Acessibilidade / Reportar erro

Fatores associados à pneumonia nosocomial em indivíduos hospitalizados

Resumos

OBJETIVO: Identificar os fatores associados à pneumonia nosocomial em hospital público de Feira de Santana, Bahia. MÉTODOS: Este estudo caso-controle foi realizado em 211 indivíduos adultos (46 casos e 165 controles), com idade média de 41 anos, atendidos na Clínica Médica, Clínica Cirúrgica ou na Unidade de Terapia Intensiva Adulta do Hospital Geral Clériston Andrade, em Feira de Santana. Os casos foram constituídos por indivíduos que desenvolveram infecção do trato respiratório (pneumonia nosocomial) após admissão hospitalar. Os controles foram formados por não portadores de pneumonia nosocomial. Informações socioeconómicas, história médica, estilo de vida e hábitos de higiene bucal foram obtidos por meio de entrevistas. Os prontuários foram checados para registro da condição de saúde do indivíduo e diagnóstico de pneumonia. Exame clínico bucal foi realizado por cirurgião-dentista treinado. Na análise bivariada, foi estimado o odds ratio (OR) como medida de associação e seus respectivos intervalos de confiança de 95% (IC 95%) com uso do método de Mantel-Haenzel. RESULTADOS: A frequência de pneumonia nosocomial na amostra foi de 21,8%. A ocorrência de hipertensão e o tempo de internamento foram maiores nos casos do que nos controles (p < 0,05). A falta de uso de fio dental e de enxaguatório bucal foram maiores no grupo controle (p = 0,01). CONCLUSÃO: Os achados apontam a hipertensão, tempo de internamento > 5 dias e ausência do fio dental e enxaguatório bucal como fatores possivelmente associados à pneumonia nosocomial, apontando-os como alvos efetivos de prevenção

Pneumonia; epidemiologia; razão de chances; fatores de risco


OBJECTIVE: To identify factors associated with nosocomial pneumonia in individuals admitted to apublic hospital in Feira de Santana, Bahia. METHODS: This case control study was carried out in 211 adult individuals (46 cases and 165 controls), of a mean age of 41 years, treated at clinical wards, surgical wards or the adult intensive care unit of Cleriston Andrade General Hospital in Feira de Santana. The cases comprised individuals who developed respiratory tract infections (nosocomial pneumonia) after hospital admission. The controls consisted of patients without nosocomial pneumonia. Information on socioeconomic status, medical history, lifestyle and oral hygiene habits was obtained through interviews. The medical records were checked to verify subjects' health status and the diagnosis opneumonia. A clinical oral examination was performed by a trained dental surgeon. Odds ratio (OR) was estimated in the bivariate analysis as an association measurement, along with the respective 95% confidence interval through the Mantel-Haenszel method. RESULTS: The frequency of nosocomial pneumonia in the sample was 21.8%. The occurrence of hypertension was higher and hospital stay duration was longer in the cases than in controls (p ≤ 0.05). Lack of dental floss and mouthwash use were higher in the controls (p = 0.01). CONCLUSION: The findings indicate that arterial hypertension, length of hospital stay of five days and lack of dental floss and mouthwash use are factors likely associated with nosocomial pneumonia, suggesting that these factors should be targeted for effective prevention.

Pneumonia; epidemiology; odds ratio; risk factors


ARTIGO ORIGINAL

Fatores associados à pneumonia nosocomial em indivíduos hospitalizados

Thaís Feítosa Leitão de OliveiraI; Isaac Suzart Gomes FilhoII; Johelle de Santana PassosIII; Símone Seixas da CruzIV; Michelle Teixeira OliveiraI; Soraya Castro TrindadeV; Adelmir de Souza MachadoVI; Julita Maria Freitas CoelhoVII; Carla Maria Lima SantosVIII; Eneida de Moraes Marcílio CerqueiraIX

IMestres em Processos Interativos dos Órgãos e Sistemas; Pesquisadoras do NUPPIIM - Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Feira de Santana, BA

IIDoutor em Periodontia; Professor Titular, UEFS, Feira de Santana, BA

IIIMestre em Saúde Coletiva; Professora Visitante, UEFS, Feira de Santana, BA

IVDoutora em Epidemiologia; Professora Adjunta, Universidade Federal do Vale do São Francisco, Petrolina, PE

