada, deveriam ser imediatamente abolidas;70

h) o governo federal liquidaria imediatamente sua dívida relacionada à transferência de responsabilidade pelas notas do Tesouro Nacional em circulação, parte em divisas, parte em títulos apropriados à condução de operação de-open market e parte sób a forma de dívida nominal que não acumularia juros e seria gradativamente liquidada por: 1. participação federal nos lucros do banco no caso em que os lucros disponíveis para distribuição aos acionistas fossem superiores a 12% do capital, depois de satisfeitas as provisões relativas à constituição de um fundo de reserva; 2. lucros relativos à cunhagem e braceagem; 3. vinte mil contos anuais provenientes de verba orçamentária. O Banco do Brasil liquidaria o débito relativo à sua circulação fiduciária por meio de transferência imediata de ativos líquidos apropriados;71

i) dos lucros líquidos anuais do banco 10% seriam transferidos para um fundo de reserva até que esse atingisse 20% do capital nominal do banco; 5% dos lucros líquidos anuais até que

o fundo de reserva correspondesse a 50% do capital; do resíduo, um máximo de 12% ao ano seria distribuído aos acionistas; se houvesse algum resíduo após o pagamento de dividendo deveria ser dividido em proporções variáveis, de acordo com o nível do fundo de reserva entre o aumento desse e a redução da dívida do governo federal com o banco;72

j) a alteração dos estatutos não poderia ser proposta ao Congresso Nacional sem a aprovação de, pelo menos, 2/3 de cada grupo de acionistas do banco.73

O resultado da restrição da participação dos bancos comerciais na subscrição do capital do banco central - limitada a 8% do capital de cada banco comercial ou 3,3% do capital do banco central - seria redução da participação do Banco do Brasil, que deveria ser de 5,4% (correspondente à participação do Banco do Brasil no capital agregado dos bancos comerciais) para 3,3%.74 A participação reduzida do Banco do Brasil parecia ainda mais estranha se fosse levado em consideração que a sua participação no capital agregado dos bancos comerciais não refletia a importância de suas operações. Em 1930, o Banco do Brasil detinha mais de 23% dos depósitos totais do setor bancário, enquanto sua participação no capital agregado dos bancos comerciais era de apenas 10,8%.

É difícil encontrar outra razão para a sugestão dessa cláusula restritiva que não fosse a intenção de minimizar a interferência governamental na gestão do novo banco, pois o governo federal detinha o controle acionário do Banco do Brasil. Esta interpretação é consistente com a preferência demonstrada por Niemeyer pela organização de um banco totalmente novo, rejeitando à alternativa dè reorganizar o Banco do Brasil. Esta preocupação em evitar qualquer interferência governamental - que violaria as regras básicas de boa conduta de um banco central formuladas por Montagu Norman - sugere uma interpretação talvez mais realista para a ênfase colocada por Niemeyer na necessidade de o capital do novo banco não ser "excessivo", pois um capital inicial "excessivo" implicaria quase certamente participação substancial do governo na sua subscrição. As recomendações de Niemeyer nesse terreno indicam que o seu objetivo era assegurar que o futuro banco central, sendo privado e "cosmopolita", colaboraria lealmente com os demais bancos centrais de acordo com o modelo "neutro de pressões políticas" proposto por Norman.75

É interessante assinalar que o temor de Niemeyer com relação aos perigos de interferência externa na operação do novo banco parecia limitar-se ao Banco do Brasil e ao governo brasileiro e não incluía interesses ligados ao capital estrangeiro que, por hipótese, não conflitavam com a política do banco central que melhor servisse aos interesses da economia nacional. A recomendação explícita de que os diretores eleitos pelos acionistas B não deveriam ser obrigatoriamente brasileiros e a sugestão de que fosse contratado um perito estrangeiro especialista em assuntos relativos à operação de um banco central confirmam essa interpretação.

A cláusula que submetia qualquer modificação dos estatutos do banco à aprovação de pelo menos 2/3 de cada grupo de acionistas permitia que uma pequena minoria de acionistas, controlando apenas 1/6 das ações bloqueasse qualquer tentativa de alterá-los.76

Em estreita relação com suas recomendações referentes à estabilização do mil-réis e conseqüente liberalização das operações cambiais, Niemeyer analisou a situação cambial do momento. Na sua opinião, a preocupação geral com a taxa cambial era excessiva, pois o saldo da "balança comercial" vinha aumentando continuamente desde 1928. Além disso, pensava que a opinião pública brasüeira freqüentemente esquecia-se de levar em consideração as "exportações invisíveis" - isto é, a entrada de capitais estrangeiros - quando analisava o balanço de pagamentos: "como é o caso de quase todas as nações em desenvolvimento... é normal que o Brasil apresente um balanço de pagamentos desfavorável que é necessariamente equilibrado por crescente investimento estrangeiro"... Disto decorria que não era "necessário ser pessimista a respeito do futuro balanço de pagamentos, desde que se persiga uma política de investimentos sadia - algo que depende do Brasil". Essa análise é errônea, pois da existência de considerável saldo na "balança comercial" decorre obrigatoriamente que a contribuição líquida do capital estrangeiro, do ponto de vista do balanço de pagamentos, seja negativa. As recomendações de Niemeyer, portanto, destinavam-se a tentar assegurar a continuação da entrada de capitais estrangeiros para que fosse possível manter intatás as remessas de lucros, juros e amortizações relativas ao capital estrangeiro público e privado investido no Brasil. Ao considerar a entrada de capitais estrangeiros como mera função do bom comportamento do governo brasileiro, Niemeyer demonstrou total falta de compreensão do verdadeiro impacto da depressão no movimento internacional de capitais.77

As recomendações específicas do relatório em relação à política a ser adotada para assegurar a continuação da colaboração de capitais estrangeiros constituem, na verdade, uma versão empobrecida das recomendações incluídas no relatório Montagu de 1924 e, mais uma vez, não levam em conta as profundas alterações ocorridas na conjuntura econômico-financeira mundial desde 1928-29. A recomendação específica mais razoável - que a concessão de empréstimos estrangeiros a governos estaduais e municipais deveria depender de autorização do governo federal - era ociosa, pois em julho de 1931 nenhum "investidor" estrangeiro em pleno gozo de suas faculdades mentais consideraria seriamente a alternativa de comprar qualquer título público brasileiro. Em uma demonstração adicional de sua dificuldade em compreender a seriedade das repercussões da crise sobre a economia brasileira, Niemeyer sugeriu que, como demonstração de suas boas intenções, o governo brasileiro deveria regularizar a situação da dívida de alguns estados e muncípios que há muito não pagavam o serviço de seus empréstimos.78 Retrospectivamente, essa sugestão parece ainda mais desligada da realidade, pois o pagamento do serviço da maior parte dos empréstimos externos federais foi suspenso decorridos apenas dois meses após a publicação do relatório.

Talvez pareça difícil compreender como Niemeyer sentiu-se à vontade para propor a estabilização do mil-réis com base em um retorno à convertibilidade em divisas (gola exchange standard) quando a situação financeira internacional claramente indicava que tal iniciativa seria inviável. Niemeyer, entretanto, não demonstrava mais do que a falta de realismo típico da maioria dos círculos financeiros internacionais, em especial britânicos, a respeito do comportamento futuro do sistema monetário internacional: o abandono do padrão-ouro pela Grã-Bretanha, em setembro de 1931, realmente surpreendeu esses círculos financeiros.

