Resumo
O presente estudo investiga as práticas discursivas nos relatórios socioambientais da Norte Energia, revelando como estas refletem a ideologia dominante de desenvolvimento. Utilizando o modelo de análise crítica do discurso de Fairclough e o conceito de contabilidade contra-hegemônica, o estudo examina os relatórios de sustentabilidade da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, com foco nos impactos sobre os povos indígenas dentro dos temas desmatamento, água, biodiversidade e violência. A construção da usina resultou em significativos impactos ambientais e sociais, como o desmatamento e a alteração dos regimes hídricos, a biodiversidade e a violência contra as comunidades indígenas locais. A análise textual revela o uso de uma linguagem técnica e quantitativa para minimizar a gravidade dos impactos ambientais, como o desmatamento e a gestão hídrica. Em relação à biodiversidade, os relatórios destacam esforços de preservação que, na realidade, mostram uma desconexão entre as ações relatadas e os impactos reais. O estudo aponta para a sub-representação da violência e dos conflitos, especialmente em relação às comunidades indígenas e ribeirinhas, onde os conflitos e as violações de direitos humanos são minimizados ou omitidos. Por fim, conclui-se que a abordagem da empresa perpetua relações de poder desiguais e marginaliza as preocupações sociais e ambientais, reforçando a necessidade de uma reorientação para uma racionalidade substantiva que valorize os direitos e conhecimentos das comunidades afetadas, promovendo um modelo de desenvolvimento mais justo e sustentável.
Palavras-chave:
discurso; contra-hegemônica; ideologia
Abstract
This study investigates the discursive practices in the socio-environmental reports of the company Norte Energia, revealing how they reflect the dominant ideology of development. Utilizing Fairclough’s critical discourse analysis model and the concept of counter-hegemonic accounting, the study examines the sustainability reports of the Belo Monte Hydroelectric Plant, focusing on the impacts on indigenous peoples within the themes of deforestation, water, biodiversity, and violence. The construction of the plant resulted in significant environmental and social impacts, including deforestation, changes in water regimes, biodiversity loss, and violence against local indigenous communities. The textual analysis reveals the use of technical and quantitative language to downplay the severity of environmental impacts, such as deforestation and water management. Regarding biodiversity, the reports emphasize preservation efforts that, in reality, show a disconnection between the reported actions and the actual impacts. The study highlights the underrepresentation of violence and conflicts, especially concerning indigenous and riverside communities, where conflicts and human rights violations are minimized or omitted. Finally, the study concludes that the company’s approach perpetuates unequal power relations and marginalizes social and environmental concerns, underscoring the need for a reorientation toward a substantive rationality that values the rights and knowledge of affected communities, promoting a more just and sustainable development model.
Keywords:
discourse; counter-hegemony; ideology
Resumen
El presente estudio investiga las prácticas discursivas en los informes socioambientales de Norte Energia, revelando cómo estas reflejan la ideología dominante de desarrollo. Utilizando el modelo de análisis crítico del discurso de Fairclough y el concepto de contabilidad contrahegemónica, el estudio examina los informes de sostenibilidad de la central hidroeléctrica de Belo Monte, enfocándose en los impactos sobre los pueblos indígenas dentro de los temas de deforestación, agua, biodiversidad y violencia. La construcción de la central resultó en impactos ambientales y sociales significativos, como la deforestación y la alteración de los regímenes hídricos, la biodiversidad y la violencia contra las comunidades indígenas locales. El análisis textual revela el uso de un lenguaje técnico y cuantitativo para minimizar la gravedad de los impactos ambientales, como la deforestación y la gestión del agua. En relación con la biodiversidad, los informes destacan esfuerzos de preservación que, en realidad, muestran una desconexión entre las acciones reportadas y los impactos reales. El estudio señala la subrepresentación de la violencia y los conflictos, especialmente en relación con las comunidades indígenas y ribereñas, donde los conflictos y las violaciones de derechos humanos son minimizados u omitidos. Finalmente, se concluye que el enfoque de la empresa perpetúa relaciones de poder desiguales y margina las preocupaciones sociales y ambientales, reforzando la necesidad de una reorientación hacia una racionalidad sustantiva que valore los derechos y conocimientos de las comunidades afectadas, promoviendo un modelo de desarrollo más justo y sostenible.
Palabras clave:
discurso; contrahegemónica; ideología
1. INTRODUÇÃO
O conceito de contabilidade contra-hegemônica (counter-accounting) surgiu como uma abordagem crítica para desafiar as narrativas dominantes e estruturas de poder na responsabilidade social corporativa e em relatórios de sustentabilidade. Essa forma de contabilidade busca emancipar-se do controle das informações detidas pelas empresas, apresentando contrarrelatos que desafiam os discursos hegemônicos e promovem mudanças emancipatórias na sociedade (Boiral, 2013; Vinnari & Laine, 2017). Trata-se, portanto, de um esforço intelectual usado para contestar relatórios oficiais que refletem a lógica hegemônica amparada no neoliberalismo opressor (Lima et al., 2024).
Relatórios de sustentabilidade têm-se mostrado limitados em demonstrar os efeitos deletérios de suas atividades socioambientais, levando ao fenômeno da “grande desconexão” (Dyllick & Muff, 2016), uma discrepância entre discursos ambientais e a degradação observada. Essa economia de mercado é sustentada por uma racionalidade calculista, que pondera e ajusta os meios aos fins dados, frequentemente resultando na dominação (Adorno & Horkheimer, 1985; Huisman, 2000)
A construção de grandes represas, como a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, representa projetos controversos e impactantes no Brasil, com profundas consequências para territórios indígenas e o meio ambiente (Kramer et al., 2022). Situada na bacia do Rio Xingu, a usina tem sido alvo de intensos debates devido aos impactos socioambientais, incluindo desmatamento, alterações hídricas, perda de biodiversidade e violência contra populações locais (Brum, 2021).
Marques (2018), em uma abordagem mais abrangente, mostra que barragens como Belo Monte causam deslocamento de populações, erosão de terras ribeirinhas, impacto na área de plantio, mudança na temperatura e composição química da água, redução da fauna e da flora fluvial e terrestre, alterações no volume da pesca, desestabilização da economia local e desmatamento, entre outros impactos elencáveis.
