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Carcinoma adenoescamoso primário do estômago

Primary adenosquamous carcinoma of the stomach: a case report

Resumos

O carcinoma adenoescamoso primário do estômago é um tumor raro, cuja incidência não excede 1% dos tumores gástricos. Esse tumor mostra dois tipos celulares distintos: um escamoso e outro adenocarcinomatoso. MATERIAL E MÉTODO: Os autores reportam um caso de carcinoma adenoescamoso primário do estômago em um paciente branco de 55 anos, cuja patologia e imuno-histoquímica mostram a presença dos dois tipos celulares: adenocarcinomatoso e escamoso. CONCLUSÃO: É discutido um caso de um tumor raro e interessante do estômago, com relação à sua patogênese, diagnóstico e aspectos clínico-patológicos.

Carcinoma adenoescamoso; Estômago


BACKGROUND: Primary adenosquamous carcinoma of the stomach is a rare tumour, the incidence of which does not exceed 1% of gastric tumours. This tumour shows two different cell components: one squamous and the other adenomatous. MATERIAL AND METHODS: The authors report a case of a primary adenosquamous carcinoma of the stomach in a 55-year-old Caucasian (white) man, whose pathology and immunohistochemistry show the presence of both types of cells: adenomatous and squamous. CONCLUSION: The authors show an interesting and rare case of adenosquamous tumour, discuss its pathogenesis, diagnosis, clinics and pathologic features.

Adenosquamous carcinoma; Stomach


Relato de Caso

Carcinoma adenoescamoso primário do estômago

E.D.F. Manna, A.A. Seixas, R.P. Machado de Araújo, M.C. Ferro

Departamento de Morfologia e Patologia da Faculdade de Ciências Médicas e Biológicas de Sorocaba da Pontifícia

RESUMO — O carcinoma adenoescamoso primário do estômago é um tumor raro, cuja incidência não excede 1% dos tumores gástricos. Esse tumor mostra dois tipos celulares distintos: um escamoso e outro adenocarcinomatoso.

MATERIAL E MÉTODO: Os autores reportam um caso de carcinoma adenoescamoso primário do estômago em um paciente branco de 55 anos, cuja patologia e imuno-histoquímica mostram a presença dos dois tipos celulares: adenocarcinomatoso e escamoso.

CONCLUSÃO: É discutido um caso de um tumor raro e interessante do estômago, com relação à sua patogênese, diagnóstico e aspectos clínico-patológicos.

UNITERMOS: Carcinoma adenoescamoso. Estômago.

INTRODUÇÃO

O carcinoma adenoescamoso do estômago é um tumor relativamente raro e bastante interessante por ser uma neoplasia com um tipo celular diferente daquele encontrado normalmente no estômago. Neste tipo de neoplasia estão presentes dois componentes celulares: um adenocarcinomatoso e outro escamoso ou epidermóide.

Os carcinomas do trato gastrintestinal com diferenciação escamosa compreendem: carcinoma de células escamosas (ou epidermóide), adenoacantoma e carcinoma adenoescamoso. O carcinoma de células escamosas é constituído somente pelo componente epidermóide. O adenoacantoma é um adenocarcinoma com áreas de metaplasia escamosa benigna, enquanto o carcinoma adenoescamoso é um tumor misto glandular e epidermóide, em que ambos os componentes são clones neoplásicos.

A incidência varia entre 0,04% e 0,7% de todos os tumores gástricos1 , podendo atingir até 0,9%2. A relação entre homens e mulheres acometidos é de 4:1 e sua maior freqüência ocorre na sexta década de vida1.

Foram encontrados 12 casos de carcinoma adenoescamoso do estômago em um levantamento realizado no Brasil, entre 1976 e 1980, pela Campanha Nacional de Combate ao Câncer, Ministério da Saúde, em 19823.

Não foi encontrado relato de caso de carcinoma adenoescamoso do estômago publicado em revista indexada da literatura nacional.

APRESENTAÇÃO DE UM CASO

Paciente do sexo masculino, 55 anos, branco, brasileiro, apresentando, há um ano, queimação epigástrica, regurgitação, azia e digestão retardada. Há seis meses, mostrou cansaço físico, dor nas pernas e dispnéia. Nesse período, perdeu aproximadamente dez quilos. Não apresentou melena ou hematêmese. Pai falecido de carcinoma gástrico. Ao exame físico, apresentava-se descorado, sem linfadenopatias, visceromegalias ou massas abdominais palpáveis.

Os exames laboratoriais mostravam: hemoglobina, 8,6g%; hematócrito, 30%; VHS, 40mm na primeira hora e 76mm na segunda hora.

O exame endoscópico apresentou lesão ulcerada volumosa de fundo necrótico ao nível da grande curvatura, cuja biópsia forneceu o diagnóstico de adenocarcinoma pouco diferenciado (ulcerado) do estômago.

A peça cirúrgica obtida mostrou carcinoma adenoescamoso com a parte adenocarcinomatosa moderadamente diferenciada (figs.1 a 4). Notam-se áreas glandulares muito nítidas (figs. 2 e 4) contrastando com áreas epidermóides (figs. 1 e 3). A neoplasia atingia todas as túnicas do estômago, incluindo a serosa. Acompanharam 35 linfonodos, sendo 14 do grande epíploon, nove da pequena curvatura, sete da artéria hepática e cinco pericoledocianos. Apenas um linfonodo do grande epíploon estava comprometido.


O material foi submetido à técnica de imunoperoxidase, sendo citoceratina (A1 e A3) positiva.