A inabalável confiança de Niemeyer no padrão-ouro implicou sua sugestão, já mencionada, em que a adoção de um gold exchange standard equivaleria, para todos os efeitos, a um sistema genuinamente baseado no padrão-ouro e que não seria mesmo desejável que o novo banco central mantivesse as suas reservas em ouro.79 Os comentários do relatório sobre essa questão sugerem que a preocupação básica de Niemeyer não parecia ser a solução do problema cambial brasileiro, mas a inclusão do novo banco central na comunidade de bancos centrais de tal modo que não houvesse qualquer repercussão desfavorável na reserva-ouro dos principais bancos centrais, em especial do Banco da Inglaterra.

Para que o banco central a ser criado dispusssse de reservas adequadas em divisas, seria necessário providenciar o lançamento de um empréstimo externo que, na opinião de Niemeyer, deveria ser da ordem de £ 16 milhões. "Com a cooperação dos principais países supridores de capital e com um orçamento equilibrado no Brasil, deveria ser possível captar recursos suficientes para um plano de estabilização se o governo brasileiro continuar a adotar as medidas necessárias à reconstrução de suas finanças internas e à manutenção do serviço de seus empréstimos externos".80

Parece claro que a questão da estabilização do mil-réis e da criação do banco central não foi seriamente considerada pelas autoridades brasileiras que percebiam - com realismo aparentemente maior qüe o de Niemeyer - que não havia possibilidade de se obterem recursos no mercado financeiro internacional mesmo para finalidades menos incertas do que a estabilização do mil-réis. O objetivo das autoridades parece haver sido extrair a aprovação de Niemeyer para a idéia de obter-se um funding loan. Niemeyer, todavia, opunha-se tenazmente a essa sugestão: o insucesso na negociação do funding loan resultou em suspensão unilateral do serviço da dívida externa por parte do Brasil em setembro/ outubro de 1931. O funding loan foi eventualmente negociado ex post em 1932.81

O relatório concluía com algumas observações de caráter geral quanto à excessiva dependência da economia brasileira em relação ao café. A "valorização" do café era criticada e sugeria-se que "após a liquidação da atual posição, nenhuma medida envolvendo responsabilidade governamental pela manutenção de preços de café, ou visando interferir com o processo de ajustamento e transferência de capital para outras indústrias que resultaria dessa política, devera ser implementada.82 Essa'recomendação é resultado da crença - detectável a cada passo na leitura do relatório - de que apenas uma violenta deflação poderia evitar um agravamento progressivo da crise econômica e ilustra de maneira exemplar a superficialidade dos esforços de Niemeyer em compreender os problemas específicos da economia brasileira.

Sua absoluta íalta de familiaridade com as condições do país não foi disfarçada por estratagemas tais como fazê-lo visitar fazendas de café em São Paulo, "não com a expectativa de aprender muito, mas para prevenir-se contra críticos que poderiam argumentar que não era possível opinar a respeito do Brasil sem haver visitado São Paulo e investigado a posição do problema cafeeiro".83

A parte substantiva do relatório não difere das recomendações que Niemeyer sugeriu em outros países que visitou, seja antes, seja depois de sua experiência brasileira. Seu papel é o de catequista pregando o evangelho segundo Montagu Norman, e não o de analista objetivo dos problemas econômicos dos países que visitou.

As recomendações ortodoxas incluídas no relatório podem ser contrastadas com os argumentos incluídos no relatório MacMillan publicado na mesma época. Ali era reconhecido que os países produtores de matérias-primas enfrentavam uma situação "extremamente difícil" dado o desequilíbrio entre sua capacidade de produção que havia sido expandida durante ou imediatamente após a guerra de 1914-18 e a evolução da demanda, o que acarretava influências depressivas, sobre os preços de exportação e, conseqüentemente, sobre o balanço de pagamento.84 Reconhecia-se também o caráter instável dessas economias (especialmente em relação à "grande fricção" causada pelo processo de geração de divisas necessárias para o pagamento da dívida pública externa), bem como as deficiências da análise tradicional que implicava a garantia de que movimentos espontâneos de capitais seriam suficientes para restabelecer o equilíbrio do sistema a novos preços relativos, no caso de ocorrer alguma "perturbação".85

É clara, também, a falta de confiança nos remédios ortodoxos como meio de assegurar a recuperação das atividades econômicas e, alguns membros do comitê, sob a influência de J. M. Keynes, assinaram um anexo que se opunha ao corte de salários como solução para a crise.86 Entretanto, o fato de a maioria dos membros do comitê ter-se recusado a assinar o anexo confirma a interpretação de que as recomendações de Niemeyer constituíam reflexo fiel das opiniões sobre política econômica em voga tanto na City de Londres quanto nos círculos oficiais britânicos.

É algo surpreendente que as reações da imprensa brasileira tenham sido, em geral, tão comedidas. O Jornal do Commercio não conseguiu encontrar nas propostas de Niemeyer nada "que possa ferir as nossas suscetibüidades". Vários jornais, entretanto, entre os quais O Globo, A Noite e o próprio Jornal do Commercio, discordavam da recomendação segundo a qual o banco central devia ser completamente independente do Banco do Brasil. O Jornal do Commercio de 31 de julho de 1931 argumentava que não seria recomendável que um banco de importância tão notável devesse permanecer fora do controle do governo enquanto o Correio da Manhã de 29 de julho sugeria que o capital do novo banco parecia insuficiente. Os críticos concentravam sua atenção sobre a ação precipitada do governo ao "aceitar" as recomendações do relatório, sem ouvir a opinião pública.88

As recomendações do relatório relativas à organização de um banco central independente e ortodoxo não foram seguidas, e somente em 1945 uma versão primitiva de banco central veio a ser constituída como departamento do Banco do Brasil. As recomendações superficiais do relatório relativas à política cafeeira também não foram observadas pelas autoridades que optaram por uma política de sustentação de preços até 1937. Algumas das recomendações referentes a detalhes de política orçamentária foram adotadas. O governo federal adotou como política a redução e eventual abolição das taxas de exportação. Porém, tanto essa decisão quanto a limitação da capacidade de endividamento das autoridades públicas não-federais devem ser vistas como parte integrante da estratégia política varguista que se baseava no fortalecimento do governo federal e conseqüente enfraquecimento das oligarquias políticas estaduais, e já haviam sido publicamente mencionadas pelo chefe do Governo Provisório antes da chegada de Niemeyer ao Brasil.88 O governo federal também esforçou-se em aumentar a importância relativa da taxação direta. A arrecadação do imposto de renda aumentou 145% entre 1930 e 1934, comparada a um aumento de 45% na arrecadação do imposto de consumo e de 34% na arrecadação do imposto de importação. O declínio da importância do imposto de importação como proporção da arrecadação federal, todavia, resultou da queda no valor e volume das importações ocorridas após 1929, e não da implementação de uma política fiscal que tivesse como objetivo reduzir sua importância em relação ao total da receita federal.

