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Determinantes das transferências fiscais para as unidades municipais: efeitos da representação desproporcional dos distritos eleitorais brasileiros

Determinantes de las transferencias fiscales para las unidades municipales: efectos de la representación desproporcionada de los distritos electorales brasileños

Resumo

A representação desproporcional dos distritos eleitorais tem efetiva influência sobre a distribuição de recursos públicos em benefício das regiões sobrerrepresentadas, o que evidencia que os gastos públicos são dirigidos por fatores políticos e institucionais. Diante disso, o objetivo deste artigo é analisar os efeitos de fatores institucionais, notadamente da representação desproporcional no Poder Legislativo, nas transferências em direção aos municípios brasileiros. Empregou-se a técnica estatística de regressão econométrica com dados em painel, tendo como unidade de análise os municípios brasileiros no período de estudo de 2004 a 2014. Os resultados apontam expressivo efeito da desproporcionalidade representativa no Congresso Nacional nas despesas discricionárias federais e estaduais, o que demonstra que a estrutura da representação orienta as motivações políticas e as ações dos gestores públicos brasileiros.

Palavras-chave:
representação desproporcional; transferências discricionárias; municípios brasileiros

Resumen

La representación desproporcionada de distritos electorales tiene una influencia efectiva en la distribución de recursos públicos en beneficio de las regiones sobrerrepresentadas, lo que pone de manifiesto que los gastos públicos están dirigidos por factores políticos e institucionales. El objetivo de este artículo es analizar los efectos de factores institucionales, notablemente de la representación desproporcionada en el Legislativo, sobre las transferencias hacia los municipios brasileños. Se empleó la técnica estadística de regresión econométrica con datos en panel. La unidad de análisis son los municipios brasileños y el período es de 2004 a 2014. Los resultados apuntan que el efecto de la desproporcionalidad representativa en el Congreso Nacional sobre los gastos discrecionales federales y estatales es expresivo, lo que demuestra que la estructura de la representación orienta las motivaciones políticas y las acciones gestoras públicas brasileñas.

Palabras clave:
representación desproporcionada; transferencias discrecionales; municipios brasileños

Abstract

The disproportionate representation of electoral districts has an effective influence on the distribution of public resources to the overrepresented regions, which shows that public spending is driven by political and institutional factors. Therefore, the objective of this article is to analyze the products of institutional factors, notably disproportionate non-legislative representation on the transfers to Brazilian municipalities. We used statistical econometric regression with panel data. Brazilian municipalities were analyzed considering the period from 2004 to 2014. The results indicate that the effect of malapportionment in the National Congress on discretionary federal and state expenditures is significant, which demonstrates that the representation structure guides political motivation and the actions of Brazilian public management.

Keywords:
malapportionment; discretionary transfers; Brazilian municipalities

1. INTRODUÇÃO

A literatura acerca das relações intergovernamentais no federalismo brasileiro vem evidenciando uma conexão entre fatores políticos e as transferências, principalmente se tratando das que são discricionárias. Estudos de excelência abordam o tema, porém, tipicamente enfocando as transferências aos estados e às regiões. Nossa investigação lança luz sobre os condicionantes das transferências fiscais dos governos central e estaduais em direção aos seus municípios. Diante disso, o objetivo geral deste artigo é analisar os efeitos de fatores institucionais, notadamente da representação desproporcional no Poder Legislativo, nas transferências em direção aos municípios brasileiros.

As transferências intergovernamentais representam importante fonte de receita para os entes federativos, principalmente aqueles com baixa capacidade arrecadatória, diferentemente dos grandes distritos, cujas taxas locais sustentam a maior parte de seus orçamentos. Esperava-se que a distribuição de recursos aos distritos eleitorais fosse dirigida, tendo em vista a equidade entre as diversas regiões do país operando em favor das regiões mais pobres. Todavia, nota-se uma conexão entre fatores políticos e a alocação dos recursos públicos, o que caracteriza uma natureza política das transferências.

Estudos têm procurado identificar essa conexão. Nesse contexto, destacam-se as pesquisas de Amorim e Simonassi (2013Amorim, O Neto ; & Simonassi, A. G. (2013). Bases políticas das transferências intergovernamentais no Brasil (1985-2004). Revista de Economia Política, 33(4), 704-725.), Arretche e Rodden (2004Arretche, M.; & Rodden, J. (2004). Política distributiva na federação: estratégias eleitorais, barganhas legislativas e coalizões de governo. Dados, 47(47), 549-576.), Gibson, Calvo e Falleti (2004Gibson, E. L., Calvo, E. F., & Falleti, T. G. (2004). Reallocative federalism: territorial overrepresentation and public spending in the Western Hemisphere. In E. L. Gibson (Ed.), Federalism and democracy in Latin America (pp. 173-193). Baltimore, MD: The Johns Hopkins University Press.), Soares e Neiva (2011Soares, M. M., & Neiva, P. (2011). Federalism and public resources in Brazil: federal discretionary transfers to states. Brazilian Political Science Review, 5(2), 94-116.) e Turgeon e Cavalcante (2014Turgeon, M., & Cavalcante, P. (2014). Desproporcionalidade da representação dos estados no Congresso Nacional e seus efeitos na alocação dos recursos federais (Texto para Discussão n. 1980). Brasília, DF: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. ). Dentre as variáveis que afetam as decisões de direcionamento das transferências intergovernamentais, há consenso entre os autores citados de que existe considerável efeito da sobrerrepresentação de distritos eleitorais sobre a distribuição de fundos públicos, isto é, os estados sobrerrepresentados no Poder Legislativo são os mais beneficiados, recebem uma proporção maior tanto das transferências constitucionais como das discricionárias - embora estas últimas não sejam, necessariamente, distributivas.

Diante desse contexto, mostra-se importante analisar o que influencia o padrão das transferências de recursos entre as esferas de governo, tanto no âmbito institucional e político, principalmente sob o viés da representação desproporcional no Poder Legislativo, como no âmbito econômico sob o aspecto de variáveis que indicariam caráter redistributivo das transferências.

Dado que é amplamente aceito na literatura que a distribuição de recursos discricionários é dirigida pelo viés de barganha política, a hipótese considerada é a de que esses recursos são importante instrumento dos governantes para a consecução de objetivos políticos.

Com a finalidade de testar a hipótese estabelecida e atingir o objetivo proposto nesta pesquisa, utilizamos a técnica da estatística de regressão econométrica com dados em painel. O período do estudo é de 2004 a 2014 e a amostra é composta por todos os municípios brasileiros que apresentaram dados para as variáveis de análise.

Além desta introdução, o artigo se divide em quatro partes. Primeiro, sintetizamos as concepções teóricas acerca da distribuição de recursos e a representação desproporcional de distritos eleitorais, bem como sobre os elementos institucionais e políticos que influenciam o padrão das transferências do governo central para os governos locais. Por conseguinte, expomos a metodologia empregada para a análise empírica seguida dos resultados e análises. Por fim, tecemos as principais conclusões.

2. SISTEMA DE TRANSFERÊNCIAS INTERGOVERNAMENTAIS

Com o processo de descentralização e o federalismo fiscal favorecido pela Constituição de 1988 (CF/1988), os entes federativos passaram a ter maior autonomia e responsabilidade fiscal, bem como maior responsabilidade na oferta de bens e serviços públicos. Segundo Arretche (2005Arretche, M. (2005). Quem taxa e quem gasta: a barganha federativa na Federação brasileira. Sociologia e Política, 2005(24), 69-85.), as bases de autoridade dos governos locais foram alteradas profundamente a partir da descentralização fiscal, houve expansão da autoridade local sobre os recursos fiscais, bem como maior autoridade tributária sobre impostos de significativa importância.

O Brasil é um país dotado de diferenças entre as jurisdições, apresentando forte desigualdade territorial. Diante desse cenário, existe no país uma série de recursos federais que visam a manter o equilíbrio federativo (Souza, 2003Souza, C. (2003). Federalismo e conflitos distributivos: disputa dos estados por recursos orçamentários federais. Dados, 46(2), 345-384.). Dentre os referidos recursos, destacam-se as transferências intergovernamentais que são uma forma de buscar maior eficiência do setor público no âmbito da implementação de políticas e serviços, e representam um mecanismo de equilíbrio das finanças públicas. Elas são pertinentes nos regimes federativos onde a gestão fiscal tem como um dos objetivos tributar e efetuar o dispêndio com equidade e eficiência, adequando a distribuição de recursos.

Por meio das transferências intergovernamentais, o governo federal presumidamente assume o papel de promover a redução das desigualdades inter-regionais, bem como da desigualdade de acesso da população a serviços públicos. No Brasil, em especial, onde há significativa desigualdade territorial1 1 Souza (2003) demonstra indicadores de desigualdade nos municípios brasileiros, destacando que as desigualdades não são apenas notadas entre as cinco regiões do país, mas também em uma mesma região ou dentro de um mesmo estado. Essas diferenças podem ser notadas de acordo com a distribuição da população dos municípios; no Nordeste ocorrem as maiores diferenças, onde o número de pequenos municípios (com população entre 10 mil e 20 mil habitantes) é bastante alto se comparado às demais regiões. , a capacidade dos municípios proverem serviços públicos seria bastante desigual sem as transferências (Arretche, 2010Arretche, M. (2010). Federalismo e igualdade territorial: uma contradição em termos? Dados, 53(3), 587-620.).

As transferências intergovernamentais podem ser classificadas em duas grandes categorias: obrigatórias e discricionárias - ou seja, decorrentes de determinação constitucional ou legal, ou que resultam de negociações entre os governos centrais e os governos subnacionais, havendo entrega de recursos a outro ente da federação a título de cooperação, auxílio ou assistência financeira.

