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Caracterização mecânica de misturas solo-escória de alto-forno granulada moída para aplicações em estradas florestais

Mechanical characterization of soil and granulated blast furnace slag mixtures for forest road applications

Resumos

O presente artigo objetivou avaliar a resistência mecânica de misturas solo-escória de alto-forno granulada moída e ativada com cal hidratada, para aplicações como camada de pavimentos de estradas florestais. O solo analisado é um residual jovem de gnaisse da Zona da Mata Norte de Minas Gerais, de textura areno-silto-argilosa, classificado como A-2-4 (0) pelo Sistema TRB e como NS' pela Metodologia MCT. A escória de alto-forno granulada moída empregada foi fornecida pela companhia brasileira Valemassa Indústria e Comércio de Argamassa Ltda. Utilizou-se uma cal hidratada comercial como agente ativador das reações de hidratação da escória. Trabalhou-se com teores de escória de 5, 10 e 15%, em relação à massa de solo seco, e de cal hidratada de 5, 10 e 20%, em relação à massa seca de escória. O estudo englobou a realização de ensaios de caracterização química da escória e de caracterização geotécnica do solo, bem como ensaios de compactação e de compressão não-confinada das misturas na energia de compactação do Proctor intermediário, considerando-se os períodos de cura em câmara úmida de 1, 7 e 28 dias. Os resultados indicaram ganhos significativos de resistência mecânica das misturas com relação ao solo, observando-se aumentos expressivos na resistência mecânica, com aumentos nos teores de escória, cal e período de cura.

Estradas florestais; misturas solo-escória de alto-forno granulada moída e resistência mecânica


This paper addresses the evaluation of the mechanical strength of mixtures of a soil and a granulated blast furnace slag activated with hydrated lime for forest road engineering applications. The tested soil is a young residual gneiss soil classified as A-2-4 (0) by the TRB System and as NS' by the MCT Methodology. The slag was supplied by the Brazilian company Valemassa Indústria e Comércio de Argamassa Ltda. A commercial hydrated lime was used to activate slag hydration reactions. The laboratory testing program encompassed the following: geotechnical soil characterization; specimens prepared at slag contents of 5, 10 and 15 % related to the soil dry mass, and lime contents of 5, 10 and 20 % related to the dry slag mass; specimens compacted at the intermediate Proctor compaction effort; unconfined compression strength tests performed in specimens at the curing times of 1, 7 and 28 days. Data from the laboratory testing program supported significant increase in mechanical strength of mixtures when increasing slag and lime contents, as well as curing time.

Forest roads; soil and granulated blast furnace slag mixtures and mechanical strength


Caracterização mecânica de misturas solo-escória de alto-forno granulada moída para aplicações em estradas florestais

Mechanical characterization of soil and granulated blast furnace slag mixtures for forest road applications

Rodrigo Zorzal VeltenI; Alexandre Pelissari Sant'AnaII; Dario Cardoso de LimaIII; Cláudio Henrique de Carvalho SilvaIII; Carlos Alexandre Braz de CarvalhoIII; Lauro Gontijo CoutoIII; Carlos Cardoso MachadoIV

IPrograma de Pós-Graduação em Engenharia Civil da Universidade Federal de Viçosa. E-mail: <rzorzal@bol.com.br>

IIFurnas Centrais Elétricas S.A

IIIDepartamento de Engenharia Civil da UFV. E-mail: <declima@ufv.br>

IVDepartamento de Engenharia Florestal da UFV. E-mail: <machado@ufv.br>

RESUMO

O presente artigo objetivou avaliar a resistência mecânica de misturas solo-escória de alto-forno granulada moída e ativada com cal hidratada, para aplicações como camada de pavimentos de estradas florestais. O solo analisado é um residual jovem de gnaisse da Zona da Mata Norte de Minas Gerais, de textura areno-silto-argilosa, classificado como A-2-4 (0) pelo Sistema TRB e como NS' pela Metodologia MCT. A escória de alto-forno granulada moída empregada foi fornecida pela companhia brasileira Valemassa Indústria e Comércio de Argamassa Ltda. Utilizou-se uma cal hidratada comercial como agente ativador das reações de hidratação da escória. Trabalhou-se com teores de escória de 5, 10 e 15%, em relação à massa de solo seco, e de cal hidratada de 5, 10 e 20%, em relação à massa seca de escória. O estudo englobou a realização de ensaios de caracterização química da escória e de caracterização geotécnica do solo, bem como ensaios de compactação e de compressão não-confinada das misturas na energia de compactação do Proctor intermediário, considerando-se os períodos de cura em câmara úmida de 1, 7 e 28 dias. Os resultados indicaram ganhos significativos de resistência mecânica das misturas com relação ao solo, observando-se aumentos expressivos na resistência mecânica, com aumentos nos teores de escória, cal e período de cura.