É impossível julgar até que ponto as recomendações do relatório Niemeyer relativas à política fiscal foram adotadas pelo Governo Provisório sem um exame de controvérsia recente sobre as políticas econômicas adotadas na primeira metade da década de 30. Esse será o objetivo da quarta parte.

4. UMA VISÃO CRÍTICA DE ABORDAGEM "REVISIONISTA" A POLÍTICA ECONÔMICA DO GOVERNO PROVISÓRIO

A maior parte das pesquisas publicadas recentemente tende a criticar a interpretação tradicional de vários aspectos da política econômica implementada nos primeiros anos da administração de Getúlio Vargas. Uma das críticas sugere que a política econômica do Governo Provisório foi "ortodoxa", prejudicando, portanto, a recuperação das atividades econômicas a partir de 1931. Como conseqüência da inadequação da política econômica - argumentam os revisionistas - a economia não se expandiu com a aceleração sugerida pela interpretação tradicional. Outros autores criticam a interpretação tradicional de que as políticas econômicas de Vargas, em geral, beneficiaram qs interesses industriais em detrimento dos interesses agrícolas, em especial da oligarquia cafeeira.89

Há uma semelhança clara entre os revisores da interpretação tradicional da história econômica do Brasil durante o primeiro período de governo de Vargas - especialmente Pelaez - e as contribuições de Diaz-Alejandra para a análise do caso argentino, se bem que os sofismas sejam de melhor linhagem no caso argentino. Ambos classificam como "ortodoxas" e/ou "fora da moda" as políticas econômicas adotadas por Vargas e Perón, elogiando, em geral implicitamente, a política econômica da oligarquia no Brasil antes de 1930 e na Argentina antes de 1943.90

De acordo com alguns dos críticos da interpretação tradicional, os líderes do Governo Provisório adotaram as recomendações de Niemeyer referentes à política fiscal porque acreditavam erroneamente que a recuperação das atividades econômicas dependia exclusivamente da adoção dessas recomendações. Nenhum esforço é feito no sentido de avaliar o verdadeiro papel da missão como instrumento de' pressão política cujo objetivo principal - a proteção dos interesses de banqueiros e tomadores de títulos brasileiros - conflitava com a implementação das políticas mais desejáveis do ponto de vista estritamente nacional. Deve-se-ia admitir que a tática do Governo Provisório - desfrutando de poder político ainda algo precário e enfrentando uma crise de balanço pagamentos extremamente séria - não podia ser outra senão tergiversar, assegurando banqueiros e tomadores de títulos das boas intenções do Brasil mesmo que não houvesse, desde o início, intenção ou possibilidade de colocar em prática as sugestões de Niemeyer.91

A sugestão de que a política fiscal do Governo Provisório foi "ortodoxa" baseia-se parcialmente na análise de pronunciamentos de vários de seus líderes sobre política econômica.92 Se bem que seja verdade que um número incontável de discursos, relatórios e entrevistas possa ser mencionado, defendendo o equilíbrio orçamentário, essa abordagem não é particularmente esclarecedora. Mais importante doque analisar os pronunciamentos de formuladores de política econômica é analisar que políticas econômicas foram realmente implementadas.

A parte substantiva do argumento baseia-se na análise dos balanços federais. A compatibilização do argumento revisionista com a evidência apresentada na tabela 4 é extremamente problemática.

Além disso, como foi notado por Fishlow, os deficits - pelo menos a partir de 1933 - resultaram de despesas reais superiores às despesas orçadas e não de superestimativas de receitas orçadas indicando política consciente de manutenção de deficits por parte do governo.93 Basear-se nos deficits relativamente "reduzidos" de 1931 e 1933 para argumentar que a política fiscal era ortodoxa, como faz Pelaez, é extremamente ilusório, pois os consideráveis deficits de 1930 e 1932 impuseram restrições à dimensão dos deficits em anos "normais".94 O mesmo autor sugere que em 1932 o Governo Provisório foi "salvo" da ortodoxia fiscal pela eclosão da insurreição paulista que implicou despesa adicional da ordem de 450 milhões de mil-réis. O deficit de 1932, entretanto, correspondeu a mais do dobro dessa cifra e o resíduo não parece poder ser integralmente explicado por um declínio da arrecadação. Em qualquer caso, o argumento baseia-se no que poderia haver ocorrido em 1932 se a insurreição paulista não houvesse ocorrido e, como toda ficção histórica, repousa em fundamentos extremamente frágeis.

A recuperação do nível de atividades é vista por esse ramo da escola revisionista como resultado não de políticas anticíclicas, mas de "fatores externos" que proporcionaram grande expansão do saldo na balança comercial. Esse teria sido o caso, realmente, se a contração do nível de importações houvesse sido autônoma. O aumento do saldo na balança comercial resultou, entretanto, da introdução de um sistema de controle cambial que dificultava ou impedia a importação de determinados produtos com o objetivo de gerar divisas suficientes para manter os pagamentos relativos ao serviço da dívida pública externa e às remessas de lucros e dividendos de capitais estrangeiros investidos no Brasil.95

Essa linha de argumentos revisionistas é acompanhada, geralmente, da afirmativa de que a interpretação tradicional exagera a importância da expansão da economia na década de 30-. Tal afirmativa foi posta em dúvida com a recente publicação de índices setoriais e de novos índices para o PIB (ver tabela 5). De relevância especial é a constatação de que a produção industrial atingiu o ponto de máximo declínio em 1930, crescendo contínua e aceleradadamente até 1935, e que a crise relacionada à depressão - além de iniciar-se em 1928 - não foi mais intensa do que a crise de 1922-26.

A crítica à interpretação tradicional, negando que o Governo Provisório haja adotado inconscientemente - e possivelmente em oposição às suas reais intenções - uma política anti-recessiva de importância considerável para assegurar uma retomada relativamente rápida do nível das atividades econômicas não parece, portanto, ser confirmada pelo exame dos fatos.

À luz desses argumentos, que sugerem que as recomendações do relatório Niemeyer relativas à política fiscal não foram adotadas pelo governo brasileiro, a Missão Niemeyer deve ser considerada como um fracasso. Nenhuma de suas recomendações mais importantes foi adotada, e as recomendações de menor importância que foram adotadas já faziam parte do programa de Vargas antes da chegada de Sir Otto.

Na verdade, mesmo do ponto de vista dos interesses estrangeiros e, em particular, britânicos operando no Brasil, não é claro que a adoção da política deflacionária proposta no relatório fosse resultar, no curto ou longo prazos, em maior disponibilidade de divisas para o serviço da dívida pública externa, ou remessas de lucros de capital estrangeiro investido diretamente no Brasil. Poderia parecer surpreendente que os interesses britânicos tenham sido incapazes de retirar vantagens das dificuldades temporárias entre o Brasil e os Estados Undios, enviando ao Brasil um perito financeiro que fosse incapaz de libertar-se de suas idéias preconcebidas sobre equilíbrio orçamentário e estabilização cambial, procurando entender as peculiaridades da situação enfrentada pela economia brasileira em meio à crise.96 Isto, entretanto, suporia erroneamente uma completa identidade de interesses entre a Grã-Bretanha, enquanto país, e a City de Londres, especificamente a Casa Rothschild, que não existia. As sugestões de Niemeyer devem ser consideradas como uma tentativa fracassada de certos interesses financeiros britânicos de assegurar a continuidade da sua influência ao nível de tomada de decisões de política econômica no Brasil.97

Resta analisar as características da situação brasileira que.possibilitaram, seja no contexto das relações internacionais do Brasil, seja no contexto político interno, que Vargas não adotasse as medidas propostas no relatório Niemeyer.