Gasparini e Miranda (2006Gasparini, C. E., & Miranda, R. (2006). B. Evolução dos aspectos legais e dos montantes de transferências realizadas pelo fundo de participação dos municípios (Texto para Discussão n. 1243). Brasília, DF: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.) apontam algumas razões para a criação dessas transferências, dentre elas a adequação entre a capacidade arrecadatória e a necessidade dos gastos públicos diante de distribuições entre as esferas de governo, a minimização das diferenças regionais ao longo do território nacional e o melhor gerenciamento dos recursos públicos em cada uma das três esferas de governo: União, estados e municípios.

Soares e Neiva (2011Soares, M. M., & Neiva, P. (2011). Federalism and public resources in Brazil: federal discretionary transfers to states. Brazilian Political Science Review, 5(2), 94-116.) observam que as transferências discricionárias federais são importantes fontes de receita no orçamento dos estados brasileiros, correspondem a aproximadamente 3% do total das taxas e 9% do total das transferências constitucionais. No entanto, há diferenças na importância dessas transferências no orçamento de cada estado de acordo com suas disparidades econômicas regionais; por exemplo, em Sergipe, as transferências discricionárias representam quase 70% dos impostos coletados, e em São Paulo representam por volta de 0,2%. Isso decorre do intuito das transferências corrigirem as disparidades regionais, procurando melhorar e aumentar a oferta de bens públicos e garantir o equilíbrio orçamentário das unidades federativas menos favorecidas e com menor capacidade arrecadatória.

Todavia, o caráter redistributivo das transferências federais é controvertido, ou melhor, é mais pertinente às transferências obrigatórias e é controvertido quanto se trata das discricionárias, como demonstrado pelos autores a seguir.

O caráter redistributivo das transferências não discricionárias é sustentado pelas investigações de Soares e Neiva (2011Soares, M. M., & Neiva, P. (2011). Federalism and public resources in Brazil: federal discretionary transfers to states. Brazilian Political Science Review, 5(2), 94-116.), que observam que os três estados juntos - São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro - cujo total das taxas de sua competência ultrapassa 50% do total coletado pelos outros estados são, também, aqueles que recebem menos de 30% das transferências constitucionais. Os estados do Nordeste, que recolhem aproximadamente 14% das taxas, recebem mais de 30% do total desse tipo de transferência. Arretche e Rodden (2004Arretche, M.; & Rodden, J. (2004). Política distributiva na federação: estratégias eleitorais, barganhas legislativas e coalizões de governo. Dados, 47(47), 549-576.) também chegaram a conclusão semelhante ao tratarem das transferências constitucionais e Gibson et al. (2004Gibson, E. L., Calvo, E. F., & Falleti, T. G. (2004). Reallocative federalism: territorial overrepresentation and public spending in the Western Hemisphere. In E. L. Gibson (Ed.), Federalism and democracy in Latin America (pp. 173-193). Baltimore, MD: The Johns Hopkins University Press.), por sua vez, encontraram moderada relação positiva entre as variáveis gastos não discricionários e pobreza, e negativa entre tais gastos e a renda per capita.

Em referência às transferências discricionárias, embora Soares e Neiva (2011Soares, M. M., & Neiva, P. (2011). Federalism and public resources in Brazil: federal discretionary transfers to states. Brazilian Political Science Review, 5(2), 94-116.) mostrem que as regiões de menor desenvolvimento econômico recebem uma porcentagem maior desses recursos (Norte, Nordeste e Centro-Oeste, respectivamente), Gibson et al. (2004Gibson, E. L., Calvo, E. F., & Falleti, T. G. (2004). Reallocative federalism: territorial overrepresentation and public spending in the Western Hemisphere. In E. L. Gibson (Ed.), Federalism and democracy in Latin America (pp. 173-193). Baltimore, MD: The Johns Hopkins University Press.) não encontraram relação significativa entre as variáveis gastos discricionários e pobreza nem entre tais gastos e a renda per capita. Para Arretche e Rodden (2004Arretche, M.; & Rodden, J. (2004). Política distributiva na federação: estratégias eleitorais, barganhas legislativas e coalizões de governo. Dados, 47(47), 549-576.), a distribuição das transferências não constitucionais não beneficia os estados mais pobres e, portanto, “não se pauta por critérios de necessidade”. Nesse sentido, Amorim e Simonassi (2013Amorim, O Neto ; & Simonassi, A. G. (2013). Bases políticas das transferências intergovernamentais no Brasil (1985-2004). Revista de Economia Política, 33(4), 704-725.), assim como Turgeon e Cavalcante (2014Turgeon, M., & Cavalcante, P. (2014). Desproporcionalidade da representação dos estados no Congresso Nacional e seus efeitos na alocação dos recursos federais (Texto para Discussão n. 1980). Brasília, DF: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. ), verificam tendência à manutenção das desigualdades inter-regionais e que os recursos transferidos aos estados parecem ser dirigidos mais por fatores políticos do que por características socioeconômicas das unidades subnacionais ou critérios de redução das desigualdades inter-regionais.

Os impactos econômicos e políticos das duas grandes categorias de transferências (obrigatórias e discricionárias) são diferentes, pois, ao passo que a função de redistribuição de recursos é operada com as transferências obrigatórias, as transferências discricionárias assumem papel suplementar e de ajustamento emergencial e, para estas, o fator político parece ser mais relevante. “A orientação para reduzir disparidades ou equalizar a distribuição de receitas é um atributo adicional que as transferências redistributivas podem assumir ou não” (Prado, 2001Prado, S. (2001). Transferências fiscais e financiamento municipal no Brasil. Projeto Descentralização Fiscal e Cooperação Financeira Intergovernamental (Relatório de Pesquisa). Rio de Janeiro, RJ: Fundação Konrad Adenauer., p. 4).

A seguir, a ênfase da discussão recai sobre as transferências discricionárias, sobre as quais é possível observar os efeitos da representação desproporcional de distritos eleitorais.

3. TRANSFERÊNCIAS E A REPRESENTAÇÃO DESPROPORCIONAL DE DISTRITOS ELEITORAIS

A representação desproporcional dos distritos tem decisiva influência sobre a distribuição de recursos aos distritos eleitorais, uma vez que trabalhos empíricos têm comprovado que há maior volume de transferências enviadas às unidades subnacionais sobrerrepresentadas e que são menos populosas e desenvolvidas economicamente.

Por representação desproporcional de distritos eleitorais se entende a discrepância entre a proporção de cadeiras legislativas e a proporção da população dos distritos eleitorais. Geralmente, tanto no Brasil como em outros países, no Poder Legislativo nacional, as unidades menos populosas são sobrerrepresentadas por ocuparem, proporcionalmente, mais cadeiras do que as unidades mais populosas (Kauchakje, 2017Kauchakje, S. (2017). Representação distrital e coalizões legislativas: o impacto da sobrerrepresentação nas votações no Congresso brasileiro (Tese de Doutorado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP.; Samuels & Snyder, 2001Samuels, D. J., & Snyder, R. (2001). The value of a vote: malapportionment in comparative perspective. British Journal of Political Science, 31(4), 651-671.).

No Congresso Nacional brasileiro, os distritos coincidem territorialmente com os estados, e nas duas casas do Poder Legislativo federal - Câmara dos Deputados e Senado - a representação de distritos eleitorais é desproporcional, isto é, em cada um dos 27 estados do país a correspondência entre população e cadeiras não é proporcional.

Na Câmara, há uma regra que estabelece um mínimo de 8 e um máximo de 70 deputados federais por distrito eleitoral; no Senado, a regra permite que cada distrito eleja 3 senadores. O número de deputados das Assembleias Legislativas, representantes do Poder Legislativo estadual, corresponde ao triplo da representação do estado na Câmara dos Deputados e, ao atingir o número de 36, será acrescido de tantos quantos forem os deputados federais acima de 12.

Segundo Samuels e Snyder (2001Samuels, D. J., & Snyder, R. (2001). The value of a vote: malapportionment in comparative perspective. British Journal of Political Science, 31(4), 651-671.), o princípio democrático de “uma pessoa, um voto” é normalmente violado, principalmente em federações com estrutura bicameral. Por exemplo, um distrito que recebe 20% dos votos nem sempre conquista 20% das cadeiras no Poder Legislativo, exprimindo que os votos podem não se traduzir em representação política (Turgeon & Cavalcante, 2014Turgeon, M., & Cavalcante, P. (2014). Desproporcionalidade da representação dos estados no Congresso Nacional e seus efeitos na alocação dos recursos federais (Texto para Discussão n. 1980). Brasília, DF: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. ).

Como consequência, as unidades subnacionais têm representação desproporcional, isto é, algumas são sub-representadas e outras sobrerrepresentadas. Nos estados mais populosos, a proporção de cadeiras versus a população é bem menor do que nos estados menos populosos, ou seja, os grandes estados são sub-representados e os estados menores são sobrerrepresentados, configurando o que a literatura denomina malapportionment em língua inglesa.

Ao distribuírem a representação legislativa nos distritos eleitorais, é comum que as regras eleitorais estabeleçam algum grau de desproporcionalidade da representação em relação ao tamanho da população, até quando desconsiderem a alteração demográfica ao longo dos anos; deste modo, alguns distritos recebem maior representação do que receberiam se houvesse proporcionalidade populacional. Assim, o valor de um voto em estados sobrerrepresentados é maior do que em estados sub-representados, pois para aqueles é necessário um número menor de eleitores para eleger um representante (Turgeon & Cavalcante, 2014Turgeon, M., & Cavalcante, P. (2014). Desproporcionalidade da representação dos estados no Congresso Nacional e seus efeitos na alocação dos recursos federais (Texto para Discussão n. 1980). Brasília, DF: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. ). Samuels e Snyder (2001Samuels, D. J., & Snyder, R. (2001). The value of a vote: malapportionment in comparative perspective. British Journal of Political Science, 31(4), 651-671.), ao pesquisarem a representação distrital em 78 países, revelaram que a maioria dos países é desproporcional, especialmente os latino-americanos2 2 No ranking de representação desproporcional no Senado, entre os 78 países da amostra, Argentina, Brasil e Bolívia aparecem em primeiro, segundo e terceiro lugar, respectivamente. Quando se trata da representação desproporcional na Câmara, o Brasil ocupa o 17º lugar (Samuels & Snyder, 2001, 2004). .