Palavras-chave: Estradas florestais, misturas solo-escória de alto-forno granulada moída e resistência mecânica.

ABSTRACT

This paper addresses the evaluation of the mechanical strength of mixtures of a soil and a granulated blast furnace slag activated with hydrated lime for forest road engineering applications. The tested soil is a young residual gneiss soil classified as A-2-4 (0) by the TRB System and as NS' by the MCT Methodology. The slag was supplied by the Brazilian company Valemassa Indústria e Comércio de Argamassa Ltda. A commercial hydrated lime was used to activate slag hydration reactions. The laboratory testing program encompassed the following: geotechnical soil characterization; specimens prepared at slag contents of 5, 10 and 15 % related to the soil dry mass, and lime contents of 5, 10 and 20 % related to the dry slag mass; specimens compacted at the intermediate Proctor compaction effort; unconfined compression strength tests performed in specimens at the curing times of 1, 7 and 28 days. Data from the laboratory testing program supported significant increase in mechanical strength of mixtures when increasing slag and lime contents, as well as curing time.

Keywords: Forest roads, soil and granulated blast furnace slag mixtures and mechanical strength.

1. INTRODUÇÃO

Segundo a Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Asfaltos (ABEDA, 2001), a malha rodoviária nacional apresenta uma extensão da ordem de 1.725.000 km, com aproximadamente 10% pavimentados; desse total, 83% enquadram-se na categoria de rodovias municipais e vicinais, dos quais 1,2% encontra-se pavimentado. Com relação ao setor florestal, Machado e Malinovski (1986) estimaram a extensão da malha viária em aproximadamente 600.000 km.

Supondo que a grande parcela das rodovias em terra justifique os serviços de pavimentação ou outras melhorias que envolvam camadas do pavimento estabilizadas quimicamente, seja pelo número de veículos, seja pela importância regional e estratégica, provavelmente algumas centenas de milhares de quilômetros necessitarão ser pavimentados no médio e longo prazos, nos setores público e florestal do Brasil.

O presente trabalho insere-se em uma abordagem do emprego de resíduos industriais na melhoria do pavimento de estradas, em especial de estradas florestais. Nele, apresenta-se um estudo dirigido ao uso da escória de alto-forno em misturas com um solo para aplicação como camada de pavimento de estradas, abrindo-se um campo de interesse para estradas florestais que estejam inseridas nas áreas de atuação de companhias siderúrgicas.

2. ESCÓRIA DE ALTO-FORNO

A escória de alto-forno é um resíduo siderúrgico industrial constituído, basicamente, de aluminossilicatos cálcicos, como resultado da combinação da ganga do minério de ferro com as cinzas do coque e do calcário utilizado como fundente no processo siderúrgico da fabricação do ferro fundido ("ferro-gusa").

A composição química e o processo de resfriamento da escória de alto-forno são fatores determinantes na sua capacidade aglomerante. A escória, quando submetida a condições de resfriamento brusco na saída do alto-forno (processo chamado de granulação da escória), apresenta propriedades hidráulicas latentes (escória vítrea); mas, se o processo empregado for o contrário (resfriamento lento), a escória se cristaliza, formando-se um produto sem atividade hidráulica.

Assim, pode-se associar a reatividade da escória de alto-forno à sua forma de obtenção no estado vítreo. Todavia, deve-se ressaltar que essa condição apenas não é suficiente para o seu emprego como aglomerante, pois é necessário que a escória seja solúvel, isto é, passível de ataque pela água, para que os elementos formadores dos compostos hidráulicos sejam liberados. Essa solubilidade é favorecida pelo teor de óxido de cálcio presente na escória. Dessa forma, a reação é lenta, mas, em meio fortemente alcalino ou através da ação de sulfatos ou de ambos, torna-se acelerada, sendo a velocidade de reação favorecida pela finura da escória (CINCOTTO et al., 1992).

3. MATERIAL E MÉTODOS

3.1. Material

3.1.1. Solo

Trabalhou-se com um solo residual jovem de gnaisse da Zona da Mata Norte de Minas Gerais. A amostra foi coletada no horizonte C de um talude de corte localizado na Vila Secundino, no Campus da Universidade Federal de Viçosa, na cidade de Viçosa.