Miranda (2020) aponta um embate, na arena de Belo Monte, entre discursos associados ao desenvolvimento: de um lado, a Igreja Católica e o Movimento Xingu Vivo para Sempre se centram na valorização da vida, no equilíbrio com a natureza, nos saberes tradicionais e no bem-estar das comunidades locais; de outro, o Estado e o Consórcio Belo Monte defendem um modelo de desenvolvimento associado ao capitalismo globalizado, à concentração do poder político e econômico e à mercantilização do trabalho e da terra.
Vieira (2019) agrega profundidade à discussão ao destacar a existência de coalizões políticas e, com base na análise crítica do discurso, demonstrar que as políticas públicas espelham construções simbólicas coletivas que ganham forma por meio da linguagem. O autor destaca que as coalizões favoráveis à usina incorporam ao seu discurso um foco centrado no desenvolvimento sustentável.
Mas sob este discurso de desenvolvimento sustentável o que surgiu foi um modelo de desenvolvimento opressor com externalidades negativas ambientais (Ribeiro & Morato, 2020) e sociais (Ribeiro & Morato, 2020; Schmutz, 2023). Um caminho alternativo é a comunhão entre homem e natureza lastreado nos saberes tradicionais dos povos originários: o Bem Viver - que se contrapõe ao Viver Melhor e não nega a existência dos conflitos, mas não os exacerba (Acosta, 2016).
O estudo foca na análise dos relatórios socioambientais da Norte Energia, examinando como refletem a ideologia dominante e a racionalidade instrumental, priorizando interesses econômicos e políticos. Utilizando a metodologia de análise crítica do discurso de Fairclough (2001), o objetivo é revelar práticas discursivas que perpetuam uma visão de progresso alinhada aos interesses hegemônicos.
Este estudo vem suprir uma lacuna em estudos brasileiros relacionados à contabilidade contra-hegemônica - que sofrem de uma severa escassez - envolvendo um caso emblemático na geração de energia elétrica que, segundo Marques (2018, p. 484), “não atende aos interesses da sociedade, mas aos da tecnoburocracia do Estado, das empreiteiras e das corporações eletrointensivas”. Contribui, assim, para a contabilidade crítica e a análise do discurso, oferecendo perspectivas sobre como práticas contábeis de sustentabilidade podem desafiar narrativas hegemônicas e promover mudanças sociais. As recomendações podem influenciar políticas públicas, normas de sustentabilidade e práticas empresariais, promovendo governança mais inclusiva e responsável.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2..1. Contabilidade contra-hegemônica
A contabilidade contra-hegemônica ou couter-account representa uma abordagem crítica no campo contábil, desafiando práticas convencionais e buscando transformar condições culturais que limitam a contabilidade (Lima et al., 2024; Boiral, 2013; Gallhofer & Haslam, 2019; Soh & Tumin, 2022). Essa perspectiva envolve critérios pragmáticos, inclusão de diversos atores e interesses, e uma orientação emancipadora (Spence, 2009).
Estudos destacam que a contabilidade contra-hegemônica pode promover mudanças significativas (Denedo et al., 2017; Gallhofer et al., 2006; Vinnari & Laine, 2017). Baseada em teorias organizacionais e sociológicas, essa abordagem diferencia-se de relatórios descritivos convencionais. Fornece informações alternativas e independentes da performance social e ambiental de uma companhia, questionando a qualidade da informação (Spence, 2009; Boiral, 2013).
Counter accounts são produzidos por grupos sociais cujos direitos e interesses são afetados por ações corporativas. Expressam o ponto de vista de grupos marginalizados, promovendo reivindicações a atores de maior poder, como governos ou grandes corporações (Apostol, 2015; Lima et al., 2024). Esse potencial expõe grupos hegemônicos e complementa a contabilidade organizacional no contexto social e político.
2.2. Análise crítica do discurso
A Análise Crítica do Discurso (ACD) constitui um modelo teórico-metodológico diversificado com amplo escopo de aplicação (Leitch & Palmer, 2010). A ACD relaciona poder e recursos linguísticos, desnaturalizando crenças e comportamentos que sustentam estruturas de dominação (Resende & Ramalho, 2004).
Originada na Linguística Crítica dos anos 1970 na Universidade de East Anglia, a ACD integra análise linguística textual com teoria social, baseando-se na Linguística Sistêmica-Funcional (Eggins, 1994; Halliday & Matthiessen, 2013). Fairclough (2001) propõe um modelo tridimensional de análise: texto, prática discursiva e prática social. A análise textual envolve vocabulário, gramática, coesão e estrutura textual, enquanto a prática discursiva examina processos de produção, distribuição e interpretação dos textos. Já a prática social foca em ideologia e hegemonia, analisando como o discurso contribui para a mudança social e cultural. Ele enfatiza a importância de desnaturalizar o discurso, questionando representações ideológicas dominantes e revelando relações de poder subjacentes (Fairclough, 2001).
2.3. Importância da Amazônia
A Amazônia, a maior floresta tropical do mundo, é crucial para a regulação do clima global e abriga uma biodiversidade incomparável. Ela desempenha um papel vital na absorção de dióxido de carbono e na produção de oxigênio, influenciando significativamente os padrões climáticos globais (Lovejoy & Nobre, 2018). Além disso, é essencial para os ciclos hidrológicos e sustenta inúmeras comunidades indígenas que dependem diretamente de seus recursos naturais para sua sobrevivência cultural e física (Wang et al., 2018).
A construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, localizada no Rio Xingu, ilustra os impactos negativos que grandes projetos de infraestrutura podem ter na Amazônia. O desmatamento para a criação de reservatórios e infraestrutura resultou na destruição de grandes áreas de floresta, comprometendo a biodiversidade local e ameaçando a extinção de diversas espécies (Castello & Macedo, 2015; Lees et al., 2016). Esse desmatamento não só degrada o ecossistema, mas também agrava os desafios de proteger a biodiversidade enquanto se busca o desenvolvimento econômico (Benchimol & Peres, 2015).
Além do desmatamento, Belo Monte alterou significativamente o regime hidrológico do Rio Xingu. A construção de barragens e o desvio de grandes volumes de água para a geração de energia reduziram drasticamente a vazão do rio em certos trechos, impactando a biodiversidade aquática e interrompendo ciclos naturais de reprodução e migração de espécies de peixes essenciais para as comunidades ribeirinhas e indígenas (Castello & Macedo, 2015; Forsberg et al., 2017). Esses impactos destacam os desafios ambientais da energia hidrelétrica na Amazônia.