VDoutora em Imunologia; Professora Adjunta, UEFS, Feira de Santana, BA

VIDoutor em Medicina; Professor Adjunto, Instituto de Ciências da Saúde, Universidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador, BA

VIIDoutora em Epidemiologia; Professora Adjunta, UEFS, Feira de Santana, BA

VIIIMestre em Saúde Coletiva; Professora Substituta, UEFS, Feira de Santana, BA

IXPós-doutora em Genética; Docente do Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva, UEFS, Feira de Santana, BA

Correspondência para Correspondência para: Isaac Suzart Gomes Filho Núcleo de Pesquisa, Prática Integrada e Investigação Multidisciplinar - NUPPIIM/UEFS Km 03, BR 116 Campus Universitário, 6º módulo CEP: 44031-460 Feira de Santana, BA, Brasil isuzart@gmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Identificar os fatores associados à pneumonia nosocomial em hospital público de Feira de Santana, Bahia.

MÉTODOS: Este estudo caso-controle foi realizado em 211 indivíduos adultos (46 casos e 165 controles), com idade média de 41 anos, atendidos na Clínica Médica, Clínica Cirúrgica ou na Unidade de Terapia Intensiva Adulta do Hospital Geral Clériston Andrade, em Feira de Santana. Os casos foram constituídos por indivíduos que desenvolveram infecção do trato respiratório (pneumonia nosocomial) após admissão hospitalar. Os controles foram formados por não portadores de pneumonia nosocomial. Informações socioeconómicas, história médica, estilo de vida e hábitos de higiene bucal foram obtidos por meio de entrevistas. Os prontuários foram checados para registro da condição de saúde do indivíduo e diagnóstico de pneumonia. Exame clínico bucal foi realizado por cirurgião-dentista treinado. Na análise bivariada, foi estimado o odds ratio (OR) como medida de associação e seus respectivos intervalos de confiança de 95% (IC 95%) com uso do método de Mantel-Haenzel.

RESULTADOS: A frequência de pneumonia nosocomial na amostra foi de 21,8%. A ocorrência de hipertensão e o tempo de internamento foram maiores nos casos do que nos controles (p < 0,05). A falta de uso de fio dental e de enxaguatório bucal foram maiores no grupo controle (p = 0,01).

CONCLUSÃO: Os achados apontam a hipertensão, tempo de internamento > 5 dias e ausência do fio dental e enxaguatório bucal como fatores possivelmente associados à pneumonia nosocomial, apontando-os como alvos efetivos de prevenção

Unitermos: Pneumonia; epidemiologia; razão de chances; fatores de risco.

INTRODUÇÃO

As pneumonias nosocomiais (PN) são desenvolvidas em ambiente hospitalar e não estão presentes, ou incubadas, no paciente no momento do seu internamento. Por ser uma das principais causas de morbimortalidade em indivíduos internados, e ainda impor altos custos à população, na medida em que aumenta a demanda terapêutica e tempo de permanência hospitalar, tem sido reconhecida como importante problema de saúde pública no mundo. No Brasil, as infecções respiratórias hospitalares são responsáveis por 13% a 18% de todas as infecções adquiridas nesse ambiente1. No entanto, são escassos os dados que sistematizam a real prevalência da PN nos hospitais brasileiros2.

Alguns fatores parecem estar associados à PN configurando grupos vulneráveis: pacientes submetidos à intubação orotraqueal e/ou ventilação mecânica; pacientes com rebaixamento do nível de consciência; indivíduos vítimas de aspiração de grande volume de secreção; condição oral deficiente; portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica; idosos; uso prévio de antimicrobianos; presença de sonda gástrica; trauma grave e broncoscopia recente3,4.

É possível que essa infecção respiratória aconteça pela microaspiração de secreções colonizadas da orofaringe, aspiração de conteúdo esofagogástrico, inalação de aerossol infectado ou, menos frequentemente, por disseminação hematogênica de um sítio de infecção distante, penetração exógena, inoculação direta na via aérea em pacientes intubados por pessoal de unidade de terapia intensiva (UTI) e aspiração maciça do conteúdo gástrico. Recentemente, também a translocação de bactérias do trato gastrointestinal é considerada um mecanismo de infecção pulmonar5,6.

