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Prevenção dos defeitos de fechamento do tubo neural

Panorama Internacional

Obstetrícia

PREVENÇÃO DOS DEFEITOS DE FECHAMENTO DO TUBO NEURAL

Os defeitos de fechamento do tubo neural (DFTN) figuram entre as mais freqüentes malformações congênitas do sistema nervoso central, apresentando incidências que variam dependendo de fatores geográficos, raciais, genéticos e sazonais. Suas formas clínicas mais comuns, as anencefalias, as espinhas bífidas ocultas (EBO) e as espinhas bífidas abertas (EBA), têm como principais diferenças seus prognósticos pós-natais. Enquanto as primeiras não representam ameaça à qualidade de vida após o nascimento, por serem letais (anencefalias) ou não causarem deficiências neurológicas importantes (EBO), as EBA, compatíveis com a vida extra-uterina, geralmente são responsáveis por danos neurológicos graves e irreversíveis. Dos pacientes acometidos pela EBA, mais de 65% alcançam desenvolvimento intelectual normal, no entanto, cerca de 80% deles apresentam incapacitantes déficits motores em membros inferiores1. Além disso, as disfunções esfincterianas estão presentes em quase todos os casos. Tais condições acabam por demandar, por conseguinte, uma série de onerosos cuidados especiais. Nos Estados Unidos, estima-se um gasto anual em torno de 200 milhões de dólares para os pacientes com EBA2.

Há aproximadamente três décadas, muitos trabalhos vêm demonstrando a importância da suplementação vitamínica periconcepcional com ácido fólico, tanto na prevenção da incidência quanto da recorrência desses defeitos.

Em estudo multicêntrico, duplo cego e randomizado, envolvendo 1817 mulheres que tiveram filhos anteriores com DFTN, demonstrou-se redução de 70% no risco de recorrência da doença naquelas que fizeram uso de 4 mg de ácido fólico ao dia, por pelo menos um mês antes da concepção e durante o primeiro trimestre da gravidez, quando comparadas às pacientes que ingeriram placebo no mesmo período3. Czeizel; Dudás4, também em estudo duplo cego e randomizado, envolvendo 4753 mulheres sem história prévia de DFTN, observaram que não houve DFTN nos filhos das pacientes que utilizaram 0,8 mg/dia de ácido fólico no período periconcepcional, ao passo que no grupo controle, seis casos foram diagnosticados.

Inúmeros outros trabalhos reforçam esses dados, embora não haja consenso em relação às doses mencionadas. A maioria dos autores sugere, no entanto, que para a prevenção da primeira ocorrência, doses não inferiores a 0,4 mg/dia de ácido fólico devam ser administradas, preferencialmente, a todas as mulheres em fase reprodutiva. Para a redução do risco de recorrência, recomendam-se doses acima de 4 mg/dia, com início pelo menos um mês antes da concepção e manutenção durante o primeiro trimestre da gravidez.

Comentário

Uma vez instalada a EBA, não há medida conhecida que possa melhorar o prognóstico do indivíduo afetado. Em alguns países, a interrupção da gestação é a principal conduta adotada após o diagnóstico pré-natal desta condição. No Brasil, como a interrupção não é permitida nesses casos, resta a esses pacientes aprenderem a conviver com suas deficiências e com as medidas paliativas disponíveis.

Tendo-se em vista a gravidade das seqüelas neurológicas nos portadores das EBA, sua alta taxa de recorrência e a ausência de tratamentos curativos, seria prudente que se estimulasse a divulgação de uma política voltada à prevenção, factível e provavelmente mais barata do que as medidas paliativas para os doentes. Atualmente, em todas as áreas da medicina, a prevenção tem sido muito valorizada. Parece, no entanto, que a adesão por parte dos obstetras na orientação quanto à prevenção das malformações fetais tem sido esquecida.

CLEISSON FÁBIO A. PERALTA

Referências

1. Ames MD, Schut L. Results of treatment of 171 consecutive myelomeningoceles ¾ 1963 to 1968. Pediatrics 1972, 50: 466-70.

2. Pérez-Escamilla R. Periconceptional folic acid and neural tube defects: Public health issues. Bull of PAHO 1995; 29; 250-61.

3. MRC Vitamin Study Research Group. Prevention of neural tube defects: results of the Medical Research Council vitamin study. Lancet 1991; 338: 131-7.

4. Czeizel AE, Dudás I. Prevention of the first ocurrence of neural-tube defects by periconceptional vitamin supplementation. N Engl J Med 1992; 327: 1832-5.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Jan 2002
  • Data do Fascículo
    Dez 2001
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