Classificação de clones de Eucalyptus sp visando à produção de polpa celulósica

Classification of Eucalyptus sp clones for kraft pulp production

Classificação de clones de Eucalyptus sp visando à produção de polpa celulósica

Classification of Eucalyptus sp clones for kraft pulp production

Paulo Fernando Trugilho^I; Maria Lucia Bianchi^II; José Lívio Gomide^III; Ulf Schuchardt^IV

^IDepartamento de Ciências Florestais da UFLA. E-mail:<[e-mail]>

^IIDepartamento de Química da UFLA. E-mail:<[e-mail]>

^IIIProfessor do Departamento de Engenharia Florestal da UFV. E-mail: <[e-mail]>

^IVDepartamento de Química Inorgânica do Instituto de Química da UNICAMP. E-mail:<[e-mail]>

RESUMO

Este trabalho objetivou classificar e selecionar clones de Eucalyptus sp, tendo em vista a qualidade das polpas kraft obtidas a partir de cada material. Os clones foram classificados quanto a rendimento depurado, viscosidade da polpa e álcali ativo usado no processo de polpação. A classificação dos clones foi realizada por meio da análise de agrupamento, utilizando-se o método de otimização de Tocher. A análise de agrupamento permitiu a separação dos clones em cinco grupos distintos, sendo encontrados grupos de clones com alto, médio e baixo potenciais para produção de polpa celulósica. As características que mais contribuíram para a divergência foram o rendimento depurado (58,1%) e a viscosidade da polpa celulósica (35,0%). Em geral, nos clones avaliados foram verificadas grandes variações com relação aos parâmetros estudados.

Palavras-chave: Clone, Eucalyptus sp, polpa Kraft e análise de agrupamento.

SUMMARY

The objectives of this study were to classify and select clones of Eucalyptus sp, aiming at pulp quality improvement. The clones were classified according to the screened yield, pulp viscosity and active alkali used for pulping. Classification of the clones was achieved by cluster analysis using the Tocher method. The clones were classified in groups having high, medium and low potential for pulp production. The results showed that the parameter that most contributed to group the different Eucalyptus sp clones was the screened yield (58,1%), followed by pulp viscosity (35,0%). In general, large variation was observed for the parameters evaluated.

Key words: Clone, Eucalyptus sp, kraft pulp, cluster analysis.

1. INTRODUÇÃO

A classificação e a seleção de indivíduos mais aptos a determinado uso têm sido muito exploradas atualmente. A classificação de material de qualidade superior deve levar em consideração tanto as características associadas à madeira quanto as do produto desejado. A busca por características que definam a qualidade e permitam a seleção de indivíduos de maior potencial para dado uso é bem antiga. Com relação especificamente à produção de polpa celulósica, variáveis relativas à madeira e ao processo de obtenção da polpa devem ser avaliadas.

Vários estudos têm sido realizados visando avaliar os efeitos das propriedades químicas e físicas da madeira no processo de polpação e na qualidade da polpa de eucalipto, especialmente pelo processo kraft (FONSECA et al., 1996). Uma característica física que sempre foi utilizada para a classificação e seleção de material superior é a densidade básica da madeira, a qual se tornou um índice de qualidade. Com relação ao processo e à qualidade da polpa celulósica, variáveis como o álcali ativo, o rendimento depurado e a viscosidade são muito importantes. O teor de álcali ativo usado depende, dentre outras características, da densidade básica da madeira (VASCONCELOS e SILVA JR., 1985). Logicamente, a variação no teor de álcali ativo usado levará a diferentes rendimentos e viscosidades da polpa produzida.

Notadamente, muitos pesquisadores se preocupam somente em obter a relação entre as características da madeira e as da polpa ou do papel, esquecendo-se de fazer a devida classificação do material, com vistas à sua separação em classes de qualidade.

A avaliação da qualidade é feita por meio da medição dos atributos de um mesmo indivíduo, os quais, na maioria das vezes, são analisados separadamente. É o que geralmente ocorre quando se dá um tratamento univariado aos atributos avaliados de um indivíduo. Esse fato contribui para dificultar ou até mesmo impedir que se possa fazer uma classificação mais precisa do material avaliado, levando equivocadamente ao descarte de material superior.

As técnicas de análises multivariadas permitem avaliar, de forma conjunta, as informações contidas nos vários atributos mensurados e, dessa forma, ter maior clareza da magnitude da variação, sendo eficiente na classificação e seleção do indivíduo.

O uso dessas técnicas tem aumentado muito nos últimos anos, principalmente após o desenvolvimento da informática. No campo florestal várias pesquisas já vêm sendo desenvolvidas, e muitos trabalhos têm sido publicados. Laar (1987) fez uma síntese da aplicação das técnicas de análises multivariadas em pesquisas na área florestal.