No contexto das relações internacionais do Brasil, isso pode ser explicado pelo enfraquecimento da posição de barganha dos interesses britânicos no Brasil. Uma vez que se tornou claro que o fluxo de capital estrangeiro havia sido interrompido, a Grã-Bretanha, ao mesmo tempo, perdeu um instrumento clássico de pressão para extrair concessões do governo brasileiro e tornou-se vulnerável à interrupção do pagamento do serviço de capitais investidos no Brasil, pois não podia retaliar na esfera comercial em vista do saldo favorável de seu comércio com o Brasil.

Os Estados Unidos, que estavam na posição de impor condições ao Brasil, não estiveram envolvidos nas negociações financeiras de 1931-32 pelos motivos já expostos e, em todo caso, qualquer pressão ameaçando a imposição de acordo bilateral de compensação conflitaria com a política global norte-americana em favor da universalidade de aplicação da cláusula de nação mais favorecida.

Não é de aplicação geral o argumento de que a depressão teve como conseqüência importante o enfraquecimento do poder de barganha dos países credores como resultado do aprofundamento das rivalidades interimperialistas, que é relevante no caso brasileiro. O caso da Argentina, por exemplo, ilustra as limitações do argumento, indicando uma possível reação do governo brasileiro, dado um clima político e uma estrutura de comércio exterior distintos.98

No contexto político interno, as razões para a atitude do Governo Provisório devem ser procuradas à raiz de suas bases políticas objetivas, que o forçavam a buscar uma solução interna para a crise que não resultasse em deflação, que na prática resultou em beneficiar relativamente os interesses ligados à indústria doméstica

Esta interpretação é posta em questão ainda por outro ramo da escola "revisionista". A revissão nesse caso refere-se à identificação dos grupos sociais que apoiaram a insurreição de 1930 e cujos interesses foram, conseqüentemente, favorecidos pela política econômica posta em prática pelo novo regime.99

A evidência apresentada por Fausto prova conclusivamente o caráter não-industrial dos grupos sociais que apoiaram a insurreição. A parte mais importante de seu argumento, entretanto, põe em dúvida a interpretação tradicional de que a política econômica de Vargas tenha favorecido os interesses industriais. Do fato de que certos interesses apoiem ou não uma mudança inconstitucional de governo, não decorre automaticamente que seus interesses sejam protegidos ou afetados desfavoravelmente pela nova ordem. Talvez os interesses industriais fossem contrários a Vargas e à Aliança Liberal, mas é provável que tenham obtido do Governo Provisório tratamento mais generoso do que poderiam esperar de Júlio Prestes.

Fausto considera problemático afirmar que o governo de Vargas haja perseguido coerentemente a industrialização nos anos iniciais da década de 30.100 De maneira ainda mais decisiva do que no caso dos defensores da tese revisionista relativa à política fiscal do Governo Provisório, seu argumento repousa na análise de definições de política econômica por parte de líderes do governo sob a forma de discursos, entrevistas, manifestos, etc. Como foi mencionado, esse nível de análise é insatisfatório, pois confunde intenções com fatos. É fundamental distinguir entre políticas realmente implementadas e declarações de princípios freqüentemente destinadas a apaziguar a opinião pública.101

A parte substantiva do argumento de Fausto repete afirmações contidas no livro de Warren Dean para mostrar que a adoção simultânea em 1931 de cobrança integral dos direitos em ouro, redução de 20% da tarifa geral e 35% para os produtos importados de países com os quais o Brasil havia assinado acordos comerciais, incluindo a cláusula de nação mais favorecida, resultou em reduzida proteção à indústria doméstica.102 Esta interpretação é equivocada, pois a afirmação de Dean parece originar-se de Bandeira de Mello que aplica o desconto de 35% à nova tarifa geral e não à antiga tarifa como dispunha o decreto 20 380 de 8 de setembro de 1931.103 A tarifa geral introduzida em 1931 era aproximadamente 25% superior à tarifa geral anterior. A pauta mínima que seria aplicada a produtos provenientes de países com os quais o Brasil houvesse assinado acordo incluindo a cláusula de nação mais favorecida era aproximadamente equivalente à tarifa em vigor até setembro de 1931- Além disso, as reduções na pauta de preços oficiais, base para o cálculo da tarifa devida, foram marginais, o que implicava, em vista da queda do preço dos produtos importados decorrente da crise internacional, um aumento da tarifa como proporção do preço das importações no Brasil.

De qualquer maneira, é difícil compreender a razão da ênfase colocada por Dean e Fausto no exame do nível da proteção tarifária, pois até 1934 operava um sistema de controle cambial que racionava o suprimento de divisas para a importação de certos bens e que resultava, em muitos casos, em proteção absoluta da produção doméstica desses bens. Pode-se argumentar que isto não era parte de uma política consciente de proteção à indústria nacional, mas do fato de que uma política não seja consciente não decorre que seja ineficaz.104

Dificuldades relativas ao balanço de pagamentos justificaram - no entender dos formuladores de política econômica - a introdução em 1931-32 de outras medidas destinadas a limitar as importações protegendo, conseqüentemente, a indústria nacional: mistura compulsória de carvão, álcool de cana e mandioca a carvão, gasolina e farinha de trigo importados; proibição de importação de equipamentos para indústrias consideradas em estado de "superprodução (isto é, com grande capacidade ociosa) , afetando as indústrias de tecidos, calçados, chapéus, açúcar, fósforos e papel; aumento de tarifas sobre vários produtos têxteis, louça e bebidas alcoólicas.

Até mesmo a política cafeeira, que tem sido apresentada pelos críticos da interpretação tradicional como prova da preocupação quase exclusiva do Governo Provisório com a agricultura, deve ser considerada não apenas como concessão aos interesses cafeeiros, mas como determinante fundamental da manutenção da demanda efetiva dos bens produzidos pela indústria doméstica.

A evidência disponível não confirma a interpretação que sugere que a política econômica do Governo Provisório não favoreceu os interesses industriais. Pelo contrário, tende a confirmar as linhas gerais-da interpretação tradicional.