As comunidades indígenas da região foram particularmente afetadas, com impactos diretos sobre os recursos naturais que sustentam suas práticas tradicionais de pesca e agricultura (Batista, 2024; Magalhães et al., 2016). O aumento do desmatamento e a pressão sobre os recursos locais exacerbam conflitos sociais, degradando significativamente as condições de vida dessas populações (Bratman, 2015). Esses efeitos demonstram a vulnerabilidade dessas comunidades frente a grandes projetos de infraestrutura, muitas vezes realizados sem consulta adequada (Tritsch & Arvor, 2016).
Outro impacto significativo de Belo Monte é a emissão de gases de efeito estufa, resultado da decomposição da vegetação submersa nos reservatórios, que libera metano, um gás muito mais potente que o dióxido de carbono (Lessa et al., 2015). Isso contradiz a ideia de energia limpa frequentemente associada às hidrelétricas e revela as complexidades da expansão da energia hidrelétrica na Amazônia (Stickler et al., 2013).
Em suma, os impactos de Belo Monte destacam as graves consequências de intervenções em ecossistemas tão delicados como a Amazônia, sublinhando a necessidade urgente de políticas que equilibrem desenvolvimento econômico com preservação ambiental e justiça social (Lees et al., 2016).
Pelo exposto anteriormente, se delineia um conflito em que de um lado encontram-se os defensores da necessidade de uma maior geração de energia, capitaneados pelo Estado brasileiro em associação com a Norte Energia, atendendo aos interesses das corporações eletrointensivas. Do outro, se concentram os pequenos agricultores; pescadores; trabalhadores extrativistas; as comunidades indígenas e demais membros das comunidades ribeirinhas, apoiados por organizações nacionais e internacionais como a Amazon Watch, a International Rivers e a Salve a Floresta, entre outras. Este segundo grupo tem forte foco na sustentabilidade local e demonstra grande preocupação com a biodiversidade amazônica, chamando atenção para a queda na ictiofauna em função da redução na vazão do rio, com reflexos na população da região - gerando fome, desemprego e desesperança. O grupo destaca que há muito tempo a região é reconhecida por sua importância ambiental e se movimenta contra a operação da usina, lastreado por inúmeros estudos que o respaldam a declarar que a atividade de Belo Monte é um ecocídio - entendido aqui como qualquer ato facultativo implementado com a consciência de que existe um alta probabilidade de causar danos graves e duradouros ao meio ambiente (Movimento Xingu Vivo para Sempre [MXVPS], 2022).
3. METODOLOGIA
Este estudo, com objetivos exploratórios e descritivos, busca investigar como os relatórios de sustentabilidade da Norte Energia refletem a ideologia dominante e retratam de forma detalhada as características observadas, sem interferir no ambiente em que ocorrem (Taherdoost, 2022). Adotando uma abordagem qualitativa, a pesquisa visa compreender a natureza de um fenômeno social complexo, o que exige uma combinação de diversas posições filosóficas e uma análise que transcenda quadros rígidos de pensamento (Pernecky, 2016). Filosoficamente, o estudo se posiciona como crítico e transformativo. A abordagem crítica considera os contextos interdisciplinares e foca em questões de poder, discursos dominantes e justiça social. Como argumenta Leavy (2017, p. 13), a pesquisa crítica é um “empreendimento político com capacidade de empoderar e emancipar”, colocando em primeiro plano as experiências das margens sociais. Já a abordagem transformativa, alicerçada na teoria crítica, lida com questões de raça, direitos indígenas e justiça social, promovendo uma ação social consciente (Leavy, 2017).
A ACD é a metodologia central utilizada para examinar a linguagem nos relatórios de sustentabilidade da Norte Energia e entre os atores sociais envolvidos. Baseando-se no modelo de Fairclough (2001), a pesquisa é descritivo-interpretativa e integra as dimensões textual, discursiva e social do discurso, permitindo múltiplas interpretações. O corpus da pesquisa inclui cinco relatórios de sustentabilidade publicados anualmente pela Norte Energia S.A. e com livre acesso no site da empresa - https://www.norteenergiasa.com.br/ -, relativos aos anos de 2017 a 2021 e divididos em tópicos que abrangem temas sociais, ambientais e relações com povos indígenas, entre outros. Este recorte temporal foi escolhido porque abrange o período após o início da operação comercial da usina, em 2016.
Como contraponto discursivo, este trabalho traz as vozes das populações originárias - bem como tradicionais - que oferecem uma visão alternativa de desenvolvimento, mediadas por documentos trazidos pelo Instituto Socioambiental e pelo Conselho Indigenista Missionário e acrescidos por amplo material bibliográfico que inclui - mas não se esgota - livros, artigos e matérias jornalísticas de diversas fontes.
Considerando a tríade de texto, prática discursiva e prática social, conforme definido por Fairclough (2001), o estudo busca desvelar os mecanismos ideológicos que moldam as representações linguísticas, influenciando as práticas sociais. A abordagem de Fairclough destaca a interação entre linguagem, poder e ideologia, oferecendo uma análise abrangente de como o discurso constrói e reflete práticas sociais e relações de poder (Handayani et al., 2018).
Para Fairclough (2001), a análise crítica de discurso se divide em três momentos: a análise textual, análise da prática discursiva e a análise da prática social. A análise textual se centrou na volatilidade temporal que desconstrói o padrão de tempo, impedindo comparações. Na análise da prática discursiva foram identificados temas que vão ao encontro de preocupações socioambientais históricas, a saber: florestas e aquecimento global, água, biodiversidade e segurança das populações. Por fim, a análise da prática social dos relatórios eivados por construções ideológicas expõe uma obra de engenharia cuja operação causa aquecimento via emissão de gases de efeito estufa (GEEs) associados ao desmatamento, perda de biodiversidade, redução quantitativa e qualitativa de água e desagregação social na região de Altamira.