Uma técnica multivariada que permite a classificação de material é a análise de agrupamento. Essa análise tem por finalidade reunir, por algum critério de classificação, os indivíduos ou qualquer outro tipo de unidade amostral em vários grupos, de tal forma que existam homogeneidade dentro e heterogeneidade entre grupos. Alternativamente, as técnicas de agrupamento têm por objetivo, ainda, dividir um grupo original de observações em vários grupos, segundo algum critério de similaridade ou dissimilaridade (CRUZ e REGAZZI, 1994).

O objetivo do presente trabalho foi classificar e selecionar clones de Eucalyptus sp. utilizando as características de produção de polpa celulósica, ou seja, a viscosidade, o rendimento depurado e o álcali ativo, em relação ao processo kraft. Para isso foi utilizada a análise de agrupamento ("Cluster Analysis"), que é uma das técnicas multivariadas de análise de dados.

2. MATERIAL E MÉTODOS

2.1. Material

Foram utilizados neste estudo 15 clones de Eucalyptus sp. com seis anos de idade, tendo sido coletadas duas árvores por clone. Os clones são provenientes de um teste clonal na Fazenda Riacho, que pertence à Votorantim Metais (VM-AGRO), localizada no município de Paracatu, região noroeste do Estado de Minas Gerais. As árvores foram derrubadas, retirando-se toretes de 30 cm de comprimento a 0, 25, 50, 75 e 100% da altura comercial, para obter uma amostragem bastante homogênea do material. Os toretes foram descascados e picados, para a obtenção dos cavacos usados nas polpações.

2.2. Polpação e análise das polpas

Foram realizados quatro cozimentos para cada árvore de cada clone, o que resultou um total de 120 polpações, utilizando-se diferentes cargas de álcali ativo. Em cada cozimento foram determinados os valores de rendimento depurado, número kappa e viscosidade da polpa produzida. Para obtenção do kappa 18, ajustaram-se equações de regressão, modelo quadrático, em que a variável independente foi o kappa, sendo as variáveis dependentes o álcali ativo, o rendimento depurado e a viscosidade da polpa celulósica.

Os cozimentos kraft foram realizados em autoclave rotativa, com quatro reatores individuais de dois litros cada um, aquecida eletricamente e dotada de termômetro e manômetro. Nos cozimentos, utilizaram-se diferentes cargas de álcali ativo, expressas como NaOH, para estabelecer a curva de deslignificação da amostra. Essas cargas de álcali foram selecionadas após a realização de cozimentos exploratórios, objetivando a obtenção de número kappa próximo de 18 na parte mediana da curva.

Os cozimentos foram realizados nas seguintes condições: cavacos = 300 g a.s., sulfidez = 25%, relação licor/madeira = 4/1, temperatura máxima = 170 °C, tempo até temperatura máxima = 90 min e tempo na temperatura máxima = 60 min.

2.3. Lavagem, desfibramento e depuração da celulose

Após o cozimento, os cavacos foram lavados exaustivamente com água na temperatura ambiente, utilizando-se tela de aço inox de 150 mesh. A individualização das fibras foi realizada em "hidrapulper" laboratorial de 25 L de capacidade, numa consistência de aproximadamente 0,6%. A depuração da celulose foi realizada em depurador laboratorial Voith dotado de placa com fendas de 0,2 mm. A celulose, após lavagem, desfibramento e depuração, foi desaguada em centrífuga, a uma consistência de cerca de 30%, e armazenada em saco de polietileno, para análises posteriores.

2.4. Caracterização da celulose

Foram determinados o rendimento depurado, o número kappa e a viscosidade das polpas celulósicas, de acordo com métodos-padrão (TAPPI, 2001).

2.5. Delineamento experimental

Na avaliação do experimento, utilizou-se o delineamento inteiramente casualizado com duas repetições (árvores-amostra). A análise de agrupamento foi realizada de acordo com o procedimento descrito por Cruz e Regazzi (1994).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados médios das características avaliadas na polpa celulósica produzida, estimados pelas equações de regressão visando ao número kappa 18, de densidade básica da madeira, e os coeficientes de variação encontram-se no Quadro 1. As análises de variância do experimento indicam que o efeito de clone foi altamente significativo em todas as características, demonstrando a existência de grande variação entre os clones avaliados. Os valores dos coeficientes de variação experimentais foram baixos, em todas as características, de acordo com a classificação de Gomes (1990), o que indica a boa precisão da coleta dos dados e a eficiência do delineamento estatístico usado.

Em se tratando de um material que não foi plantado para atender à finalidade de produção de polpa celulósica, os valores de rendimento depurado obtidos de alguns clones de Eucalyptus sp. foram muito satisfatórios. Os resultados de rendimento depurado indicam a existência de grande variação entre clones, pois os valores variaram de 43 a 52%. Dentre os vários clones estudados, destacaram-se os de número 3 e 12 como matéria-prima de grande potencial para produção de polpa celulósica. Esses clones apresentaram como média dos rendimentos depurados e de viscosidade valores de, respectivamente, 51,6% e 58,2 cP. Além disso, foram os clones que necessitaram da menor quantidade de álcali ativo (17,6%) para a obtenção de polpa com kappa 18.