O paciente foi encaminhado para tratamento quimioterápico com 5-fluorouracil, adriamicina e mitomicina, tendo realizado controles endoscópicos com biópsias, cujos resultados mostraram ausência de neoplasia. O seguimento de dois anos mostrou remissão dos sinais e sintomas da doença nesse período. Seis meses após a cirurgia, o paciente desenvolveu quadro de herpes zooster em hemitórax direito, com evolução favorável.

Posteriormente, o paciente desenvolveu diabetes melito tipo II e hipertensão arterial sistêmica, após ganho considerável de peso.

DISCUSSÃO E CONCLUSÃO

Na literatura, alguns critérios foram propostos para se considerar um carcinoma gástrico como adenoescamoso: localização da neoplasia fora do cárdia, ausência de extensão do tumor para o esôfago e a inexistência de carcinoma de células escamosas em qualquer outro órgão4,5.

Para o diagnóstico anatomopatológico é necessário identificar pontes intercelulares e massas de células queratinizadas com a formação de pérolas córneas nas áreas escamosas6.

Os tumores adenoescamosos podem ser polipóides, ulcerados circunscritos ou ulcerados infiltrativos, enquanto a forma de linite plástica e a de giant folds (pregas gástricas gigantes) são mais raras1.

Em relação à origem da área escamosa maligna, várias teorias foram formuladas. Wood defende a origem a partir das células basais indiferenciadas pluripotenciais7. Boswell propõe a existência de epitélio escamoso preexistente heterotópico ou metaplásico8. A teoria mais aceita nos artigos recentes defende a diferenciação escamosa a partir de um adenocarcinoma preexistente1,2,8,9. A diferenciação escamosa é mais comum nos carcinomas avançados, sendo rara nos precoces2 , favorecendo esta última teoria.

Ultra-estruturalmente, o tumor mostra ambos os componentes, adenomatoso e escamoso, numa célula individual10.

O comportamento clínicopatológico do tumor é governado basicamente pelo componente adenocarcinomatoso9. Este divide-se em três grupos com características distintas: o indiferenciado, o moderadamente diferenciado e o bem diferenciado11. O indiferenciado aparece em idade mais precoce e distribui-se igualmente nos dois sexos, enquanto o bem diferenciado aparece em idade mais avançada e predomina no sexo masculino. O bem diferenciado apresenta com maior freqüência metástases hepáticas via sistema porta e acometimento linfonodal; o indiferenciado desenvolve mais freqüentemente carcinomatose peritoneal9. O moderadamente diferenciado apresenta caracteres intermediários entre os dois grupos anteriores.

O prognóstico do carcinoma adenoescamoso parece pior do que o do adenocarcinoma, devido à maior profundidade de invasão e a maior freqüência de permeação linfática e vascular das células carcinomatosas, quando diagnosticado6.

SUMMARY

Primary adenosquamous carcinoma of the stomach: a case report

BACKGROUND: Primary adenosquamous carcinoma of the stomach is a rare tumour, the incidence of which does not exceed 1% of gastric tumours. This tumour shows two different cell components: one squamous and the other adenomatous.

MATERIAL AND METHODS: The authors report a case of a primary adenosquamous carcinoma of the stomach in a 55-year-old Caucasian (white) man, whose pathology and immunohistochemistry show the presence of both types of cells: adenomatous and squamous.

CONCLUSION: The authors show an interesting and rare case of adenosquamous tumour, discuss its pathogenesis, diagnosis, clinics and pathologic features. [Rev Ass Med Brasil 1998; 44(2): 152-4.]

KEY WORDS: Adenosquamous carcinoma. Stomach.

  • 1. Kawabe K, Nakanuma Y, Terada T, Nakamura Y. Adenosquamous carcinoma of the stomach presenting "giant gastric folds". Gastroenterol Jpn 1990; 25(6): 739-45.
  • 2. Mori M, Fukuda T, Enjoji M. Adenosquamous carcinoma of the stomach: histogenetic and ultrastructural studies. Gastroenterol 1987; 92(4): 1.078-82.
  • 3. Brumini R. Cancer no Brasil: dados histopatológicos 1976-80. Rio de Janeiro, Campanha Nacional de Combate ao Câncer, Ministério da Saúde, 1982; 277.
  • 4. Parks RE. Squamous neoplasms of the stomach. Am J Roentgenol 1967;101: 447-9.
  • 5. Mori M, Iwashita A, Enjoji M. Adenosquamous carcinoma of the stomach: a clinicopathologic analysis of 28 cases. Cancer 1986; 57: 333-9.
  • 6. Rodriguez MC, Saint-Palais SM, Rueda Pérez JM et al Carcinoma adenoescamoso del estómago. Rev Esp Enf Digest 1994; 86(4): 757-60.
  • 7. Wood DA. Adenoacanthoma of the pyloric end of the stomach. Arch Pathol 1943; 36: 177-89.
  • 8. Boswell JT, Helwig AB. Squamous cell carcinoma and adenoacanthoma of the stomach: a clinicopathologic study. Cancer 1965; 18(2): 181-92.
  • 9. Mingazzini PL, Barsotti P, Malchiodi Albedi F. Adenosquamous carcinoma of the stomach: histological, histochemical and ultrastructural observations. Histopatol 1986; 7: 433-43.
  • 10. Straus R, Heschel S, Fortmann DJ. Primary adenosquamous carcinoma of the stomach: a case report and review. Cancer 1969; 24: 985-95.
  • 11. Bacchi CE, Cardoso de Almeida PC, Franco M. Carcinomas do estômago. In Bacchi R, Cardoso de Almeida PC, Franco M: Manual de padronizaçăo de laudos histopatológicos Săo Paulo, Sociedade Brasileira de Patologia, 1995; 87-97.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Jul 2000
  • Data do Fascículo
    Jun 1998
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