3.1.2. Escória de alto-forno granulada moída

A escória de alto-forno granulada utilizada foi produzida pela empresa Aço Minas Gerais S. A. - Açominas, com composição química apresentada no Quadro 1. Esse resíduo foi moído pela empresa Valemassa Indústria e Comércio de Argamassa Ltda., que forneceu uma amostra desse material para ser utilizada no presente trabalho.


3.1.3. Cal hidratada

Foi empregada uma cal hidratada comercial adquirida no comércio da cidade de Viçosa, Minas Gerais, da marca SUPERCAL e fabricada pela companhia ICAL. Sua função nas misturas foi atuar como elemento ativador das reações de hidratação dos compostos químicos da escória de alto-forno granulada moída.

3.2. Métodos

No presente estudo, trabalhou-se com: (i) caracterização geotécnica do solo e química da escória de alto-forno granulada moída; (ii) teores de escória de alto-forno granulada moída de 5, 10 e 15% em relação à massa seca de solo; (iii) teores de cal hidratada de 5, 10 e 20% em relação à massa seca de escória; (iv) compactação de corpos-de-prova do solo e de suas misturas com escória de alto-forno e cal hidratada na energia do ensaio Proctor intermediário; (v) ensaios de compressão não-confinada realizados nos corpos-de-prova do solo e misturas compactados, nos períodos de cura de 1, 7 e 28 dias.

Os ensaios foram realizados segundo as seguintes Normas Técnicas: granulometria (ABNT, 1984a), limites de Atterberg (ABNT, 1984bc), massa específica dos grãos (ABNT, 1984d), compactação (ABNT, 1986) e compressão não-confinada (DNER, 1994). Considerando que, presentemente, não se dispõe de norma técnica brasileira específica para a determinação da resistência mecânica das misturas em estudo, adotou-se aquela preconizada pelo extinto Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER, 1994) para a caracterização de misturas solo-cimento, envolvendo as etapas de compactação, cura, imersão em água e ruptura dos corpos-de-prova.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

No Quadro 2, apresentam-se os resultados dos ensaios de caracterização geotécnica realizados com o solo em estudo. Observa-se, nesse quadro, que o solo apresenta plasticidade relativamente baixa, com IP da ordem de 11% e textura areno-argilo-siltosa, sendo classificado como A-2-4 (0), segundo o sistema TRB, e como NS', segundo a Metodologia MCT.


No Quadro 3, mostram-se os resultados dos ensaios de compactação, englobando os parâmetros umidade ótima (hot) e peso específico aparente seco máximo (gdmax) das misturas solo e escória, nas nove combinações de solo, escória de alto-forno granulada moída e cal hidratada consideradas no presente trabalho. Para fins práticos, observou-se que a adição de escória de alto-forno granulada moída e cal hidratada aos solos não conduziu a variações significativas nos parâmetros ótimos de compactação.


Os Quadros 4, 5 e 6 trazem os resultados dos ensaios de resistência à compressão não confinada das misturas solo, escória de alto-forno granulada moída e cal realizados, respectivamente, nos períodos de cura de 1, 7 e 28 dias. Com relação aos dados apresentados nesses quadros, como já relatado por Sant'Ana et al. (2004), informa-se que as misturas com 5% de escória ativada com 5 e 10% de cal hidratada e 10% de escória ativada com 5% de cal hidratada não resistiram à imersão em água por quatro horas nos ensaios de compressão axial realizados em corpos-de-prova cilíndricos segundo a metodologia recomendada pelo DNER (1994) para misturas solo-cimento, considerando-se os períodos de cura de 1, 7 e 28 dias. No presente trabalho, o mesmo comportamento foi, também, observado na mistura com 15% de escória ativada com 5% de cal hidratada, nos períodos de cura de 1 e 28 dias. Acredita-se que o desempenho dessa mistura aos sete dias de cura possa estar relacionado com possível desvio ocorrido no processo de compactação dos corpos-de-prova, embora se deva ressaltar que os valores de resistência à compressão não confinada, obtidos nesse período de cura (Quadro 5), são de pequena monta, da ordem daqueles associados às misturas com 5% de escória e 20% de cal e 10% de escória e 10% de cal, no primeiro dia de cura (Quadro 4).