BIBLIOGRAFIA

Arquivos

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  • Williams, B.H. Economic foreign policy of the United States. Nova York, 1929.
  • *
    Este artigo é uma versão revista do original mimeografado, publicado em inglês pelo Centro de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Cambridge como
    Working Papers n. 10.
    O autor, seguindo a tradição, ressalta que as opiniões aqui expressas são de sua exclusiva responsabilidade.
  • 1
    O autor agradece o incentivo e as sugestões de ordem formal e/ou substantiva de Roberto Abdenur, Alice Abreu, Albert Flshlow, Jorge Fodor, Pedro Malan, Milton da Matta, Arturo O'Connell, Antonio Cláudio Sochaczewski, Brian Van Arkadie e John Wells, em diferentes etapas da elaboração deste artigo.
  • 2
    Nesta versão do artigo resume-se consideravelmente a primeira parte, pois a versão em inglês tinha por objetivo oferecer uma visão geral da economia brasileira na década de 20 e não apenas ressaltar suas características mais relevantes do ponto de vista do tema aqui abordado.
  • 3
    Por empréstimo público entende-se, neste artigo, qualquer empréstimo lançado em moeda estrangeira, geralmente no exterior, em benefício do governo federal brasileiro, de governo estaduais, de municípios ou de autoridades responsáveis pela acumulação de estoques de café.
  • 4
    Informações sobre movimento de capitais estrangeiros neste período são extremamente insatisfatórias. As estimativas existentes sugerem que remessas de lucros e dividendos de capital estrangeiro na década de 20 corresponderiam a cerca de £ 14 milhões anualmente, enquanto remessas de imigrantes seriam da ordem de 3-5 milhões. Ver
    Report submitted to His Excellency the President of Brazil. By The Right Honourable Edwin S. Montagu, 23.2.24; e League of Nations,
    Balance of payments 1933. Geneva, 1934.
  • 5
    Ver Rippy, J. F.
    British investments in Latin America, 1822-1949. A case study in the operations of private enterprise in retarded regions. Minneapolis, 1959. Em 1929, de acordo com U.S. Departament of Commerce, Bureau of Foreign and Domestic Commerce,
    American direct investments in foreign countries, 1940, Economic Series n. 20, Washington, 1941, a distribuição do investimento direto norte-americano no Brasil - que totalizava 17$ 194 milhões - era a seguinte: 46 milhões na industria manufatureira, 23 milhões na distribuição de petróleo, 16 milhões em atividades de distribuição em geral e 97 milhões em companhias de serviço público. Estimativas de investimento não devem ser consideradas mais do que indicações grosseiras da posição real, pois existem problemas sérios tanto em relação a cada estimativa de
    per si quanto à sua comparabilidade. Para a discussão de alguns desses problemas, ver United Nations, op. cit. cap. 1.
  • 6
    Este tema é tratado com mais detalhe pelo autor em trabalho recente sobre a dívida pública externa brasileira:
    Brazilian public foreign debt policy, 1931-1943. Cambridge, 1973, mimeog.
  • 7
    A importância dos empréstimos brasileiros como proporção dos negócios da Casa Rothschild era substancial. Um cálculo grosseiro indica que os empréstimos brasileiros corresponderam a pelo menos 10% do total das emissões dos Rothschild entre 1824 e 1904. Ver Ayer, J.
    A. century of finance, 1804-1904, the London House of Rothschild. London, 1905.
  • 8
    A deterioração do balanço de pagamentos britânico foi o principal motivo de contração do volume de empréstimos emitidos em Londres, Ver Moggridge, D.
    British monetary policy 1924-1931. The Norman conquest of $ 4,86. Cambridge, 1972, sobre o uso de
    moral suasion como instrumento para racionar a emissão de empréstimos estrangeiros em Londres durante a década de 20.
  • 9
    Em 1912 uma ação judicial foi impetrada pelo Departamento de Justiça norte-americano contra o comitê de valorização nos Estados Unidos com base em suposta violação do Sherman Act. Um acordo fora do tribunal resultou em rápida liquidação dos estoques acumulados nos Estados Unidos e na retirada da ação judicial. Em 1925 o Departamento de Estado informou certos banqueiros nova-iorquinos que não aprovaria a emissões de empréstimos em benefício do estado de São Paulo. Ver Williams, B. H.
    Economic foreign policy of the United States. Nova York, 1929, p. 94, 400-3.
  • 10
    A guerra causou importante reorientação do comércio dos Estados Unidos: entre 1913 e 1925 as importações norte-americanas de países não-europeus aumentaram de 51,8% para 70,7% das importações totais, enquanto que as exportações para países nãoeúropeus passaram de 39,6% para 47% do total das exportações. Ver Phelps, C. H.
    The foreign expansion of American banks. American bank branching abroad. Nova York, 1927, p. 113. Alguns produtos norte-americanos gozaram de tarifa preferencial no Brasil até 1923.
  • 11
    Sobre o triângulo "invertido" que caracterizava as relações econômicas internacionais da Argentina, ver Jorge Fodor e Arturo 0'Connell, La Argentina y la economia atlântica en la primera mitad dei siglo XX.
    Desarrollo Económico, v. 13, n. 49, abr. jun. 1973. Ao contrário do triângulo argentino - resultado de um saldo favorável na balança comercial com a Grã-Bretanha e um saldo desfavorável no comércio com os Estados Unidos - o triângulo brasileiro era "bem comportado", pois os Estados Unidos tinham um saldo comercial favorável com a Grã-Bretanha. A Grã-Bretanha perdeu, depois da guerra, sua posição de dominância no Brasil tanto na esfera comercial como na esfera financeira. O único ramo de atividades no qual a sua dominância mantinha-se durante a década de 20 era em transporte marítimo. Em 1926 navios britânicos nas rotas brasileiras transportaram o dobro da tonelagem transportada por navios alemães, seus concorrentes mais próximos. Ver Manchester, A. K.
    British preeminence in Brasil. Its rise and declines a study in European expansion. Nova York, 1972 (reprint), p. 336.
  • 12
    Essa generalização seria possivelmente enfatizada com inclusão de movimentos de capitais privados, pois o movimento liquido de capitais privados britânicos tornou-se desfavorável ao Brasil - e os capitais já investidos no país continuavam a gerar lucros e dividendos - enquanto o investimento privado norteamericano estava em franca expansão.
  • 13
    Existe, entretanto, considerável literatura sugerindo que, ao contrário de outros centros financeiros, o mercado de Londres operava totalmente livre de pressões políticas. Ver, por exemplo, relatório de Montagu Norman, Governador do Banco da Inglaterra (1920-1944), ao
    Committee of Treasury do Banco da Inglaterra em 1929, citado por Clay, H .
    Lord Norman. London, 1957, p. 287; e Einzig, P.