Os conceitos de ideologia e hegemonia são essenciais para a investigação do discurso como prática social. Ideologia, como concebida por Marx e Engels, representa um conjunto de ideias que ocultam suas origens nos interesses de grupos específicos (Ferguson et al., 2009). Fairclough (2001) trata a ideologia como central na ACD, examinando como o discurso reflete e reproduz relações de poder e práticas sociais. O conceito de hegemonia é crucial para desvendar as conexões entre as práticas sociais e a expressão verbal, permitindo analisar como o discurso pode reproduzir, reestruturar ou desafiar hegemonias preexistentes na sociedade (Fairclough, 2001). Além disso, a discussão é enriquecida pelos conceitos de racionalidade substantiva e instrumental, que ajudam a correlacionar os discursos apresentados aos fatos evidenciados (Sell, 2012).
4. ANÁLISES
4.1. Análise textual - escrevendo em números
Os números desempenham um papel significativo como signos dentro do discurso, diferentemente das palavras, que expressam juízos, sentimentos e ações. Enquanto as palavras dependem da relação entre sujeito e objeto para construir significado, os números são considerados um conhecimento universal do objeto, não necessitando da presença do objeto para existirem (Lima, 2012). Essa distinção ressalta a natureza objetiva e independente dos números em relação ao contexto em que são utilizados, contrastando com a natureza mais subjetiva e contextual das palavras.
Os recentes debates sobre o papel das organizações em mitigar os impactos ambientais e sociais destacam a importância dos relatórios de sustentabilidade. A eficácia desses relatórios está na forma como são elaborados e comunicados. Os números, embora possam transmitir uma falsa sensação de certeza, são fundamentais para a credibilidade e objetividade da comunicação (Seife, 2012). A transição do Positivismo para o Racionalismo valoriza a quantificação e mensuração como formas de compreender a realidade (Choueri & Nascimento, 2019; Haslam et al., 2019).
Números são considerados conhecimento universal do objeto, diferentemente das palavras, que dependem do contexto para construir significado (Lima, 2012). A ausência de dados essenciais nos relatórios compromete a transparência e a confiança dos stakeholders. Portanto, é essencial entender como os números são utilizados para comunicar os impactos ambientais e sociais das organizações.
Esta seção analisa o uso de dados quantitativos nos relatórios de sustentabilidade da Norte Energia, explorando como esses elementos influenciam a comunicação e a interpretação da sustentabilidade corporativa. A quantificação de indicadores socioambientais é uma prática complexa, que pode tanto esclarecer quanto obscurecer a extensão dos impactos e esforços de sustentabilidade. Um ponto preliminar a ser considerado é a adoção do padrão Global Reporting Initiative (GRI) na confecção do relatório de sustentabilidade, o qual estipula métricas e indicadores, demandando a divulgação de dados quantitativos. Essas métricas perpassam um leque extenso de temáticas, incluindo, mas não se limitando, a emissões de gases de efeito estufa, consumo hídrico, equidade de gênero e práticas laborais. Esse elemento constitui um fator determinante que influencia tanto a articulação da narrativa quanto a modalidade de apresentação das informações, primordialmente mediante expressões quantificadoras.
Embora métricas ofereçam uma base objetiva, elas podem comprometer a assimilação de informações pelos stakeholders.
Os relatórios da Norte Energia frequentemente utilizam números para enfatizar eficiência e resultados, conforme exemplificado em diversos excertos oriundos dos relatórios analisados:
2017: A empresa destaca o parcelamento de uma multa de R$ 740 milhões como um sucesso na gestão de recursos, sem detalhar os impactos do risco hidrológico.
2018: Menciona a geração de 12.062 GWh de energia, mas sem parâmetros comparativos, dificultando a avaliação da eficiência.
2019: Enfatiza o uso de 3 milhões de metros cúbicos de concreto, sem discutir os impactos ambientais ou as ações mitigadoras.
2020: Relata investimentos de R$ 6,3 bilhões em questões socioambientais, mas sem detalhar os resultados concretos dessas ações.
2021: Coleta de 57 mil amostras de água é destacada, mas faltam detalhes sobre os parâmetros de qualidade e os impactos observados.
Esses exemplos ilustram a predominância da racionalidade instrumental, focada em resultados quantificáveis, muitas vezes à custa de uma compreensão mais holística dos impactos socioambientais. Essa predominância revela que a ênfase nos números pode obscurecer a transparência e limitar a compreensão dos verdadeiros impactos das operações da empresa.
Ao apresentar números extensos, estatísticas, gráficos e informações complexas, esses elementos podem aumentar a credibilidade e fornecer uma base objetiva (Aquino, 2022). No entanto, é necessário reconhecer que, embora as métricas ofereçam uma base objetiva, elas não transmitem a história completa. Os números e as expressões quantificadoras por si só podem ter limitações na transmissão do real impacto e contexto das ações e práticas de uma organização (Aquino, 2022).
Os relatórios de sustentabilidade da Norte Energia utilizam números para construir uma narrativa de eficiência e responsabilidade, mas frequentemente omitem detalhes cruciais sobre os impactos reais das operações. A análise destaca a necessidade de integrar perspectivas de racionalidade substantiva, que considerem os valores e necessidades das comunidades afetadas, promovendo um desenvolvimento mais justo e sustentável.
4.2. Análise da prática discursiva
Parte superior do formulárioA análise da prática discursiva nos relatórios de sustentabilidade da Norte Energia, responsável pela Usina Hidrelétrica de Belo Monte, revela uma estratégia comunicativa meticulosamente construída para moldar percepções e reforçar uma ideologia de desenvolvimento marcada pela racionalidade instrumental. Ao longo dos anos, de 2017 a 2021, a empresa utilizou seus relatórios para apresentar suas operações sob uma luz favorável, minimizando os impactos negativos e, ao mesmo tempo, perpetuando uma visão de progresso alinhada aos interesses econômicos dominantes.
A construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, considerada um dos maiores projetos de infraestrutura do Brasil, é apresentada pela Norte Energia como um marco de desenvolvimento sustentável, como em sua própria declaração de missão de “geração de energia e desenvolvimento sustentável para o crescimento do Brasil” (Norte Energia, 2017, p. 3). Entretanto, uma análise crítica do discurso empregado nos relatórios da empresa revela que essa narrativa é cuidadosamente elaborada para legitimar as ações da empresa, mascarando os impactos socioambientais adversos.