Estudos nacionais e internacionais, como os realizados por Amorim e Simonassi (2013Amorim, O Neto ; & Simonassi, A. G. (2013). Bases políticas das transferências intergovernamentais no Brasil (1985-2004). Revista de Economia Política, 33(4), 704-725.), Ansolabehere, Gerber e Snyder (2002Ansolabehere, S; Gerber, A; & Snyder, J. (2002). Equal votes, equal money: court-ordered redistricting and public expenditures in the American States. American Political Science Review, 96(4), 767-777.), Arretche e Rodden (2004Arretche, M.; & Rodden, J. (2004). Política distributiva na federação: estratégias eleitorais, barganhas legislativas e coalizões de governo. Dados, 47(47), 549-576.), Gibson et al. (2004Gibson, E. L., Calvo, E. F., & Falleti, T. G. (2004). Reallocative federalism: territorial overrepresentation and public spending in the Western Hemisphere. In E. L. Gibson (Ed.), Federalism and democracy in Latin America (pp. 173-193). Baltimore, MD: The Johns Hopkins University Press.), Kauchakje (2017Kauchakje, S. (2017). Representação distrital e coalizões legislativas: o impacto da sobrerrepresentação nas votações no Congresso brasileiro (Tese de Doutorado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP.), Lee (1998Lee, F. E. (1998). Representation and public policy: the consequences of Senate apportionment for the geographic distribution of federal funds. The Journal of Politics, 60(1), 34-62.), Turgeon e Cavalcante (2014Turgeon, M., & Cavalcante, P. (2014). Desproporcionalidade da representação dos estados no Congresso Nacional e seus efeitos na alocação dos recursos federais (Texto para Discussão n. 1980). Brasília, DF: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. ) têm apresentado evidências robustas sobre a ocorrência de desequilíbrios fiscais em favor de unidades sobrerrepresentadas.

Ao examinar a alocação dos recursos pelo governo federal em direção às unidades subnacionais, Ansolabehere et al. (2002Ansolabehere, S; Gerber, A; & Snyder, J. (2002). Equal votes, equal money: court-ordered redistricting and public expenditures in the American States. American Political Science Review, 96(4), 767-777.), Lee (1998Lee, F. E. (1998). Representation and public policy: the consequences of Senate apportionment for the geographic distribution of federal funds. The Journal of Politics, 60(1), 34-62.) e Gibson et al. (2004Gibson, E. L., Calvo, E. F., & Falleti, T. G. (2004). Reallocative federalism: territorial overrepresentation and public spending in the Western Hemisphere. In E. L. Gibson (Ed.), Federalism and democracy in Latin America (pp. 173-193). Baltimore, MD: The Johns Hopkins University Press.), bem como Turgeon e Cavalcante (2014Turgeon, M., & Cavalcante, P. (2014). Desproporcionalidade da representação dos estados no Congresso Nacional e seus efeitos na alocação dos recursos federais (Texto para Discussão n. 1980). Brasília, DF: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. ), mostraram que entes subnacionais sobrerrepresentados tendem a receber maiores montantes de recursos federais per capita em relação aos que são sub-representados, ou seja, o número de assentos legislativos relativos à população determina a alocação dos recursos governamentais.

Amorim e Simonassi (2013Amorim, O Neto ; & Simonassi, A. G. (2013). Bases políticas das transferências intergovernamentais no Brasil (1985-2004). Revista de Economia Política, 33(4), 704-725.) têm como hipótese que as transferências intergovernamentais são um importante mecanismo utilizado pelo Poder Executivo federal para alcançar objetivos políticos. Os autores evidenciam que estes prevalecem sobre os critérios de equidade socioeconômica; os níveis mais elevados de transferências per capita estão associados a composições políticas de coalizões de governo.

Da mesma forma, Kauchakje (2017Kauchakje, S. (2017). Representação distrital e coalizões legislativas: o impacto da sobrerrepresentação nas votações no Congresso brasileiro (Tese de Doutorado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP.) demonstra que o modelo distributivo de barganha legislativa é usado para explicar o favorecimento dos estados sobrerrepresentados na distribuição de recursos públicos tendo como condicionante a participação de parlamentares desses estados em coalizões legislativas.

Arretche e Rodden (2004Arretche, M.; & Rodden, J. (2004). Política distributiva na federação: estratégias eleitorais, barganhas legislativas e coalizões de governo. Dados, 47(47), 549-576.) estudaram a influência das políticas eleitoral e legislativa na distribuição de transferências intergovernamentais dos governos brasileiros. Os autores constataram que os presidentes brasileiros têm grande autoridade sobre as transferências fiscais, junto com incentivos para trocar gastos federais por votos do Legislativo. Assim, a distribuição das transferências intergovernamentais constitui importante ferramenta para a obtenção de apoio parlamentar.

As transferências intergovernamentais denotam um mecanismo de auxílio financeiro em situações de restrição orçamentária nos entes federativos com baixa capacidade de arrecadação, as unidades sobrerrepresentadas, geralmente, arrecadam os menores valores em taxas locais, ao passo que os grandes distritos têm maior capacidade arrecadatória, suas taxas locais sustentam a maior parte dos recursos orçamentários.

Tanto as transferências discricionárias como as obrigatórias são importantes no sentido de suplementar o orçamento e implementar políticas aos governos subnacionais com menor capacidade fiscal e baixo desenvolvimento econômico.

Kauchakje (2017Kauchakje, S. (2017). Representação distrital e coalizões legislativas: o impacto da sobrerrepresentação nas votações no Congresso brasileiro (Tese de Doutorado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP.) observa correspondência entre sobre e sub-representação e níveis de desenvolvimento. Nos estados que são sobrerrepresentados e têm baixos indicadores de desenvolvimento, a coincidência é de 36,8% no Congresso (68,4% no Senado, 31,6% na Câmara); todos os estados desse grupo são das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Como as unidades sobrerrepresentadas são as que denotam menor desenvolvimento econômico, isso justifica maior volume de recursos direcionados a essas localidades, em busca da equidade territorial (Kauchakje, 2017Kauchakje, S. (2017). Representação distrital e coalizões legislativas: o impacto da sobrerrepresentação nas votações no Congresso brasileiro (Tese de Doutorado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP.). Soares e Neiva (2011Soares, M. M., & Neiva, P. (2011). Federalism and public resources in Brazil: federal discretionary transfers to states. Brazilian Political Science Review, 5(2), 94-116.) mostram que, no Brasil, as regiões que recebem maior porcentagem das transferências são as menos desenvolvidas (Norte, Nordeste e Centro-Oeste, respectivamente).

A representação desproporcional de distritos eleitorais tem efetiva influência sobre a distribuição de recursos públicos em benefício das regiões sobrerrepresentadas. Principalmente no que se refere às transferências discricionárias, os estados sobrerrepresentados são os mais beneficiados, evidenciando que os gastos públicos são dirigidos por fatores políticos e institucionais, como a representação desproporcional, e, portanto, não refletem, necessariamente, características das unidades subnacionais.

3.1 PADRÃO DAS TRANSFERÊNCIAS FEDERAIS E ESTADUAIS PARA OS MUNICÍPIOS: ELEMENTOS INSTITUCIONAIS E POLÍTICOS

Espera-se que mecanismos institucionais de equilíbrio das finanças públicas, como é o caso das transferências fiscais, sejam dirigidos em função da equidade entre as diversas regiões do país, operando em favor das regiões mais pobres. Entretanto, observa-se uma conexão entre fatores políticos e a alocação dos recursos públicos - reconhece-se que há uma natureza política das transferências.

De acordo com Amorim e Simonassi (2013Amorim, O Neto ; & Simonassi, A. G. (2013). Bases políticas das transferências intergovernamentais no Brasil (1985-2004). Revista de Economia Política, 33(4), 704-725.), podem ser preferíveis decisões de direcionamento das transferências para localidades mais relevantes politicamente do que as que necessitem bastante desses recursos. Segundo Gibson et al. (2004Gibson, E. L., Calvo, E. F., & Falleti, T. G. (2004). Reallocative federalism: territorial overrepresentation and public spending in the Western Hemisphere. In E. L. Gibson (Ed.), Federalism and democracy in Latin America (pp. 173-193). Baltimore, MD: The Johns Hopkins University Press.), quando a transferência de recursos se dá por interesses políticos em detrimento das necessidades econômicas dos entes subnacionais, ocorre o federalismo realocativo, que sobressai em relação ao federalismo proporcional.

Os fatores políticos que dirigem as transferências fiscais estão relacionados com o processo orçamentário. As regras para apresentação de emendas ao orçamento limitam a capacidade de cada parlamentar influenciar a distribuição de recursos de acordo com suas preferências geográficas e eleitorais (Kauchakje, 2017Kauchakje, S. (2017). Representação distrital e coalizões legislativas: o impacto da sobrerrepresentação nas votações no Congresso brasileiro (Tese de Doutorado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP.). Até os gastos com investimento, que compõem menor parcela do orçamento, são determinados pelo Poder Executivo (Figueiredo & Limongi, 2008Figueiredo, A. C., & Limongi, F. (2008). Política orçamentária no presidencialismo de coalizão. Rio de Janeiro, RJ: Ed. FGV.).