A partir dos anos 1970, após identificação de bactérias do biofilme dental na cavidade orofaríngea, surgiu uma forte indicação de que a PN pode estar associada à composição bacteriana do biofilme dental, podendo essa colonização ser favorecida ou agravada com a higienização bucal negligenciada durante o período de internamento dos pacientes7,8.

Frente à relevância dessa temática e ao impacto da infecção do trato respiratório no quadro de morbimortalidade no Brasil, o objetivo do estudo foi identificar os principais fatores associados à pneumonia nosocomial em indivíduos internados em um hospital público, em Feira de Santana - BA.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo caso-controle realizado em indivíduos internados no Hospital Geral Clériston Andrade (HGCA), em Feira Santana, durante o período de maio a setembro de 2010. O grupo caso foi constituído pelos pacientes com diagnóstico de pneumonia nosocomial (PN) e o grupo controle, pelos pacientes sem PN. Somente casos incidentes de PN foram avaliados no período estabelecido para a coleta de dados.

O tamanho mínimo da amostra foi determinado para um projeto maior intitulado "Associação entre doença periodontal e pneumonia nosocomial", que deu origem a este trabalho. A estimativa inicial do cálculo amostrai empregou um poder de estudo de 90%, com intervalo de confiança de 95%, baseado na revista de literatura que empregou uma faixa com variações de 1,5 a 4,0 mais chances de um indivíduo desenvolver a infecção do trato respiratório nosocomial em presença da doença periodontal. Neste estudo, foram selecionados 46 casos e 165 controles9,10.

Integraram os grupos caso e controle apenas os pacientes que estavam sendo atendidos na Unidade de Terapia Intensiva, Clínica Médica ou Clínica Cirúrgica da mesma instituição hospitalar (Hospital Geral Clériston Andrade), na tentativa de aumentar a similaridade entre os grupos. Esses indivíduos foram selecionados seguindo os critérios médicos de semiologia e diagnóstico da infecção respiratória. O corpo médico especializado do próprio hospital foi responsável pelo diagnóstico contido nos prontuários de internamento de cada participante do estudo.

Os critérios de elegibilidade dos casos foram indivíduos com idade mínima de 18 anos e com infecção do trato respiratório adquirida após admissão hospitalar, independente da situação referida como causa de internamento, à exceção de envolvimento pulmonar, diagnosticado pelo corpo médico do HGCA.

A seleção dos controles foi feita gradativamente, de acordo com a inclusão dos casos, sendo que os indivíduos deveriam estar internados no mesmo hospital e no mesmo período de identificação do caso; ser provenientes de uma das três unidades clínicas mencionadas anteriormente; e não apresentar manifestações clínicas e radiográficas de infecção respiratória nosocomial, garantindo a premissa de não casos.

Os critérios de exclusão para ambos os grupos foram indivíduos com idade menor de 18 anos, admitidos no hospital com diagnóstico de pneumonia comunitária, ou atendidos em outras dependências do HGCA que não fossem a UTI, Clínica Médica e Clínica Cirúrgica.

Em virtude de alguns trabalhos sinalizarem a precária condição bucal como possível fator de risco para a PN, foi realizado exame odontológico para mensuração de sinais de inflamação gengival e nível de cuidado bucal, no próprio leito hospitalar, por um cirurgião-dentista treinado, cego para condição de presença de PN do indivíduo avaliado. Assim, foram excluídos indivíduos que apresentavam sinais e sintomas clínicos como delirius tremens, febre e quadro intenso de queilite angular, ou ainda uso de equipamentos como sonda nasogástrica, que impossibilitavam a realização do exame bucal.

O diagnóstico de PN foi estabelecido pelos médicos assistentes do HGCA, considerando a presença de infiltrado recente identificado na radiografia de tórax combinado a pelo menos um dos seguintes critérios: febre; leucocitose ou leucopenia; tosse ou expectoração purulenta; e crescimento bacteriano em cultura de secreção traqueal, ou ponta do cateter, presentes após no mínimo 48 horas de hospitalização1. Ressalta-se ainda que, neste processo de seleção amostral, não houve pareamento para qualquer fa-tor de confusão.