Na análise frankfurtiana, com o objetivo de identificarem o desencantamento do mundo, os autores Adorno e Horkheimer tencionam a relação entre natureza e entendimento humano, tida como responsável pela divisão do trabalho e pela dominação e prevalência do entendimento sobre a natureza (Adorno & Horkheimer, 1985; Ramos, 2019). Segundo Adorno e Horkheimer (1985, p. 5), “o que os homens querem aprender da natureza é como empregá-la para dominar completamente a ela e aos homens”. Como se nada mais importasse, nem mesmo a autoconsciência, mas apenas o saber capaz de destruir os mitos, cujo elemento básico sempre foi antropomorfismo - a projeção do subjetivo na natureza (Adorno & Horkheimer, 1985).
Nos relatórios de sustentabilidade, a prática discursiva é evidente na maneira como o desmatamento é abordado. O desmatamento, uma das consequências mais devastadoras da construção da usina, é descrito de forma técnica e impessoal, com foco nas medidas de compensação e monitoramento ambiental. Termos como “reflorestamento”, “compensação ambiental” e “monitoramento contínuo” são usados para criar uma imagem de controle e responsabilidade. Por exemplo, “como o processo de reflorestamento contará com mudas de espécies nativas produzidas com sementes da própria região” (Norte Energia, 2018, p. 50).
No entanto, essa abordagem esconde a magnitude real da destruição ambiental de uma obra que deslocou dezenas de milhares de indivíduos; mexeu no curso do rio; impactou a fauna e a flora; matou mais de 85 mil peixes em um período de apenas 4 anos; deslocou homens para o extrativismo ilegal, acelerando o desmatamento; afetou o ciclo hidrológico e elevou a emissão de GEEs, entre outros efeitos deletérios (Chade, 2024). A linguagem técnica, ao invés de fornecer uma visão clara e honesta dos impactos, serve para suavizar a percepção pública, minimizando a gravidade do desmatamento e, assim, neutralizando potenciais críticas. Essa estratégia reflete o que Fairclough (2001) descreve como a manipulação discursiva para sustentar relações de poder desiguais.
Além do desmatamento, a questão da água na região afetada pela usina é outro aspecto central nos relatórios de sustentabilidade da Norte Energia. A empresa adota uma abordagem quantitativa para relatar suas ações relacionadas à qualidade da água, enfatizando a conformidade com as normas regulatórias, mas não cita a norma nem os limites normativos e a coleta de dados como prova de sua responsabilidade ambiental. Assim, a empresa afirma que “em 2012, foram realizadas 7.135 medições de níveis de água subterrânea em poços e cacimbas em 101 pontos diferentes. Também, foram realizadas 1.690 coletas de amostras para monitoramento da qualidade da água subterrânea” (Norte Energia, 2019, p. 25) - mas não destaca quais regulamentos normativos ou científicos embasam a quantidade coletada.
Essa abordagem quantitativa falha em abordar as consequências reais das operações da usina sobre as comunidades locais. A redução da vazão do Rio Xingu, por exemplo, é um problema grave que afeta diretamente a subsistência das comunidades indígenas e ribeirinhas que dependem desse recurso. Com o barramento definitivo do rio em 2015, a quantidade, velocidade e o nível da água na região não derivam mais do fluxo natural do Xingu, mas dependem do controle da Norte Energia. Por meio do chamado Hidrograma de Consenso, a empresa controla o volume de água que passará pelas comportas da usina, descendo pela Volta Grande do Xingu (Instituto Humanitas Unisinos, 2018). A notícia apontou que a medida de mitigação deveria começar a ser implementada no ano de 2019, quando foi inaugurada a última das turbinas da hidrelétrica. Além disso, destacou o papel do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que estabeleceu um rigoroso plano de monitoramento dos impactos derivados do controle de vazão prevista no Hidrograma durante 6 anos, de 2019 a 2025 (Instituto Humanitas Unisinos, 2018).
Essa ênfase em aspectos quantitativos do monitoramento reflete uma tendência identificada por autores como Boiral (2013), que observam como as empresas utilizam a quantificação para desviar a atenção das questões qualitativas mais profundas e problemáticas.
A biodiversidade é abordada de maneira superficial nos relatórios da Norte Energia. Embora a empresa destaque seus esforços para proteger espécies ameaçadas e restaurar habitats degradados, a análise crítica revela uma desconexão significativa entre as ações relatadas e a realidade. A retórica da preservação é usada para criar uma fachada de responsabilidade ambiental, enquanto os impactos reais sobre a biodiversidade são amplamente ignorados. A empresa enfatiza que “a Usina assumiu um papel estratégico para a preservação ambiental da região, na inclusão social e desenvolvimento econômico dos municípios mapeados nas áreas de Influência Direta (AID)” (Norte Energia, 2019, p. 8). Por outro lado, relatos de ribeirinhos destacavam eventos significativos de mortandade de peixes e impactos negativos sobre as comunidades: “peixes começaram a morrer presos na Volta Grande. ‘Eles não conseguiram sobreviver no ambiente mais quente e com níveis mais baixos de oxigênio na água remanescente’, disse Costa” (Branford, 2016).
Esta prática discursiva, que busca suavizar a percepção pública dos danos ambientais, é uma estratégia para manter a legitimidade das operações da empresa, uma vez que, na realidade, as ações de conservação têm pouco efeito sobre a recuperação dos ecossistemas afetados. A utilização de termos como “proteção” e “restauração” é característica de uma retórica que, embora pareça positiva, mascara os impactos negativos e perpetua a narrativa de que a empresa está agindo de maneira responsável, mesmo quando as evidências sugerem o contrário (Boiral, 2013).
Outro ponto observado foi a questão da violência contra as comunidades locais e indígenas. Os relatórios de sustentabilidade da empresa tratam essa questão de maneira sub-representada, com menções vagas e minimizadas aos conflitos e às violações de direitos humanos. Essa abordagem discursiva serve para desviar a atenção dos problemas graves enfrentados pelas comunidades, obscurecendo a verdadeira extensão dos impactos sociais da construção da usina. Ao minimizar a gravidade da violência e dos conflitos, a empresa perpetua relações de poder desiguais, não dando voz às populações afetadas e, ao mesmo tempo, construindo uma narrativa que sugere que os impactos sociais da usina são gerenciáveis e controláveis. A marginalização dessas vozes dissidentes e a manipulação discursiva para legitimar as operações da empresa refletem o que Fairclough (2001) identifica como práticas discursivas que reforçam a hegemonia e a dominação.