No entanto, o Poder Executivo brasileiro assume papel central no processo orçamentário, podendo vetar o orçamento aprovado e tendo, também, uma margem discricionária em sua execução. Para as transferências discricionárias, essa margem é, na norma, irrestrita, podendo o Executivo decidir sobre o montante e a destinação delas (Limongi & Figueiredo, 2005Limongi, F., & Figueiredo, A. C. (2005). Processo orçamentário e comportamento legislativo: emendas individuais, apoio ao Executivo e programas de governo. Dados, 48(4), 737-776.; Soares & Neiva, 2011Soares, M. M., & Neiva, P. (2011). Federalism and public resources in Brazil: federal discretionary transfers to states. Brazilian Political Science Review, 5(2), 94-116.).

A estratégia do governo central de enviar um montante maior de recursos aos estados sobrerrepresentados pode estar relacionada com a obtenção de apoio parlamentar para formar coalizões políticas. Uma vez que a escolha de alocação dos recursos visando, por exemplo, à melhoria da infraestrutura nos entes subnacionais gera impactos somente no longo prazo, o incentivo para o governo central efetuar tal alocação é enfraquecido (Amorim & Simonassi, 2013Amorim, O Neto ; & Simonassi, A. G. (2013). Bases políticas das transferências intergovernamentais no Brasil (1985-2004). Revista de Economia Política, 33(4), 704-725.).

Há estímulos para que os atores políticos troquem gastos localizados por apoio legislativo, tendo por objetivos a conquista de cargos, a permanência no poder ou a integração de coalizões legislativas majoritárias. Assim, a distribuição das transferências intergovernamentais é uma ferramenta valiosa para o alcance desses objetivos políticos (Arretche & Rodden, 2004Arretche, M.; & Rodden, J. (2004). Política distributiva na federação: estratégias eleitorais, barganhas legislativas e coalizões de governo. Dados, 47(47), 549-576.).

Uma vez que, como dito, a maior parte dos estudos focaliza as transferências para os estados e regiões, pretendemos ampliar neste estudo as contribuições anteriores, tendo como unidade de análise os municípios brasileiros, isto é, investigar-se-ão os efeitos de variáveis institucionais, políticas e econômicas no envio de transferências dos governos central e estadual às unidades municipais.

4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Com a finalidade de testar a hipótese estabelecida e atingir o objetivo desta pesquisa, utilizamos a técnica estatística de regressão econométrica com dados em painel. De modo complementar, realizou-se uma análise espacial de clusters. O período de estudo é de 2004 a 2014, o universo são os munícipios brasileiros e a amostra foi composta de acordo com a disponibilidade de dados no nível municipal. Após a seleção das variáveis foram construídos os modelos, a fim de mensurar o efeito das variáveis independentes ou explicativas na variável a explicar.

4.1 BASE DE DADOS

Os dados foram coletados para o período de 1988 (ano de implementação da atual Constituição Federal) a 2014, porém, para as estimações estatísticas, o período se inicia em 2004, pois a partir desse ano foi possível desagregar as transferências obrigatórias das discricionárias.

Ao trabalhar com várias unidades de observações por um longo período, como é o caso desta pesquisa, algumas vezes faltam dados de variáveis importantes para certos anos. Nesse caso, determinar que a amostra seja de todos os municípios para os quais há dados de todas as variáveis no período de análise faria com que restasse um número muito pequeno de observações, prejudicando a heterogeneidade almejada na pesquisa longitudinal. Assim, pôde-se aumentar o tamanho da amostra trabalhando com testes estatísticos com painel desbalanceado, o que significa que para cada município da amostra se tem um número diferente de dados temporais.

Diante do exposto, as amostras utilizadas para cada ano do período da análise foram as seguintes: 2004 = 4.608 municípios; 2005 = 4.548 municípios; 2006 = 4.990 municípios; 2007 = 4.831 municípios; 2008 = 4.908 municípios; 2009 = 4.881 municípios; 2010 = 4.915 municípios; 2011 = 4.613 municípios; 2012 = 4.567 municípios; 2013 = 4.757 municípios; e 2014 = 4.542 municípios. Assim, foi possível trabalhar com uma média de 4.741 munícipios3 3 A perda de municípios se deve à ausência de dados e não prejudica os resultados, pois a amostra utilizada mantém a diversidade regional que caracteriza o Brasil. . Acrescenta-se que foram retirados da amostra os municípios que se emanciparam no período do estudo.

Ademais, optou-se por expurgar da amostra os grandes municípios (população acima de 300 mil habitantes), uma vez que são considerados discrepantes, podendo causar problemas de estimação dos modelos estatísticos4 4 Na análise exploratória dos dados, os resultados para os grandes municípios se mostraram muito discrepantes dos demais, podendo causar distorções na análise inferencial. Para definir o número de habitantes de corte para municípios grandes, adotou-se o critério baseado na classificação do Tesouro Nacional, que realiza o seguinte agrupamento de população: a) população inferior a 50 mil habitantes; b) população entre 50 mil e 300 mil habitantes; d) população entre 300 mil e 1 milhão de habitantes; e e) população maior do que 1 milhão de habitantes. .

Os dados foram obtidos do Relatório de Finanças do Brasil, da Secretaria do Tesouro Nacional (Finbra), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), da base de dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipeadata) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

4.2 TÉCNICA ESTATÍSTICA

Foram estimados modelos econométricos de regressão com dados em painel desbalanceado. Os modelos adotados foram os de efeitos fixos5 5 Os procedimentos para a adoção dos modelos mais adequados serão descritos detalhadamente no item de definição das variáveis e dos modelos estatísticos. e os cálculos foram realizados por meio do programa computacional Stata 13.

A expressão matemática para o modelo pode ser representada como uma equação linear, na forma:

Y i t = β 0 + δ 0 D 1 t δ 1 X 1 i t + β 2 X 2 i t + β 3 X 3 i t + α i + u i t i = 1 , X ; t = 2004 , , 2014

em que i representa a i-ésima unidade do corte transversal e t o t-ésimo período de tempo. Y é a variável dependente das variáveis independentes (explicativas) Xs; β0 é a constante do modelo; a variável D é uma dummy; β1, β2 e β3 são parâmetros que serão determinados a partir dos dados observados e foi utilizado δ para ressaltar a interpretação dos parâmetros que multiplicam variáveis dummy; a variável αi capta todos os fatores não observados, constantes no tempo, que afetam Yit, que é o termo que designa que o modelo é de efeitos fixos, pois aí é fixo ao longo do tempo; por fim, uit é o erro de variação temporal, porque representa fatores não observados que mudam ao longo do tempo e afetam Yit.

4.3 DEFINIÇÃO DAS VARIÁVEIS E DO MODELO ECONOMÉTRICO

As variáveis a explicar foram estabelecidas a partir da classificação das transferências em obrigatórias e discricionárias7 7 Foram apurados os valores das transferências pelo critério de competência com valores empenhados sem restos a pagar. . De acordo com órgãos oficiais brasileiros, as transferências podem ser obrigatórias8 8 Exemplos de transferências obrigatórias: Fundo de Participação dos Municípios (FPM); Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR); Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI); Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico; Contribuição do Salário-Educação; Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro ou Relativas a Títulos ou Valores Mobiliários Incidentes sobre o Ouro; Transferências da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Naturais; Transferências de Recursos do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE); Transferências Financeira do ICMS — Desoneração — Lei Complementar (LC) n. 87/1996; entre outras. , que são impostas na CF/1988, bem como previstas em lei ou discricionárias, que se dividem em específicas9 9 Exemplos de transferências específicas: relativas ao Sistema Único de Saúde (SUS); Recursos do Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS); entre outras. , por delegação10 10 Exemplos de transferências por delegação: Transferências a consórcios públicos; Transferências de convênios relativas ao SUS; Transferências de convênios da união destinadas a programas de assistência social; entre outras. e voluntárias.

O propósito de desagregar a variável dependente neste estudo foi estabelecer uma clara divisão entre o repasse de transferências, sendo possível analisar o repasse de recursos que têm determinações legais e constitucionais, bem como os repasses em que o Poder Executivo tem poder de discricionariedade.

O foco das análises incide sobre as transferências voluntárias, que são recursos entregues a título de cooperação, auxílio ou assistência financeira que não decorra de determinação constitucional, legal, ou os destinados ao Sistema Único de Saúde (SUS)11 11 Optou-se por não trabalhar com as transferências específicas e delegadas, pois para muitos municípios essa variável não foi relatada no banco de dados do Finbra, o que causaria muitos valores missing na amostra, prejudicando as estimações estatísticas. Além disso, elas representam um valor muito pequeno com relação ao total das transferências discricionárias. . É nas transferências discricionárias que se pode observar o efeito da sobrerrepresentação nas barganhas legislativas de ano a ano. Segundo Arretche e Rodden (2004Arretche, M.; & Rodden, J. (2004). Política distributiva na federação: estratégias eleitorais, barganhas legislativas e coalizões de governo. Dados, 47(47), 549-576.), sobre esse tipo de repasses, o Executivo Federal tem amplo grau de discricionariedade - decidindo para onde se destinam esses recursos, bem como quando serão executados. É possível que os outros tipos de transferências também sejam afetados pela sobrerrepresentação, no entanto, esse efeito é obtido de maneira diferente e em momentos diferentes.

A principal variável independente empregada no modelo foi para testar a hipótese de que os municípios de estados sobrerrepresentados são os que recebem maior montante dos recursos de transferências.

A variável foi construída com o índice de representação relativa (IRR) dos estados no Congresso, o qual será relacionado com o montante das transferências fiscais para os estados e seus municípios. A fórmula do índice será apresentada mais adiante.

