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Comunicamo-nos adequadamente com os nossos pacientes?

À BEIRA DO LEITO

BIOÉTICA

Comunicamo-nos adequadamente com os nossos pacientes?

José Eduardo de Siqueira

O último número da Revista Bioética do Conselho Federal de Medicina apresenta-nos um Simpósio sobre humanização no atendimento à saúde, tratando de questões muito atuais. Destacamos o texto da Profa. Maria Júlia Paes da Silva, que trata da importância da comunicação interpessoal no atendimento médico. Apresenta o homem como ser possuidor de códigos biopsicossociais e argumenta que os pacientes permanecem atentos à maneira como o profissional se faz presente na comunicação verbal e não-verbal. Salienta que não existe neutralidade nas trocas de mensagens efetuadas entre pessoas. A comunicação entre seres perceptivos tem dois componentes: o conteúdo, ou seja, o fato, a informação que se quer transmitir, e o sentimento que sempre está presente quando há interação entre duas pessoas.

Infelizmente, o modelo de ensino vigente no curso de Medicina, estruturado no início do séc. XX por Abraham Flexner, privilegia o biológico em detrimento do ser humano biográfico. Em decorrência dessa percepção marcadamente cartesiana, oferece-se aos estudantes cada vez mais conhecimentos técnicos oriundos das inúmeras disciplinas acadêmicas e as informações são apresentadas sem qualquer preocupação de síntese integradora que respeite a dimensão antropológica do paciente. Como resultado, ao término do curso, formam-se especialistas em doenças, despreparados, entretanto, para cuidar de pessoas enfermas.

Qualquer médico sabe, por experiência própria, que uma doença raramente é orgânica ou psíquica, social ou familiar. Sabe o profissional que a enfermidade é concomitantemente orgânica, psíquica, social e familiar. Quando uma pessoa procura atendimento médico, invariavelmente está buscando por cuidados que não se limitam a livrar-se de um mal-estar circunstancial. A relação médico-paciente nunca deixará de ser interação intersubjetiva experimentada por duas pessoas. Não basta, portanto, apenas habilidades técnicas, pois fundamental é acolher o enfermo em sua dimensão biopsicossocial.

Em síntese, a vinculação entre profissional de saúde e paciente, que o ato médico impõe, é resultado de dois movimentos que se completam. O paciente que procura o profissional e o médico que acolhe o enfermo. Ambos são qualitativamente distintos, mas Hipócrates encontrou uma única palavra para descrever este ato ''philia'', que pode ser traduzido como amizade, amor, solidariedade, compromisso, compaixão.

Quando se acolhe um amigo não é apenas sua presença física que recebemos, mas sim, seus sentimentos, fragilidades e fortalezas. Muito maior atenção deve merecer o paciente já que invariavelmente apresenta-se fragilizado pela enfermidade.

Referência

1. Silva MJP. O papel da comunicação na humanização da atenção à saúde. Bioética 2002; 10(2):73-88.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Maio 2004
  • Data do Fascículo
    2004
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