A prática discursiva da Norte Energia não se limita à forma como os impactos ambientais e sociais são minimizados, mas também abrange a maneira como a empresa constrói sua própria imagem de responsabilidade e compromisso com o desenvolvimento sustentável. Os relatórios são usados como ferramentas para reforçar uma ideologia de desenvolvimento que está profundamente enraizada em uma visão de progresso tecnológico e econômico.
Em conclusão, a prática discursiva nos relatórios de sustentabilidade da Norte Energia é uma manifestação clara de como o discurso corporativo pode ser utilizado para legitimar e perpetuar uma ideologia de desenvolvimento baseada na racionalidade instrumental. Através de uma linguagem técnica, a empresa consegue minimizar os impactos negativos de suas operações, apresentando suas ações como ambientalmente responsáveis e socialmente benéficas. No entanto, a análise crítica do discurso revela que essa narrativa é construída para ocultar a realidade dos danos causados e para fazer com que as vozes das comunidades afetadas não sejam ouvidas. A prática discursiva da Norte Energia, portanto, não apenas reflete, mas também reforça a hegemonia de uma ideologia de desenvolvimento que privilegia o crescimento econômico em detrimento das considerações sociais e ambientais. Essa análise sublinha a importância de adotar uma perspectiva crítica que revele as contradições e as limitações de tal abordagem, promovendo um desenvolvimento mais inclusivo e sustentável.
4.3. Análise da prática social
A análise da prática social presente nos relatórios de sustentabilidade da Norte Energia, empresa responsável pela Usina Hidrelétrica de Belo Monte, oferece uma compreensão de como essas práticas estão intimamente ligadas às estruturas de poder e ideologias dominantes que regem o desenvolvimento econômico no Brasil. Através dessa análise, podemos observar como a racionalidade instrumental, que prioriza o crescimento econômico e o progresso tecnológico, muitas vezes se sobrepõe às considerações ambientais e sociais, resultando em práticas que perpetuam desigualdades e injustiças, especialmente no que diz respeito às comunidades indígenas e ribeirinhas diretamente afetadas pelo empreendimento.
A construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, um dos maiores projetos de infraestrutura já realizados no Brasil, tem sido amplamente promovida como uma solução para as necessidades energéticas do país, sendo frequentemente apresentada como uma fonte de “energia limpa”. No entanto, essa narrativa, difundida nos relatórios de sustentabilidade da Norte Energia, é profundamente contraditória quando confrontada com a realidade dos impactos ambientais e sociais causados pela usina. A análise crítica do discurso e da prática social evidencia como esses impactos são sistematicamente minimizados ou ocultados nos documentos corporativos, enquanto a usina é retratada como um projeto essencial para o desenvolvimento econômico do país (Fearnside, 2017). Para isso tem-se que encarar quatro questionamentos, apresentados nos subtópicos a seguir.
4.3.1. Hidrelétricas como energia limpa: como considerá-las assim em vista da tumba negra da floresta?
Especificamente sobre o desmatamento em terras indígenas, o relatório do observatório De Olho nos Ruralistas revela uma realidade alarmante e complexa envolvendo a sobreposição de fazendas em terras indígenas no Brasil, com implicações sérias para os direitos territoriais dos povos indígenas, a preservação ambiental e a estabilidade social. Os dados obtidos a partir do cruzamento de bases de dados fundiários do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) lançam luz sobre uma situação que exige atenção imediata e ação efetiva, mostrando como as hegemonias econômicas influenciam diretamente as decisões sobre o uso da terra e o desmatamento (Castilho et al., 2023).
A identificação de 1.692 sobreposições de fazendas em terras indígenas, totalizando 1,18 milhão de hectares, equivale a uma área do tamanho do Líbano. A preocupante constatação de que 95,5% dessas sobreposições ocorrem em territórios pendentes de demarcação ressalta a vulnerabilidade dessas áreas diante da expansão agropecuária (Castilho et al., 2023).
A análise da utilização da área sobreposta revela que gigantes dos setores de grãos, carne, madeira, açúcar, etanol e fruticultura emergem como os principais responsáveis por essas convergências territoriais, com a presença de grupos multinacionais notáveis como Bunge, Amaggi, Bom Futuro, Lactalis, Cosan, Ducoco e Nichio (Castilho et al., 2023).
Essa questão é significativa, já que uma importante contribuição para o aquecimento global é o desmatamento. Atualmente esse processo de desmatamento atinge com grande intensidade as florestas tropicais, entre elas a amazônica, levando a um patamar de derrubada de 35 campos de futebol por minuto no período de 2000 a 2009 (Nelles & Serrer, 2020).
Segundo Marques (2018) um aquecimento superior a 3 ºC é considerado desastroso, superando uma série de limites que engloba o fim das monções da África Ocidental, o colapso das geleiras da Antártida Ocidental e a morte de diversas florestas, inclusive a amazônica, entre outras consequências nefastas. Um aumento que supere os 5 ºC é considerado como catastrófico, com cenários desconhecidos, representando uma realidade não vivenciada nos últimos 20 milhões de anos que trará uma ameaça existencial para a maioria dos habitantes do planeta.
4.3.2. A fartura aparente de água: com esse “marzão” de água doce, pode “fartar” água?
A prática social associada à gestão dos recursos hídricos na região também reflete a mesma racionalidade instrumental que permeia o discurso oficial da Norte Energia. A usina de Belo Monte foi construída em uma região onde a água é um recurso abundante e vital para as comunidades locais, especialmente para as populações indígenas e ribeirinhas que dependem diretamente do Rio Xingu para sua subsistência. Os relatórios de sustentabilidade enfatizam os esforços da empresa para monitorar e controlar a qualidade da água, utilizando uma abordagem quantitativa que destaca a coleta de dados e a conformidade com normas regulatórias. No entanto, essa abordagem quantitativa falha em capturar os impactos significativos que as operações da usina têm sobre o regime hidrológico local e sobre as comunidades que dependem desses recursos. A redução da vazão do Rio Xingu, resultante da construção dos reservatórios, compromete a biodiversidade aquática e as práticas tradicionais de pesca e agricultura das comunidades indígenas e ribeirinhas, impactos que são minimizados ou ignorados nos relatórios (Pezzuti et al., 2018).