Os dados de pesquisas empíricas apresentados pela literatura sustentam o uso do IRR_estados como medida relevante para a análise aqui proposta. Na perspectiva dos governos estaduais, observa-se que os estados, sobretudo os de baixo desempenho econômico e sobrerrepresentados, compõem seu orçamento contabilizando as transferências recebidas do governo central para a realização de políticas públicas destinadas a seus municípios (Soares & Neiva, 2011Soares, M. M., & Neiva, P. (2011). Federalism and public resources in Brazil: federal discretionary transfers to states. Brazilian Political Science Review, 5(2), 94-116.). Sob o prisma do comportamento legislativo, constata-se que uma parcela (ainda que pequena em relação ao total do orçamento) dos repasses de recursos voluntários para os estados é, também, advinda de emendas de parlamentares individuais e endereçada a munícipios específicos (Arretche & Rodden, 2004Arretche, M.; & Rodden, J. (2004). Política distributiva na federação: estratégias eleitorais, barganhas legislativas e coalizões de governo. Dados, 47(47), 549-576.; Figueiredo & Limongi 2008Figueiredo, A. C., & Limongi, F. (2008). Política orçamentária no presidencialismo de coalizão. Rio de Janeiro, RJ: Ed. FGV.). Quer dizer, congressistas no nível federal atuam tanto sobre matéria nacional como sobre matérias de interesse de seus estados de origem e populações locais. A tentativa de levar recursos tangíveis para seu estado e para determinados municípios é compreendida como parte da estratégia de busca de votos dos representantes, a qual orienta sua atividade parlamentar. A carreira de cada parlamentar está sujeita a pressões partidárias, do governo nacional e do governo de seu estado de origem, além das demandas advindas de seu círculo eleitoral consolidado ou que se almeja ampliar pela conquista de novos eleitores (Cheibub, Figueiredo, & Limongi, 2009Cheibub, J. A.; Figueiredo, A.; & Limongi, F. (2009). Political parties and governors as determinants of the behavior of Brazilian legislators. Latin American Politics and Society, 51(1), 1-30.; Lee, 2007Lee, F. E. (2007). Geographic representation and the US Congress. Maryland Law Review, 67(1), 50-61.; Shepsle, 2010Shepsle, K. (2010). Analyzing politics: rationality, behavior, and institutions. New York, NY: W. W. Norton.).

A desproporcionalidade de representação dos estados brasileiros no Congresso Nacional foi observada por meio do IRR definido por Ansolabehere et al. (2002Ansolabehere, S; Gerber, A; & Snyder, J. (2002). Equal votes, equal money: court-ordered redistricting and public expenditures in the American States. American Political Science Review, 96(4), 767-777.), cuja fórmula para o cálculo é:

I R R = P C c a d e i r a s d i s t r i t o e l e i t o r a l P C c a d e i r a s p a í s

Onde:

P C c a d e i r a s d i s t r i t o e l e i t o r a l = c a d e i r a s d i s t r i t o e l e i t o r a l c a d e i r a s p a í s

P C c a d e i r a s p a í s = c a d e i r a s l e g i s l a t i v o p a í s p o p u l a ç ã o p a í s

De acordo com Ansolabehere et al. (2002Ansolabehere, S; Gerber, A; & Snyder, J. (2002). Equal votes, equal money: court-ordered redistricting and public expenditures in the American States. American Political Science Review, 96(4), 767-777.), há representação proporcional quando IRR = 1,0; sub-representação quando IRR < 1,0 e sobrerrepresentação para IRR > 1,0.

A partir do IRR, foi construída uma variável dummy atribuindo valor 1 para os municípios de estados sobrerrepresentados na Câmara dos Deputados, na Assembleia Legislativa e no Senado brasileiros, e valor 0 caso contrário.

As diferenças de representação no Poder Legislativo entre os estados brasileiros são detalhadas no item de resultados desta seção. Por ora, cumpre ressaltar que a sobrerrepresentação é mais elevada no Senado, o número de cadeiras é menor e o sistema de eleição é diferente: enquanto no Senado o sistema eleitoral é majoritário, na Câmara ele é proporcional. Os senadores são eleitos no número de 1 ou 2 a cada eleição e, portanto, a disputa é menor, podendo receber voto de todo o estado, enquanto os deputados disputam com no mínimo mais 7 até mais 69 (como é o caso do Estado de São Paulo) e, nesses casos, uma das estratégias eleitorais possíveis é formar redutos eleitorais para garantir votos de acordo com um perfil específico de eleitores (Kinzo, Martins, & Borin, 2004Kinzo, M. A., Martins, J. P., Junior , & Borin I. (2004). Patrones de competencia electoral en la disputa por la Cámara de Diputados en Brasil (1994-2002). América Latina Hoy, 2004(38), 143-162.).

As demais variáveis explicativas foram selecionadas a partir da discussão teórica, tendo como referência os estudos de Amorim e Simonassi (2013Amorim, O Neto ; & Simonassi, A. G. (2013). Bases políticas das transferências intergovernamentais no Brasil (1985-2004). Revista de Economia Política, 33(4), 704-725.), Arretche e Rodden (2004Arretche, M.; & Rodden, J. (2004). Política distributiva na federação: estratégias eleitorais, barganhas legislativas e coalizões de governo. Dados, 47(47), 549-576.), Gibson et al. (2004Gibson, E. L., Calvo, E. F., & Falleti, T. G. (2004). Reallocative federalism: territorial overrepresentation and public spending in the Western Hemisphere. In E. L. Gibson (Ed.), Federalism and democracy in Latin America (pp. 173-193). Baltimore, MD: The Johns Hopkins University Press.) e Soares e Neiva (2011Soares, M. M., & Neiva, P. (2011). Federalism and public resources in Brazil: federal discretionary transfers to states. Brazilian Political Science Review, 5(2), 94-116.).

Lembramos, mais uma vez, que os estudos citados enfocam as transferências intergovernamentais da União para os estados/distritos. Neste estudo, o foco recai sobre as transferências da União e dos estados para o nível municipal.

Utilizamos, além da sobrerrepresentação, variáveis de caráter político e econômico que expomos no Quadro 1. Buscamos, por meio delas, testar o comportamento estratégico do presidente e do governador no envio das transferências aos municípios, analisando os efeitos de acordo com objetivos voltados a conquistar popularidade de governo e realizar a redistribuição de recursos em direção às regiões mais pobres, bem como os efeitos voltados à construção de apoio ao governo.

Quadro 1
Descrição das variáveis dos modelos econométricos

A partir das variáveis selecionadas foram adotados os modelos a seguir.

i. Determinantes das transferências fiscais da União aos municípios:

l n ( u o b r i ) i t = β 0 + δ 0 s o b r e c a m i t + δ 0 s o b r e s e n i t + δ 1 e l e p r e s i t + δ 2 e l e m u n i t + β 1 l n ( p e s ) i t + β 2 l n ( i n v ) i t + β 3 l n ( r e n d a ) i t + α i + u i t (1)

l n ( u v o l ) i t = β 0 + δ 0 s o b r e c a m i t + δ 0 s o b r e s e n i t + δ 1 e l e p r e s i t + δ 2 e l e m u n i t + β 1 l n ( p e s ) i t + β 2 l n ( i n v ) i t + β 3 l n ( r e n d a ) i t + α i + u i t (2)

ii. Determinantes das transferências fiscais dos estados aos municípios:

l n ( e o b r i ) i t = β 0 + δ 0 s o b r e a l i t + δ 1 e l e p r e s i t + δ 2 e l e m u n i t + β 1 l n ( p e s ) i t + β 2 l n ( i n v ) i t + β 3 l n ( r e n d a ) i t + α i + u i t (3)

l n ( e v o l ) i t = β 0 + δ 0 s o b r e a l i t + δ 1 e l e p r e s i t + δ 2 e l e m u n i t + β 1 l n ( p e s ) i t + β 2 l n ( i n v ) i t + β 3 l n ( r e n d a ) i t + α i + u i t (4)

O termo i = 1,..., x representa o corte transversal (os municípios brasileiros); o termo t = 2004,...,2014, representa o período de tempo analisado. Pelo modelo apresentado, o termo de erro é composto por dois elementos: αi, que é o elemento de corte transversal; e uit, que é o elemento combinado da série temporal e do corte transversal (Gujarati, 2011Gujarati, D., & Porter, D. C. (2011). Econometria básica (5a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Elsevier.).

A denotação “ln” significa que foi aplicado o logaritmo neperiano nas variáveis dependentes e nas variáveis independentes contínuas, obtendo modelos log-lineares13 13 A interpretação dos coeficientes de modelos log-lineares é em variação percentual. , forma funcional que se mostrou mais adequada para o estudo. Os valores de repasses de transferências fiscais, as despesas governamentais, bem como o produto interno bruto (PIB) tendem a ser assimétricos; transformações logarítmicas desse tipo de variável reduzem tanto a assimetria como a heterocedasticidade. Segundo Wooldridge (2005Wooldridge, J. M. (2005). Introdução à econometria: uma abordagem moderna. São Paulo, SP: Thomson.), variáveis estritamente positivas têm distribuições heterocedásticas; esse problema pode ser aliviado, se não eliminado, pelo uso do logaritmo neperiano. Além disso, o uso do ln “estreita a amplitude dos valores das variáveis, em alguns casos em quantidade considerável. Isso torna as estimativas menos sensíveis a observações díspares na variável dependente ou nas variáveis independentes” (Wooldridge, 2005, p. 181). Os valores absolutos foram corrigidos pela população e deflacionados, os cálculos foram feitos em reais per capita de 2014 e utilizou-se como deflator o índice geral de preços (IGP-DI) da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Ademais, os modelos também foram estimados com as variáveis em sua forma original e foi aplicado o teste de MacKinnon, White e Davidson (MWD), proposto por Gujarati (2011Gujarati, D., & Porter, D. C. (2011). Econometria básica (5a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Elsevier.), para a escolha entre os modelos linear e log-linear. Sobre a hipótese nula do teste MWD, o modelo linear é o mais apropriado, e sobre a hipótese alternativa, o modelo log-linear é o mais adequado. Como não foi possível rejeitar nenhum dos modelos, optou-se pelo que alcançou melhor ajustamento, parâmetros com sinais esperados, bem como R² ajustado e estatística F melhorados. De acordo com Wooldridge (2005Wooldridge, J. M. (2005). Introdução à econometria: uma abordagem moderna. São Paulo, SP: Thomson.), na escolha funcional do modelo, quando nenhum deles é rejeitado, pode-se utilizar o R² ajustado para a seleção.