    The fight for financial supremacy. London, 1931, passim. Para referências à importância de considerações políticas no mercado de Nova York, ver nota 9.
  • 14
    Brazil. Annuál Report 1926. p. 4, F.O. 371:11967, A2932/2932/6.
  • 15
    Chamberlain para Alston, 1.4.26, F.O. 371:11115, A2075/G.
  • 16
    Sir Victor Wellesley, minuta, 19.4.26, F.O. 371:11115, A2075/G.
  • 17
    Sir Austen Chamberlain, minuta, 19.4.26, F.O. 371:11115, A2075/G.
  • 18
    Sir Victor Wellesley, minuta, 20.4.26, F.O. 371:11115, A2075/G.
  • 19
    Tilley to Curzon, n. 14, 18.1.24, F.O. 371:9508, A896/70/6.
  • 20
    Brazil, Annual Report 1927, p. 5, F.O. 371:12744, A 1687/1687/6.
  • 21
    Kemmerer, o notório perito norte-americano, visitou o Brasil em 1923 em missão sem grande repercussão. Ver Seidel, R.N. American reformers abroad: the Kemmerer Missions in South America, 1923-1931.
    Journal of Economic History, 1972.
  • 22
    Brazil, Annual Report 1923. p. 9, F.O. 371:9516, A2168/2168/6. A missão elaborou dois relatórios: um para consumo popular e outro para consumo exclusivo dos Rothschild. A cópia dessa versão nos arquivos do
    Foreign Office parece haver-se extraviado. Ver carta de Lionel de Rothschild para Sir William Tyrrell, 154.24, F.O. 371:9508, A2427/70/6.
  • 23
    Telegrama 62 (R) ,
    Foreign Office para Tilley (Rio de Janeiro), 27.11.23, F.O. 371:8430, A7012/818/6.
  • 24
    Terms of reference (Montagu Mission), anexo à carta de Rothschild para Sperling, 12.12.23, F.O. 371:8430, A7294/818/6.
  • 25
    Com relação à recusa de Montagu em interceder em favor da
    Great Southern Brazilian Railway ver Tilley para MacDonald, n.37, 15.2.24., F.O. 371:9513, A1529/270/6. Mencionando ás dificuldades relacionadas ao contrato entre a
    Rio anã São Paulo Telephone Company e a Prefeitura do Distrito Federal, Tilley observou que, enquanto seus esforços haviam sido em vão, talvez. Montagu pôde interessar-se pelo caso, pois dispunha de "melhores meios de persuasão". Ver
    Brazil, Annual Report 1923. p. 14-5, F.O. 371:9516 A2168/2168/6.
  • 26
    Montagu op. cit. passim.
  • 27
    Brazil Annual Report 1923. p. 5. F.O. 371:9516, A2168/2168/6.
  • 28
    Anexo a Tilley para MacDonald, n. 160, 19.7.24, F.O. 371:9511, A4877/87/6.
  • 29
    Telegrama 46, Birch para
    Foreign Office (D'Aberhon para Board of Trade), 18.9.29, F.O. 731:13469, A6297/6239/6.
  • 30
    Telegrama 52 (R) , Birch para
    Foreign Office (D'Abernon para Board of Trade), 20.9.29, F.O. 371:13469, A 6296/6239/6 e telegrama 1, D'Abernon para Board of Trade, 21.9-29, F.O. 371:13469, A6297/ 6239/6.
  • 31
    Hopkins (Treasury) para Subsecretário de Estado,
    Foreign Office, 15.3.30, F.O. 371:14205, A1989/727/6. O governo colombiano sofreu desaponto similar, pois também nesse caso o
    Foreign Office havia assegurado que a redução da tarifa sobre café seria estudada com "cuidado e simpatia" se o governo colombiano resolvesse favoravelmente algumas reivindicações de interesses britânicos. O governo colombiano, de fato, resolveu favoravelmente o caso
    Colombia Mining Co. sem concessão recíproca do governo britânico. Memorando de Broad, minutas de Craigie e Kelly, F.O. 371:15060, A4110/182/6.
  • 32
    Sobre política de "valorização" do café, ver especialmente Rowe, J. W. F. London and Cambridge Economic Service, Special Memorandum n. 35, Studies in the artificial control of raw materials n. 3.
    Brazilian Coffee. London, 1932 Edminster , L. e Wallace, B.
    International control of raw materials. Washington, 1930, cap. 5.
  • 33
    Ver Rowe. op. cit. p. 39-44.
  • 34
    t Ver Moggridge. op. cit. p. 20-19.
  • 35
    Ver Rowe, op. cit. p. 53.
  • 36
    Mesmo assim, a menos de 50% do preço internacional. O governo federal começou a comprar café con recursos internos em 1931.
  • 37
    Lomax para Irving, n. 99, 29.12.30. F.O. 371:15059, A804/73/6; Vargas, Getúlio.
    A nova política do Brasil. Rio de Janeiro, 1938, v. 1, p. 183, discurso de 3.10.31; e Normano, J.F. op. cit. p. 267.
  • 38
    O encarregado de negócios britânico antecipou corretamente "a vitória manipulada do Dr. Júlio Prestes, seguida de possível derramento de sangue", mas não pensava que uma ruptura definitiva fosse ocorrer. Despachos de embaixadores britânicos anteriores descreviam Vargas quando Ministro da Fazenda como uma
    non-entily e um joguete nas mãos de Washington Luís. Em 1930, contudo, já se percebia na embaixada britânica que esse juízo era incorreto. Steel para Henderson, n. 18, 14.2.30., A1776/106/6 e Steel para Henderson, n. 43, 27.3.30, A2845/106/6, ambos em F.O. 371:14199. Ver capítulos 32 e 33 de Bandeira, Moniz,
    Presença dos Estados Unidos no Brasil (Dois séculos de história). Rio de Janeiro, 1973, para uma descrição da reação norte-americana do golpe.
  • 39
    Essa era a opinião de observadores estrangeiros tais como os representantes no Rio dos Rothschild e de Lazards. Ver Lomax para Irving, n. 99, 29.12.31. F.C. 371:15059, A804/73/6.
  • 40
    Ver memorando de Rothschild de 17.12.30, F.O. 371:14206, A8229/2833/6 e telegrama de Washington Luís para Júlio Prestes, 19.6.30 citado por Silva, Hélio.
    1930, a revolução traída. Rio de Janeiro, 1966, p. 840.
  • 41
    Seeds para Henderson, n. 135, 16.9.30, F.O. 371:14206, A6070/2833/6.
  • 42
    Esse fato é escamoteado por Whitaker. J. M., em
    A administração financeira do Governo Provisório de 4 de novembro de 1930 a 16 de novembro de 1931. São Paulo, 1931, p. 55, que afirma explicitamente que o "convite" havia sido iniciativa do Governo Provisório. A parte do livro relativa ao relatório da Missão Niemeyer é notável tanto pela quantidade de informações incorretas que contém, quanto pela evidente simpatia pelo ponto de vista dos interesses britânicos.
  • 43
    Norman para Vansittart, 7.1.31, F.O. 371:14206 e memorando de Rothschild citado na nota 40. Sir Otto Niemeyer era, na época,
    comptroller do Banco da Inglaterra e diretor do Banco Nacional do Egito, da
    Vickers-Armstrong e da
    Agricultural Mortgage Corporation. Havia sido funcionário do Tesouro entre 1906 - primeiro lugar no concurso para o
    Civil Service no qual J. M. Keynes havia obtido o segundo - e 1927.
  • 44
    "... um banco central que seja tão dominado por seu próprio governo, que não tenha independência ou Iniciativa, ou mesmo direito a protestar, não pode desempenhar o seu papel, seja internamente, seja em cooperação com outros bancos centrais". Citado por Sir Henry Clay, op. cit. p. 290. Ver na mesma fonte outras referências às idéias de Montagu Norman sobre o funcionamento correto de bancos centrais. Ver também o cap. 2 de Strange, Susan.
    Sterling and British policy a politicai study of an internationál currency in decline. London, 1971.