A subvalorização dos ecossistemas aquáticos e a gestão dos recursos hídricos, conforme apontado no relatório High Cost of Cheap Water, produzido pela World Wide Fund for Nature (WWF), é uma preocupação crítica que vai além do reconhecimento da água como um recurso vital. Essa subvalorização reflete uma falha mais profunda em reconhecer e integrar os benefícios ecológicos, culturais e sociais proporcionados por ecossistemas aquáticos saudáveis. Em contraste com a abordagem da Norte Energia, que parece tratar os recursos hídricos mais como commodities ou insumos para a produção de energia, o referido relatório argumenta pela necessidade de uma visão mais holística que reconhece os ecossistemas de água doce como sistemas dinâmicos e essenciais para o desenvolvimento da vida (WWF, 2019).
Outro documento - o “Atlas Águas” - segue a mesma linha ao enfatizar a interconectividade dos sistemas hídricos e sua vulnerabilidade às mudanças climáticas e atividades humanas, ressaltando a importância de uma gestão que vai além do monitoramento técnico. Enquanto os relatórios da Norte Energia focam em ações específicas, como coleta de amostras e monitoramento da qualidade da água, o Atlas sugere a necessidade de uma estratégia mais abrangente que considere os impactos a longo prazo e as interações dinâmicas entre diferentes fatores ambientais e sociais. Isso implica em uma abordagem que reconheça a água não apenas como um recurso a ser gerenciado, mas como parte integrante de ecossistemas complexos e de comunidades humanas que dela dependem (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico [ANA], 2021).
4.3.3. Árvores e bichos de todos os tipos: essa diversidade não tem mais fim?
A Amazônia tem uma biodiversidade impressionante; apesar de toda a devastação, o bioma abriga ainda cerca de 400 bilhões de árvores. Apesar das lacunas de conhecimento científico, há um consenso de que essa imensidão verde abrigue de 10% a 15% da biodiversidade terrestre do planeta, e novas espécies são descobertas ano após ano. Em uma única década o projeto Amazônia Viva revelou 637 novas espécies de plantas, 216 de anfíbios, 39 de mamíferos e milhares de invertebrados, entre outras descobertas. Em apenas um hectare da floresta podem ser encontradas mais espécies de árvores que as existentes em toda a Europa. (Marques, 2023).
A importância inquestionável da biodiversidade para as comunidades indígenas é reconhecida na literatura científica (Choueri & Nascimento, 2019; Reis et al., 2017; Turíbio et al., 2022), sinalizando um alinhamento com a racionalidade substantiva. A interdependência entre a biodiversidade local e os modos de vida tradicionais ressalta uma visão que vai além de meros aspectos econômicos, enfatizando valores culturais e sociais intrínsecos.
As vozes indígenas expressam claramente os impactos negativos para a biodiversidade. Bel Juruna, do povo Juruna, afirmou: “Isso será um cemitério de árvores; isso será um cemitério de peixes. E assim nós, Juruna, estaremos aqui lutando para que nós também não nos tornemos um cemitério em nossa aldeia” (Bascomb & Higgins, 2021).
A prática social em torno da biodiversidade na área de Belo Monte é particularmente reveladora das limitações da abordagem da Norte Energia. Os relatórios de sustentabilidade da empresa frequentemente destacam as ações de preservação e as parcerias com instituições de pesquisa para monitorar a fauna e a flora local. No entanto, esses esforços são insuficientes para compensar os danos causados pela construção da usina. A análise crítica dos documentos revela que essas medidas de conservação são, em grande parte, simbólicas e servem mais para criar uma imagem de responsabilidade ambiental do que para efetivamente proteger a biodiversidade. A desconexão entre as ações relatadas e os resultados observados no terreno demonstra como as práticas sociais associadas ao projeto de Belo Monte são moldadas por uma racionalidade instrumental que prioriza a legitimação das operações da empresa em detrimento da preservação ambiental (Boiral, 2013).
4.3.4. Avanço de um mundo sobre o outro: isso pode ser considerado progresso?
Belo Monte revela um impacto significativo e desestruturante sobre as comunidades locais, especialmente os povos indígenas, que viram suas vulnerabilidades aumentarem com a construção da usina (Ribeiro & Morato, 2020). A controvérsia em torno de Belo Monte foi encerrada com a demarcação política de que a usina é sustentável, apoiada por diretrizes científicas e estudos sobre o rio, perpetuando um modelo predatório de apropriação da natureza (Prates & Almeida, 2021).
A cidade de Altamira carrega uma série de impactos negativos, desde antes da constituição do lago, que inclui aumento no consumo de drogas, desemprego elevado, altas taxas de homicídio e lutas entre facções criminosas (Dolce, 2023). Como contraponto a seu efeito desestruturante, a usina coloca em seus relatórios uma série de ações no âmbito social que incluem infraestrutura de água e esgoto, serviços de saúde e segurança pública, entre outras - muitas delas de vulto insignificante. Trata-se de uma clara estratégia utilizada em processos de gerenciamento de imagem.
Povos indígenas e ribeirinhos declaram viver uma guerra pela água em função de Belo Monte. Dezenas de milhares de pessoas foram deslocadas, mais de 85 mil peixes foram mortos, madeireiros ilegais se instalaram na região e os rios foram impactados. As linhas de energia rasgam a floresta, mas as comunidades vivem no escuro. Uma área alagada na região, que outrora era de grande beleza, é conhecida hoje como cemitério de floresta. A dor daqueles que viviam em comunhão com o rio solta um brado já conhecido: o “rio era meu pai e minha mãe. Hoje, tudo acabou” (Batista, 2024).
A análise da prática social aplicada aos relatórios de sustentabilidade da Norte Energia revela a forma como a empresa tenta neutralizar as críticas e resistências ao projeto de Belo Monte. Os relatórios frequentemente apresentam as ações da empresa em termos positivos, destacando os esforços de diálogo com as comunidades locais e as iniciativas de compensação ambiental. No entanto, essa narrativa contrasta fortemente com os relatos das comunidades indígenas e ribeirinhas, que apontam para uma realidade de marginalização, violência e violação de direitos. A prática social da empresa, nesse contexto, envolve a construção de uma imagem pública de responsabilidade social que não corresponde às experiências vividas pelas populações afetadas (Pezzuti et al., 2018).
5. CONCLUSÕES
O presente estudo teve como objetivo analisar criticamente o discurso apresentado nos relatórios socioambientais da Norte Energia, empresa responsável pela Usina Hidrelétrica de Belo Monte.