A estimação dos modelos em painel foi realizada de três maneiras: mínimos quadrados ordinários (MQO) para dados empilhados (pooled data), onde há agrupamento de cortes transversais ao longo do tempo, ou seja, todos os dados são empilhados e não é considerada a natureza dos cross-section e de séries temporais; efeitos fixos, em que é levada em consideração a heterogeneidade de cada indivíduo, pois cada um deles possuirá uma variável dummy que representará o intercepto; e efeitos aleatórios, em que as diferenças entre as unidades são captadas pelo termo de erro. Foram adotados para as análises os modelos de efeitos fixos, pois para os fins deste estudo se mostraram mais adequados.

5. RESULTADOS

Analisamos nesta seção os efeitos de variáveis políticas e econômicas, com o enfoque na sobrerrepresentação no Poder Legislativo brasileiro, sobre os repasses de recursos públicos tendo como premissa que os municípios de estados menores, os sobrerrepresentados, são os que recebem maiores montantes das transferências, tanto advindos da União como dos estados.

Foram estudadas as transferências obrigatórias e discricionárias da União e dos estados aos municípios. Todavia, o foco das análises são as discricionárias que são voluntárias advindas da União. A ênfase nas transferências da União se dá porque elas representam um montante significativo nos orçamentos dos governos locais14 14 Giuberti (2005), por exemplo, mostra dados da dependência dos governos subnacionais em relação às transferências da União. Em 2002, em média, 50% da receita corrente dos municípios era oriunda desse fundo. .

Como veremos adiante, os resultados confirmam que há propensão dos governos federal e estadual a direcionarem recursos discricionários das transferências para os municípios de acordo com critérios políticos e, na medida em que prevalecem as necessidades políticas sobre as socioeconômicas, esse pode ser um dos fatores que intensificam as desigualdades regionais.

5.1 DESPROPORCIONALIDADE DE REPRESENTAÇÃO NOS ESTADOS BRASILEIROS

O IRR foi calculado para a Câmara dos Deputados, a Assembleia Legislativa e o Senado para todos os anos do período de 1988 a 2014. Para a análise do gráfico seguinte, realizamos uma adaptação da classificação de Ansolabehere et al. (2002Ansolabehere, S; Gerber, A; & Snyder, J. (2002). Equal votes, equal money: court-ordered redistricting and public expenditures in the American States. American Political Science Review, 96(4), 767-777.), na qual modificamos os intervalos para identificar os estados proporcionais (IRR > 0,90 e < 1,2); os sobrerrepresentados (IRR > = 1,2); e os sub-representados (IRR < = 0,90). Essa adaptação foi útil para representar e descrever características gerais do Poder Legislativo brasileiro em relação à desproporcionalidade.

O Gráfico 1 apresenta a média do IRR para os 27 estados brasileiros no período de 1988 a 2014.

Gráfico 1
Média do IRR da Câmara dos Deputados, Assembleia Legislativa e Senado para os estados brasileiros (1988-2014)

Na Região Norte se encontram os cinco estados com maior índice de representação tanto na Câmara dos Deputados e na Assembleia Legislativa como no Senado, que são: Acre, Amapá, Rondônia, Roraima e Tocantins. Em contraste, o estado de São Paulo apresenta os menores valores do IRR e é o único em que a sub-representação coincide na Câmara, na Assembléia e no Senado. Os estados do Pará, do Maranhão e de Santa Catarina são considerados proporcionais na Câmara dos Deputados, na Assembleia Legislativa e no Senado.

Ademais, constata-se que na Câmara dos Deputados 67% dos estados têm representação proporcional e a maioria desses estados é das regiões Nordeste, Sudeste e Sul. O Senado e a Assembleia Legislativa apresentam, respectivamente, 11% e 19% de estados com representação proporcional.

Em relação à sobrerrepresentação, ambos - Senado e Assembleia Legislativa - apresentam 59% dos estados sobrerrepresentados, em que a maioria está na Região Norte, seguida por Nordeste e Centro-Oeste. A Câmara denota 30% de estados sobrerrepresentados e São Paulo é o único estado sub-representado nessa casa. Nenhum estado da Região Sul apresenta o IRR > 1,2 e na Região Sudeste somente o estado do Espírito Santo é sobrerrepresentado no Senado e na Assembleia Legislativa, os demais são sub-representados ou proporcionais.

A linha vermelha pontilhada no Gráfico 1 representa IRR > = 1,2 para mostrar os estados em que estão acima desse valor e são sobrerrepresentados. Evidencia-se que o Senado detém os maiores índices de representação relativa, bem como possui desproporcionalidade de representação bem mais elevada do que na Câmara dos Deputados. Portanto, é possível que a sobrerrepresentação no Congresso brasileiro seja dirigida pelo Senado.

O mapeamento a seguir foi realizado com ferramentas de geoprocessamento e análise espacial e visa a dar suporte às análises estatísticas. Foram analisados os repasses de transferências voluntárias da União aos municípios utilizando a média de 2004 a 201415 15 Os mapas, bem como a análise espacial de cluster, foram produzidos para cada ano do período analisado. No entanto, devido a não haver significativa mudança dos dados nesse período, optou-se por apresentar os dados com o cálculo da média. . O foco foi identificar se o repasse de recursos está relacionado com a sobrerrepresentação no Legislativo brasileiro.

A partir do mapa de autocorrelação espacial, observamos a espacialização dos diferentes níveis de recebimento de recursos nos municípios brasileiros. O Índice de Moran permitiu identificar agrupamentos de áreas próximas com altos ou baixos recebimentos de transferências per capita. Os municípios em vermelho escuro e azul-escuro compõem agrupamentos estatisticamente significativos indicando a existência de clusters de valores. As cores vermelho claro e azul-claro indicam a presença de outliers. As áreas mais claras são aquelas que não apresentaram significância estatística no cálculo do Índice de Moran.

Evidencia-se, a partir da Figura 1, que principalmente os municípios de estados com maiores IRR (Acre, Amapá, Rondônia, Roraima e Tocantins) denotam os maiores valores de recebimento de transferências per capita. Os clusters que apresentam valores altos e estão próximos (high-high cluster) se concentram nesses municípios. Enquanto os municípios que apresentam os clusters com valores mais baixos (low-low cluster) são maioria dos estados sub-representados na Câmara dos Deputados, na Assembleia Legislativa e no Senado, como o Pará, a Bahia, o Maranhão, Pernambuco, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo.

Figura 1
Mapa de análise de cluster do repasse das transferências voluntárias per capita da União aos municípios (2004-2014)

Os municípios considerados não significativos não se enquadram nos agrupamentos, pois apresentam valores de receita de transferências variados, assim como os valores dos municípios vizinhos.

Esses resultados vão ao encontro da literatura sobre o tema, uma vez que evidenciam a influência da sobrerrepresentação no repasse das transferências voluntárias. Os demais fatores políticos, como relação partidária e coalizões entre o governo do poder local e o governo federal, podem impactar o repasse de recursos públicos, principalmente nos que são discricionários. No entanto, para melhor entendimento dessa dinâmica de repasse de recursos, há necessidade de estudos focalizados nessas variáveis.

A seguir são apresentadas as estimações dos modelos econométricos com as variáveis previamente selecionadas.

5.2 EFEITOS DA SOBRERREPRESENTAÇÃO SOBRE AS TRANSFERÊNCIAS FEDERAIS E ESTADUAIS PARA AS UNIDADES MUNICIPAIS BRASILEIRAS

Utilizamos alguns testes de especificação do modelo em direção à identificação da abordagem mais adequada para que os resultados fossem alcançados de maneira satisfatória.

Primeiro foi identificado o modelo mais apropriado, se empilhado (pooled), de efeitos fixos ou de efeitos aleatórios, e, após isso, aplicou-se o teste de Wald para detectar a presença de heterocedasticidade.

Inicialmente foi empregado o teste de Chow para identificar se o modelo mais apropriado é o empilhado ou o de efeitos fixos. No modelo empilhado, todos os coeficientes são constantes ao longo do tempo e entre os indivíduos, e a forma é o habitual MQO. No modelo de efeitos fixos, os coeficientes angulares são constantes, mas o intercepto varia entre as unidades, mantendo-se constante ao longo do tempo. O resultado do teste de Chow é observado na estatística F da estimação do modelo sobre efeitos fixos, onde, sob a hipótese nula, o modelo restrito (empilhado) é mais apropriado e, sob a hipótese alternativa, opta-se pelo modelo irrestrito (efeitos fixos).

De acordo com a estatística F dos modelos de efeitos fixos foi possível rejeitar a hipótese nula de que o modelo empilhado é mais propício; assim, aceita-se a hipótese alternativa de que o modelo de efeitos fixos é preferível ao empilhado para este estudo.

Após essa constatação, faz-se necessário testar se o modelo de efeitos fixos também é preferível ao modelo de efeitos aleatórios; para tanto, empregou-se o teste de Hausman, no qual, sob hipótese nula, tanto o modelo de efeitos fixos quanto o de efeitos aleatórios são consistentes, sendo o segundo mais eficiente. Sob a hipótese alternativa, o modelo de efeitos aleatórios fornece estimativa inconsistente dos parâmetros e, dessa forma, a diferença entre os dois estimadores deve ser diferente de zero.

