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Sobre o emprego do termo racional em economia e administração

Resumos

Este artigo foi redigido em 76 e publicado no começo de 77. Nele é discutido o significado do termo racional. A análise é exemplificada através do que se considera uma ação 'empresarial racional. A adequação dos meios utilizados aos fins propostos constitui o caráter fundamental do termo. Os meios, porém, devem ser os socialmente aceitos. Além do mais, a ação racional compreende a previsão das suas conseqüências sobre a consecução de outros objetivos, gerais e específicos.

Racionalidade; ação racional; comportamento empresarial; previsão das conseqüências; eficiência administrativa; meios e fins; valores sociais; ação social


This paper was written in 76' and published in the beginning of 77. In this is discussed the meaning of the term rational. The analysis is made through the use of an example of what is considered a rational entrepreneurial action. The adequacy of the used ways for the proposed objectives is the fundamental character of the termo The ways, however, should be accepted on social grounds. And more, the rational action comprises the prevision of this consequences on the achievement of other specific and generalobjectives.

Rationality; rational action; entrepreneurial behavior; prevision of consequences; administrative efficiency; ways and aims; social values; social action


REVISITADA

Sobre o emprego do termo racional em economia e administração

José Carlos Pereira

Ex-professor do Departamento de Ciências Sociais da antiga Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP. Atualmente Professor Associado Aposentado do Departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP

RESUMO

Este artigo foi redigido em 76 e publicado no começo de 77. Nele é discutido o significado do termo racional. A análise é exemplificada através do que se considera uma ação 'empresarial racional. A adequação dos meios utilizados aos fins propostos constitui o caráter fundamental do termo. Os meios, porém, devem ser os socialmente aceitos. Além do mais, a ação racional compreende a previsão das suas conseqüências sobre a consecução de outros objetivos, gerais e específicos.

Palavras-chave: Racionalidade, ação racional, comportamento empresarial, previsão das conseqüências, eficiência administrativa, meios e fins, valores sociais, ação social.

ABSTRACT

This paper was written in 76' and published in the beginning of 77. In this is discussed the meaning of the term rational. The analysis is made through the use of an example of what is considered a rational entrepreneurial action. The adequacy of the used ways for the proposed objectives is the fundamental character of the termo The ways, however, should be accepted on social grounds. And more, the rational action comprises the prevision of this consequences on the achievement of other specific and generalobjectives.

Key words: Rationality, rational action, entrepreneurial behavior, prevision of consequences, administrative efficiency, ways and aims, social values, social action.

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Artigo publicado originalmente na RAE de jan.lfev. 1977, Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, p. 29-33.

1. Não nos estenderemos na distinção entre tecnocrata e técnico. Para nossos fins limitados, apenas diremos que entendemos como tecnocratas aqueles que possuem conhecimentos técnicos adquiridos e desenvolvidos através da educação científica e que os utilizam como forma de influenciar a realidade social em maior ou menor escala; denominados técnicos, por outro lado, os que possuem os ditos conhecimentos sem ter uma influência definida no curso dos acontecimentos (Conforme MEYNAUD, Jean. La tecnocracia, mito o realidade? Madrid: Tecnos, 1968, cap. 1, sección 1). Da mesma forma, Carlos Estevam Martins entende como tecnocrata "o tecnológo que foi capaz de afirmar o seu próprio poder, o poder inerente à sua capacitação técnico-científica", enquanto o tecnológo que não se auto-afirmou ou é "um simples assessor técnico" ou "um tecnoburocrete", que não possui poder especifico, comandado unicamente "por meio de instrumentos de poder puramente burocráticos" (Conforme Tecnocracia e burocracia, Estudos CEBRAP 2, p. 146, out, 1972).

2. Conforme MARX, Karl. El capital, critica de la economia politica. Tradução Wescelao Roces. 2ª edição, México: Fondo de Cultura Económica, v. 3, 1959, p. 256.

3. Considere-se, ainda, que esses valores tendem a variar de uma camada social para outra, dentro da mesma sociedade e cultura. Daí produzirem-se, especialmente nas modernas sociedades complexas e diferenciadas, freqüentes conflitos normativos. Diferindo as normas grupais das gerais, como as normas de um grupo parcial para outro, haverá sempre um grau maior ou menor de diversidade quanto ao que deva ser considerado (se analisada a questão desse ângulo) um comportamento "racional", no caso, "normal".