As viscosidades obtidas variaram amplamente, desde 19,85 até 61,40 cP, para um kappa 18. Essa grande variabilidade foi fortemente influenciada pela carga alcalina requerida para obtenção de kappa 18, que variou de 17,5 a 24,0%, e também pelas características químicas estruturais dos carboidratos das madeiras. Novamente, destacaram-se os clones 3 e 12, que apresentaram as maiores viscosidades e utilizaram a menor carga de álcali ativo no cozimento.

No Quadro 2, apresenta-se a classificação, com base nas características da polpa celulósica, realizada pela análise de agrupamento e método de otimização de Tocher, bem como os valores médios das características intragrupos. As características que mais contribuíram para a divergência, segundo o procedimento apresentado por Singh, citado por Cruz (1997), foram o rendimento depurado (58,1%) e a viscosidade da polpa celulósica (35,0%).

Observou-se que, dentre os vários clones estudados, aqueles de maior potencial para a produção de polpa celulósica (clones 3 e 12) foram classificados em um mesmo grupo (grupo 3). Esses clones resultaram em bons rendimentos, altas viscosidades e exigência de baixa carga de álcali para cozimento. No entanto, os clones que compõem o grupo 2 (clones 1 e 11) resultaram em polpas com baixo rendimento depurado, baixa viscosidade e exigência de elevado álcali ativo, tendo, portanto, menor potencial para a produção de polpa celulósica. Esses resultados indicaram a eficiência da análise de agrupamento, método de otimização de Tocher, na classificação dos clones e formação dos grupos.

O grupo 1, formado com a maioria dos clones (53,3%), apresentou valores médios considerados satisfatórios para as características avaliadas, mas baixos rendimentos depurados. No grupo 4 (clones 2 e 8) foram classificados os clones com potencial intermediário, ficando compreendido entre os grupos 1 e 3.

O clone 4 foi classificado em um grupo isolado (grupo 5), o que pode ser explicado pelo fato de a viscosidade da sua polpa ter sido baixa em relação aos valores obtidos nos demais clones, especialmente os do grupo 4. O clone 4 proporcionou polpa com rendimento superior ao dos clones 1 e 11. A Figura 1 ilustra as diferenças observadas entre os grupos.

Pode-se verificar, nessa figura, que o aumento do álcali ativo utilizado resultou numa diminuição da viscosidade da polpa. Isso ocorreu porque maior carga de álcali causa uma degradação mais intensa dos carboidratos que constituem a parede das fibras celulósicas, resultando numa diminuição da viscosidade. A carga alcalina aplicada exerceu considerável efeito na viscosidade. A Figura 1 também aponta uma tendência de aumento de rendimento depurado com a utilização de baixas cargas alcalinas e, conseqüentemente, com o aumento da viscosidade.

4. CONCLUSÃO

Pelos resultados, pode-se concluir que:

ocorreu grande variação entre os clones avaliados;

a análise de agrupamento classificou os clones em cinco grupos distintos;

os grupos 3 e 2 foram formados, respectivamente, com os clones de maior e menor potencial para produção de polpa celulósica;

as características que mais contribuíram para a divergência foram o rendimento depurado (58,1%) e a viscosidade da polpa celulósica (35,0%); e

a carga de álcali ativo exerceu maior efeito sobre a viscosidade da polpa celulósica que sobre o rendimento depurado.

5. AGRADECIMENTOS

Ao grupo Votorantim Metais (VM) - Unidade Agroflorestal, pelo apoio logístico e pela cessão do material utilizado.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Recebido em 14.11.2002 e aceito para publicação em 10.08.2004.

• CRUZ, C.D. Programa GENES - Aplicativo computacional em genética e estatística Viçosa, MG: Universidade Federal de Viçosa, 1997. 442p.
• CRUZ, C.D.; REGAZZI, A.J. Modelos biométricos aplicados ao melhoramento genético Viçosa, MG: Universidade Federal de Viçosa, 1994. 390p.
• FONSECA, S. M.; OLIVEIRA, R.C.; SILVEIRA, P.N. Seleção da árvore industrial, Revista Árvore, v.20, n.1, p. 69-85, 1996.
• GOMES, F. P. Curso de estatística experimental 13. ed. Piracicaba: Universidade de São Paulo, 1990. 466p.
• LAAR, A.V. Multivariate analysis - A way to better understanding of complexity. South African Forestry Journal, n.141, p.34-40, 1987.
• Technical Association of the Pulp and Paper Industry - TAPPI. Standard Methods Atlanta: Tappi Press, 2001.
• VASCONCELOS DIAS, R.L.; SILVA JR., C.E. Pulp and paper properties as influenced by wood density: species and age of Eucalyptus sp Aracruz-ES: Centro de Pesquisa e Tecnologia, Aracruz Celulose S.S., 1985. p. 7-35.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  16 Maio 2005
• Data do Fascículo
  Dez 2004

Histórico

• Aceito
  10 Ago 2004
• Recebido
  14 Nov 2002