As pressuposições que se fazem com base na provável correlação entre os regressores X e o componente de erro individual definem a escolha entre modelos de efeitos fixos ou aleatórios. Se houver correlação, o modelo de efeitos fixos é o mais indicado, se não houver, o de efeitos aleatórios (Gujarati, 2011Gujarati, D., & Porter, D. C. (2011). Econometria básica (5a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Elsevier.). Assim, ao rejeitar a hipótese nula de que não há correlação entre os erros, considera-se o modelo de efeitos fixos mais eficiente; caso contrário, na ausência de correlação, o modelo indicado é o de efeitos aleatórios16 16 Os resultados dos testes de Hausman se encontram nas tabelas 1 e 2 de resultados dos modelos. .

O teste de Hausman fornece as estimativas sobre os dois modelos, de efeitos fixos e aleatórios, calculando a diferença entre seus coeficientes. Uma vez que foi possível, de acordo com a probabilidade de qui-quadrado (chi2), rejeitar a hipótese nula, isso significa que o estimador de efeitos aleatórios é significativamente diferente do estimador de efeitos fixos; assim, aceita-se a hipótese alternativa de que o modelo de efeitos aleatórios é inconsistente. Desse modo, estatística do teste de Hausman, a abordagem de efeitos fixos é a mais apropriada.

Também aplicamos o teste de Wald, que apresentou presença de heterocedasticidade nos modelos, o que é comum em dados longitudinais. Assim, foram estimados os modelos de efeitos fixos sobre erros padrão robustos; esse procedimento visa a ajustar o desvio padrão das variáveis, a fim de corrigir a ausência de homocedasticidade dos resíduos da regressão. Diante disso, apresentam-se a seguir os resultados das estimações, seguindo o processo e as equações descritas anteriormente.

A Tabela 1 descreve os resultados das estimações que objetivam explicar o repasse das transferências da União para os municípios. O modelo 1 tem as transferências obrigatórias como variável dependente e o modelo 2 explica as transferências voluntárias17 17 Cabe lembrar que, no que tange à forma funcional das estimações, os resultados foram calculados com as variáveis contínuas em seu formato original, bem como considerando o log. Assim como Amorim e Simonassi (2013) e Arretche e Rodden (2004), optou-se por utilizar os modelos log-lineares, uma vez que sobre esse método os modelos se mostraram mais robustos. .

Tabela 1
Estimações dos modelos das transferências da União aos municípios brasileiros

Verifica-se que as regressões como um todo se mostraram significativas. A estatística F, que considera a significância global do modelo, indica que as variáveis independentes em conjunto explicam as variações na variável explicada. Pela estatística t se observa a significância individual dos coeficientes, onde, exceto a variável de sobrerrepresentação no Senado (sobresen), todas as outras apresentaram significância estatística com 1% e 5% de probabilidade de erro. O R² ajustado18 18 O R² ajustado é preferível ao R², pois o R² nunca diminui quando novas variáveis independentes são adicionadas em um modelo, enquanto a fórmula do R² ajustado leva em conta os graus de liberdade, por isso será menor que o R², porém, mais adequado (Wooldridge, 2005). , é de 95% para o modelo 1 e de 36% para o modelo 2. Segundo Gujarati (2011Gujarati, D., & Porter, D. C. (2011). Econometria básica (5a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Elsevier.), a interpretação do R² deve ser modesta, no sentido de que valem mais coeficientes significativos e sinais esperados do que um R² alto. Com dados que envolvem várias observações, no geral se obtêm valores baixos de R², em virtude das diversidades das unidades de corte transversal e série temporal. Todavia, com o F significativo, pode-se considerar que os regressores influenciam o regressando, ainda mais se os regressores também são individualmente significativos. No modelo 2, os parâmetros das duas primeiras variáveis explicativas utilizadas para verificar os efeitos da sobrerrepresentação na Câmara (sobrecam) e no Senado (sobresen) no repasse das transferências foram significativos a 1% e apresentaram sinais positivos; isso indica que os municípios de estados sobrerrepresentados nas duas casas são mais beneficiados pelas transferências voluntárias da União se comparados com os municípios de estados sub-representados. Mais especificamente, estima-se que os municípios de estados sobrerrepresentados na Câmara e no Senado recebem, respectivamente, em torno de 14% e 13% a mais de transferências voluntárias per capita da União do que os municípios de estados sub-representados. Com relação ao modelo 1, que tem as transferências obrigatórias como variável dependente, a variável sobresen não foi estatisticamente significativa, enquanto o coeficiente da variável sobrecam expressa que os municípios de estados sobrerrepresentados na Câmara recebem um montante per capita menor (-3,2%) de transferências obrigatórias do que os municípios de estados sub-representados nessa casa.

O efeito da sobrerrepresentação no repasse das transferências previstas em lei e nas voluntárias é antagônico. Nas obrigatórias (modelo 1), a sobrerrepresentação causa uma redução no repasse desse tipo de recurso, enquanto o efeito observado nas transferências voluntárias (modelo 2) é inverso. Assim, cabe destacar o que concluem: “o efeito da sobrerrepresentação não é meramente um artefato das regras que regem as transferências constitucionais. Ele parece emergir do poder de barganha dos estados menores” (Arretche & Rodden, 2004Arretche, M.; & Rodden, J. (2004). Política distributiva na federação: estratégias eleitorais, barganhas legislativas e coalizões de governo. Dados, 47(47), 549-576., p. 565).

Esse resultado era o esperado, uma vez que vai ao encontro da literatura; como mencionado na seção de concepções teóricas, há consenso de que os líderes políticos utilizam os recursos fiscais, principalmente os discricionários, destinando-os preferencialmente aos distritos que lhes proporcionem maior apoio legislativo. Dito de outro modo, os governantes trocam gastos localizados visando a estratégias eleitorais e legislativas (Arretche & Rodden, 2004Arretche, M.; & Rodden, J. (2004). Política distributiva na federação: estratégias eleitorais, barganhas legislativas e coalizões de governo. Dados, 47(47), 549-576.). Ao analisar as variáveis elepres e elemun, nota-se que em anos de eleições presidenciais os municípios recebem, em média, 6% a mais de transferências voluntárias per capita do que nos demais anos, evidenciando a existência de ciclos eleitorais da política. No tocante aos efeitos dessas variáveis nas transferências obrigatórias, o inverso ocorre, há uma queda de repasses para os municípios em anos de eleições tanto presidenciais como municipais, assim como os efeitos nos repasses de recursos voluntários nas eleições municipais.

Os coeficientes das variáveis de despesas indicam elasticidades positivas, isto é, os aumentos de gastos com pessoal e investimento19 19 Ressalta-se que estimamos os modelos sem as variáveis de gasto com pessoal e investimento e observamos que a retirada das referidas variáveis não alterou significativamente os parâmetros e a relevância dos demais regressores. Assim, optamos por incluí-las nos modelos e nas análises. motivam maiores repasses de recursos fiscais tanto obrigatórios como voluntários.

É interessante observar que aumentos em investimento por parte da gestão pública dos municípios implicam montantes significativamente maiores de receitas das transferências voluntárias se comparadas às receitas das transferências obrigatórias. Isso indica estímulos por parte dos repasses de recursos voluntários a gastos com essa rubrica.

Uma vez que os recursos discricionários são de caráter emergencial e na maioria das vezes se destinam a investimentos, espera-se que um acréscimo nessa despesa implique maiores recursos enviados a essas unidades. Em relação à variável pes, a interpretação é que os gastos com pessoal podem maximizar a aprovação populacional, pois, principalmente nos pequenos municípios, onde há baixa geração de renda, as despesas com folhas de salário servem aos interesses clientelistas, esses gastos garantem renda mínima a parte da população, sendo o município o principal empregador local. Possibilitando dessa forma, aos governantes, um bom desempenho eleitoral e manutenção do poder político.

Por sua vez, a variável renda, empregada como proxy de desenvolvimento, testa as proposições das teorias que preveem resultados redistributivos em direção às regiões mais pobres. Esta variável apresenta coeficientes positivos em todos os modelos; isso indica que um aumento da renda per capita dos municípios ocasiona aumentos de recebimento de transferências obrigatórias e voluntárias.

A Tabela 2 apresenta as estimações para as transferências dos estados aos municípios.

Tabela 2
Estimações dos modelos das transferências dos estados aos municípios brasileiros

Assim como nas interpretações anteriores, o foco recai sobre as transferências voluntárias (modelo 6). As estatísticas F e t exprimem a significância dos modelos. Os R² são satisfatórios, apresentam 95% e 46% de poder de explicação dos modelos 5 e 6, respectivamente.

A primeira variável explicativa, sobreal, é uma variável dummy para os municípios de estados sobrerrepresentados na Assembleia Legislativa. Ela não foi estatisticamente significativa para explicar o recebimento de transferências voluntárias. Ao observar o resultado do modelo 5, sobreal apresenta uma relação positiva com a variável dependente, indicando que municípios de estados sobrerrepresentados na Assembleia Legislativa recebem, em média, 9% a mais de repasses dos recursos estaduais que são previstos em lei do que os municípios de estados sub-representados.

Os coeficientes seguintes que analisam a existência de ciclos eleitorais mostram que, tanto em anos de eleições presidenciais como municipais, há aumento no recebimento de recursos estaduais voluntários.

Em modelos nos quais a variável dependente está em sua forma logarítmica e quando o coeficiente de uma variável independente dummy sugere grande mudança proporcional em y, a diferença proporcional exata pode ser obtida com o cálculo da semielasticidade (Wooldridge, 2005Wooldridge, J. M. (2005). Introdução à econometria: uma abordagem moderna. São Paulo, SP: Thomson.). De modo geral, se β1 for o coeficiente de uma variável dummy, digamos, x1, quando ln(y) é a variável dependente, a diferença percentual exata em y prevista quando x1 = 1 versus quando x1 = 0 é calculada por meio da seguinte fórmula:

100 . e x p β 1 ' . 1

em que exp é o antilogarítmo do β1’ (parâmetro estimado da variável dummy).