Para investigação dos possíveis fatores de risco (idade avançada, condição bucal deficiente, tempo de internamento, presença de sonda gástrica, ventilação mecânica, etilismo, presença de doenças crônicas e traumas graves), foram empregados, como instrumentos de coleta, questionários, prontuários médicos e exames clínicos bucais.

Os dados foram obtidos por meio de entrevista destinada a indivíduos internados ou aos responsáveis, quando os pacientes não apresentavam condições de responder. Para tanto, foi realizada aplicação de um questionário semiestruturado explorando os seguintes eixos temáticos: características sociodemográficas; estilo de vida; condição geral de saúde e odontológica. Os questionários foram aplicados por pesquisadores previamente treinados na condução das questões, de modo a minimizar os vieses de informação que poderiam comprometer a validade interna do estudo.

No momento da chegada ao hospital, um pesquisador, com formação em enfermagem, fazia a identificação dos casos e controles, orientando o entrevistador para aplicação do questionário. No momento da entrevista, o aplicador, previamente treinado para este fim, foi cegado para a condição diagnóstica do indivíduo quanto à PN, somente com acesso aos prontuários médicos após término do preenchimento inicial do questionário. Com propósito ainda de minimizar vieses na investigação, participantes cujos responsáveis não fossem capazes de responder às perguntas, por não conhecerem a rotina de cuidados, não foram incluídos na amostra. Após aplicação do questionário, um cirurgião-dentista acompanhado por auxiliar realizava em seguida o exame clínico dentário.

As variáveis analisadas neste estudo foram: idade (18-41 anos e > 41 anos); sexo, raça/cor autorreferida (pardo/preta ou branca); nível de escolaridade (< 4 anos ou > 4 anos de estudo); renda familiar (até 1 salário-mínimo ou > 1 salário-mínimo); classe econômica (A/B/C ou D/E) segundo critério da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisas (ABEP); situação conjugal (com companheiro ou sem companheiro); prática de atividade física (sim ou não); hábito de fumar (não fumante ou ex-fumante/fumante); etilismo (sim ou não); diabetes (sim ou não); hipertensão arterial (sim ou não); alergias (sim ou não); doença cardíaca (sim ou não); asma (sim ou não); doenças ósseas (sim ou não); uso de droga (sim ou não); tempo de internamento (> 5 dias ou < 5 dias); motivo de internamento (causas externas/trauma ou doenças infecciosas/crônico-degenerativas/neoplasias); tipo de ventilação (invasiva ou não invasiva); uso de fio dental (sim ou não); uso de enxaguatório bucal (sim ou não); consulta periódica ao dentista (sim ou não); orientação profissional sobre higiene bucal (sim ou não); número de dentes presentes (> 20 ou 6-20 dentes); e sangramento gengival (< 25% ou > 25%). A categorização das variáveis contínuas, quando requerida, foi feita com base na distribuição das mesmas ou conforme pontos de corte identificados na literatura.

Para a comparação das frequências de pneumonia nosocomial segundo as variáveis em estudo, foi utilizado o teste qui-quadrado (x2) de Pearson e o de Fisher, com alfa definido de 5%. Em seguida, realizou-se análise bivariada entre os fatores socioeconômicos e biológicos e a penumonia nosocomial, estimando-se o odds ratio (OR) como medida de associação e seus respectivos intervalos de confiança de 95% (IC 95%) com uso do método de Mantel-Haenzel. Para o processamento e análise dos dados foi utilizado o software STATA, versão 9.0.

Todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual de Feira de Santana, Bahia, Brasil (protocolo nº 079/2007).

RESULTADOS

A amostra foi constituída por 211 indivíduos adultos com média de idade de 41 ± 17,01 anos, sendo 85,8% do sexo masculino. Apenas dois indivíduos, do grupo controle, recusaram participar do estudo, e um indívíduo foi excluído da amostra pelo fato de seu responsável alegar não ter conhecimento da rotina de cuidados do paciente. A frequência de pneumonia nosocomial na amostra foi de 21,8%, constituindo 46 casos e 165 controles. Quanto aos dados sociodemográficos dispostos na Tabela 1, algumas diferenças foram observadas entre os casos e controles, mas não foram estatisticamente significantes (p > 0,05).