4. Conforme MERTON, Robert K. Social theory and social structure. New York: The Free Press, 1965, cap. 4: Social structure and anomie, e 5: Continuities in the theory of social structure and anomie.

5. GODELlER, Maurice. Racionalidade e irracionalidade na economia. Trad. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, p. 24.

6. Esta coerência, contudo, como já afirmamos atrás, dificilmente pode ser atingida nas condições reais de funcionamento e dinâmica do sistema, já que haverá sempre divergências entre os vários fins perseguidos pelo empresariado que é a camada social que estamos tomando para exemplo.

7. Conforme GODELIER. Maurice. Op. cit. p. 131. Estas conclusões fundamentais do autor citado podem ser melhor compreendidas se dissermos que, para ele, a hipótese da irracionalidade do comportamento dos indivíduos de sociedades primitivas ou tradicionais "não põem em evidência senão a ideologia dos que aceitam sem crítica os preconceitos das sociedades capitalistas ocidentais em relação a si mesmas e às outras sociedades"(p. 58-9). Isto é, a humanidade não teria aguardado o capitalismo para aprender a economizar seus esforços: ( ... ) "toda informação etnológica e histórica nos mostra que, em todas as sociedades, indivíduos e grupos procuram maximizar fins cujo conteúdo e hierarquia exprimem a dominância de certas relações sociais ( .. .) sobre as outras e se encontram baseadas na própria estrutura de cada tipo de sociedade"(p.32­3).

8. Idem, ibidem, p. 44-66.

9. De certo modo, podemos relacionar essa "racionalidade" interna ao que Karl Mannheim denomina racionalidade funcional. Usa ele o termo racionalidade (ou inacionalidade) em dois sentidos, aos quais chama de "substancial" e "funcional". Na definição da racionalidade funcionai, destaca o aspecto fundamental do conceito, no sentido em que o estamos usando aqui, ou seja, a relação entre meios e fins. Assim é que entende por tal termo "uma série de medidas organizadas de forma a levar a um objetivo previamente definido, recebendo todos os elementos dessa série de atos uma posição e um papel funcionais. Tal organização funcional de uma série de atos estará, por outro lado, em suas melhores condições quando, para atingir o objetivo, coordena os meios mais eficientemente"(Conforme MANNHEIM, Karl. O homem e a sociedade, estudos sobre a estrutura social moderna. Trad. Waltensir Dutra, Rio de Janeiro: Zahar, 1962. p. 63.

10. Conforme FERNANDES, Florestan. Mudanças sociais no Brasil. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1960, p. 58.

11. Idem, ibidem, p. 59.

12. Idem, ibidern, p. 60.

13. "Enquanto na manufatura, a lei férrea da proporcionalidade prescreve determinadas massas de operários a determinadas funções, na distribuição dos produtores de mercadorias e de seus meios de produção entre os diversos ramos sociais de trabalho reinam, em misturas caóticas, o acaso e a arbritariedade. Claro está que as diversas esferas de produção procuram manter-se constantemente em equilíbrio (. . .) Esta tendência constante, porém (...) só se manifesta como reação contra o desequilíbrio constante. A norma, que no regime de divisão do trabalho dentro da fábrica se segue a priori, como um plano preestabelecido, na divisão do trabalho dentro da sociedade governa a posteriori, corno uma lei interna, muda, perceptível tão somente nas mudanças barométricas dos preços do mercado e como algo que se impõe ao capricho e à arbritariedade dos produtores de mercadorias (. . .) Na sociedade do regime capitalista de produção, a anarquia da divisão social do trabalho e o despotismo da divisão do trabalho na manufatura condicionam-se reciprocamente". (Conforme MARX, Karl. Op. cit. v. 1, p. 289-90). Alicerçando-se neste trecho afirma Luiz Pereira, com propriedade: "se de um lado a racionalidade no interior da unidade de trabalho é imposta pela irracionalidade do sistema global de produção de bens e serviços, por outro essa racionalidade 'interna' (. . .) em função do lucro condiciona e determina a irracionalidade 'externa' do sistema de unidades de trabalho" (Conforme PEREIRA, Luiz. Trabalho e desenvolvimento no Brasil. São Paulo: Difusão Européia do livro, 1965, p. 35-6).