A Tabela 3 demonstra os resultados do cálculo da semielasticidade para as variáveis elepres e elemun20 20 Ressalta-se que esse cálculo foi realizado para coeficientes de variáveis dummy com valores grandes, pois em coeficientes de valores pequenos não há mudanças significativas quando se calcula a estimativa mais precisa por meio da semielasticidade. do modelo 6.

Tabela 3
Cálculo da semielasticidade para as variáveis elepres e elemun do modelo 6

Assim, infere-se que em anos de eleições presidenciais há 38% (a estimativa mais precisa é de 46%) mais transferências voluntárias per capita sendo repassadas dos estados para os municípios. Em relação aos anos de eleições municipais, esse aumento, de acordo com a estimativa mais precisa calculada na Tabela 3, é de aproximadamente 22%. Isso evidencia a existência de ciclos eleitorais da política relacionados, principalmente, com o montante de recursos voluntários que são repassados dos estados aos municípios.

As duas rubricas de despesas municipais têm relação positiva com as variáveis dependentes. De acordo com o modelo 6, os gastos com pessoal e com investimento influenciam no montante de recursos que é enviado aos municípios de modo semelhante. Dito de outra maneira, o aumento de 1% nesses gastos está associado a um aumento de repasses em 30% e 41%, respectivamente. Há incentivo ao aumento de repasse de transferências dos estados aos municípios, que aumentam suas despesas com investimento e pessoal. Possivelmente, o repasse de maiores recursos aos municípios que gastam com folhas de pessoal é motivado por interesses clientelistas.

Por fim, a variável que testa o caráter redistributivo das transferências intergovernamentais não foi estatisticamente significativa para explicar o repasse de recursos voluntários. Sobre os recursos constitucionais ela tem um efeito positivo, indicando, assim como nos modelos anteriores, que as transferências não se pautam por critérios de promoção da equidade entre os diversos municípios analisados.

6. CONCLUSÕES

O objetivo deste estudo foi observar os efeitos da desproporcionalidade de representação do Poder Legislativo brasileiro sobre as transferências de recursos federais e estaduais para os municípios. Para esse propósito, analisou-se a principal variável explicativa - a sobrerrepresentação. A hipótese geral que norteou a pesquisa foi que os municípios de estados sobrerrepresentados são favorecidos na obtenção de recursos de transferências discricionárias, pois elas funcionam como meio de troca no modelo de barganha legislativa.

Os resultados encontrados indicam que a desproporcionalidade de representação na Câmara dos Deputados, na Assembleia Legislativa e no Senado é um fator que influencia o repasse de recursos fiscais. Os municípios de estados sobrerrepresentados recebem mais transferências per capita do que os municípios de estados sub-representados. Observa-se que esse efeito é quantitativamente maior quando se trata dos repasses das transferências voluntárias. Esse resultado vai ao encontro da literatura em que municípios menores - de estados sobrerrepresentados - são os mais beneficiados pelas transferências discricionárias.

Há indícios de que determinantes políticos têm prevalecido sobre as necessidades socioeconômicas, uma vez que os municípios mais desenvolvidos recebem mais recursos (mesmo das transferências obrigatórias), fato que contraria a ideia de redistribuição, o que é identificado como federalismo realocativo. Quanto a isso, ressaltamos que nem todas as unidades sobrerrepresentadas - menos populosas - também são as que têm menores índices de desenvolvimento.

Diante dessa sequência de fatos, constata-se que, no Brasil, o efeito da desproporcionalidade representativa no Congresso Nacional sobre as despesas discricionárias federais e estaduais é expressivo, e, portanto, a estrutura da representação política tem orientado as ações dos gestores públicos da União e dos estados brasileiros. Uma das consequências imediatas desse padrão de distribuição dos recursos públicos pode ser o agravamento das desigualdades inter-regionais.

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  • Wooldridge, J. M. (2005). Introdução à econometria: uma abordagem moderna São Paulo, SP: Thomson.
  • 1
    Souza (2003) demonstra indicadores de desigualdade nos municípios brasileiros, destacando que as desigualdades não são apenas notadas entre as cinco regiões do país, mas também em uma mesma região ou dentro de um mesmo estado. Essas diferenças podem ser notadas de acordo com a distribuição da população dos municípios; no Nordeste ocorrem as maiores diferenças, onde o número de pequenos municípios (com população entre 10 mil e 20 mil habitantes) é bastante alto se comparado às demais regiões.
  • 2
    No ranking de representação desproporcional no Senado, entre os 78 países da amostra, Argentina, Brasil e Bolívia aparecem em primeiro, segundo e terceiro lugar, respectivamente. Quando se trata da representação desproporcional na Câmara, o Brasil ocupa o 17º lugar (Samuels & Snyder, 2001Samuels, D. J., & Snyder, R. (2001). The value of a vote: malapportionment in comparative perspective. British Journal of Political Science, 31(4), 651-671., 2004Samuels, D. J., & Snyder, R. (2004). Legislative malapportionment in Latin America. In E. L. Gibson (Ed.), Federalism and democracy in Latin America (pp. 131-172). Baltimore, MD: The Johns Hopkins University Press.).
  • 3
    A perda de municípios se deve à ausência de dados e não prejudica os resultados, pois a amostra utilizada mantém a diversidade regional que caracteriza o Brasil.
  • 4
    Na análise exploratória dos dados, os resultados para os grandes municípios se mostraram muito discrepantes dos demais, podendo causar distorções na análise inferencial. Para definir o número de habitantes de corte para municípios grandes, adotou-se o critério baseado na classificação do Tesouro Nacional, que realiza o seguinte agrupamento de população: a) população inferior a 50 mil habitantes; b) população entre 50 mil e 300 mil habitantes; d) população entre 300 mil e 1 milhão de habitantes; e e) população maior do que 1 milhão de habitantes.
  • 5
    Os procedimentos para a adoção dos modelos mais adequados serão descritos detalhadamente no item de definição das variáveis e dos modelos estatísticos.
  • 6
    Para cada ano do corte temporal há um número diferente de observações, devido à característica desbalanceada do painel. O número de municípios utilizados em cada amostra anual está descrito na seção 4.1.
  • 7
    Foram apurados os valores das transferências pelo critério de competência com valores empenhados sem restos a pagar.
  • 8
    Exemplos de transferências obrigatórias: Fundo de Participação dos Municípios (FPM); Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR); Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI); Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico; Contribuição do Salário-Educação; Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro ou Relativas a Títulos ou Valores Mobiliários Incidentes sobre o Ouro; Transferências da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Naturais; Transferências de Recursos do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE); Transferências Financeira do ICMS — Desoneração — Lei Complementar (LC) n. 87/1996; entre outras.
  • 9
    Exemplos de transferências específicas: relativas ao Sistema Único de Saúde (SUS); Recursos do Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS); entre outras.
  • 10
    Exemplos de transferências por delegação: Transferências a consórcios públicos; Transferências de convênios relativas ao SUS; Transferências de convênios da união destinadas a programas de assistência social; entre outras.
  • 11
    Optou-se por não trabalhar com as transferências específicas e delegadas, pois para muitos municípios essa variável não foi relatada no banco de dados do Finbra, o que causaria muitos valores missing na amostra, prejudicando as estimações estatísticas. Além disso, elas representam um valor muito pequeno com relação ao total das transferências discricionárias.
  • 12
    Para identificar os efeitos do desenvolvimento dos municípios, cogitamos a utilização do índice de desenvolvimento humano municipal (IDHM); no entanto, a aferição dos resultados incluindo essa variável poderia causar problemas, uma vez que ela é medida decenalmente e, assim, não teria a variação necessária para um modelo em painel com uma série temporal de 10 anos.
  • 13
    A interpretação dos coeficientes de modelos log-lineares é em variação percentual.
  • 14
    Giuberti (2005)Giuberti, A. C. (2005). Lei de Responsabilidade Fiscal: efeitos sobre o gasto com pessoal dos municípios brasileiros. Brasília, DF: Escola de Administração Fazendária. , por exemplo, mostra dados da dependência dos governos subnacionais em relação às transferências da União. Em 2002, em média, 50% da receita corrente dos municípios era oriunda desse fundo.
  • 15
    Os mapas, bem como a análise espacial de cluster, foram produzidos para cada ano do período analisado. No entanto, devido a não haver significativa mudança dos dados nesse período, optou-se por apresentar os dados com o cálculo da média.
  • 16
    Os resultados dos testes de Hausman se encontram nas tabelas 1 e 2 de resultados dos modelos.
  • 17
    Cabe lembrar que, no que tange à forma funcional das estimações, os resultados foram calculados com as variáveis contínuas em seu formato original, bem como considerando o log. Assim como Amorim e Simonassi (2013) e Arretche e Rodden (2004), optou-se por utilizar os modelos log-lineares, uma vez que sobre esse método os modelos se mostraram mais robustos.
  • 18
    O R² ajustado é preferível ao R², pois o R² nunca diminui quando novas variáveis independentes são adicionadas em um modelo, enquanto a fórmula do R² ajustado leva em conta os graus de liberdade, por isso será menor que o R², porém, mais adequado (Wooldridge, 2005).
  • 19
    Ressalta-se que estimamos os modelos sem as variáveis de gasto com pessoal e investimento e observamos que a retirada das referidas variáveis não alterou significativamente os parâmetros e a relevância dos demais regressores. Assim, optamos por incluí-las nos modelos e nas análises.
  • 20
    Ressalta-se que esse cálculo foi realizado para coeficientes de variáveis dummy com valores grandes, pois em coeficientes de valores pequenos não há mudanças significativas quando se calcula a estimativa mais precisa por meio da semielasticidade.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2019

Histórico

  • Recebido
    27 Ago 2017
  • Aceito
    05 Jun 2018
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