No que diz respeito às comorbidades apresentadas na Tabela 2, apenas hipertensão se mostrou estatisticamente associada à pneumonia nosocomial, sendo duas vezes mais frequente no grupo dos casos do que nos controles (OR: 2,22; IC 95%: 1,05-4,72; p = 0,02). O tempo de internamento > 5 dias (intervalo entre data de entrada no hospital e data da coleta) foi aproximadamente dez vezes maior nos casos de pneumonia do que nos controles, sendo essa diferença estatisticamente significante (IC 95%: 2,73-41,01; p < 0,001).

Em relação às características referentes a hábitos de higiene bucal e condições de saúde bucal dos indivíduos internados, na Tabela 3 é possível observar que o não uso de fio dental (OR: 0,43; IC 95%: 0,21-0,90) e o não uso de enxaguatório (OR: 0,38; IC 95%: 0,17-0,85) estavam estatisticamente associados aos casos de pneumonia. Embora o número de dentes não tenha mostrado diferença estatisticamente significante entre os grupos, observouse que a frequência de indivíduos com menor quantidade de dentes (de seis a 20 dentes) foi maior. O mesmo pode ser dito em relação ao sangramento gengival, quando a chance de ocorrência foi quase duas vezes maior nos indivíduos com pneumonia (OR = 1,94; IC 95% 0,65-5,59) do que no grupo controle.

DISCUSSÃO

No presente estudo, observou-se alta frequência de pneumonia nosocomial entre os indivíduos (aproximadamente 22%), reforçando o reconhecimento dessa infecção como importante problema de saúde pública no Brasil e a principal causa iatrogênica do indivíduo hospitalizado submetido a intervenções curativas.

Ressalta-se ainda que, embora essa infecção hospitalar represente um desequilíbrio entre flora microbiana normal e mecanismos de defesa, comumente observado em pacientes gravemente doentes, ele pode ser decorrente de determinadas condições de saúde responsáveis pela internação, ou procedimentos invasivos ou imunosupressores aplicados aos pacientes11.

No que se refere às comorbidades apresentadas pelos indivíduos, a hipertensão esteve associada aos casos de pneumonia nosocomial, provavelmente por ser uma doença associada ao outras enfermidades crônicas que podem ter debilitado o indivíduo, favorecendo essa infecção respiratória.

Quanto aos possíveis fatores de risco estudados destaca- se o tempo de internamento > 5 dias, o que vem a sugerir que quanto maior o tempo de internamento, maior a probabilidade de o paciente desenvolver infecções respiratórias adquiridas no ambiente hospitalar. Esse fato corrobora com os trabalhos de Lisboa et al.2 e Amaral et al.12. Estudos têm demonstrado que o tempo de internamento prolongado apresenta uma relação próxima com o fluxo salivar. Sabe-se que a secreção salivar tem significativo papel na manutenção da saúde bucal, e quando suprimida ou diminuída, causa sensação de boca seca, dificuldade de deglutição do bolo alimentar e aumento do risco de desenvolvimento de infecções oportunistas. Amerongem et al.13 citam que a presença de determinadas imunoglobulinas e enzimas antimicrobianas na saliva, como a lactoferrina, lisozima e lactoperoxidase, é de fundamental importância para a defesa do organismo e manutenção da saúde. A sedação do paciente em centros de terapia intensiva e a extensão do tempo de internamento interferem na baixa de secreção salivar e promovem mudanças na flora oral microbiana em questão de poucas semanas, favorecendo a prevalência de bactérias gram-negativas e, consequentemente, possibilitando quadros de infecções pulmonares por aspiração desses patógenos14,15.

No estudo de Oliveira et al.16, dos 151 pacientes que tiveram tempo de internação superior a quatro dias, 114 (77%) desenvolveram infecção hospitalar (RR: 10,2; IC 95%: 8,5–12,3). No mesmo estudo, a frequência dos pacientes com infecção hospitalar que utilizaram ventilação mecânica foi de 49,6%, condição também observada em maior frequência nos indivíduos ventilados no presente estudo. Estes dados reforçam o papel da ventilação mecânica como provável fator de risco significante na etiologia dessa doença, pois estes equipamentos de ventilação são frequentemente contaminados pelas próprias bactérias dos pacientes, servindo de principal rota de entrada no trato respiratório inferior.