14. Chama ele de "racionalidade formal de uma gestão econômica ao grau de cálculo que lhe é tecnicamente possível e que aplica realmente", denominado "racionalidade material ao grau em que o abastecimento de bens dentro de um grupo de homens (. . .) tenha lugar por meio de uma ação social de caráter econômico orientada por determinados postulados de valor" ( ... ) Salienta que enquanto o primeiro conceito é inequivoco, o segundo é completamente equívoco: "Significa só este conjunto de coisas: que a consideração não se satisfaz com o fato inequívoco (relativamente) e puramente formal de que se proceda e calcule de modo racional em relação a fins com os meios factíveis tecnicamente mais adequados, mas que se coloquem exigências éticas, políticas, utilitárias, hedonistas, estamentais, igualitárias ou de qualquer outra classe e que desse modo se meçam as conseqüências da gestão econômica ainda que seja plenamente racional do ponto de vista formal, isto é, calculável com respeito a valores ou a fins materiais". (Conforme WEBER, Max. Economía y sociedad. Trad. de José Medina Echavarría. México: Fondo de Cultura Económica, 1944, v. 1, p. 83. )

15. Idem, ibidem, p. 108.

16. Idem, ibidem, p. 110.

17. Considere-se que, aqui, para argumentar, estamos nos colocando na posição do empreendedor capitalista e dentro dos quadros do sistema capitalista de produção.

18. Conforme WEBER, Max. Op. cit. v. 1, p. 22-3.

19. Idem, ibidem, p. 24.

  • 1. Năo nos estenderemos na distinçăo entre tecnocrata e técnico. Para nossos fins limitados, apenas diremos que entendemos como tecnocratas aqueles que possuem conhecimentos técnicos adquiridos e desenvolvidos através da educaçăo científica e que os utilizam como forma de influenciar a realidade social em maior ou menor escala; denominados técnicos, por outro lado, os que possuem os ditos conhecimentos sem ter uma influęncia definida no curso dos acontecimentos (Conforme MEYNAUD, Jean. La tecnocracia, mito o realidade? Madrid: Tecnos, 1968, cap. 1, sección 1).
  • Da mesma forma, Carlos Estevam Martins entende como tecnocrata "o tecnológo que foi capaz de afirmar o seu próprio poder, o poder inerente ŕ sua capacitaçăo técnico-científica", enquanto o tecnológo que năo se auto-afirmou ou é "um simples assessor técnico" ou "um tecnoburocrete", que năo possui poder especifico, comandado unicamente "por meio de instrumentos de poder puramente burocráticos" (Conforme Tecnocracia e burocracia, Estudos CEBRAP 2, p. 146, out, 1972).
  • 2. Conforme MARX, Karl. El capital, critica de la economia politica. Traduçăo Wescelao Roces. 2Ş ediçăo, México: Fondo de Cultura Económica, v. 3, 1959, p. 256.
  • 4. Conforme MERTON, Robert K. Social theory and social structure. New York: The Free Press, 1965, cap. 4: Social structure and anomie, e 5: Continuities in the theory of social structure and anomie.
  • 5. GODELlER, Maurice. Racionalidade e irracionalidade na economia. Trad. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, p. 24.
  • 10. Conforme FERNANDES, Florestan. Mudanças sociais no Brasil. Săo Paulo: Difusăo Européia do Livro, 1960, p. 58.
  • 14. Chama ele de "racionalidade formal de uma gestăo econômica ao grau de cálculo que lhe é tecnicamente possível e que aplica realmente", denominado "racionalidade material ao grau em que o abastecimento de bens dentro de um grupo de homens (. . .) tenha lugar por meio de uma açăo social de caráter econômico orientada por determinados postulados de valor" ( ... ) Salienta que enquanto o primeiro conceito é inequivoco, o segundo é completamente equívoco: "Significa só este conjunto de coisas: que a consideraçăo năo se satisfaz com o fato inequívoco (relativamente) e puramente formal de que se proceda e calcule de modo racional em relaçăo a fins com os meios factíveis tecnicamente mais adequados, mas que se coloquem exigęncias éticas, políticas, utilitárias, hedonistas, estamentais, igualitárias ou de qualquer outra classe e que desse modo se meçam as conseqüęncias da gestăo econômica ainda que seja plenamente racional do ponto de vista formal, isto é, calculável com respeito a valores ou a fins materiais". (Conforme WEBER, Max. Economía y sociedad. Trad. de José Medina Echavarría. México: Fondo de Cultura Económica, 1944, v. 1, p. 83.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Jun 2013
  • Data do Fascículo
    Jun 1993
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