  • 45
    Sir Victor Wellesley, minuta de entrevista com o embaixador da França em Londres, 11.2.31, F.O. 371:15062, A988/283/6; telegrama 363, Lindsay para
    Foreign Office, 25.10.30 e telegrama 546 (R) ,
    Foreign Office para Lindsay, 28.10.30, ambos em F.O. 371:14201, A6293/106/6 e
    Brazil, Annual Report 1930. p. 11, F.O. 371:15067, A1849/1849/6. Ver também nota 38.
  • 46
    Brazil, Annual Report 1930. F.O. 371:15067, A1849/1849/6.
  • 47
    Isto ocorreu no caso de:
    a) dívidas da Cia. Costeira: telegrama 51 (R) ,
    Foreign Office para Seeds, 8.4.31, F.O. 371:15067 A2221/1809/6.
    b) dívidas da Central do Brasil: telegrama 71, Seeds para
    Foreign Office, 30.731. F.O. 371:150 67, A4682/1547/6.
    c) interesse da firma britânica Marconi na possível reorganização dos serviços postais e telegráficos recomendada por Niemeyer em seu relatório: telegrama 69, Seeds para
    Foreign Office, 22.7.31, A4455/3530/6; telegrama 77, Seeds para
    Foreign Office, 18.7.31, A4926/3530/6; telegrama 83,
    Foreign Office para Seeds, 17.7.31, A4313/3730/6, todos em F.O. 371:15068.
  • 48
    The Niemeyer Report to the Brazilian government. Rio de Janeiro, 4 jul. 1931, (citado em notas posteriores como
    Report...) § 1º? Como o autor não teve acesso a uma cópia da versão brasileira oficial, foi obrigado a utilizar a versão em inglês.
  • 49
    The New York Times, citado por Normano, op. cit. p. 270; e Simonsen, Roberto.
    A indústria em face da economia nacional. São Paulo, 1937, p. 117. As opiniões de Simonsen podem haver sido influenciadas pelo fato de que era um sócio de Murray & Simonsen, firma que representava os interesses de Lazard Brothers no Brasil. Essa casa bancária londrina manifestou em diversas ocasiões o seu ressentimento com relação ao que considerava a conivência de Niemeyer, relativa ao tratamento desfavorável dos empréstimos nos quais estava interessada, nas sucessivas negociações destinadas a fixar o nível e a distribuição do serviço da dívida pública brasileira entre 1931 e 1943. Ver memorando de Lazards, 17.6.43, F.O. 371:33661, A5978/473/6.
  • 50
    Seeds para Henderson, n. 8, 13.1.31, A732/283/6; e Lomax para Henderson, Overseas Trade B(10), 9.131, A1291/283/6, ambos F.O. 371:15062.
  • 51
    Extrato de memorando de Irving para Seeds, 4.4.31 F.O. 371:15063, A2659/283/6.
  • 52
    Report... § 5º
  • 53
    Report... § 3º
  • 54
    Ver Schdevin, C.B.
    Australia and the great depression. A study of economic development and policy in the 1920 and 1930. Sydney, 1970, p. 181-3; e o pronunciamento de Sir Otto Niemeyer na Conferência de Melbourne, jul. e ago. de 1930 incluído em Shann, E.O.G. & Copland, D.B.
    The crisis in Australian finance, 1929-31. Sydney, 1931, p. 18-29.
  • 55
    Report... § 4º a 14.
  • 56
    Ver nota 50.
  • 57
    Memorando de Irving, 15.5.31 F.O. 371:15063, A3593/283/6.
  • 58
    Report... § 15.
  • 59
    Report... § 16.
  • 60
    Três tipos de notas circulavam na época: nota do Banco do Brasil, da Caixa de Estabilização e do Tesouro Nacional.
  • 61
    Report... § 17 e estatutos e notas aos estatutos.
  • 62
    Report... notas aos estatutos, art. 37.
  • 63
    Report... §17 (a) . Essa justificativa é praticamente idêntica à apresentada para limitar o capital do Banco de Reservas da índia a 50 milhões de rúpias pelo Report of the Royal Commission on Indian Currency and Finance 1926, § 91, incluído em
    Reports of Currency Committees, Calcutta, 1931.
  • 64
    Report... notas aos estatutos, arts. 5º e 6º.
  • 65
    Report... estatutos, art. 6º e minuta de decreto, art. 12. No caso de a subscrição pública não cobrir 50% do capital inicial do banco, o governo federal subscreveria o resíduo de ações.
  • 66
    Report... § 18. É interessante comparar essas recomendações com as de Niemeyer ao governo de Nova Zelândia, referentes à criação de um banco de reservas em 1930. A insistência na necessidade de garantir o funcionamento de banco central independente de qualquer ingerência governamental não impediu que Niemeyer recomendasse que o governador e o vice-governador deveriam ser nomeados pelo Governador-Geral da Nova Zelândia. Niemeyer, portanto, não parecia ser contra a ingerência de
    qualquer governo na gestão de bancos centrais. As suas propostas foram, de qualquer modo, profundamente modificadas quando o
    Reserve Bank of New Zealand Act de 1933 foi aprovado, pois o Estado assegurou o direito de nomear vários dos diretores. Ver Tocker, A.H. New Zealand Banking and Currency. The Niemeyer Report,
    Economic record. 1931 e Sutch W.B.
    Recent economic changes in New Zealand. Wellington, 1936.
  • 67
    Letras relativas a atividades agrícolas não poderiam constituir mais do que 25% da carteira de letras internas.
  • 68
    Report... i 18.
  • 69
    Report... § 24. Notas aos estatutos, art. 36.
  • 70
    Report... estatutos, arts. 41 e 42; e minuta de decreto, art. 10.
  • 71
    Report... minutas de decreto, arts. 3º a 9º.
  • 72
    Report... estatutos, art. 47.
  • 73
    Report... estatutos, art. 53.
  • 74
    O capital do Banco do Brasil era de 100 000 contos e o capital total do setor bancário de 918 000 contos em 1930. Depósitos no Banco do Brasil eram no mesmo ano de 1 331 031 contos comparados com 5 731 000 contos em todo o setor bancário.
    Anuário Estatístico do Brasü 1947. p. 225, e
    Statesman's Year-book 1931.
  • 75
    Ver em Moreau, Emile.
    Souvenirs d'un gouverneur de la banque de france. Paris, 1954, um interessante relato das contradições entre os principais bancos centrais.
  • 76
    J. M. Whitaker aparentemente não partilhava do temor manifestado por alguns críticos do relatório quanto à possibilidade de interferência estrangeira: "os receios de açambarcamento por parte de elementos estrangeiros deviam ser considerados excessivos, diante das cautelas tomadas pelos estatutos, para preveni-los, não só no parcelamento do capital social, como na forma de constituição da Diretoria do Banco". Whitaker, op. cit. p. 57-8.
  • 77
    Report... § 25 e
  • 78
    Report... § 30.
  • 79
    Report... notas aos estatutos, art. 37.
  • 80
    Report... § 28.
  • 81
    Ver nota 6.
  • 82
    Report... § 31.
  • 83
    Memorando de Irving, São Paulo, 15.5.31, F.O. 371:15063, A3593/283/6.
  • 84
    No caso do Brasil, estas dificuldades, que haviam sido ao menos parcialmente evitadas com a "valorização" do café, tornaram-se subitamente visíveis em 1929.
  • 85
    (MacMillan)
    Committee on finance and industry, Report. London, 1931, §§ 136-7, 175-8 e 183-5.
  • 86
    Id. anexo I, § 52.
    87 Anexo a Seeds para Henderson, n. 140, F.O. 371:15063, A4981/283/6.
    88 Vargas, Getúlio.