Observa-se também, no Quadro 4, que, independentemente do período de cura considerado, aumentando os teores de escória e cal, aumentaram, significativamente, as resistências mecânicas das misturas, o que comprovou a ação positiva da escória, como agente estabilizante do solo analisado, e da cal, como agente de ativação de reações de hidratação da escória. Outro aspecto de interesse observado foi a influência positiva do período de cura nos ganhos significativos de resistência mecânica das misturas, observando-se o desenvolvimento de reações de cimentação com o tempo, como ilustra a Figura 1, com preponderância para os ganhos ocorridos nos primeiros sete dias de cura.


Considerando os teores de escória de alto-forno granulada moída e cal hidratada empregados no presente trabalho, bem como a recomendação da Norma Técnica NBR 12253 (ABNT, 1992) para misturas solo-cimento, que destaca que a resistência mínima dessas misturas deve ser igual ou superior a 2,1 MPa para um período de cura de sete dias, conclui-se que a mistura com 10% de escória ativada com 10% de cal praticamente atendeu às exigências de misturas solo-cimento para emprego como camadas de base e sub-base de pavimentos rodoviários.

5. CONCLUSÃO

A análise dos resultados do programa experimental leva às seguintes conclusões: (i) a escória de alto-forno granulada moída ativada com cal hidratada mostrou-se um agente químico eficiente na estabilização do solo residual jovem em estudo; (ii) a adição de escória ao solo não causou variações significativas nos parâmetros ótimos de compactação desse solo; (ii) considerando-se o desvio-padrão observado, a mistura de 10% de escória ativada com 10% de cal atingiu aos sete dias de cura, para fins práticos, as exigências mínimas de resistência mecânica para o emprego de misturas solo-cimento como camadas de base de pavimentos rodoviários, segundo a NBR 12253.

6. AGRADECIMENTOS

Ao CNPq, pela concessão de bolsas de iniciação científica ao primeiro autor; à companhia Valemassa Indústria e Comércio de Argamassa Ltda., pelo fornecimento da escória de alto-forno granulada; e à Universidade Federal de Viçosa, pela infra-estrutura de laboratório e pessoal para a realização do presente trabalho.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Recebido em 30.03.2005 e aceito para publicação em 10.11.2005.

  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS EMPRESAS DISTRIBUIDORAS DE ASFALTO - ABEDA. Manual básico de emulsões asfálticas: soluções para pavimentar sua cidade. Rio de Janeiro: 2001. 134p.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS - ABNT. NBR 7181/84, Solo - Análise Granulométrica - Procedimento Rio de Janeiro: 1984a. 13p.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS - ABNT. NBR 6459/84, Solo - Determinação do Limite de Liquidez - Procedimento Rio de Janeiro: 1984b. 6p.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS - ABNT. NBR 7180/84, Solo - Determinação do Limite de Plasticidade - Procedimento Rio de Janeiro: 1984c. 3p.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS - ABNT. NBR 6508/84, Solo - Determinação da Massa Específica Aparente - Procedimento Rio de Janeiro: 1984d. 8p.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS - ABNT. NBR 7182/84, Solo - Ensaio de Compactação - Procedimento Rio de Janeiro: 1986. 10p.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS - ABNT. NBR 12253/92, Solo - Cimento - Dosagem para Emprego como Camada de Pavimento Rio de Janeiro: 1992. 7p.
  • CINCOTTO, M. A.; BATTAGIN, A. F.; AGOPYAN, V. Características da Escória Granulada de Alto-Forno e seu Emprego como Aglomerante e Agregado São Paulo: IPT, 1992. (Boletim, 65).
  • DEPARTAMENTO NACIONAL DE ESTRADAS DE RODAGEM - DNER. DNER-ME 201/94, Solo-cimento - Compressão Axial de Corpos-de-prova Cilíndricos - Método de Ensaio Rio de Janeiro: Norma Rodoviária, 1994. 4p.
  • MACHADO, C. C.; MALINOVSKI, J. R. Rede viária florestal Curitiba: FUPEF, 1986. 157p.
  • SANT'ANA, A. P. et al. Avaliação da resistência mecânica de misturas solo-escória de alto-forno granulada moída para fins rodoviários. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE JOVENS GEOTÉCNICOS, 1., 2004, São Carlos. Simpósio São Carlos: EESC/Universidade de São Paulo, 2004. 6p. (CD-ROM).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Maio 2006
  • Data do Fascículo
    Abr 2006

Histórico

  • Aceito
    10 Nov 2005
  • Recebido
    30 Mar 2005
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