A análise buscou revelar como as práticas discursivas refletiram a ideologia e hegemonia dominante, utilizando o quadro teórico da contabilidade contra-hegemônica.
Desse modo, foi adotado como modelo de análise a abordagem de Fairclough (2001), o qual compreende o evento discursivo simultaneamente em três dimensões: como um texto, uma prática discursiva e uma prática social. Tais dimensões estruturaram a análise que, tendo os povos indígenas como elemento focal, se dividiu nos temas desmatamento, água, biodiversidade e violência.
Na análise textual revelou-se a predominância do discurso baseado em números, ressaltando a racionalidade instrumental, que prioriza a eficiência e os resultados mensuráveis, em detrimento de uma racionalidade substantiva, que consideraria os valores culturais e sociais das comunidades impactadas.
Na análise da prática discursiva, foi evidenciado como o discurso dos relatórios de sustentabilidade são construídos para legitimar as práticas da empresa. A análise dos relatórios de sustentabilidade da Norte Energia revelou que a prática discursiva da empresa é parte de um esforço mais amplo para manter e reforçar a hegemonia de uma ideologia de desenvolvimento que ignora as necessidades e os direitos das comunidades locais. Ao adotar uma linguagem técnica e burocrática, a empresa consegue criar uma narrativa que parece legítima e responsável, mas que, na verdade, serve para mascarar os impactos negativos de suas operações. Essa estratégia de comunicação é eficaz em neutralizar críticas e em manter a legitimidade das operações da empresa, mesmo quando as evidências sugerem que essas operações estão causando danos significativos ao meio ambiente e às populações locais. A prática discursiva da empresa, portanto, é uma ferramenta poderosa para a manutenção do status quo, perpetuando relações de poder desiguais e marginalizando as vozes das comunidades afetadas (Fairclough, 2001; Boiral, 2013).
A construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte é um exemplo claro de como as práticas sociais associadas a grandes projetos de infraestrutura são moldadas por interesses econômicos e políticos que frequentemente entram em conflito com as necessidades e os direitos das comunidades locais. A análise dos relatórios de sustentabilidade da Norte Energia revela que, embora a empresa se esforce para apresentar suas operações como responsáveis e sustentáveis, a realidade é que as práticas sociais associadas à usina muitas vezes perpetuam desigualdades e injustiças sociais. A imposição de projetos como Belo Monte, sem o devido respeito às vozes e aos conhecimentos das populações afetadas, exemplifica como a racionalidade instrumental e a ideologia de desenvolvimento hegemônica operam para consolidar o poder econômico em detrimento da justiça social e ambiental (Fearnside, 2017; Glass, 2016).
Os relatórios de sustentabilidade da Norte Energia, portanto, não são apenas ferramentas de comunicação corporativa; eles funcionam como mecanismos para a disseminação de uma ideologia hegemônica de desenvolvimento que justifica e naturaliza os impactos ambientais e sociais da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. A análise crítica dessas práticas sociais revela como a racionalidade instrumental é utilizada para construir uma narrativa que legitima as operações da empresa, ao mesmo tempo que minimiza ou oculta os danos causados. Essa análise também evidencia a importância de adotar uma perspectiva crítica e inclusiva que valorize a racionalidade substantiva e integre as vozes e os conhecimentos das comunidades afetadas.
Esta abordagem discursiva é uma manifestação da hegemonia da ideologia de desenvolvimento predominante, que prioriza a eficiência econômica e a conformidade regulatória sobre considerações sociais e ambientais mais amplas. Conforme Fairclough (2001) argumenta, o discurso não é apenas um reflexo da realidade, mas uma prática que ajuda a construir e manter relações de poder e dominação.
De outra forma, a análise dos relatórios mostrou que a apresentação técnica e a ênfase em medidas compensatórias e monitoramento quantitativo servem para manter a hegemonia da narrativa corporativa, minimizando a visibilidade das vozes dissidentes e das críticas. Isso é evidente na forma como os impactos negativos são marginalizados ou omitidos, e os sucessos técnicos são amplificados, perpetuando a dominação ideológica e econômica sobre as comunidades afetadas.
Este artigo tem como limitações: a não inclusão de outros canais de comunicação institucional, como redes sociais e campanhas publicitárias; e a falta de acesso a documentos internos de órgãos fiscalizadores, o que poderia aumentar a profundidade da análise.
Pesquisas futuras poderiam estender a análise até a atualidade, avaliando a ocorrência ou não de mudanças para um enfoque mais holístico da construção discursiva. Esta pesquisa pode ter desdobramentos que incluam a coleta de informações, por meio de entrevistas direcionadas aos stakeholders menos empoderados, relativas à percepção de ocorrência ou não de desenvolvimento, entendido como um crescimento não só na esfera econômica, mas também nos campos social e ambiental. Estudos comparativos envolvendo diferentes projetos de infraestrutura em diversas regiões poderiam fornecer uma visão mais ampla dos impactos causados pelas práticas empresariais. A integração de outras teorias críticas também poderia enriquecer a análise e fornecer novas perspectivas sobre os desafios da sustentabilidade e responsabilidade corporativa. Além disso, ampliar o corpus para incluir outras fontes de comunicação corporativa e analisar o discurso de organizações relacionadas ao funcionamento da usina que se encontram em polos opostos do conflito.
AGRADECIMENTOS
Este trabalho contou com apoio financeiro da CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior.
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DISPONIBILIDADE DE DADOS
Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.
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Pareceristas:
Diego Mota Vieira (Universidade de Brasília, Brasília / DF - Brasil) https://orcid.org/0000-0003-1275-1648
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Pareceristas:
Maria Elisabete Pereira dos Santos (Universidade Federal da Bahia, Salvador / Bahia - Brasil) https://orcid.org/0000-0001-8565-1125
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Relatório de revisão por pares:
O relatório de revisão por pares está disponível neste link https://periodicos.fgv.br/rap/article/view/94495/88065
Editado por
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Editora-chefe:
Alketa Peci (Fundação Getulio Vargas, Rio de Janeiro / RJ - Brasil) https://orcid.org/0000-0002-0488-1744
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Editor adjunto:
Sandro Cabral (Insper Instituto de Ensino e Pesquisa, São Paulo / SP - Brasil) https://orcid.org/0000-0002-8663-2441
Disponibilidade de dados
Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
05 Dez 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
20 Ago 2024 -
Aceito
08 Jun 2025