Ainda no que se refere aos cuidados de higiene bucal, houve uma associação estatisticamente significante entre não uso de fio dental e de enxaguatório bucal. No entanto, atenta-se para o fato de que houve maior relato de frequência de uso do fio dental e enxaguatório bucal por parte dos casos do que os controles. É provável que essa maior frequência de uso tenha sido reportada por aqueles que apresentam ou apresentaram história de problemas periodontais e que tentam incorporar em sua rotina o uso desses métodos de controle da doença bucal.

No estudo de fatores da condição bucal associados à infecção respiratória, ressalta-se que a presença de dentes existentes e o grau de comprometimento periodontal constituem componentes relevantes nessa temática. Sabe-se que a flora bucal de indivíduos dentados é bastante diferente dos indivíduos edêntulos. Se por um lado, na ausência de dentes há menor prevalência de bactérias aeróbicas, concentrando-se os lactobacilos e fungos17, ressalta-se que uso de próteses mal-higienizadas, especialmente por idosos dependentes, que não conseguem manter suas próteses suficientemente limpas, acaba funcionando como reservatório de patógenos respiratórios, que, quando deglutidos ou aspirados, podem provocar infecções inesperadas18,19. No presente estudo, a frequência de indivíduos com menos de 20 dentes (quantidade mínima de dentes funcionais estimada pela Organização Mundial da Saúde para alcance da meta para o ano 201020) foi maior nos casos de pneumonia nosocomial, bem como a magnitude da associação entre sangramento gengival e pneumonia foi quase duas vezes maior, embora não tenham se revelado estatisticamente significantes.

Apesar de alguns cuidados tomados com a metodologia do estudo, no intuito de garantir a confiabilidade da variável independente (pneumonia nosocomial) e evitar ao máximo os possíveis falsos-positivos, como a padronização do critério de diagnóstico da doença e o treinamento dos examinadores e entrevistadores, algumas limitações são impostas pela presente investigação, com destaque para a natureza retrospectiva do desenho analítico, possíveis vieses de memória, vez que algumas perguntas requeriam informações autoreferidas e o reduzido poder estatístico resultante da amostra insuficiente para detectar associações entre fatores de risco e pneumonia nosocomial. Além disso, ressalta-se o não controle adequado de fatores confundidores como a idade, uma vez que quanto maior faixa etária, maior a probabilidade de infecções hospitalares. Outro ponto limitante refere-se ao critério de seleção dos controles, que envolveu pacientes hospitalizados que apresentam frequentemente comorbidades múltiplas, e os resultados podem ser diferentes da população em geral, impossibilitando generalização dos achados (viés de Berkson).

Dessa forma, sugerem-se estudos adicionais com amostras adequadas para identificação dos possíveis fatores associados à pneumonia nosocomial e assim o controle e redução dessa infecção, bem como estudos confirmatórios que melhor investiguem as associações encontradas aqui, a exemplo da hipertensão arterial e cuidados de higiene bucal.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, pode-se apreender que embora a bactéria seja um fator necessário para a doença respiratória, ela sozinha não é suficiente para causar a infecção. Outros fatores estão envolvidos e devem ser considerados, como aqueles que afetam o controle neurológico da deglutição e respiração e, assim, favorecem a aspiração de bactéria bucal ou conteúdo orofaríngeo, a existência de comorbidades relacionadas e os cuidados de higienização bucal.

Dessa forma, é preciso enfatizar a conscientização pro-fissional, para buscar a excelência no atendimento com competência profissional, e abordagem holística do individuo hospitalizado, visando minimizar a ocorrência de pneumonias nosocomiais.

AGRADECIMENTOS

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB) e à Universidade Estadual de Feira de Santana, pelo aporte financeiro a esta pesquisa.

Artigo recebido: 18/02/2011

Aceito para publicação: 06/09/2011

Suporte Financeiro: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB)

Conflito de interesse: Não há.

Trabalho realizado na Universidade Estadual de Feira de Santana, Feira de Santana, BA

©2011 Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.