    A nova política do Brasil. Rio de Janeiro, 1938. v. 1, p. 93-103, discurso de 233.31.
  • 89
    Para as várias interpretações revisionistas, ver Leff, N. Long-term Brazilian economic development.
    Journal of Economic History, 1969; Dean W.
    The inãustrialization of São Paulo, 1880-1945. Austin, 1969; Fausto, B.
    A revolução de 1930. História e historiografia. São Paulo, 1970; e vários artigos publicados por Pelaez, CM . na
    Revista Brasileira de Economia entre 1968 e 1972. A interpretação tradicional clássica é apresentada por Furtado, C.
    Formação econômica do Brasil. Rio de Janeiro, 1963, cap. 30-3. Deve-se ressaltar que as críticas às "revisões" da interpretação tradicional incluídas nesta parte não pretendem de modo algum ser completas. Sua inclusão decorre da necessidade de demonstrar que o Governo Provisório
    não adotou políticas econômicas ortodoxas, especialmente a partir de 1931, não aceitando, assim, as recomendações do relatório Niemeyer e de examinar as razões que determinaram essa decisão.
  • 90
    Diaz-Alejandro, CF.
    Essays on the economic history of the Argentine Republic. New Haven, 1970. Para uma crítica de algumas das teses de Diaz-Alejandro, ver Fodor, J. Peron's policies towards agriculture and exports, 1946-48; dogmatism or common sense?, a sair em D. Rock, ed.,
    Modern Argentina.
  • 91
    Durante o primeiro ano do Governo Provisório, o fato de o Ministro da Fazenda ser J. M. Whitaker, ligado à oligarquia cafeeira paulista e interesses britânicos, está possivelmente relacionado ao caráter nitidamente ortodoxo dos pronunciamentos governamentais sobre problemas econômicos. Em um exemplo típico de oportunismo político relacionado às recomendações da missão, Aranha, no final de 1933, quando o governo pretendia convencer os credores estrangeiros a aceitar redução do serviço contratual da dívida pública externa, desenterrou o cadáver da missão e sugeriu que o Brasil oportunamente adotaria as recomendações de Niemeyer. Ver entrevista de Oswaldo Aranha a
    A Noite, 27.10.33, mencionada em Seeds e Simon n. 254, 3.11.33. F.O. 371:16551, A8587/670/6.
  • 92
    Por exemplo: "manter uma administração de rigorosa economia, cortando todas as depesas improdutivas e suntuárias - único meio eficiente de restaurar as nossas finanças e conseguir saldos orçamentários reais", discurso de Getúlio Vargas, 3.11.30.
    A nova política do Brasil, Rio de Janeiro, 1938, v. 1, p. 73; ou entrevista de Oswaldo Aranha a imprensa em 15.12.31, mencionada em Seeds a Simon, n. 233, 19.12.31, F.O. 371:15805, A573/308/6.
  • 93
    Ver Fishlow, A. Origins and consequences of import substitution in Brazil (prova tipográfica) a sair em L. Di Marco, ed.,
    International economics anã development.
  • 94
    Ver Pelaez, C. A balança comercial, a grande depressão e a industrialização brasileira.
    Revista Brasileira de Economia, 1968.
  • 95
    ver Fishlow, A. op. cit. p. 529; e
  • 96
    Se a alternativa de convidar o Dr. Kammerer em lugar de Niemeyer houvesse ocorrido é improvável que suas recomendações fossem mais liberais a julgar por suas atividades em outros países latino-americanos. Ver Seidel. op. cit.
  • 97
    Thompson, do
    Foreign Office, demonstrou considerável poder de previsão, mas escasso contato com a realidade política brasileira ao comentar, antes que Niemeyer apresentasse seu relatório, que "algum progresso pode ocorrer enquanto Sir Otto Niemeyer estiver no Brasil - quando ele partir, entretanto, as autoridades vão retomar os seus
    baã old ways, a menos que um perito residente britânico seja nomeado"; minuta, 24.7.31, P.O. 371:15063, A2659/283/6. A visita de Niemeyer permitiu, entretanto que estabelecesse contatos que foram de grande utilidade nas futuras negociações relativas à dívida externa brasileira.
  • 98
    No seu relatório de 1933 sobre a criação de um banco central na Argentina, por exemplo, Niemeyer incluiu muitas das suas sugestões relativas ao caso brasileiro: ênfase na natureza independente do banco central, limitações do direito de voto do Banco de la Nación (cujo capital correspondia a mais de 25% do capital total do sistema bancário, mas detinha apenas 10% das ações do banco central) e indicação de diretores de bancos estrangeiros que operavam na Argentina. Estas propostas foram apenas parcialmente modificadas pelo Congresso conservando-se as características de "banco de banqueiros". Ver
    The Review of the River Plate, 7.4.33, p. 13-31; e 29.3.35, p. 16-22. Agradeço a Jorge Fodor por haver chamado minha atenção para as atividades de Niemeyer na Argentina.
  • 99
    Fausto, op. cit.
  • 100
    Id. p. 48.
  • 101
    Compare-se, por exemplo, "rever o sistema tributário, de modo a amparar a produção nacional, abandonando o protecionismo dispensado às indústrias artificiais, que não utilizam matéria-prima do pais e mais contribuem para encarecer a vida e fomentar o contrabando", discurso de Getúlio Vargas, 3.11.30, op. cit. p. 73, com: "De outro lado, impõe-se-nos, como medida de defesa econômica, única ao nosso alcance, a redução da importação... devemos aceitar, como postulado cívico, o compromisso de ampliar as nossas lavouras e aperfeiçoar as nossas indústrias, de forma tal que passe a ser considerado deslize de patriotismo alimentârmo-nos, ou vestirmo-nos com tecidos ou gêneros importados", discurso de Getúlio Vargas, 23.2.31. op. cit. p. 97.
  • 102
    Fausto, op. cit. p. 48; e Dean. op. cit. p. 196.
  • 103
    ver Mello, A. Bandeira de.
    Política commercial do
    Brasil. Rio de Janeiro, 1933, p. 100-1, e decreto 20 380 de 8.9.31.
  • 104
    A política comercial do Governo Provisório também é considerada "ortodoxa" por Peláez. Essa sugestão é surpreendente, pois o autor limita-se a mencionar o fato de que, de acordo com a teoria das vantagens comparativas, a distribuição de recursos durante esse período não foi a mais eficiente possível e que empecilhos ao comércio resultaram em declínio de emprego no exterior e redução" no número e variedade dos bens disponíveis no mercado brasileiro... Isto é, a politica comercial do Governo Provisório foi "ortodoxa" porque não respeitou os postulados da teoria prtedoxaj. Ver Péláez C. As conseqüências econômicas da ortodoxia monetária, cambial e fiscal no Brasil entre 1889 e 1945,
    Revista Brasileira de Economia, 1971. Seria interessante saber em que pais os formuladores da politica econômica decidiram não aumentar a proteção à indústria doméstica durante a década de 30 para evitar desrespeitar os postulados da teoria pura do comércio internacional. Ver Robinson, J. The new mercantilismo Cambridge, 1966.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Ago 1974
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