  • 1. Medeiros EAS. Treatment of nosocomial pneumonia: a prospective and multicenter study used cefepime. Rev Assoc Med Bras. 1999,45:2-8.
  • 2. Lisboa T, Faria M, Hoher JÁ, Borges LAA, Gómez J, Schifelbain L et al. Prevalência de infecção nosocomial em unidades de terapia intensiva do Rio Grande do Sul. Rev Bras Terap Intensiva. 2007;19:414-420.
  • 3. Cardoso AP, Menezes AMB, Lemos ACM, Farias AMC, Torres B, Franco CAB et al. Consenso brasileiro de pneumonias em indivíduos adultos imunocompetentes. J Pneumol. 2001;27(Supl 1):S1-S32.
  • 4. Marik PE. Aspiration syndromes: aspiration pneumonia and pneumonitis. Hosp Pract (Minneap). 2010;38:35-42.
  • 5. Chawla R. Epidemiology, etiology, and diagnosis of hospital-acquired pneumonia and ventilator-associated pneumonia in Asian countries. Am J Infect Control. 2008;36:93-100.
  • 6. Paju S, Scannapieco FA. Oral biofilms, periodontitis, and pulmonary infections. Oral Dis. 2007;13:508-12.
  • 7. Koeman M, van der Ven AJ, Hak E, Joore HC, Kaasjager K, de Smet AG et al. Oral decontamination with chlorhexidine reduces the incidence of nosocomial pneumonia. Am J Respir Crit Care Med. 2006 15;173:1348-55.
  • 8. Pace CC, McCullough GH. The association between oral microorgansims and aspiration pneumonia in the institutionalized elderly: review and recommendations. Dysphagia. 2010;25:307-22.
  • 9. Dupont WD, Plummer WD. Power and sample size calculations: a review and computer program. Control Clin Trials. 1990;11:116-28.
  • 10. Dupont WD. Power calculations for matched case-control studies. Biometrics. 1988;44:1157-68.
  • 11. Fernandes AT, Ribeiro-Filho N, Barroso EA. Conceito - cadeia epidemiológica das infecções hospitalares e avaliação custobenefício das medidas de controle. In: Fernandes AT, editores. Infecção hospitalar e suas interfaces na área da saúde. São Paulo: Atheneu; 2000. p. 215-65.
  • 12. Amaral SM, Cortês AQ, Pires FR. Nosocomial pneumonia: importance of the oral environment. J Bras Pneumol 2009;35:1116-1124.
  • 13. Amerongen AVN, Veerman ECI. Saliva: the defender of the oral cavity. Oral Dis. 2002;8:12-22.
  • 14. Fourrier F, Duvivier B, Boutigny H, Roussel-Delvallez M, Chopin C. Colonization of dental plaque: a source of nosocomial infections in intensive care unit patients. Crit Care Med. 1998;26:301-8.
  • 15. Russell SL, Boylan RJ, Kaslick R, Scannapieco FA, Katz RV. Respiratory pathogen colonization of the dental plaque of institutionalized elders. Spec Care Dentist. 1999,19:128-34.
  • 16. Oliveira AC, Kovner CT, Silva RS. Infecção hospitalar em unidade de tratamento intensivo de um hospital universitário brasileiro Rev Latinoam Enferm. 2010;18:97-104.
  • 17. Terpenning M. Geriatric oral health and pneumonia risk. Clin Infect Dis. 2005;40:1807-10.
  • 18. Sumi Y, Miura H, Michiwaki Y, Nagaosa S, Nagaya M. Colonization of denture plaque by respiratory pathogens in dependent elderly. Arch Gerontol Geriatr. 2007;44:119-24.
  • 19. Theilade E, Budtz-Jorgensen K, Theiladc J. Predominant cultivable microtiora of plaque on removable dentures in patients with healthy oral mucosa. Arch Oral Biol. 1983;28:675-4.
  • 20. Hobdell MH, Myburgh NG, Kelman M, Hausen H. Setting global goals for oral health for the year 2010. Int Dent J. 2000;50:245-9.
  • Correspondência para:

    Isaac Suzart Gomes Filho
    Núcleo de Pesquisa, Prática Integrada e Investigação Multidisciplinar - NUPPIIM/UEFS
    Km 03, BR 116 Campus Universitário, 6º módulo
    CEP: 44031-460 Feira de Santana, BA, Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Jan 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2011

    Histórico

    • Recebido
      18 Fev 2011
    • Aceito
      06 Set 2011
    Associação Médica Brasileira R. São Carlos do Pinhal, 324, 01333-903 São Paulo SP - Brazil, Tel: +55 11 3178-6800, Fax: +55 11 3178-6816 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: ramb@amb.org.br